quarta-feira, janeiro 20, 2016

Viva o companheiro da Al-Qaeda - GUILHERME FIUZA

REVISTA ÉPOCA

Há um colaborador da al-Qaeda dando aulas no ensino público brasileiro. Não, não é alguma figura misteriosa suspeita de alguma coisa. É um terrorista condenado - repetindo: condenado - na França por planejar ataques desses que esfacelam centenas de vidas. Pois bem: o professor de física Adlène Hicheur, argelino naturalizado francês, dá aulas na Universidade Federal do Rio de Janeiro, como revelou a reportagem de ÉPOCA. Adivinhe o que fez o governo Dilma Rousseff diante dessa bomba?

Adivinhou: o governo popular informou que vai averiguar o caso, sem precipitações, para esclarecer exatamente do que se trata etc. Ou seja: vai proteger o exterminador. Quem deu a boa notícia foi o insubstituível José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça e dos gatunos do petrolão e do mensalão. Joaquim Barbosa chegou a pedir a demissão do ministro, porque já estavam demais os flagrantes de sua coreografia com os réus daLava Jato. Como é inocente, esse Joaquim Barbosa. Quem iria demitir Cardozo?
Não há ninguém para fazer isso. Quem teria autoridade para fazê-lo está sob proteção do próprio, no vistoso balé com o Supremo Tribunal Federal e a Procuradoria-Geral da República para segurar de pé um governo podre. Governo podre este que concedeu uma bolsa para o terrorista da al-Qaeda trabalhar no Brasil.

Novamente faz-se necessário repetir: o governo brasileiro concedeu uma bolsa do CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico ao companheiro explosivo. Veja o professor da UFRJ trabalhando pelo desenvolvimento científico e tecnológico com o membro da al-Qaeda Fênix da Sombra, aceitando montar uma unidade terrorista na França: "Se sua proposta se trata de uma estratégia precisa (como trabalhar no seio da casa do inimigo central e esvaziar o sangue de suas forças), é preciso então que eu revise o plano que havia preparado."
Como se vê, o Brasil não pode abrir mão de um cientista dessa categoria. É interessante observar que, em dado momento da conversa do valoroso professor da UFRJ com o companheiro Phenix Shadow (o nome original), é mencionada a estratégia de provocar a "recessão econômica" em seus alvos capitalistas. Aí fica tudo definitivamente claro. O governo Dilma não pode demitir um professor da al-Qaeda que faz exatamente o mesmo trabalho realizado pelo PT nos últimos 13 anos: provocar a recessão econômica. É bem verdade que o PT tem sido muito mais eficiente que a al-Qaeda, mas o terrorista está aqui para aprender.

Seria, portanto, uma total incoerência a demissão do professor Adlène Hicheur do ensino público federai. A Petrobras acaba de anunciar um corte orçamentário que causará perda de R$ 260 bilhões no PIB. Ou seja: o PT também trabalha para esvaziar o sangue das forças do inimigo -estão todos falando a mesma língua. A única diferença é que nas mensagens entre os companheiros da al-Qaeda tudo é "se Deus quiser" ou "graças a Deus", e entre os companheiros petistas é tudo graças a Lula (não precisam dizer se Lula quiser, porque ele quer).

O caso do acolhimento do professor terrorista pelo governo Dilma é altamente didático sobre o cenário político brasileiro. O negócio é este mesmo: espalhar células "anticapitalistas" pelo sistema (todos com crachá de bondade progressista) para esvaziar o sangue das instituições e tomar conta delas, para então depená-las. Como o Brasil está constatando, quanto maior a crise econômica provocada pelos companheiros, menor a força da sociedade para deter o avanço de seus crimes. A cereja do bolo é a crise orçamentária na Polícia Federa!: se a Lava Jato parar por falta de verbas, eles chegarão ao crime perfeito.

Enquanto isso, os delinquentes do bem vão para as ruas de São Paulo e outras capitais depredar os símbolos do capitalismo e paralisar as vias públicas — caminhando e cantando e esvaziando o sangue do inimigo, que não pode tocar nos pimpolhos porque eles carregam bandeirolas estudantis (falsas). Já têm até hino da MPB. Está clara a correlação?

Se não estiver, continue esperando eles terminarem o assalto. Lula e Dilma não são réus porque têm o manto protetor da lenda coitada. Não toquem no professor da al-Qaeda - ele também é um coitado lutando contra o monstro capitalista. Até que não exista mais sangue para ser chupado.


Tons de Tombini - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 20/01

Normalmente, o FMI fica atrás nas previsões, é mais lento nas correções, porque dentro de cada país é que se sabe mais precisamente o que está acontecendo. Ontem o Fundo reduziu a previsão do PIB do Brasil de -1% para -3,5% este ano e para 2017 caiu de 2,3% para zero. Ficou junto com os mais pessimistas. Normalmente, o BC dá sinais e os segue. Mas ontem Alexandre Tombini mudou o tom no primeiro dia do Copom.

Normalmente, o mercado forma consensos. Mas nada está normal nos últimos tempos. Os economistas estão divididos, como a coluna mostrou ontem. A partir da declaração de Tombini, de que as projeções do FMI serão levadas em consideração na reunião, houve uma mudança na curva de juros e nas previsões do que vai acontecer hoje. Quem achava que os juros subiriam 0,5% passou a aumentar a probabilidade de 0,25%. E há os que acham que o BC pode nem mexer nos juros.

O Brasil teve o maior corte nas previsões do PIB que o FMI fez, mostrando que o país está indo na contramão. A previsão do Fundo é de que a economia global terá um crescimento de 3,4% este ano e de 3,6% no ano que vem. Enquanto as estimativas para a economia mundial sofreram pequenos cortes em relação ao relatório de outubro do ano passado, de 0,2 ponto em ambos os anos, para o Brasil os números caíram 2,5 pontos e 2,3 pontos respectivamente.

