terça-feira, janeiro 30, 2018

(O) Barba de molho - CARLOS ANDREAZZA

O Globo - 30/01

A matriz da insegurança jurídica galopante hoje no Brasil é o STF, fonte da instabilidade sobre a qual Lula se reinventa a ponto mesmo de raptar adversários para seu discurso


Então nos acercamos do momento decisivo em que a Justiça responderá ao cidadão brasileiro — sobre o mais visível dos casos — se tem mesmo, conforme acusam historicamente os petistas, seus privilegiados, se está ou não a serviço do establishment ; se é para todos ou não. Aqui, porém, o drama convida a ironia. Isso porque é Lula — o homem do povo — o sujeito cujo futuro, em 2018, dirá se, apesar da Lava-Jato, nada mudou; se as cortes superiores deste país continuarão rebolando, jurisprudência formada e reformada segundo o vento partidário na biruta, para que os poderosos assim permaneçam.

O porvir do ex-presidente esclarecerá se ele é ou não um poderoso; se é um dos intocáveis em função dos quais, fulanizadas, as leis se aparam; se é ou não, retórica popular à parte, um representante das elites contra as quais porção resistente de seus eleitores sempre votou. E aí? Tudo o mais constante, uma vez cumpridos os ritos recursais e de acordo com o entendimento corrente do Supremo Tribunal Federal: Lula será preso. Isso se as regras de hoje valerem amanhã. Alguém, entretanto, apostaria nisso? Com firmeza, alguém? Embora só agora o jornalismo tenha lançado a devida atenção ao movimento, faz meses — sempre com o destino do ex-presidente no radar — que o STF testa, em suas turmas, derrubar a jurisprudência que autoriza que um réu, uma vez condenado em segunda instância, possa ser preso.

A preparação do terreno foi — é — primorosa: depois de tatear a cancha, medindo a reação da sociedade frente à intenção, o tribunal de Cármen Lúcia ora simula uma dança de cadeiras, uma troca de convicções, Gilmar para um lado, Rosa Weber para outro, tudo para que, afinal, aquele que não havia participado da deliberação anterior, Alexandre de Moraes, pronunciese pela flexibilização da cousa, talvez de modo a subir um grau na exigência e condicionar — para que a prisão seja possível — a condenação em um segundo órgão colegiado; no caso de Lula, o STJ. Uma lambada para que escape da cadeia.

Alguém duvida? Sobretudo: alguém duvida de que juízes de nossa corte máxima se orientem não em relação a fatos, mas a nomes? Há mais de ano escrevo que a matriz da insegurança jurídica galopante hoje no Brasil é o Supremo, fonte da instabilidade sobre a qual Lula se reinventa a ponto mesmo de raptar adversários para seu discurso. Ou haverá outra maneira de ler as declarações de autoridades — Temer, Alckmin, Doria, Maia, Meirelles etc. — segundo as quais, para a pacificação democrática do país, melhor seria que o ex-presidente disputasse a eleição e fosse derrotado nas urnas?

Isso — essa barbaridade, essa ignorância política, esse desrespeito à ordem institucional, deturpação que é o próprio sonho do lulismo — significa passar a mão na bunda da ideia de Justiça e transformar o que é um processo judicial em disputa eleitoral, como se o julgamento fosse exercício de exceção, como se o juiz fosse um oponente de Lula, o perseguido.

Estou errado? Não é essa a estratégia esquerdista, bovinamente chancelada por seus adversários? Ou será a universalização desse discurso pela classe política puro medo e método? Já defendi a tese de que políticos querem o ex-presidente candidato porque isso traduziria o absoluto triunfo da impunidade, a Lava-Jato tombada ante o establishment: se Lula, mesmo condenado em segunda instância, vencer tudo o que há contra si e puder (alguém descarta a possibilidade?) concorrer em outubro, o que significará haver fulminado a regra por meio da qual deveria ser preso e, em efeito dominó, a Lei da Ficha Limpa, que o tornaria inelegível, ninguém mais cairá. Mas esse é o cálculo dos políticos.

Como, porém, lidar com as palavras, em entrevistas, de Marco Aurélio Mello, ilha suprema para quem a prisão de Lula — como se não houvesse a jurisprudência do STF, tribunal que integra — seria precipitada e traria riscos de caos social? O que é isso, senão explícita manifestação de que a lei se curva a pressões, recua ante o mito da convulsão popular e se molda à agenda política de apaniguados? O que é isso, senão prudência seletiva? O que é isso, senão um habeas corpus preventivo apregoado nas páginas dos jornais? E veja que concordo com o ministro no conceito: prisão sem trânsito em julgado é inconstitucional. Muito pior do que isso, contudo, é que uma corte constitucional ajuste entendimento a depender do réu.

