terça-feira, maio 23, 2017

ARTIGOS VAZAMENTO DE CONVERSA ENTRE REINALDO AZEVEDO E IRMÃ DE AÉCIO NEVES REFORÇA O PONTO DO PRÓPRIO JORNALISTA - RODRIGO CONSTANTINO

RODRIGO CONSTANTINO
Rodrigo Constantino
Um blog de um liberal sem medo de polêmica ou da patrulha da esquerda “politicamente correta”.
ARTIGOS

VAZAMENTO DE CONVERSA ENTRE REINALDO AZEVEDO E IRMÃ DE AÉCIO NEVES REFORÇA O PONTO DO PRÓPRIO JORNALISTA

Reinaldo Azevedo está fora da Veja. Pediu demissão após quase 12 anos de blog, e a administração aceitou. O motivo? Uma conversa particular com Andrea Neves, irmã do senador Aécio, que foi vazada de forma criminosa, na qual o jornalista criticava a própria revista.
Sou daqueles que admirava muito Reinaldo, e que se decepcionou bastante com ele, com suas mudanças recentes. Ele “tucanou” demais da conta, passou a detonar não só quem merece duras críticas, como Rodrigo Janot, mas também a própria Lava Jato e até o juiz Sergio Moro. Achei estranha sua postura diversas vezes, e o critiquei quando julguei necessário.
Mas não é por isso que vou festejar sua demissão, ou pior: o motivo dela. Alguns podem preferir espetar o jornalista, que alegava ter vários empregos para cuspir na “direita xucra”. Não eu. Coloco os princípios acima dessas coisas. Não suportava mais, para ser sincero, a afetação de Reinaldo, sua arrogância, histeria, e mesmo suas contradições suspeitas. Mas isso não me faz rasgar os valores básicos da liberdade de expressão e do jornalismo.
Carlos Andreazza, editor e amigo de Reinaldo, foi direto ao ponto:
Pessoal, o pessoal que tem compromisso com a liberdade, muito cuidado ao festejar a conversa entre Reinaldo Azevedo e Andrea Neves.
Nada de comprometedor há ali. Nenhum crime. É diálogo de jornalista e fonte – algo absolutamente comum.
Reinaldo não integra o processo em questão. Não é investigado. Não era o grampeado. O que há de grave no caso, portanto, é a quebra do sigilo de fonte – sagrado para o livre jornalismo.
Falei acima em cuidado – e isto é o importante agora – porque é o que devem tomar doravante todos os que criticam a atuação do Ministério Público.
Isso é tentativa de intimidação.
Hoje contra Reinaldo. E amanhã?
Guilherme Macalossi também se mostrou preocupado:
Não há nenhum crime na conversa de Reinaldo Azevedo com Andrea Neves, mas há crime em divulgá-la, visto que é a conversa de um jornalista com sua fonte. Ou vocês acham que jornalistas não falam com políticos? No que consta transcrito, só existem as mesmas críticas que Reinaldo faz publicamente a Lava Jato e a Janot. Esse episódio é gravíssimo, e fere os mais basilares fundamentos da liberdade de expressão. A Lava Jato, querendo fazer justiça, está praticando justiçamentos.
Nós, jornalistas e formadores de opinião, não podemos nos calar diante de um claro abuso de poder só porque o alvo é nosso adversário ou desafeto. Essa postura é típica da esquerda. Reinaldo denunciava esse clima de “justiçamento” e, em minha opinião, havia muito de paranoia, de defesa velada dos caciques tucanos. Mas o vazamento criminoso dessa conversa deu força ao próprio jornalista, mostrou que ele tem um ponto sim, que há coisas muito estranhas acontecendo em nosso país.
Não gostar de Reinaldo, ou de suas ideias, não é motivo bom o suficiente para fechar os olhos para crimes cometidos pelas próprias autoridades. Uma das coisas que mais incomodaram Carlos Andreazza no caso da censura ao livro do pseudônimo Eduardo Cunha foi justamente o silêncio das demais editoras, dos jornalistas, pois se tratava de um editor “de direita”. Isso não é um critério razoável ou aceitável. Ao menos não para os liberais.
Reinaldo pode não ter meu apoio nas suas teses recentes, no seu estilo mais histriônico ou nas derrapadas “legalistas” que não víamos antes, mas ele tem minha solidariedade nesse caso específico. Foi vítima de uma safadeza. Pior: de um crime. Que os culpados sejam responsabilizados, pois não podemos aceitar o arbítrio de quem deve se ater ao cumprimento das leis.
Fecho com trecho do poema “No caminho com Maiakovski”, de Eduardo Alves da Costa:
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem;
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
Rodrigo Constantino

A situação está tão difícil que político está pensando em off.