Não há consenso no mercado financeiro de que a alta de juros, neste momento, seja o melhor remédio para combater a inflação. Cresce entre os economistas o receio de que mais juros terão apenas efeitos negativos porque aumentarão o custo da dívida interna e o risco-país. Isso pressionará o dólar e a própria inflação. O problema é que os sinais do Banco Central nos últimos meses foram sempre no sentido de refutar essa teoria e indicar que a alta de juros aconteceria para levar a inflação ao centro de 4,5% no ano que vem.

Há apenas 12 dias, no dia 8 de janeiro, o Banco Central enviou carta aberta ao Ministério da Fazenda para explicar as razões de a inflação ter estourado o teto da meta em 2015. No último parágrafo, afirma que “adotará as medidas necessárias de forma a assegurar o cumprimento de objetivos do regime de metas, ou seja, circunscrever a inflação aos limites estabelecidos pelo CMN, em 2016, e fazer convergir a inflação para a meta de 4,5% em 2017.” Essa foi apenas uma de várias demonstrações de alta da Selic nos últimos meses.

Por isso, a nota divulgada ontem pelo presidente do BC, Alexandre Tombini, mexeu tanto com o mercado financeiro. A interpretação foi que Tombini deixou a porta aberta para não subir os juros ou fazer um movimento de alta menor, de 0,25 ponto.

O FMI trata de previsões do mundo todo, por isso nunca é de se esperar que ele esteja mais adiantado do que os outros, seja para prever crescimento ou queda. Desta vez ele se alinhou com os que recentemente aumentaram a previsão de recessão. Há alguns bancos e consultorias que já chegaram à previsão de queda do PIB de 3,5%, mas a mediana do Focus está em 3% e há grandes instituições projetando até abaixo de 3%.

O Banco Central já fez reuniões difíceis, mas esta é talvez a mais complicada dos últimos tempos. A inflação está em dois dígitos, o que não acontecia há 13 anos, e a previsão é de um segundo ano de estouro da meta. Todo o manual de política de metas manda subir os juros. A recessão está entrando em seu segundo ano e as projeções são de que a redução será quase tão forte quanto a de 2015. Com o PIB em queda livre não se pode subir os juros sob pena de aumentar a intensidade da queda. Um indicador encomenda uma decisão do Banco Central exatamente oposta ao que o outro exige. Não será uma decisão fácil para um BC que, além de tudo, nunca teve autonomia para agir e que, a cada reunião, tem que provar que tomou decisão de forma independente.

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A Secretaria de Educação do Rio mandou um comunicado, a propósito da coluna de domingo, na qual havia críticas à decisão de cortar na merenda escolar. A Secretaria informa que a decisão foi revista e os alunos terão merenda quente nos cinco dias. Difícil este momento para os gestores. É preciso saber onde cortar e onde gastar.

As relações incestuosas de um empreiteiro - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 20/01

Mensagens trocadas pelo presidente afastado da OAS, Léo Pinheiro, recuperadas pela Lava-Jato, denunciam um reprovável conflito de interesses


Iniciada em março de 2014, a Operação Lava-Jato já reuniu o maior acervo da Justiça brasileira em provas, depoimentos, denúncias sobre um esquema de desvio de dinheiro público. Tudo proporcional ao tamanho do que foi saqueado pelo lulopetismo e aliados, a Petrobras. E material continua a ser acumulado, o qual, depois de servir para instruir processos contra inúmeros acusados, será rica fonte para pesquisas e estudos sobre vários aspectos deletérios de como a política e os negócios se misturam no Brasil, longe da opinião pública e dos instrumentos de fiscalização do Estado — em funcionamento na Lava-Jato, felizmente.

Até agora, entre os vários personagens que afloraram no escândalo, destaca-se Léo Pinheiro, presidente afastado da OAS, e cujas mensagens resgatadas de seus telefones celulares pela Polícia Federal revelam uma ampla rede de interesses.

Ao lado de Marcelo Odebrecht, de Ricardo Pessoa, da UTC, entre outros investigados, Léo Pinheiro surge nas investigações como alguém com grande capacidade de articular-se com políticos, autoridades do Executivo e do Judiciário, distribuir e obter favores.

Do círculo de conhecimento do empreiteiro, estão, ou estavam, o ex-presidente Lula, a quem jocosamente chama de “Brahma”, o indefectível Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e, entre outros mais, o atual ministro-chefe da Casa Civil, o ex-governador da Bahia Jaques Wagner (PT) — onde está a sede da empresa —, que inspirou a criatividade de Pinheiro ao ser apelidado por ele de “Compositor”, referência ao músico alemão.

O que transparece de trocas de mensagens entre o empreiteiro, políticos e assessores é que o limite entre a defesa de interesses públicos, por parte de autoridades, e pessoais foi largamente ultrapassado.

Noticiou-se que o vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em uma das viagens ao Brasil, teria defendido a oferta da Boeing para substituir os ultrapassados jatos de interceptação da FAB, negócio afinal arrebatado pela sueca Saab. Mas não consta que Biden tenha pedido à Boeing favores para amigos e para ele mesmo, numa escrachada troca de favores.

No convívio descuidado entre empreiteiros e governantes brasileiros, a história tem sido outra, denuncia a Lava-Jato. A OAS de Léo Pinheiro finalizou o prédio em que a família Lula tem um tríplex no Guarujá. Até mesmo Rose, Rosemary Noronha, amiga do ex-presidente, é citada na troca de recados como se houvesse algo que Pinheiro pudesse ajudá-la pessoalmente.