Lula jamais lidou com as ações que há contra si como matéria jurídica — ou teria trocado de advogado, né? Para ele, a condenação em segunda instância nunca foi dúvida. Tampouco lhe importava o placar do julgamento, porque os embargos que lhe interessam já estão interpostos faz tempo (com adesão luxuosa de adversários parvos ou apavorados, e de juízes covardes ou mal-intencionados): a politização radical dos processos judiciais e a judicialização extrema do processo eleitoral.

Politicamente, nesta altura, é erro primário de leitura analisar o tabuleiro para 2018 sem Lula, como se fosse uma peça que se pode suprimir, apagar, do jogo com uma sentença judicial; como se não fosse, ao contrário, a presença eleitoral em função da qual todos se organizam. Politicamente, preso ou não, com candidatura formalmente viável ou não, com nome na urna ou não, por meio de poste ou não: Lula será candidato.

A questão jurídica, no entanto, permanece a mesma: e aí, doutor, a lei é para todos ou não; Lula é homem comum ou não?

A palavra 'mal' foi abolida do nosso vocabulário covarde - JOÃO PEREIRA COUTINHO

FOLHA DE SP - 30/01

Ficar sem palavras é a pior coisa que pode acontecer a quem vive delas. Mas há sempre uma primeira vez.

Amigos sábios tinham feito um ultimato: ou eu assistia a "O Ato de Matar", o premiado documentário de Joshua Oppenheimer, ou eles cortavam relações comigo.

Cedi. Tinham razão. É talvez a mais radical e perturbadora experiência cinematográfica dos meus últimos longos anos.

Cenário: Indonésia, dias de hoje. Tema: as matanças organizadas por milícias pró-Suharto depois do golpe militar de 1965 para limpar o país de "comunistas" (um termo suficientemente vago que tanto se aplica a militantes marxistas como a imigrantes chineses).

Mas o melhor de tudo são os atores principais: nada menos que os próprios carrascos, hoje envelhecidos, e que partilham com Oppenheimer lembranças e técnicas com uma naturalidade que está para lá do bem e do mal. E, quando digo "atores", a palavra é exata: eles não apenas falam abertamente dos seus crimes como encenam os crimes para explicar melhor.

O caso de Anwar Congo merece destaque. No início do documentário, encontramos a lenda (tradução: mais de mil vítimas). E o que impressiona no velho Anwar é a sua alegria –não a alegria de viver, mas a alegria que sente na evocação da matança.

Eu sei, eu sei: a palavra "mal", hoje, foi abolida do nosso vocabulário covarde. O mal nasce da pobreza, da ignorância, da doença. Ou, melhor ainda, é um resquício lamentável de fantasias religiosas.

Para Anwar, o mal é uma afirmação da existência. Os detratores das milícias gostam de usar a palavra "gangsters". Mas Anwar gosta dessa palavra: "gangster", diz-nos ele com a sabedoria de um filólogo, significa "homem livre". E os "homens livres" criam as suas próprias leis.

Anwar é uma espécie de existencialista do açougue que aprendeu tudo com o cinema americano. A pose, os ternos, os gestos. E, claro, as técnicas.

Com ele visitamos o terraço de uma casa que servia de matadouro nos anos loucos de 1965 e 1966. Era uma terrível sujidade –o sangue, o cheiro. Quem aguentava aquilo?

Poucos. Ninguém. Os nazistas, que eram os nazistas, só optaram pelas câmeras de gás porque os fuzilamentos em massa andavam a perturbar a saúde psíquica dos soldados do Reich.

Então o nosso "gangster" começou a estrangular com arame, o método mais barato e eficaz. Ele próprio, com um amigo, mostra-nos como a coisa funcionava. É tão fácil como andar de bicicleta –e ele conta tudo como quem fala de uma bicicleta.

E a consciência? Haverá uma consciência que tudo vigia e condena?

Boa pergunta. Uma pergunta que os carrascos fazem uns aos outros. O nosso Anwar, apesar da alegria, confessa a um deles que ainda tem pesadelos. O outro desvaloriza: diz-lhe que é uma questão de nervos mas que um bom médico cura tudo.

Depois, em momento que parece ter sido escrito por Dostoiévski "lui même", ainda aconselha: o segredo de matar com a consciência tranquila é encontrar uma boa desculpa para o ato.

E para quem pensa que existem leis internacionais –ou, jocosamente, "direitos humanos"– que impedem esse ato, um dos carrascos decide filosofar: a Convenção de Genebra foi escrita por vencedores. Ali, na Indonésia, eles são os vencedores. O código que interessa é outro: a Convenção de Jacarta, digamos.

Era Adam Smith, na sua "Teoria dos Sentimentos Morais", quem dizia que só somos verdadeiramente humanos quando temos a capacidade de nos imaginarmos no lugar do outro.

"O Ato de Matar" apresenta-nos o resultado dessa "falha de imaginação": a transformação do ato de matar em simples rotina cotidiana. Como escovar os dentes, comer, fumar.