Se uma pessoa acredita ser galinha, por que não respeitar? - JOÃO PEREIRA COUTINHO

FOLHA DE SP - 23/05

Não é todos os dias que um ensaio filosófico inicia uma polêmica na mídia. Aconteceu.

A professora Rebecca Tuvel escreveu na revista "Hypatia" um artigo sobre o "transracialismo" ("In Defense of Transracialism"). Explico: será que ser negro é apenas uma questão de ancestralidade ou de pigmentação da pele? Ou qualquer um pode reclamar-se como negro?

A título de exemplo, a prof. Tuvel relembra a odisseia de Rachel Dolezal, a ativista americana dos direitos dos negros que sempre se apresentou como negra –e que foi denunciada pelos pais (ambos brancos) como uma farsante.

Ninguém gostou, muito menos a comunidade negra que acusou Dolezal de loucura, desrespeito, oportunismo. Em sua defesa, Dolezal afirmou que a "negritude" não é uma questão hereditária ou biológica. É uma questão mental, emocional, existencial. E cultural: ela, branca, via-se como negra. E como negra desejava ser tratada.

Para a prof. Tuvel, as reivindicações dos "transracialistas" devem ser respeitadas. Exatamente como respeitamos a comunidade transgênero na luta contra o preconceito. Não é legítimo condenar Rachel Dolezal e aplaudir Caitlyn Jenner.

Foi o dilúvio e o jornal "The New York Times" tem relatado esse dilúvio. Modestamente, gostaria de me declarar do lado da prof. Tuvel. O seu ensaio, aliás, é um exemplo de rigor lógico para qualquer candidato a filósofo.

Eis o argumento central: nas questões transgêneras, falamos de indivíduos que não se identificam com o sexo que lhes foi imposto. Se alguém nasceu com um pênis ou uma vagina, isso não determina que ele seja homem ou mulher. É perfeitamente possível que o portador do pênis se sinta mulher ou que a portadora de uma vagina se sinta homem, independentemente de optar por uma cirurgia de mudança de sexo.

Como defende Rebecca Tuvel, a sociedade soube evoluir da mera caução biológica (pênis = homem; vagina = mulher) para acomodar um valor mais importante: a autoidentificação de gênero.

Essa mesma evolução deve ser promovida nas questões "transraciais". Afirmar que um "negro" depende da ancestralidade ou da pigmentação de pele é repetir o erro do determinismo biológico. Mais importante que esse determinismo é a "autoidentificação racial".

Claro que Rebecca Tuvel sabe que o respeito devido aos "transraciais" não depende apenas da autoidentificação. É necessário o reconhecimento social dessa nova identidade. É por isso que a prof. Tuvel relembra o utilitarismo de John Stuart Mill e o seu "princípio do dano": o Estado só deve interferir na liberdade de alguém se houver dano para terceiros. Será que a autoidentificação racial ou de gênero provoca esse dano?

A minha resposta é negativa. E só lamento que Rebecca Tuvel não tenha sido mais ambiciosa no combate à intolerância. Por que falar de sexismo ou racismo deixando de lado, por exemplo, o especismo? Falo da arrogância humana de nos considerarmos superiores ao restante reino animal.

É essa arrogância que explica a soberba com que olhamos para a "disforia de espécie": se uma pessoa acredita ser uma galinha, por que não reconhecer essa identidade?

Os intolerantes dirão que um ser humano não põe ovos nem tem a fisiologia (e a fisionomia) de uma galinha. Mas essa crítica apenas repete o velho preconceito biológico que interessa combater. É mais importante não ter nascido com penas –ou respeitar uma autoidentificação que é do domínio interior? E que, seguindo Stuart Mill, em princípio não causa dano a terceiros?

Digo "em princípio" porque admito que certos comportamentos –bicadas em público, cenas íntimas com outros galos (ou galinhas)– podem ser problemáticos para a harmonia social. Mas quem sou eu –e quem somos nós– para condenar um indivíduo que cacareje e viva pacificamente na sua capoeira? Mais do que tolerar, é preciso respeitar e reconhecer.

Há precisamente 40 anos, Woody Allen filmou "Annie Hall". Na cena final, a conhecida piada: um homem vai ao médico e diz que o irmão pensa que é uma galinha. O médico aconselha internamento para o irmão. O homem responde: "Eu até internava, doutor, mas preciso dos ovos."

Francamente: até quando vamos rir dessa piada?

O destino das reformas - JOSÉ MÁRCIO CAMARGO

ESTADÃO - 23/05

Esperar até o próximo governo para que elas sejam implementadas será um grande desastre



O tsunami político que devastou Brasília na quarta-feira à noite parece ser o único assunto possível. Escrever sobre economia, neste momento, é algo particularmente difícil.