Lula também fez incontáveis gestões a favor de projetos dessas empreiteiras brasileiras. Tudo muito defensável. Menos o fato de o presidente receber por palestras dadas em eventos das mesmas empreiteiras, e tampouco encaminhar pedidos de favores a pessoas próximas.

Este é um aspecto de todo esse escândalo que precisa ser esclarecido, para ajudar na moralização da vida pública brasileira.

Arroz, feijão e inflação - PEDRO FERREIRA E RENATO FRAGELLI

VALOR ECONÔMICO - 20/01

No intuito de minorar o desastre eleitoral petista previsto para o pleito municipal deste ano, Lula e o PT têm defendido a retomada imediata do crescimento econômico. Sem que antes se equacione o problema do endividamento público explosivo, essa aventura não apresenta a menor chance de sucesso.

A história econômica brasileira registra várias experiências fracassadas de adiamento do combate à inflação, no intuito de se promover o crescimento de curto prazo. Em 1963, quando as medidas anti-inflacionárias adotadas pelo Plano Trienal começaram a gerar um inevitável desaquecimento, João Goulart concedeu reajustes para o salário mínimo e aos servidores, inviabilizando o plano de Celso Furtado. A inflação retomou sua trajetória ascendente, enquanto o PIB tomou o rumo descendente.

Em agosto de 1979, ao substituir o ministro Simonsen, Delfim Neto tentou retomar o crescimento, a despeito da pressão inflacionária decorrente do segundo choque do petróleo. A aventura dobrou o nível de inflação, tendo sido revertida após um ano com catastróficos resultados sobre o PIB a partir de 1981. Em 1986, após substituir o ministro Dornelles, Funaro adotou medidas expansivas. Seis meses depois, quando a inflação mensal atingiu 14%, lançou o Plano Cruzado que fracassou em menos de um ano.

O que atualmente impede a economia brasileira de crescer é a incerteza causada pelo crescimento explosivo da dívida pública e pela fragilidade do quadro político. Enquanto a receita tributária cai devido à recessão, a despesa pública continua a crescer por causa da indexação de boa parte dos gastos. Diante da elevada taxa real de juros atual de 6% ao ano, o superávit primário necessário para estabilizar a relação dívida/PIB teria que atingir 3% do PIB, isto sob a hipótese irrealista de que o PIB voltasse a crescer a 2% ao ano. Mas a proposta orçamentária para 2016 prevê superávit de apenas 0,5%, e mesmo esse número modesto parece impossível de ser alcançado.

Diante do crescimento explosivo da dívida, o governo só consegue rolar os títulos que vencem ao aceitar pagar uma elevada taxa de juros. Tentativas voluntaristas de baixá-la levariam ao encurtamento do prazo médio de vencimento, agravando a instabilidade.

A retomada do crescimento exigiria aumento de investimentos. Mas o empresário que hoje considera a possibilidade de investir sequer consegue calcular a taxa de retorno do projeto, dada a instabilidade política e a certeza que novos impostos serão criados durante o prazo de maturidade do empreendimento. Por que correr os riscos inerentes à produção ante a confortável alternativa de receber 6% ao ano aplicando em títulos públicos? Em vez de investir no negócio, as empresas abertas recompram ações no mercado em baixa.

Enquanto a sociedade brasileira não negociar politicamente quem pagará o custo do ajuste, via menores serviços e transferências, ou maiores impostos, o país continuará paralisado. Do ponto de vista de ajuste fiscal, o ano de 2015 foi praticamente perdido. Mas, pelo menos, a correção de preços relativos - câmbio e preços administrados artificialmente contidos durante o período pré-eleitoral - foi iniciada, gerando uma inevitável pressão de custos que levou a inflação a 10,7%. Para que esse patamar de inflação não se perpetue, é preciso que os salários nominais não acompanhem a inflação, desarmando-se a pressão de custos, e que o governo não re-introduza, como vem anunciando, mecanismos de estímulo para economia. Aquecer a economia agora perpetuaria o patamar inflacionário de 2015, aumentando as incertezas.

Diante do rito estabelecido pelo STF, a derrota do impeachment ficou mais provável, e teoricamente Dilma Rousseff teria assim uma oportunidade de se redimir dos erros crassos da Nova Matriz Econômica. Uma vez confirmada no cargo, ela poderia tentar implantar reformas estruturais, entre elas a reforma da previdência. O estabelecimento de uma idade mínima para a aposentadoria, com uma adequada regra de transição, poderia ser apresentada como medida necessária para garantir a sobrevivência dos programas de maior impacto sobre os mais desfavorecidos, como o Bolsa Família. Uma adequada campanha poderia explicar à população que a idade mínima não atinge os mais pobres, pois estes não conseguem se aposentar por tempo de contribuição, mas sim por idade, pois trabalham muitos anos na economia informal.

Somos, entretanto, bastante céticos de que haverá espaço político para qualquer ajuste mais profundo durante os próximos três anos. O PT já anunciou com todas as letras ser contra qualquer reforma estrutural e clama por políticas de estímulo ao crescimento. Os demais partidos da base de apoio ou vão na mesma direção ou estão mais preocupados em sobreviver à Operação Lava-Jato. Assim, apesar dos anúncios recentes do novo ministro da fazenda, é muito pouco provável que o governo leve ao Congresso uma proposta de reforma previdenciária ou qualquer proposta de ajuste mais séria.

Além disto, os sinais têm sido contraditórios: ao mesmo tempo em que o BC indica aumento dos juros, o Ministério da Fazenda anuncia expansão do crédito dos bancos públicos. O primeiro quer conter a demanda e recuperar sua reputação, o segundo quer expandir a demanda, ajudando o PT nas eleições de outubro. Como Nelson Barbosa já mostrou ter maior poder político, tudo indica que a segunda linha de ação prevalecerá e que teremos pela frente uma política feijão com arroz que buscará estimular o crescimento da economia tentando manter a inflação sob controle. Esse é um filme ruim que já vimos no passado. Não há final feliz, a inflação ganha no final.