Terminei o documentário sem palavras. E depois, consultando as notícias do dia, lá encontrei as polêmicas do momento. Como, por exemplo, as acusações pungentes de que os filmes de James Bond são "sexistas" e merecem boicote.

Em condições normais, tanta estupidez teria o dom de me enervar. À luz do documentário, olho para elas com uma brandura paternal. As cabecinhas vazias do Ocidente que perdem tempo com essas coisas são, afinal, crianças brincando no jardim.

Discurso petista pede a violação da lei em prol de Lula - JOEL PINHEIRO DA FONSECA

FOLHA DE SP - 30/01
O discurso de defesa política de Lula como candidato envolve necessariamente afirmar uma conspiração de todo o Judiciário, toda a grande mídia e ainda grande parte dos partidos políticos. Exige também, a partir da semana passada, pedir a violação da lei em prol de um cidadão. Quem acreditasse e propusesse isso a sério não teria como participar normalmente da vida democrática do país, pois negaria frontalmente nossas instituições e defenderia, se possível, sua anulação na marra. Por sorte, embora muitos repitam esse discurso, ninguém está disposto a realizá-lo.

Esse é o sinal claro de que a polarização tem aumentado: a necessidade de negar as instituições normais da vida política e social -em particular a mídia, que é de onde vêm informações que não se pautam pela narrativa paranoica- para sustentar a própria posição.

O único jeito de fazer isso e preservar uma aura de justiça é enxergar, por trás delas, uma vontade maléfica e todo-poderosa em operação. No caso do lulismo, essa entidade é o "golpe", que já foi elevado em entidade metafísica que se transforma e age no tempo. O julgamento de Lula é mais um desdobramento do golpe.

Lula diz que "não vê motivos" para respeitar a decisão da Justiça; Gleisi Hoffmann afirma que "vai morrer gente" caso Lula seja preso; João Pedro Stedile ameaça tomar as ruas para mostrar que quem manda no país não é o Estado. Seriam afirmações muito graves em qualquer país. A julgar por esse discurso, estamos próximos de uma guerra civil, de uma quebra irremediável do vínculo elementar de respeito à estrutura de poder vigente, que só pode se resolver na violência.

Mas estamos no Brasil, o país em que a palavra declamada aos quatro ventos não prenuncia ação nenhuma. Muito pelo contrário: ela preserva seu radicalismo justamente para não ter que se transformar em ação, posto que o custo seria alto demais. Um país em que se prega a revolução armada ao mesmo tempo em que se busca apoio do PMDB.

O discurso do "golpe" é usado pelas lideranças do lulismo para afagar o ego de seguidores sinceros. Esses, por sua vez, não farão absolutamente nada com essas palavras, a não ser um ou outro post nas redes sociais e, caso não chova, marcar presença em algum protesto na avenida Paulista. Estão do lado correto da história, e isso basta.

Não tenho a menor ilusão de ver Lula preso. Sua condenação é o momento perfeito para o STF reverter a prisão em segunda instância. Prender político graúdo já é demais, né? Não casa com nosso amor pelo caminho do meio, pelo tal acordo que a todos salva, e que muda apenas lentamente o equilíbrio do poder (sem que ninguém abra mão de seus ideais).

Entretanto, a Lei da Ficha Limpa será mantida e não veremos reação relevante nas ruas. O discurso do lulismo radical jamais foi levado a sério. Na prática, no campo que importa, o jogo segue, usando das palavras necessárias para colar com cada público. Se colar, colou. Se não colar, bola para a frente.

Para quem, como eu, participa desse jogo como público, um conselho: ser um pouco menos crente na santidade dos líderes, um pouco menos virtuoso no campo fácil do discurso e tentar se colocar de forma mais responsável no debate, pensando não em estar do lado "do bem", e sim no melhor resultado para a sociedade.

‘Queridos companheiros’ - JOSÉ CASADO

O Globo - 30/01

Lula lamentou não poder reencontrar velhos amigos no fim de semana em Adis Abeba, líderes de dinastias cleptocratas que sustentam longevas ditaduras


Sem passaporte, Lula não pôde encontrar “companheiros” ditadores na África. Horas depois de ser condenado a mais de 12 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, estava pronto para atravessar o Atlântico e participar de uma reunião sobre... a luta contra a corrupção. A viagem de dez mil quilômetros à Etiópia (14 horas em voo direto) foi abortada pela Justiça na sexta-feira. “Vejam que absurdo” — contou em video na página do PT. “Eu estava com a mala pronta, quando recebi um recado em casa: um juiz bloqueou o meu passaporte.”

Protestou: “Nós vivemos um momento de ditadura de uma parcela do Poder Judiciário, sobretudo o Poder Judiciário que cuida de uma coisa chamada Operação Lava-Jato, que vocês já devem ter ouvido falar aí na África.” Lula iria à cúpula da União Africana em Adis Abeba, capital de um país onde o “estado de emergência” é decreto recorrente, e a opinião pública não pode ser expressa nem em particular.