Até quarta-feira à noite, o ambiente no Congresso Nacional quanto à aprovação das reformas era bastante positivo. A reforma trabalhista parecia próxima de ser aprovada pelo Senado e o sentimento em Brasília era de que o governo, em conjunto com organizações da sociedade civil, estava caminhando para conseguir os votos necessários para aprovar a reforma da Previdência. A forma como a delação premiada da família Batista foi divulgada colocou um freio nessa tendência. Pelo menos no curto prazo.

Existem pelo menos três cenários possíveis.

O cenário mais provável, em razão do teor das gravações já postas à disposição do público até o momento, é a permanência do presidente Michel Temer no cargo. Neste caso, ele terá de reorganizar suas forças, o que deverá levar algumas semanas. Não podemos nos esquecer de que o presidente perdeu um de seus principais aliados neste trabalho: o senador Aécio Neves. Ainda que não ocorra uma paralisia no processo de reformas, devemos esperar um atraso significativo em suas aprovações.

Um segundo cenário seria que, ao tornar público o conjunto das delações, fique clara a participação do presidente Temer em atos ilícitos e ilegais, o que o forçaria a renunciar ao cargo. Neste caso, quem assume interinamente é o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, que convoca eleições indiretas no Congresso Nacional e elege o sucessor definitivo no prazo de 30 dias.

A questão é como o presidente interino vai se comportar quanto às reformas. Terá ele vontade e capacidade política para aglutinar apoio suficiente para tocar uma agenda tão pesada? A história recente mostra que sim. Neste caso, devemos esperar que o processo seja acelerado, assim que o presidente interino assumir o cargo.

O terceiro cenário é que o movimento a favor da realização de eleições diretas ganhe força e imponha ao Congresso uma mudança da Constituição. Esse cenário me parece o menos provável e o mais negativo para a economia, além de antidemocrático. Afinal, temos uma Constituição que deve ser respeitada, e não uma Constituição que, sempre que ocorre algum problema, é mudada para se adaptar às circunstâncias do momento.

Caso o presidente venha a renunciar, o novo presidente deveria ser um político em atividade, com respeitabilidade dentro e fora do Congresso e com liderança suficiente para montar uma base parlamentar capaz de finalizar a aprovação do mais importante conjunto de reformas constitucionais realizado no País, pelo menos desde a redemocratização.

Uma vez vendo-se diante desse problema, o Congresso terá de tomar uma decisão rápida e eleger alguém capaz de retomar as negociações para a aprovação das reformas da Previdência e trabalhista.

O Brasil está diante de um desafio de grandes proporções. E, mais uma vez, o Congresso vai ser chamado para enfrentar este desafio. E, historicamente, ele tem se mostrado bastante competente nestes momentos decisivos.

A forte reação negativa dos investidores que se seguiu ao tsunami político da quarta-feira deve ser vista como um prenúncio do que poderá ocorrer caso a crise política gere paralisação do processo de reformas. Neste cenário, o País chegaria a 2019 numa situação extremamente precária, com Produto Interno Bruto (PIB) em queda e desemprego em elevação. Ou seja, esperar até o próximo governo para que as reformas sejam implementadas será um desastre de grandes proporções. Ainda que com algum atraso, as reformas precisam ser aprovadas ainda este ano.

*PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA PUC/RIO, É ECONOMISTA DA OPUS GESTÃO DE RECURSOS

Tensão na República - MÍRIAM LEITÃO

O Globo - 23/05

Nas conversas gravadas, em qualquer etapa da atual era de escândalos, o que se ouve confirma o temor dos procuradores da Lava-Jato de uma união dos políticos para interromper a operação. Ela hoje parece forte o suficiente para acuar o presidente da República, mas ao mesmo tempo ficou mais vulnerável às críticas pelo acordo da delação superpremiada com Joesley Batista.

Na gravação de Sérgio Machado com o senador Romero Jucá se falou em estancar a sangria. Na conversa entre Joesley e o presidente, o empresário falou, diante de um Temer aquiescente, em controlar juízes e comprar procuradores. Na conversa do senador afastado Aécio Neves com Joesley, ou nas declarações públicas dos ex-presidentes Lula e Dilma, a operação é xingada e tratada como inimiga. Aliás, ela é a inimiga que une os adversários da política.

As falhas da operação vão abrindo flancos para o fortalecimento do movimento anti-Lava-Jato. Quando Sérgio Machado livrou-se, e aos seus filhos, de processos, já houve um enorme desconforto. Agora há revolta. Um dos poucos momentos em que Temer consegue atrair concordância é quando aponta o absurdo de o empresário grampeador estar vivendo em Nova York depois de ter passado anos enriquecendo com medidas governamentais e empréstimos públicos que o beneficiaram e que foram conseguidos através da corrupção. Não é sustentável um volume tão grande de benefícios e isso enfraquece até o ministro Edson Fachin, que homologou a delação nesses termos.