Pedro Cavalcanti Ferreira e Renato Fragelli Cardoso são professores da Escola de Pós-graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas

O FMI e o Brasil da propina - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 20/01

A corrupção brasileira é destaque, mais uma vez, no cenário da economia global – uma realização indiscutível da administração petista. A Petrobrás é a única empresa citada nominalmente nas novas projeções econômicas do Fundo Monetário Internacional (FMI), divulgadas ontem. Pelos novos cálculos, a economia brasileira encolherá 3,5% neste ano e terá crescimento nulo em 2017. Para a atividade global, as estimativas indicam expansão de 3,4% em 2016 e de 3,6% no próximo ano. As previsões do FMI são agora piores que as do mercado nacional: contração de 2,99% em 2016 e crescimento de 1% em 2017, segundo a última pesquisa Focus do Banco Central (BC).

Os economistas do FMI rebaixaram quase todas as projeções publicadas em outubro, mas as perspectivas do Brasil continuam entre as piores. Houve recuo de 0,2 ponto nas estimativas para o desempenho global neste ano e no próximo. No caso do Brasil, os cortes das previsões chegaram a 2,5 e 2,3 pontos. A mudança da percepção – para pior – também foi acentuada entre os analistas nacionais do setor privado e do governo. A mudança é explicável, em boa parte, pelo aumento das incertezas políticas e pelos tropeços da política econômica.

A piora das projeções globais foi em parte ocasionada pela observação de menor dinamismo entre os emergentes. “Em termos de composição por país, as revisões são amplamente explicadas pelo Brasil, onde a recessão causada pela incerteza política, no meio dos continuados efeitos da investigação sobre a Petrobrás, tem-se mostrado mais funda e mais prolongada do que antes se esperava”, escreveram os autores do relatório do FMI. O escândalo da Petrobrás já havia sido citado em documentos do FMI e do Banco Mundial. O assunto está virando lugar-comum nas avaliações da economia brasileira.

A situação brasileira é citada também de forma negativa quando se explica a piora das projeções para a América Latina e o Caribe. Pelos novos cálculos, o produto bruto da região diminuirá 0,3% em 2016 e crescerá 1,6% em 2017. Ou seja, agora se projeta contração econômica para os latino-americanos e caribenhos, “apesar do crescimento positivo na maior parte dos países”. Explicação: “Isso reflete a recessão no Brasil e em outros países em dificuldades econômicas”.

Os outros países são o Equador e a Venezuela. O primeiro sofre as consequências da desvalorização do petróleo e da alta do dólar, usado como moeda nacional. O segundo também é prejudicado pela redução dos preços do petróleo, mas seu principal problema é, obviamente, a política bolivariana.

A Venezuela está em recessão desde 2014, com números bem piores que os brasileiros, e sua inflação chegou à casa de 140% ao ano. Seu comércio interno foi desarranjado pela intervenção do governo, faltam dólares para a importação de bens de consumo essenciais e indústrias são forçadas a paralisar a produção, de tempos em tempos, por falta de matérias-primas e componentes. Também o desastre venezuelano afeta as estatísticas da região, mas o peso dos números brasileiros é muito maior.

Na reunião anual do FMI, em outubro, um dirigente do FMI mencionou de forma elogiosa, numa entrevista coletiva, o dinamismo recente da economia paraguaia, favorecido, segundo ele, por uma política econômica prudente. Entre os principais problemas enfrentados pelos paraguaios, nos últimos tempos, o funcionário incluiu as políticas dos maiores vizinhos, numa referência óbvia a Brasil e Argentina. Os dois países têm sido os grandes entraves à integração global do Mercosul. A derrota eleitoral do kirchnerismo, com a eleição de Maurício Macri para a presidência da Argentina, cria alguma expectativa de mudança na política do bloco.

Mas continua muito arriscado apostar na conversão do governo petista para uma diplomacia econômica mais pragmática, voltada para uma integração mais eficaz no comércio e nas cadeias internacionais de produção. Defensor dessa integração, o ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy deixou o governo em dezembro, pressionado pelo PT e desprestigiado pela presidente Dilma Rousseff.

Na ratoeira - ALEXANDRE SCHWARTSMAN

Folha de SP - 20/01

Uma crítica comum à aplicação do regime de metas para a inflação no Brasil refere-se à "insistência no ano-calendário", isto é, à necessidade de atingir a meta no final de um ano, em vez de se concentrar em períodos mais longos, faltando-lhe "paciência". Sempre que vejo esse comentário me ponho a pensar: em que planeta vive quem afirma tal atrocidade?

Não é sequer necessário lembrar que o BC não entrega a inflação na meta desde 2009; basta notar que há cerca de um ano o BC prometeu convergência para o final de 2016, prazo devidamente prorrogado para 2017. Ano-calendário onde, cara-pálida?

Isto dito, elevar o prazo de convergência da inflação à meta não é necessariamente errado, mas, se há benefícios nessa estratégia, há também custos, e a decisão requer que ambos sejam considerados, posição que geralmente escapa ao pessoal do espaço sideral.

Digamos, por exemplo, que, dado um desvio muito significativo da inflação, o BC decida esticar o período de convergência de um ano para três. Para facilitar, suponhamos que a inflação inicial seja 9%, a meta, 3%, e que o BC decida reduzir a inflação em 2% a cada ano. Assim, o objetivo no primeiro ano seria 7%, caindo para 5% no segundo e, finalmente, 3%.

Mantendo as coisas simples, vamos também supor que as expectativas de inflação se ajustem a essa trajetória. Assim, a expectativa para o primeiro ano seria o equivalente a 2/3 da inflação passada (6%) e 1/3 da meta (1%), isto é, 7%.