Queixou-se por não poder estar com “o querido companheiro” Hailemariam Desalegn, primeiro-ministro etíope, cuja polícia matou mil opositores nos últimos 16 meses e recolheu outros 21 mil a “campos de reabilitação” — informa a Human Rights Watch em relatório deste mês.

Organismo comunitário, a União Africana foi erguida nos anos 90 pelo falecido ditador líbio Muamar Kadafi, na época isolado porque patrocinava atentados como o da bomba num avião da Pan Am, que espalhou 270 cadáveres sobre uma vila da Escócia. Kadafi apoiou Lula na campanha de 2002, segundo o ex-ministro Antonio Palocci, preso em Curitiba. Eleito, Lula foi a Trípoli. A visita a Kadafi para “negócios” , como definiu, está contada em livro dos repórteres Leonêncio Nossa e Eduardo Scolese.

A viagem do ex-presidente à Etiópia foi organizada pelo “companheiro e querido irmão” José Graziano, a quem elegeu diretor da FAO, braço da ONU para a agricultura. Graziano foi ministro do Fome Zero. Bom projeto, o Fome Zero logo virou peça de marketing político no exterior em 2003. Morreu de inanição governamental, estimulada pela má vontade do PT, então focado nos “negócios” do caso Mensalão. Graziano inscreveu o antigo chefe num debate sobre fome com o “querido Obasanjo”, evento da cúpula africana sobre a luta contra a corrupção. Presidente da Nigéria (1999 a 2007), Olusegun Obasanjo recentemente foi declarado “avô da corrupção” pela Câmara de seu país, que constatou o sumiço de parte dos investimentos (US$ 16 bilhões) em projetos de energia.

Outros “companheiros” que Lula pretendia encontrar para “um abraço fraternal” eram Denis Nguesso (do Congo), Teodoro Obiang (da Guiné Equatorial), e Ali Bongo (do Gabão). O trio lidera dinastias cleptocratas que sustentam longevas ditaduras na África.

Os Nguesso colecionam 66 imóveis de luxo na França, segundo o Tribunal de Paris. Os Obiang escondiam uma conta bancária em Washington cujo saldo era quatro vezes e meia superior ao valor do patrimônio imobiliário da rainha Elizabeth II, da Inglaterra. Os Bongo foram apanhados em transferências diretas de US$ 130 milhões do Tesouro do Gabão para suas contas privadas no Citibank, em Nova York.

Sem passaporte, Lula não pode reencontrar os velhos amigos, no fim de semana em Adis Abeba, para explicar-lhes a sentença a 12 anos de prisão e porque ainda é réu em outros seis processos por corrupção.


Menos intriga e mais reforma - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 30/01

A reforma da Previdência afeta todos brasileiros, especialmente gerações mais novas


É natural que surjam tensões partidárias em ano de eleição, quando as lideranças políticas se articulam para obter a melhor composição de chapa possível para seus quadros. Esse trabalho é um elemento absolutamente necessário da vida política, sem o qual as causas e as ideias de cada partido correriam o risco de ficarem sub-representadas no pleito popular.

Ter presente esse contexto pode ajudar a olhar com realismo as atuais movimentações de alguns postulantes a candidato à Presidência da República. Testar opções, avaliar espaços, medir forças – tudo isso é parte da política.

Não se pode, porém, perder de vista que há um tema urgente no País à espera de solução, a reforma da Previdência. Não fossem as idiossincrasias do sr. Rodrigo Janot, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, que altera as regras para a concessão de pensões e aposentadorias, provavelmente teria sido votada pelo Congresso em maio do ano passado. O imbróglio envolvendo a delação da JBS atravancou a agenda do País. Basta lembrar que a Câmara dos Deputados, num intervalo de menos de três meses, foi obrigada a se pronunciar sobre duas denúncias contra o presidente da República. Ainda que inequivocamente ineptas, as acusações provocaram no ambiente político os presumíveis distúrbios que esse tipo de medida tende a despertar.

Depois de um intenso trabalho de coordenação política, acompanhado de um crescente esforço de comunicação – sempre aquém do necessário, mas que melhorou ao longo do tempo –, o governo federal criou as condições para que a reforma da Previdência fosse votada pelo Congresso. No fim do ano, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, anunciou que a PEC 287/2016 irá à votação no dia 19 de fevereiro de 2018.

Diante desse cenário, deve ser um consenso entre todas as autoridades minimamente preocupadas com o interesse nacional que a necessidade de aprovar a reforma da Previdência deve, no momento, prevalecer sobre qualquer possível divergência em torno da definição dos possíveis candidatos à Presidência da República. Não é hora de criar e tampouco de estimular a mais mínima dissonância capaz de eventualmente causar algum óbice ao andamento da PEC 287/2016.