A economista Maria Cristina Pinotti disse em conversa recente que na Itália a “Mãos Limpas” fracassou exatamente quando parou de ter o apoio da opinião pública e foi sendo erodida pelas denúncias e críticas feitas contra os líderes da operação. O resultado de todo o enorme esforço de combate à corrupção na Itália foi lamentável. Quando Berlusconi assumiu, ele nomeou para ministro da Infraestrutura o maior empresário italiano da construção, uma espécie de Marcelo Odebrecht.

— A Itália tem muitas semelhanças com o Brasil, mas muitas diferenças. Nas diferenças reside meu otimismo — disse ela.

Cristina Pinotti também alerta que o mundo mudou bastante nos últimos 25 anos, entre a operação na Itália e a que está ocorrendo no Brasil.

— É interessante notar as diferenças que esses 25 anos produziram. Hoje a gente tem muito mais ajuda do sistema financeiro internacional no combate à corrupção e lavagem de dinheiro. Em função da luta contra o tráfico de drogas, o contraterrorismo, criou-se um aparato que dá muito suporte para as investigações anticorrupção — diz.

No Brasil, os procuradores da Lava-Jato estudam o que se passou na Itália e sabem que é preciso manter a opinião pública a favor da investigação para evitar que os políticos investigados se unam e aprovem leis que os favoreçam. Foi assim que aconteceu lá.

Os críticos da Lava-Jato, seja entre os políticos, seja no meio jurídico, costumam apontar os riscos dos excessos dos policiais e procuradores. Eles respondem que excessiva é a corrupção que está sendo revelada a cada movimento da investigação. Os crimes são tão persistentes que no mês passado, após três anos da Lava-Jato, ainda se entregava malas de dinheiro a políticos. Os críticos da operação argumentam que, neste caso de Temer, há um erro inicial, e que se fosse no tempo do Castelo de Areia a delação seria anulada pela maneira como foi feita a gravação do presidente, sem ordem judicial. Aliás, os advogados derrubaram várias operações anteriores apontando as falhas processuais. A Lava-Jato aprendeu com isso e tomou mais cuidado que as outras.

Os ministros do STF têm opiniões bem divergentes sobre o que está acontecendo e há um grupo de ministros que discorda do rumo dos últimos eventos. Esse embate entre as tendências do Supremo vai ficar mais nítido neste acirramento da crise.

Contra a Lava-Jato será usada a excessiva condescendência com os irmãos Batista. Esse é o argumento mais convincente que os críticos da operação têm. É o ponto fraco. O acordo não foi feito em Curitiba, mas na Procuradoria-Geral da República. A pressão contra a Lava-Jato vai se intensificar, na mesma medida em que a operação aumenta a pressão contra seus alvos. A tensão está no ar.

Estatismo e corrupção - NEY CARVALHO

O GLOBO - 23/05
Quanto mais ascendência o Estado tiver sobre a economia, mais corrupção existirá na sociedade respectiva. E o Brasil é vítima evidente do estatismo

Nunca as palavras de Lord Acton foram tão verdadeiras como na atualidade do Brasil: “O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente”.

Não se trata, apenas, do exercício do mesmo por uma pessoa, mas do poder do Estado e suas múltiplas facetas sobre a economia e a vida dos cidadãos, que se transfere, automaticamente, aos indivíduos, políticos ou burocratas, que controlam o Estado. E constitui a gênese da corrupção.

A história brasileira não conhece episódios de corrupção endêmica como aos que hoje assistimos, nem no Império nem na República Velha. Ambos foram regimes em que o Estado se mantinha alheio aos negócios e à vida privada. A origem da corrupção que nos assola é claramente identificável.

O crescimento da influência estatal sobre a economia nasceu há mais de oito décadas na ditadura de Getulio Vargas nos anos 1930. Vargas foi o principal responsável pelo aumento do poder do Estado mantido, inexplicavelmente, pelos regimes liberais em economia das Constituições que se sucederam desde 1946, após sua destituição.

Naqueles tempos foi uma constante a criação de repartições públicas como autarquias, conselhos, departamentos, inspetorias, institutos e, sobretudo, empresas estatais. Surgiram a Companhia Vale do Rio Doce e a Siderúrgica Nacional. De um dos presidentes da primeira dizia-se que havia bebido o rio, comido o doce e deixado um vale no caixa. A segunda chegou aos anos 1990 aos trancos e barrancos. O executivo Roberto Lima Neto, encarregado de prepará-la para privatização, narra que a empresa estava inadimplente com 44 bancos e fornecedores diversos, além de todos os impostos e contribuições. Tinha linhas de produção paralisadas por falta de insumos, e foi possível reduzir o quadro funcional em nada menos que sete mil empregados, um terço do efetivo. Essas duas empresas foram salvas da onda de corrupção atual pelas privatizações de fins do século XX.