Já se o BC decidisse por um período de convergência de seis anos (1% por ano), ainda supondo credibilidade, as expectativas seriam 5/6 da inflação passada (7,5%) e 1/6 da meta (0,5%), isto é, 8%.

Assim, quanto mais extenso for o período de convergência, tanto maior será o peso dado à inflação passada na formação de expectativas, ou seja, mais indexada se torna a economia.

Concretamente, esse processo deve ser uma das razões (se não a principal) para a resistência crescente da inflação à queda. Quanto mais os reajustes de salários e preços se baseiam na inflação passada, mais persistente se torna a inflação e mais custosa, do ponto de vista de desemprego e queda do produto, passa a ser sua redução.

Isso coloca o BC diante de um dilema. Caso tente reverter o processo, optando pela convergência mais rápida, terá de pagar um custo, em termos de atividade econômica, maior do que pagaria se mantivesse a estratégia de queda lenta da inflação, a menos que consiga convencer a todos de que, como a convergência será rápida, não será mais necessário reajustar preços e salários com base na inflação passada.

Por outro lado, agentes sabem que o BC, dado seu passado, se preocupa com os custos da desinflação e estaria propenso, de forma oportunista, a estender o período de convergência mesmo se todos passassem a crer que a inflação cairia rapidamente.

Nesse caso, simplesmente não acreditariam em promessas de convergência rápida e seguiriam reajustando preços e salários com base na inflação passada.

Incapaz, portanto, de se comprometer com a queda rápida da inflação, só resta ao BC seguir com a estratégia gradualista. Isso torna o combate mais difícil hoje do que era no passado e será ainda mais complicado quanto mais demorarmos em tratá-lo.

O BC se colocou na ratoeira e não faz ideia de como escapar dela.

O Banco Central na contramão. De novo - CRISTIANO ROMERO

VALOR ECONÔMICO - 20/01
Quando decidiu comentar as projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) para o crescimento da economia brasileira neste e no próximo ano, o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, atendeu a uma brutal pressão do Palácio do Planalto, que não quer ver o Comitê de Política Monetária (Copom) elevando a taxa básica de juros (Selic) na reunião desta quarta-feira. Ao afirmar que são "significativas" as revisões feitas pelo Fundo, que ficou mais pessimista, Tombini deixou claro que o Copom desistiu de elevar a Selic neste momento. Trata-se de mais um capítulo da triste história de perda de institucionalidade do BC na atual gestão e de deterioração da qualidade da política econômica do país.

Por que o presidente do BC se surpreendeu justamente agora? Ora, o boletim Focus, que colhe para o Banco Central as projeções de mais de cem instituições financeiras, acadêmicas e de classe, já vinha mostrando há algum tempo que a mediana das projeções aponta para uma queda superior a 2,5% no Produto Interno Bruto (PIB) em 2016. No último boletim, divulgado segunda-feira, a mediana está em 2,99%. Para 2017, o Focus prevê alta de 1%, enquanto o FMI revisou sua projeção de crescimento de 2,3% para zero.

As projeções do Fundo são mais acuradas que as realizadas no Brasil? O que se sabe desde sempre é que os cálculos da instituição são bastante defasados. Em seu comentário, Tombini chamou atenção para o fato de o FMI ter atribuído a fatores "não econômicos" as razões para a "rápida e pronunciada deterioração das previsões". Foi preciso, então, que uma entidade estrangeira advertisse o presidente do BC do Brasil dos efeitos da crise política na atividade econômica?

É curioso porque no último ano Tombini, em conversas reservadas, atribuiu mais de uma vez à "dominância política" a tragédia econômica brasileira. Não se tenha dúvida, por conseguinte: o presidente do Banco Central esteve com a presidente da República e esta lhe ordenou que mantenha os juros onde estão ou até que os reduza.

Uma característica marcante da gestão de Tombini é que desde 2011, alegando razões diversas, ele protelou para o ano seguinte a busca da meta de inflação. Ainda que a conquista da meta, em algumas ocasiões da história do regime de metas, tenha sido postergada para o momento seguinte, no caso da atual administração os adiamentos apenas acarretaram aumento das práticas de indexação e, portanto, do custo de desinflação, uma herança certamente maldita para a próxima geração.

Em 2015, primeiro ano do novo mandato de Dilma Rousseff, parecia que as coisas seriam diferentes ao menos no BC. Tombini e sua equipe voltaram a seguir o regime de metas. Ao observar o modelo, retomaram o ciclo de aperto monetário porque a inflação, mesmo com a economia em recessão, não parava de crescer. Contrariando opiniões inclusive de economistas de perfil ortodoxo, Tombini se preparava, neste momento, para elevar os juros.

A razão é simples: o modelo do Banco Central mostra uma deterioração que, se não for revertida, resultará numa inflação persistentemente acima da meta. O plano de Tombini era fazer um discurso duro quanto à necessidade de combater as pressões inflacionárias e trabalhar para levar o IPCA o mais próximo possível de 6,5% em 2016 e de 4,5% em 2017 - sabendo que não conseguiria lograr sucesso, mas indicando o caminho.

Quando calibra a taxa de juros, o Copom olha para o hiato do produto, a distância que separa o PIB efetivo do potencial. A princípio, a forte queda da atividade econômica e, portanto, do PIB efetivo indicaria um cenário desinflacionário, de abertura do hiato, especialmente quando se observa o que ocorreu nos três primeiros trimestres de 2015. No ano passado, o PIB pode ter recuado 4%, com queda de 9% da absorção doméstica no último trimestre.