O País merece esse cuidado com a reforma da Previdência. É um assunto que afeta todos os brasileiros, especialmente as gerações mais novas, que estão mais vulneráveis aos efeitos da eventual irresponsabilidade de manter as atuais regras. O déficit da Previdência é insustentável, com perversos efeitos sobre os atuais e os futuros beneficiários. O rombo crescente coloca sérias dúvidas sobre a capacidade do Estado de continuar arcando no futuro com as pensões e aposentadorias. No presente, afeta duramente a situação fiscal, pondo em xeque os esforços feitos nos últimos meses para retirar o Brasil da crise que o lulopetismo colocou. A crise da Previdência também afeta a atuação do próprio Estado, cada dia mais limitado em sua capacidade de investimento por força do rombo do sistema de aposentadoria e pensões.

Além disso, não é todo dia que surge no Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição que enfrenta de forma tão direta os privilégios do funcionalismo como o faz a PEC 287/2016. Só faltaria que as eleições deste ano pudessem de alguma forma representar um ademão para conservação das benesses de alguns poucos. Cabe aos envolvidos no processo eleitoral a responsabilidade de não transformar as eleições em ocasião para preservar ou ampliar desigualdades, ao dificultar a reforma da Previdência.

Têm especial responsabilidade nessa questão os presidentes da Câmara e do Senado. É hora de união em favor das reformas, e o esforço de cada um nessa direção será a prova decisiva para saber quem está de fato a favor do Brasil.

Correção – A esquerda democrática a que se refere o editorial A esquerda e o esquerdismo, publicado no dia 29/1/2018, é a esquerda reformada da social-democracia e de outras correntes, que surgiu e se firmou na Europa após a 2.ª Guerra.

Brasil 200, pela independência ou independência do país - FLÁVIO ROCHA

FOLHA DE SP - 30/01

Muitos de vocês já devem saber que recentemente lançamos o "Brasil 200". Embora tenha, com muito orgulho, erguido sua pedra fundamental em evento realizado em Nova York, esse movimento não é meu ou das lideranças que o apoiam.

Trata-se de um movimento da sociedade civil, que quer um Brasil diferente do arremedo de país em que foi transformado por sucessivos governos desastrosos.

"Brasil 200" é uma alusão aos 200 anos de Independência, assim batizado para que não percamos de vista o objetivo fundamental do movimento. Os 200 anos serão comemorados em 2022, quando termina o mandato do presidente eleito neste ano. 2022, portanto, começa em 2018. Os 200 anos do Brasil independente começam aqui e agora.

O país encontra-se prostrado. Recentemente, o previsível rebaixamento da nota de crédito pela Standard & Poor's foi um duro lembrete da situação em que estamos.

Apesar da incipiente recuperação econômica, ainda temos muito o que caminhar para conseguir um crescimento sustentável que absorva os inacreditáveis 12 milhões de desempregados.

O fato é que o Brasil não tem um governo. O governo é que tem um país. E o usa indevidamente, sem observar os princípios básicos de uma administração saudável e republicana, em que o bem comum está acima de interesses individuais ou de grupos. O resultado é a gastança, o desperdício, o endividamento, com prejuízo a todos, ou quase todos, se é que me entendem.

Nosso esforço diário em gerar riqueza é drenado pelos ralos bilionários de corrupção e clientelismo, é ameaçado por regulações insanas e intervencionismo retrógrado. Os últimos anos, em que prevaleceu o paternalismo autoritário, foram marcados pela aversão ao liberalismo e ao empreendedorismo. Se ameaça vidas —as vidas das famílias do exército de desempregados—, a incompetência é criminosa.

É preciso dar um basta! Chegou a hora de uma nova independência. É preciso tirar o Estado das costas da sociedade, do cidadão que não aguenta mais carregá-lo como um fardo. Essa é a independência de que falo, a independência que remete à liberdade.

A jornada é longa e, quanto antes for iniciada, melhor. Em quatro anos não é possível fazer tudo, claro, mas é possível fazer muito. Estamos conversando com cidadãos para chegar a uma pauta comum a ser entregue aos candidatos ao Executivo e ao Legislativo que tenham compromisso com a liberdade.

A elite empresarial brasileira, da qual faço parte, infelizmente não tem liderado o processo de mudança para tornar o Brasil um país mais livre. Parte dela é até sócia do assalto ao Estado com prejuízos incalculáveis para a população mais carente. Isso é absolutamente inaceitável.

Como cidadão, eu me orgulho da operação Lava Jato. Mas me entristeço por ver empresários envolvidos nos maiores escândalos de corrupção da nossa história. Sem uma elite comprometida com o progresso e com o avanço institucional, não vamos a lugar algum.

Está mais do que na hora de os empresários assumirem sua responsabilidade. Empreendedores devem ser os guardiões mais intransigentes da competitividade e da liberdade, pré-requisitos para a criação de riqueza, que move a economia e coloca a sociedade no caminho da prosperidade e da justiça social.