O mesmo não aconteceu com as companhias lançadas no mandato democrático de Vargas, entre 1951 e 1954: Petrobras, BNDES, e Eletrobras. Não foram privatizadas e estão, hoje, em todos os cardápios de corrupção, prejuízos, delações premiadas e demais mazelas a que temos assistido.

O poder quase absoluto do Estado sobre a economia está na raiz da corrupção. Ela não chega a ser um fenômeno exclusivamente estatal. Se ocorrer em empresas privadas, será episódio circunscrito a cada companhia e seus acionistas. Mas quando acontece no âmbito do Estado, atinge todos os contribuintes e, portanto, a coletividade, pois é ela que pagará a conta.

Quanto mais ascendência o Estado tiver sobre a economia, mais corrupção existirá na sociedade respectiva. E o Brasil é vítima evidente do estatismo criado nos anos Vargas, mantido nas etapas posteriores, inclusive no regime militar, e exacerbado no período lulopetista.

Ney Carvalho é escritor e historiador

Delação de Joesley recebe descabida premiação - EDITORIAL O GLOBO

O Globo - 23/05


A anistia dos irmãos do grupo JBS pelo Ministério Público recebe críticas, diante da gravidade dos crimes confessados de corrupção


Não está em questão a importância do instrumento da delação premiada para que pessoas físicas e jurídicas ajudem na investigação de crimes, em troca da atenuação de penas. Dispositivo em vigor há muito tempo em vários países, e consagrado pelos resultados positivos que obtém, o mecanismo da “colaboração premiada” foi instituído no Brasil, em 2013, na lei 12.850, sobre organizações criminosas, ironicamente sancionada pela então presidente Dilma Rousseff, cada vez mais enredada em malfeitos apurados pela Lava-Jato devido ao tipo de testemunho instituído por esta lei.

O balanço que a Lava-Jato periodicamente atualiza comprova o êxito da investigação, robustecida pelas delações. Apenas em 2016, a operação, instituída na cidade de Curitiba em março de 2014, levou a que R$ 204 milhões — a mais elevada cifra já recuperada pela Justiça no Brasil —, rapinados na Petrobras, fossem restituídos à estatal. Os números sobre condenações, prisões preventivas, penas lavradas etc. também são retumbantes.

O que se encontra em debate é o espírito magnânimo com que o Ministério Público tem negociado a atenuação de penas com criminosos confessos, em troca da ajuda no desbaratamento de quadrilhas e na revelação de corruptos dentro de governos e na política.

Este debate cresceu bastante com o acerto feito entre a Procuradoria-Geral da República e os irmãos Joesley e Wesley Batista, do grupo JBS. A delação de Joesley, a gravação que fez do presidente Temer — contestada por este —, a do tucano Aécio Neves, e os entendimentos com o deputado Rocha Loures, por indicação de Temer, cujo desfecho foi a entrega de uma mala com R$ 500 mil, são explosivos em si.

Como também é explosivo o que a PGR oferece aos irmãos: imunidade em outras investigações relacionadas ao caso e perdão judicial, a depender da palavra final do juiz. Ou seja, anistia integral. Concessões que vêm sendo feitas na Lava-Jato já haviam sido alvo de críticas, mas a anistia dos irmãos tem sido vista como uma overdose de benevolência, um desrespeito a quem paga pesados impostos, bilhões deles destinados ao JBS nos governos Lula e Dilma.

Diante deste acordo, Marcelo Odebrecht parece vítima de rigores medievais: completará em dezembro dois anos e meio trancafiado em Curitiba, para ficar mais cinco em prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica.

Sequer a multa de R$ 110 milhões para cada irmão, a serem pagos a perder de vista, chega a ser penalidade compatível com a gravidade dos crimes cometidos. A multa equivale a irrisórios 7% do patrimônio declarado por Joesley.

A PGR alega que os riscos pessoais corridos pelos delatores para registrar delinquências ainda em curso justificam o acordo. Porém, o perigo é que a delação premiada vire uma via rápida para a impunidade. Assim, a lei deixa de ter caráter pedagógico, de prevenção.

A delação que é um escândalo - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 23/05

A delação do empresário da JBS é escandalosa, e não apenas pelos crimes relatados. As histórias que a cercam são de enorme gravidade, indicando, no mínimo, o pouco cuidado com que se tratou um material com enorme potencial explosivo para o País


O vazamento da delação de Joesley Batista na semana passada deixou uma vez mais o País profundamente consternado, ao envolver em ações criminosas graduados personagens da vida nacional, a começar pelo presidente da República, Michel Temer. Surpreende que denúncias tão graves tenham sido divulgadas – assumindo, assim, ares de veracidade – sem que nada do que delas consta, e tampouco as circunstâncias que envolvem os fatos, tenha sido averiguado previamente. Tal açodamento foi, no mínimo, irresponsável. Haja vista as consequências da divulgação nos campos político, econômico e financeiro.