O problema é que, também no quarto trimestre, a taxa de investimento (a Formação Bruta de Capita Fixo, isto é, os gastos das empresas e do setor público com máquinas, equipamentos e construção civil) pode ter caído algo como 25%. Quando isso ocorre, reduz-se o potencial de expansão do PIB, o que ajuda a fechar o hiato do produto.

Instituições do mercado que replicam o modelo do BC revelam que, desde a divulgação do último Relatório de Inflação (RI), em dezembro, a projeção de inflação do cenário de referência - aquele no qual a autoridade monetária se ampara para calibrar os juros - piorou. No RI, o IPCA projetado para 2016 é de 6,2%. Aplicando-se o modelo do BC, essa projeção já teria saltado para 6,9%, uma rápida deterioração. No caso de 2017, o salto é de 4,8% para 5,4%.

No cenário de mercado, captado pelo boletim Focus, as expectativas também se deterioraram rapidamente: para 2016, a inflação esperada já é de 7%, ante 6,3% projetados em dezembro; em relação a 2017, os números são 5,2% e 4,9% respectivamente. Além das projeções e das expectativas, o cenário para a taxa de câmbio piorou desde dezembro. O que melhorou foram as estimativas para preço do petróleo e das commodities em geral.

As expectativas também se deterioraram nas medidas de inflação implícita com que o mercado trabalha nas negociações das NTN-Bs, títulos de longo prazo indexados à inflação. Nesses papéis, a inflação implícita está acima de 8,5% para 2016. A pedido desta coluna, uma gestora fez uma interpolação das expectativas contidas nesses papéis para os próximos anos e constatou que a inflação mais baixa, até 2022, é 7,8%.

Se olhasse para seus parâmetros, o Copom teria que aumentar os juros hoje, o que parece uma excrescência e de fato é - se o BC não tivesse procrastinado a sua tarefa nos últimos cinco anos, a inflação não estaria em dois dígitos, uma infâmia, dado que o país não cresce e a carestia corrói a renda justamente dos salários mais baixos e daqueles que vivem de programas de transferência, como o Bolsa Família; os juros também seriam bem menores.

Ao atender sem protestos a meros desígnios políticos, o BC perde institucionalidade - deveria mirar-se no exemplo de instituições como o Tesouro Nacional, que, mesmo sem independência, mostrou ao país do que a tirania é capaz. O resultado da subserviência traduz-se em números: a inflação média anual e mensal da atual gestão é bem superior à dos oito anos do governo Lula - respectivamente, 7,07% e 0,57%, ante 5,79% e 0,47%.

Deixa comigo... - ROBERTO DAMATTA

O GLOBO - 20/01

Dizer num solene manifesto que é uma injustiça prender os ladrões do petrolão promove a dúvida



‘Que eu faço”, “Resolvo”, “Não vou contar”, “Falo com ele”, “Pago”. Complementando, o “deixa comigo” reafirma confiança. É uma expressão reveladora de como as palavras — além de criarem e balizarem o mundo, garantem compromissos — “fazem coisas”, como aprendi com o filósofo John Longshaw Austin. Há uma obrigação na promessa. O mesmo ocorre quando digo “deixa comigo!”.

Mas tudo depende do contexto, senão casar num palco seria um casamento “de verdade”. Mas, em certos momentos, o elo entre o falar e o fazer nivela as distâncias. Falar de sexo é em, certas situações, fazer sexo. Do mesmo modo, os sacrilégio assustam.

Romualdo Flores, católico fervoroso e amigo do coração, ficava chocado ao ouvir as blasfêmias espanholas de Manolo Rivera, um pensador com quem debatemos conflitos intestinos que iam das guerras civis ao soturno incesto da corrupção federalizada num seminário internacional sobre a calúnia realizado em Santander, Espanha.

A calúnia faz com a que o absurdo abafe a verdade. Ela promove a dúvida. “Eu sabia...”, diz o lado maldoso do seu coração ao ouvir a aleivosia. Anunciada com veemência, ela intriga porque, como a propaganda, muitos precisam da mentira e do absurdo. Ademais, tudo o que é impresso ou pronunciado em voz empolada ganha um viés de veracidade. Recentemente, um conhecido foi caluniado, e logo descobri que a aleivosia tinha a capacidade de parir um monte de dúvidas. Como o caluniado era velho e honesto, não era sicofanta e dizia o que pensava, não teria ele realmente cometido o crime denunciado pelo caluniador? Quem, afinal seria o f.d.p — o caluniador ou a vítima? Eis o absurdo que faz com que a calúnia “pegue”. Dizer num solene manifesto que é uma injustiça prender os ladrões do petrolão promove a dúvida que até hoje fratura o território que divide bandidos bilionários enriquecidos pelo assalto às instituições públicas, cujas penas deveriam ser o dobro das de desdentados ladrões de galinha.

Jogar com o oposto de um caráter ou reputação é um elemento perturbador, pois equivale a arrancar uma máscara. O puritano santimonioso é revelado como um pedófilo; um professor de antropologia é denunciado como preconceituoso. Nada foi mais chocante para alguns meninos da minha geração do que descobrir a sexualidade do pais, sobretudo da mãe, cujo nome era sagrado.

Pelo mesma lógica, nada pode ser mais decepcionante do que descobrir que o partido nascido dos trabalhadores e liderado por um operário apaixonou-se perdidamente pelos muito ricos e a eles entregou as riquezas do país. Parece uma caluniosa ficção mas, infelizmente, é verdade.

Daí o mal-estar das reversões morais quando projetos de melhorar o mundo são profanados. A verdade nua e crua — que obriga o mais covarde a tomar uma atitude — produz um efeito semelhante ao da calúnia: essa hipermentira. Prender ladrões do bem comum é como condenar um pai comprovadamente incestuoso. O autorroubo ou a autossabotagem é a negação que tipifica o bandido-político e o neurótico clássico estudado e desvendado por Freud. Qual é a lógica por trás de governantes que batem a carteira do povo que governam?