Da justiça social verdadeira, acrescento, aquela que promove autonomia, dignidade e oportunidade para todos. Não podemos mais ser parte do problema. Temos que honrar nossa vocação e ser parte da solução.

Se saio da minha zona de conforto para tomar essa iniciativa é porque tenho fé no Brasil e nos brasileiros. Urge devolver o Brasil ao seu verdadeiro dono, o povo brasileiro.

Tenho convicção de que está em nossas mãos refundar o Brasil em bases mais livres e solidárias, mais modernas e prósperas para todos. Essa é a minha ideologia, esse é o meu compromisso.

FLÁVIO ROCHA é presidente da Riachuelo e vice-presidente do IDV (Instituto para o Desenvolvimento do Varejo)

Sem preconceito - ELIANE CANTANHÊDE

ESTADÃO - 30/01

Previdência, Eletrobrás e Embraer: não aos dogmas, sim ao debate real e maduro

Além das denúncias, da impopularidade e das quedas de braço com a Justiça, o presidente Michel Temer está decidido a enfrentar preconceitos e dar racionalidade aos debates sobre reforma da Previdência e pulverização de ações da Eletrobrás. A “combinação” Embraer-Boeing pode pegar carona na discussão. A ideia é resistir ao “não sei, não vi, não provei, mas não gostei”. Não é inteligente, não é razoável e não leva o Brasil a lugar nenhum. É preciso saber, ver, ouvir especialistas e versões divergentes para ser a favor ou contra, ou a favor só em parte.

“Reforma da Previdência? Sou contra.” Por quê? “Porque só prejudica os pobres.” Isso é efeito da campanha deseducativa, que finge estar defendendo “os pobres” quando, na verdade, embute a defesa de privilégios das carreiras mais bem pagas do Estado.

São elas, junto com partidos ditos de esquerda, que operam contra a reforma, não para proteger a aposentadoria e pensões de trabalhadores de baixa renda, mas sim aposentadorias de mais de R$ 30 mil de algumas categorias – caso de juízes e magistrados. A reforma é justamente para evitar que o sistema entre em colapso ao longo dos anos e a base da pirâmide – que é quem efetivamente precisa de aposentadoria – acabe ficando sem ela.


Defenda-se a Justiça, não boquinhas como aposentadorias milionárias de setores do funcionalismo, quando a grande maioria dos trabalhadores tem um teto de R$ 5.700, ou como auxílio-moradia irrestrito para juízes e altos funcionários dos três Poderes.

No caso da Eletrobrás, Temer e o ministro das Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, fazem tudo para fugir da palavrinha maldita, “privatização”, e insistem que a intenção é pulverizar suas ações, arejá-la, atrair investimentos privados, estender a ela a chance dada, lá atrás, à Vale do Rio Doce, que passou a empregar nove vezes mais pessoas depois da... privatização.

O governo diz que pretende manter ações e parte do controle estratégico da empresa, num sistema “golden share”, mas a maior reação no Congresso vem principalmente do Nordeste e de Minas, que recorrem a um discurso “nacionalista” para disfarçar a importância da Chesf e de Furnas, respectivamente, como generosos cabides de emprego para apadrinhados políticos. Contra a reforma, o “interesse dos pobres”. Contra a modernização da Eletrobrás, “o interesse nacional”.

Fernando Filho cita, objetivamente, um dado do ministério: de 2004 a 2016, a União deixou de arrecadar em torno de R$ 165 bilhões por manter a Eletrobrás exatamente onde está, sem contar os grandes valores que a União teve de despejar na companhia.

Quanto à Embraer: é um orgulho dos brasileiros, campeã internacional no segmento de jatos executivos e produzindo aviões tanto para a área civil como para a área militar. Empresa moderna, com técnicos competentíssimos, especialmente após privatizada.

Temer já disse e repetiu que a União não vai abrir mão do controle da Embraer. E a sueca Saab já enviou a Brasília um alto representante alertando para a questão da transferência de tecnologia no jato Gripen para a FAB, em parceria com a Embraer. De gabinete em gabinete, a Boeing garante: qualquer acordo respeitará o controle da União e manterá a blindagem e a autonomia do programa dos Gripen.

Enfim, não se trata aqui de fazer campanha pela reforma, nem pela privatização (ou tenha lá que nome tiver) da Eletrobrás, nem pela “combinação” (novamente, tenha lá que nome tiver) entre a Embraer e a Boeing. Trata-se, sim, de defender um debate aberto, ponderado, maduro sobre o que é e o que não é melhor para o Brasil e os brasileiros, agora e no futuro. Ou seja: sem preconceito e sem dogmas que signifiquem apenas o atraso pelo atraso.

Buscam-se ideias - MERVAL PEREIRA

O Globo - 30/01
O impasse generalizado que vivem os partidos políticos para a escolha de candidatos à presidência da República demonstra com clareza não apenas a falta de líderes, mas, sobretudo, a desimportância dos programas de governo no debate eleitoral.