A delação do empresário da JBS é escandalosa, e não apenas pelos crimes relatados. As histórias que a cercam são de enorme gravidade, indicando, no mínimo, o pouco cuidado com que se tratou um material com enorme potencial explosivo para o País.

Em primeiro lugar, causa escândalo o fato de que a principal notícia vazada na noite de quarta-feira passada não foi confirmada e, mesmo assim, o Ministério Público Federal (MPF) não fez qualquer retificação. Foi afirmado que um áudio gravado por Joesley Batista provava que o presidente Michel Temer havia dado anuência à compra do silêncio de Eduardo Cunha e de Lúcio Funaro. Ainda que a conversa apresentada seja bastante constrangedora para o presidente Michel Temer pelo simples fato de ter sido travada com alguém da laia do senhor Joesley Batista, das palavras ouvidas não se comprova a alegada anuência presidencial. Ou seja, aquilo que tanto rebuliço vem causando na vida política e econômica do País desde a semana passada não foi comprovado e, pelo jeito, não o será, pelo simples fato de não existir.

Como o Broadcast – serviço de notícias em tempo real da Agência Estado – revelou no sábado passado, a gravação da conversa entre Joesley Batista e Michel Temer no Palácio do Jaburu não foi periciada antes de ser usada no pedido de abertura de inquérito contra o presidente. Ou seja, nem mesmo essa medida de elementar prudência foi adotada pelo Ministério Público Federal. Em razão de a denúncia envolver altas personalidades, seria curial dar os passos processuais com extrema segurança, até mesmo para evitar eventual nulidade da ação e consequente impunidade dos eventuais culpados. Tudo indica, no entanto, que o principal objetivo do MPF era obter notoriedade, e não fazer cumprir a lei.

A fragilidade da delação de Joesley Batista não se esgota nesses pontos. De forma um tanto surpreendente, o MPF não apresentou denúncia contra o colaborador, como se a revelação dos supostos crimes cometidos pelo presidente da República e por outros nomes importantes da vida nacional fosse suficiente para remir a pena do criminoso confesso. Trata-se de evidente abuso, a merecer pronta investigação da Justiça. Se, como o MPF denuncia, os crimes foram tão graves e abrangem toda a política nacional, é um grave e escandaloso erro – para dizer o mínimo – conferir perdão a quem os perpetrou e lucrou abundantemente. Note-se que a lei proíbe que se dê imunidade aos líderes de organização criminosa. Não seria essa a função dos senhores Joesley e Wesley Batista nos acontecimentos em questão?

Além disso, até o momento não foi apresentada uma possível razão que justificasse o procedimento seguido pelo MPF e pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em relação à delação de Joesley Batista. Como não estava ligado à Operação Lava Jato, o caso deveria ter sido distribuído por sorteio, e não encaminhado diretamente ao ministro Edson Fachin.

A delação de Joesley Batista ainda expõe o Ministério Público em dois pontos muito sensíveis. O delator contou que o procurador Ângelo Goulart Villela, mediante pagamento de R$ 50 mil mensais, era seu informante dentro do MP. Ora, tal fato leva a checar com lupa todos os passos do empresário nesse processo de colaboração. Além disso, um procurador da República, que atuava muito próximo a Rodrigo Janot, deixou a Procuradoria-Geral da República (PGR) para trabalhar no escritório que negocia com a própria PGR os termos da leniência do Grupo JBS. Tudo isso sem cumprir qualquer quarentena.

Ansiosamente, o País espera que avance o combate à corrupção. Tal avanço deve ser feito, porém, de forma menos descuidada.


STF pode rever perdão - MERVAL PEREIRA

O Globo - 23/05

A anistia prometida aos irmãos Batista pelo Ministério Público Federal (MPF) não deve ser mantida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a quem cabe a última palavra sobre o assunto. “O Ministério Público não é dono do perdão”, sintetizou um ministro do Supremo ao comentar a péssima repercussão que a anistia a Joesley e Wesley Batista teve na sociedade.

Quando, ao fim do processo, o procurador-geral da República encaminhar ao STF sua conclusão, com os pedidos de penas para os envolvidos e o perdão para os donos da JBS, caberá à Segunda Turma decidir. Neste momento, deverá ser revista a proposta do Ministério Público para adequar a punição ao que diz a legislação. O artigo 13, parágrafo único, diz que “a concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiário e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso”.

Como o Ministério Público é um representante da sociedade, e o perdão judicial tem sido rejeitado de maneira enfática pelos cidadãos, que têm se manifestado através das mídias sociais e abaixo-assinados, caberá ao juiz, no caso aos ministros da Segunda Turma, adequar a penalidade à legislação sem dar a impressão de que houve uma exceção favorável aos irmãos Batista nesse caso.