Se os papéis públicos exigem coerência, como resolver essa multidão de atos desonestos que assolam o país? Um pensador com mais inteligência do que o malogrado cronista diria que essa desonestidade tem, de um lado, um laço profundo com o gigantismo centralizador das esferas de poder; e, do outro, a fé ou a crença em formulas que resolveriam o Brasil. A crença não depende de experiência. Muito pelo contrário, quanto mais ela é rechaçada pelos fatos e pela vida, mais nela se deve acreditar. O crítico absoluto dos outros é um sujeito perdido no labirinto da sua arrogância. Como o soldado que marcha de passo errado.

“Deixa comigo”, dizem as crenças e os amigos de fé dos logros que promovem uma potente solidariedade. Num plano menos visível, porém, o “deixa comigo” é a devolução de um favor. Trata-se do fechamento de um ciclo de reciprocidades que filtram permanentemente valores e ideais. Se os ideais exigem uma sincera e difícil impessoalidade, o favor dos “deixa comigo” tudo perdoa em nome dos companheiros a quem se deve a devolução de um gesto de simpatia na forma de alguns milhões de dólares.

Volto ao começo.

O “deixa comigo” é primo da impunidade. Afinal, tudo passa, e o povo, também sem memória, esquece.

— Acertamos na mosca comprando uma refinaria superfaturada.

— Mas, e se descobrirem?

— Não vão descobrir.

— Mas... e se descobrirem?

— Estamos juntos e cobertos pelo gabinete. Ademais, temos os ritos do processo.

PS: o que diz “deixa comigo” está livre, leve e solto. Acaba de chegar de Miami cheio de lembrancinhas para a família. Já o preocupado passa uma temporada na Papuda, lendo a Bíblia.

Roberto DaMatta é antropólogo

Vai indo que eu não vou - VINICIUS TORRES FREIRE

Folha de SP - 20/01
Em um texto menor que cinco tuítes, dez linhas, o presidente do Banco Central deixou ontem muita gente perplexa ou indignada. Pode ser também que tenha posto fogo no último mapa, ou GPS algo bichado, da política econômica.

Na véspera de uma decisão importante do BC, Alexandre Tombini meio disse "esqueçam o que escrevi" nos últimos meses sobre a taxa básica de juros. Ainda que não o tenha feito, causou um salseiro problemático.

Tombini insinuou que o aumento da taxa de juros, se algum, será menor do que o previsto pelos donos do dinheiro grosso e seus porta-vozes, crença baseada no que o BC afirmava fazia uns seis meses. O pretexto da nota foi a previsão do FMI para o crescimento da economia do Brasil, revisado para baixo, para o ritmo desastroso já sabido de todo mundo.

E daí? Faz diferença, no universo paralelo das pessoas que se ocupam das conversas sibilinas do BC, muitas das quais têm enorme influência no preço do dinheiro. Na falta de rumo certo, é mais provável que tenhamos mais inflação ou inflação mais resistente, difícil de abater.

A economia está desorientada. O governo tem uma meta de gastos em que ninguém acredita. Não há planos de médio ou longo prazo; os de curto prazo são rumores e causam desconfiança. Além de governo na pindaíba e do tumulto político, a economia mundial contribui para nos desnortear.

Em suma, não se sabe bem o que será de gasto público, juros, inflação e câmbio. Sim, é o que parece, estamos à deriva ou quase. E o BC com isso?

Pelo menos desde 2009, o BC vai e volta no anúncio do que pretende fazer de inflação e, pois, taxas de juros. É da vida e responsabilidade dos BCs adaptar-se a reviravoltas econômicas e financeiras. É boa hora para elevar juros rapidamente, causar desemprego e, em tese, baixar logo a inflação? É o caso de ir mais devagar com o andor?

Desde 2009, o BC em geral escolheu o jeitinho, anunciando que levaria a inflação à meta em prazo mais dilatado (dois anos, em vez de um, digamos, para simplificar). Estivesse ou não errado, seja lá o motivo, a inflação não voltou à meta. Uma reviravolta ou duas pode não dar muito problema. Sete anos de juras desfeitas causam descrédito, claro, e acomodação com inflação maior, mais difícil, custosa, de abater.

No início de 2015, o BC disse outra vez "agora vai": a inflação baixa à meta de 4,5% ao ano em 2016 nem que a vaca tussa (então esperava-se IPCA entre 7% e 8% em 2015). Dados os desastres da economia, IPCA viajando a 10%, aceitou-se outra mudança de planos BC: inflação na meta em 2017. Era sinal de aumento de juros.

Ao avisar por onde e em qual ritmo vai, o BC evita acidentes e, se tem crédito, até faz seu trabalho com menos custo (menos juros). O BC dizia até anteontem que estava indo por um caminho. Ontem sugeriu que talvez não vá, com pretexto bisonho.

É verdade que as estradas já estava arruinadas ou obstruídas. Temos uma recessão histórica de quase 4% e do PIB e inflação de 11%, rara combinação desastrosa. Há mesmo muita gente razoável, de ideias de resto divergentes, para quem elevar a taxa de juros agora é inócuo ou até piora a inflação.

Agora, a confusão é geral: inclui o BC, que não sabe o que faz ou passa essa impressão.

Tudo mudou, menos Marina Silva - ELIO GASPARI

Folha de SP - 20/01
Marina Silva está de volta. Se o Tribunal Superior Eleitoral cassar os mandatos de Dilma Rousseff e Michel Temer, o Brasil terá uma eleição presidencial neste ano e Marina poderá lembrar que sua candidatura não contém pesticidas, glúten, nem menções na Lava Jato. Mesmo que isso não aconteça, o grau de deterioração do sistema partidário chegou a um ponto que Marina será uma candidata altamente competitiva em 2018. Seu novo partido é jovem e virgem, pois nenhuma roubalheira chegou a quilômetros de distância da ex-ministra do Meio Ambiente de Lula.