Nem PT nem PSDB, partidos que polarizam a política nacional há mais de 20 anos, têm consistência programática que mantenha seus eleitores unidos em torno de ideias, fato que ficou encoberto esse tempo todo justamente devido à radicalização do confronto direto entre eles, que supostamente representam duas maneiras distintas de ver o mundo.

Quando o candidato tucano em 2006, o mesmo Geraldo Alckmin que deve voltar a disputar a presidência este ano, recuou na defesa das privatizações, foi-se a coerência partidária, escancarou-se a disputa do poder pelo poder numa ação mercadológica equivocada.

Assim como a coerência ideológica petista esvaneceu-se quando o partido operário que nasceu para fazer política de outra maneira revelou-se um velho usuário da corrupção como método político, desde o início da escalada a partir de municípios como o Ribeirão Preto de Palocci, com a licitação pública para “molho de tomate refogado, peneirado, com ervilhas", que era produzido por apenas uma empresa.

Ou a Santo André do prefeito Celso Daniel, assassinado por disputas internas no PT pela propina dos serviços públicos. Tanto PT quanto PSDB governaram o país com as mesmas alianças políticas, o que sugere que os partidos que os apoiaram também não tinham programas a serem seguidos, no máximo alguns se sentiam mais à vontade que outros apoiando os governos petistas ou tucanos, mas raros foram os que permaneceram em seu campo programático sem aderir às indecências do poder.

Não há dúvida de que o esquema corrupto montado pelo PT para controlar o Estado brasileiro e colocá-lo à disposição de seus interesses foi uma aberração poucas vezes vista em qualquer país do mundo.

Disseminou-se a corrupção que, antes, era um câncer que existia de maneira pontual e localizada, sem caráter de metástase espalhada pelo corpo institucional do país. A corrupção como método de governo atingiu as raias do absurdo, e terminou por corroer um esquema partidário que já era anódino, transformando-o em mero instrumento de interesses patrimonialistas.

Mesmo em seu estágio pré-petismo, a corrupção de colarinho branco, seja de empresários ou de políticos e funcionários públicos, não era combatida, como foi a partir do mensalão, devido a uma aplicação restritiva da lei que favorecia o estamento dirigente.

O que se vê nos últimos anos é a aplicação da lei de forma a que alcance os que estavam dela protegidos, e há ainda muitos tabus a serem derrubados para que se chegue a um estado em que ninguém está acima da lei.

Desde os vícios corporativos arraigados até mesmo no Judiciário, que amortecem a força moral que garante a seus membros o reconhecimento da sociedade à sua ação revitalizadora da cidadania, até excrescências como o foro privilegiado, cujo sentido foi sendo desvirtuado e ampliado até tornar-se uma proteção para os desvios de conduta, assim como a imunidade parlamentar.

No momento em que o país vive uma das piores crises que já enfrentou, seria imprescindível que os reais problemas nacionais entrassem no debate eleitoral sem que o populismo impedisse o enfrentamento de questões centrais, como as reformas estruturantes.

Infelizmente estamos longe desse dia. Buscam-se nomes em vez de ideias, e para combater promessas irresponsáveis, parece que só temos mais irresponsabilidades a serem oferecidas ao eleitorado. Aguarda-se que a ampliação do espaço de debate abra caminho para candidatos que defendam projetos de país, deixando para trás a radicalização, à esquerda e à direita, que prometia fazer dessa a campanha presidencial mais lamentável dos últimos tempos.

Patrulheiros da moral criam tribunais para decidir quem pode andar nas ruas - RANIER BRAGON

FOLHA DE SP - 30/01


"Cagão" e "bosta" foram algumas das delicadezas dirigidas a Gilmar Mendesem um voo no sábado (27). Dias antes, duas mulheres haviam apupado o ministro do STF em Portugal. Uma delas disse rogar para que Deus o enviasse sem escalas ao quinto dos infernos.

Tudo registrado em vídeo por celulares e espalhado nas redes sociais.

Atos assim falam mais sobre quem se presta a eles do que qualquer outra coisa. O alvo dos autointitulados "cidadãos de bem" é pego quase sempre só, tal um colegial paga-lanches assolado na hora do recreio.

Essa turma de patriotas já decidiu no seu tribunal particular e inapelável quem pode embarcar em voos comerciais ou jantar em restaurantes.

Dane-se o contraditório, quem pensa diferente, o Estado de direito, as leis, as formas mais dignas e menos covardes de protesto. Em suma, danem-se as instituições democráticas –essas porcarias todas que "deveriam ser fechadas" porque não "prestam pra nada", nas palavras de um dos bravateiros do voo de Gilmar.