Como não houve até agora nenhuma condenação final no STF, os parâmetros das penas e dos benefícios das delações premiadas ainda não foram definidos. Somente na primeira instância houve sentenças. A tendência entre os ministros do STF é tratar com rigor esse caso, dando apoio às decisões do ministro Luiz Edson Fachin, que homologou a delação dos irmãos Batista apenas no aspecto formal, e não entrou ainda no mérito da questão.

O presidente Michel Temer desistiu de pedir a paralisação do inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) porque, tendo colocado contra si um prazo fatal, seria derrotado no plenário nesta quarta-feira e perderia, em consequência, o apoio político para continuar governando.

A maioria no STF tende a considerar que o ministro Luiz Edson Fachin, relator da Lava-Jato, agiu corretamente ao homologar a denúncia da Procuradoria Geral da República e abrir o inquérito contra o presidente da República pelos indícios veementes que se encontram nos autos que, além do áudio da conversa, têm o relato detalhado do empresário Joesley Batista sobre o encontro com o presidente Temer.

A perícia do áudio seria feita no curso do inquérito, que não depende apenas dele para existir. Mesmo que ele venha a ser considerado prova inútil na sua totalidade, ainda resistirão os depoimentos de Joesley e seus executivos. Mesmo o áudio pode ser considerado válido em partes ou no todo, sendo aparentemente minoritária a tese de que, anulado o áudio, também seriam anuladas automaticamente as partes da delação premiada nele contidas.

A defesa do presidente Temer, ao contratar o perito Molina para a análise da fita, ganhou tempo e retirou da frente o prazo que havia sido colocado pelo próprio presidente da República. Mas também acrescentou novas incongruências à sua defesa, pois se houvesse certeza de que o áudio estava mesmo manipulado criminosamente, aí é que haveria razão para pedir o arquivamento do inquérito. Além do fato de que o perito fez sua análise sem ter o aparelho com que foi captado o áudio, o que ele dizia na véspera aos jornais que seria imprescindível. Esse pendrive está sendo enviado dos Estados Unidos e será analisado pela perícia técnica da Polícia Federal.

Existe, por exemplo, a possibilidade de que esse tipo de tecnologia interrompa a gravação sempre que há um silêncio no diálogo, e recomece a gravar em seguida, o que justificaria uma eventual interrupção, sem que signifique que houve uma edição ou supressão de falas.

Os depoimentos de Joesley e Wesley Batista e seus executivos, gravados pelos procuradores do Ministério Público, têm a mesma importância que todas as demais delações, havendo apenas a necessidade de obter provas do que foi delatado. O áudio seria uma prova incontestável e aceleraria o inquérito, porém mesmo na sua ausência há outros elementos de prova, como as malas de dinheiro monitoradas pela Polícia Federal e os demais documentos entregues pelos delatores ao Ministério Público.


A responsabilidade da imprensa - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 23/05

Não é de hoje que os procuradores usam a imprensa para disseminar acusações que, uma vez veiculadas, ganham ares de condenação


A tarefa primária da imprensa consiste em fornecer ao leitor informações que lhe permitam formar opinião acerca do mundo em que vive. Da qualidade das informações processadas pelos jornalistas depende, em grande medida, a formação de consensos em torno do que é realmente melhor para o País, muitas vezes a despeito do que querem aqueles que estão no poder ou que lá querem chegar. O jornalismo que, por açodamento, se baseia no que está apenas na superfície e se contenta com o palavrório de autoridades para construir manchetes bombásticas se presta a ser caixa de ressonância de interesses particulares e corporativos, deixando de lado sua missão mais nobre – jogar luz onde os poderosos pretendem que haja sombras.

No dramático episódio das denúncias contra o presidente Michel Temer, feitas pela Procuradoria-Geral da República com base em delação dos empresários Joesley e Wesley Batista, ficou claro, mais uma vez, que o Ministério Público sabe como explorar a ânsia dos jornalistas pela informação de grande impacto.

Não é de hoje que os procuradores usam a imprensa para disseminar acusações que, uma vez veiculadas, ganham ares de condenação. É evidente que a imprensa não pode ignorar denúncias graves emanadas do Ministério Público, ainda mais quando envolvem autoridades de primeiríssimo escalão, mas a história ensina que muitas vezes as acusações não têm fundamento, resultando em danos irreparáveis para os acusados.

Outro sintoma de que a imprensa se deixa levar pela sofreguidão do Ministério Público é que as manchetes e os noticiários estão reproduzindo a própria linguagem dos procuradores e dos delatores, que vêm tratando todo tipo de pagamento de empresários a partidos e políticos como “propina”, quando muitas vezes se trata de mera doação eleitoral. Assim, quase todos os políticos que em algum momento receberam dinheiro de empresas são, por definição, arrolados como corruptos – e então confirma-se a tese do Ministério Público de que o mundo político está podre.

Atribuir as denúncias ao Ministério Público não é o bastante, do ponto de vista ético, para isentar a imprensa de responsabilidade por esses danos, pois são os jornais que decidem dar ou não dar destaque a acusações que ainda carecem de confirmação, especialmente quando o que está em jogo é a estabilidade do País.

No caso específico que envolve Michel Temer, está claro, hoje, que as primeiras manchetes a respeito da delação dos irmãos Batista – segundo as quais o presidente teria dado aval ao pagamento de propina ao deputado cassado Eduardo Cunha para que ele continuasse em silêncio – estavam imprecisas. A interpretação mais danosa a Temer – a de que teria havido “anuência do presidente da República” ao pagamento de suborno a Cunha – foi feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, conforme se lê na avaliação que ele fez do diálogo entre o presidente e Joesley Batista.

Foi essa avaliação que pautou a imprensa. Nenhum jornalista teve acesso às gravações feitas por Joesley senão alguns dias depois. Nesse intervalo de tempo, a pergunta óbvia – é possível confiar cegamente no que diz o Ministério Público? – não foi feita. Tampouco se questionou que objetivos poderiam ter os vazadores do conteúdo de uma delação que deveria estar sob sigilo. Considerou-se que a versão de Janot bastava para incriminar o presidente da República.

Quando a imprensa enfim obteve a íntegra da gravação, os jornalistas puderam constatar que a interpretação de Janot era excessivamente subjetiva. Mas então o estrago político já estava consumado e o maior prejudicado não era Temer, mas o País, que precisava de estabilidade para a recuperação da economia. É um estrago grande e talvez irreversível, em certa medida.

É justamente em momentos tão graves como esses que o País e suas instituições – a imprensa entre elas – devem fazer profundas reflexões sobre a responsabilidade de cada um. Já temos crises em abundância. Não há necessidade de que se fabriquem mais.

Sobre golpes e eleições - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 23/O5

Nota-se, na militância que ainda chama de golpe o impeachment de Dilma Rousseff (PT), um júbilo revanchista com as agruras agora vividas por Michel Temer (PMDB).

Por natural que seja, tal sentimento não deve deixar de conflitar-se com arraigadas percepções da realidade. Afinal, os setores supostamente culpados pelo naufrágio do poder petista —a Lava Jato, a imprensa, o mercado— desempenham os mesmos papéis de antes.

O aparato policial investiga (não sem alguma dose de abusos), os veículos de comunicação reverberam (além de apresentarem suas próprias apurações e pontos de vista), os agentes econômicos protegem seus interesses. O processo por vezes é cruel, mas mantém-se nos limites do jogo democrático.

Golpe não houve, tampouco está em curso. O impeachment respeitou, ao longo de meses, os ritos jurídicos e legislativos. Nada mais legítimo que Temer, igualmente, valha-se de todos os recursos e garantias legais à sua disposição.

Instituições, no entanto, nunca serão engrenagens impermeáveis às forças políticas. Dilma não foi à lona apenas por ter fraudado de modo explícito o Orçamento –o que, para esta Folha, não justificava punição tão traumática.

Seu destino poderia ser outro se a recessão que produziu e o estelionato eleitoral que cometeu não tivessem esvaziado sua sustentação popular e legislativa.

Numa nota de ironia, cumpre recordar que algumas das derradeiras tentativas de salvar seu mandato partiram do empresariado, que se empenhava em evitar o agravamento da derrocada econômica.

Não diferem, na essência, os cálculos que ora se fazem em torno dos desfechos possíveis para a crise do governo Temer.

Este originou-se dos votos de mais de dois terços do Congresso, agregando uma expressiva maioria ancorada na centro-direita. Mesmo sob o impacto da Lava Jato e de dissidências recentes, essa coalizão ainda reúne condições de ditar o rumo dos acontecimentos.

Só com seu aval poderão ser abertos processos, por crime comum ou de responsabilidade, contra o presidente; caso este venha a ter sua chapa cassada pela Justiça Eleitoral, seu mandato será concluído, segundo a Constituição, por um nome escolhido pelos deputados e senadores.

Em defesa dessa previsibilidade já começam a mobilizar-se grupos que temem uma recaída recessiva do país. Preocupam-se com a hipótese de avanço de uma emenda constitucional ou de uma tese jurídica que possibilite a realização, já, de eleições diretas.

Argumentam, com certa razão, que não é o melhor costume mudar as regras durante o jogo; nem será surpresa se a velha acusação de golpe voltar à tona.

Mais uma vez, não é disso que se trata. A emenda só avançará com respaldo das ruas, o que a diferencia de conchavos parlamentares; seu objetivo não é beneficiar este ou aquele de forma casuística. Ao invés de restringir um direito —no caso, ao voto—, o texto o universaliza. Em momento tão delicado, é opção que não convém descartar.