Nem é preciso dizer que muita gente que arrota moral e bons costumes nas redes sociais não suportaria 15 minutos de escrutínio sério da própria vida. Nem que toda a bravura surge, normalmente, quando estão em bando, contra oponente preferivelmente solitário. Nem que boa parte deseja, na verdade, é a volta de generais a nos ditar goela abaixo o que fazer ou deixar de fazer.

A história está repleta de vestais a atirar pedras nas adúlteras, tocar fogo às "bruxas" ou decidir no berro quem pode ou não andar nas ruas.

Gilmar Mendes mandou soltar alvos da Justiça contra as quais pesam sérias acusações, entre eles empresário com quem tem laço familiar. Tem questionável relação com o governo, com encontros a portas fechadas inimagináveis a um magistrado com pudor institucional. E uma série de outras práticas controversas.

Nada disso, porém, justifica o grotesco teatro encenado pelos talibãs da moral, família e bons costumes.

A sombra do lulismo - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADÃO - 30/01

O lulismo é a transformação de estratégias sindicais em políticas de governo e projeto de Poder

O ex-prefeito da capital paulista Fernando Haddad, um dos cotados para ser candidato à Presidência da República pelo PT no lugar de Luiz Inácio Lula da Silva, disse que o lulismo sobreviverá ao chefão petista. Ou seja, mesmo que o ex-presidente seja impedido de concorrer ao Palácio do Planalto, na provável hipótese de que a lei se cumpra e ele pague pelos crimes que cometeu e pelos quais foi julgado e condenado, o movimento político que leva seu nome permanecerá vivo, segundo seus seguidores e também na opinião de alguns especialistas.

Entre esses analistas, aliás, há quem considere o lulismo superior até mesmo ao varguismo. Trata-se de um evidente exagero em mais de um sentido, especialmente quando se comparam os efeitos duradouros das políticas econômica, trabalhista e industrial do ditador Getúlio Vargas com o caráter precário da “justiça social” promovida por Lula, cujos efeitos, festejados por seus adoradores como seu grande legado, cessaram mesmo antes do fim da era petista.

Ressaltados os evidentes limites do lulismo, contudo, não se pode deixar de reconhecer que o movimento político que se atribui a Lula certamente continuará a existir por um bom tempo mesmo depois que seu timoneiro já não estiver em condições de atuar politicamente. E isso acontecerá não somente porque Lula continuará tentando fazer política, mesmo que esteja atrás das grades, mas principalmente porque, como disse Haddad, “são 40 anos de Lula”, tempo mais que suficiente para consolidar o chefão petista como referência no universo político e no imaginário popular.

Sendo assim, diante da inegável força de Lula e considerando-se que seu movimento assombrará a eleição presidencial deste ano, obrigando os principais candidatos a se posicionarem a respeito dele, é preciso compreender do que se trata, afinal, o lulismo, e apontar seus efeitos nefastos para a vida nacional.

O lulismo é a transformação de estratégias sindicais em políticas de governo e projeto de poder. Lula nunca deixou de buscar exclusivamente aquilo que era melhor para si mesmo e para seus apaniguados. Nesse sentido, os fins sempre justificaram os meios, como estão aí a comprovar o mensalão e o petrolão.

Não é um apartamento no Guarujá ou um sítio em Atibaia que provam a corrupção de Lula. Esses são apenas alguns dos sinais exteriores de uma relação absolutamente promíscua entre o chefão petista e aqueles que foram cooptados por seu projeto patrimonialista de ocupação do Estado e privatização do poder, tratando como inimigos todos os que não se submeteram ao PT. Já os que aceitaram se associar ao empreendimento lulopetista foram recepcionados como autênticos “companheiros” – José Sarney, Renan Calheiros e Paulo Maluf, entre outros de igual naipe.

Lula nunca esteve preocupado com os trabalhadores em geral, mas apenas com os seus trabalhadores, isto é, aqueles que estivessem vinculados de alguma maneira à máquina sindical petista. Tampouco estava interessado no desenvolvimento nacional sustentável, e sim nos ganhos dos empresários amigos, encantados com o capitalismo sem risco oferecido pelo lulismo e prontos a defender a todo custo seu grande líder e benemérito.

Com isso, o lulismo produziu a ilusão de que estava realizando “justiça social” quando, na verdade, apenas aprofundava o fosso econômico entre ricos e pobres. Enquanto procedia a uma brutal transferência de renda dos mais pobres para os mais ricos, por meio de subsídios, incentivos e contratos públicos, o lulismo concedia às classes desfavorecidas a ilusão do consumo. Nunca antes “o pobre viajou de avião”, como jactou-se Lula, mas esse mesmo pobre continuava a não ter saneamento básico nem educação decente.

Tudo isso revela o oportunismo que está na essência do lulismo. Assim, se o lulismo sobreviver a Lula, como muitos preveem, que seja para sempre reconhecido pelo que é: um movimento que aposta na ignorância política e no vale-tudo para capturar o poder.