Depois de passar algum tempo em silêncio, Marina reaparece condenando o movimento pelo impeachment de Dilma (que empossa Temer) e defendendo a intervenção do TSE. Numa entrevista ao repórter Marcelo Leite, a professora expôs a concepção "marineira" dos problemas nacionais oferecendo uma esperança, ela. Reapresentou a barafunda retórica que contribuiu para a ruína de sua campanha em 2014.

Definiu-se como "sustentabilista progressista", condenou o uso de rótulos e classificou seu partido como um "experimento" de superação do PT e do PSDB, que rotula como social-democratas. A Rede seria um partido tradicional, de massas e de quadros. Ele busca "um modelo de desenvolvimento que seja sustentável nos seus aspectos econômico, social, ambiental, cultural, político, ético e até mesmo estético".

Essa construção pode dizer tudo, ou nada. Marina exercitou um velho hábito: diz o que não é, mas não diz o que é. Como o freguês que entra num restaurante, lê o menu e diz o que não quer comer. Não quer uma "perspectiva de terra arrasada" porque busca "uma nova síntese". Não quer "megaestruturas para ficar fazendo política como muitos vinham fazendo". Não quer hegemonia nem a sacralização do seu partido. Diante da confusão geral, Marina Silva diz que "o primeiro dever de casa que temos de fazer é trabalhar de fato no programa, de estabelecer prioridades".

Chega-se assim ao programa Marina.

Na eleição de 2014, em menos de três meses, ela teve um desempenho tão espetacular quanto melancólico. Depois da morte de Eduardo Campos, em agosto, conseguiu uma ascensão fulminante, ultrapassando Aécio Neves e liderando as pesquisas para o segundo turno com dez pontos de frente sobre Dilma Rousseff.

Teve duas adversidades: seu escasso tempo no horário gratuito na televisão (dois minutos) e a barafunda de seu programa de governo. Nele apresentava propostas econômicas racionais e saídas políticas visionárias, como a "democracia de alta intensidade" com a convocação de plebiscitos. Em setembro, os adversários começaram a atacá-la e, nos últimos dias da campanha, Aécio recuperou-se, deixando-a fora do segundo turno, mas com 20 milhões de votos.

Marina cometeu o erro de acreditar que poderia se eleger com propostas indecifráveis, vagas ou mesmo conflitantes. Foi obrigada a recuar, mas pode-se dizer tudo dela, menos que tenha mentido com a grandiosidade pertinaz de Dilma Rousseff.

Na sua versão Rede, a ex-ministra corre o risco de reviver um episódio ocorrido há décadas. Um sociólogo de fala desconexa terminou sua exposição e o divertido deputado gaúcho Temperani Pereira cumprimentou-o: "Saiba que diante de suas palavras estou incorrobúvel e imbafefe".

Renan perde força - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 20/01

A tentativa aparentemente frustrada do presidente do Senado, Renan Calheiros de se tornar presidente nacional do PMDB, ou indicar o substituto de Michel Temer, retira-lhe o trunfo político com que pretendia defender seu mandato, acossado por vários processos.

Tudo indica que o PMDB está se acertando por dentro para manter uma unidade pelo menos formal, que lhe permita negociar com o PT em condições de igualdade. Dono das maiores bancadas da Câmara e do Senado, o PMDB dividiu-se nos últimos meses diante da hipótese de impeachment da presidente Dilma, mas agora volta a se unir em torno de Temer para não perder a força política.

Hoje o vice se encontrará a sós com a presidente, num ambiente menos hostil de parte a parte, cada um com sua prioridade: Dilma precisa de apoio na Câmara para que o processo de impeachment não tenha prosseguimento, e Temer precisa da unidade para se manter na presidência do partido.

O senador Renan Calheiros, em mais um movimento para reforçar seu apoio à presidente Dilma, começou uma negociação interna para derrotar Temer na convenção de março, mas, além dos seis processos a que responde, Renan passou a ser citado em várias delações premiadas como receptador de propinas da Petrobras, da subsidiária BR Distribuidora e da Transpetro, onde um apaniguado seu, o ex-senador Sérgio Machado reinou por 12 anos.

As condições políticas para comandar o partido esvaíram-se diante da constatação de que novas denúncias devem ser apresentadas contra ele proximamente. No momento, ao que tudo indica, o presidente do Senado está mais empenhado em se defender das acusações do que em tentar aumentar seu poder dentro do partido, que, aliás, já foi maior. Mesmo por que a maioria do PMDB prefere se afastar do PT, e não se reaproximar mais dele, como pretende Calheiros.

O presidente do Senado, aliás, faz isso não por afinidades ideológicas com o petismo, mas em interesse próprio. Está convencido de que a proximidade com o governo lhe traz benefícios nos processos a que responde. Se se convencer de que não tirará vantagens concretas dessa aproximação, pode aderir ao impeachment se o ambiente político se alterar a partir do primeiro trimestre, quando o desemprego ameaça ser desastroso.

No processo mais perigoso para Renan, ele luta para se beneficiar da prescrição da pena. O Procurador-Geral da República de então, Roberto Gurgel, denunciou o senador Renan Calheiros pela prática dos crimes de peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso, com base no inquérito nº 2593 do Distrito Federal, sobre o rumoroso caso de uma amante do senador que recebia pensão de uma empreiteira.

O inquérito data de 2007, quando Calheiros teve que renunciar à presidência do Senado para não ser cassado, mas a denúncia só foi apresentada em 2013. Gurgel alegou que a demora se deu devido estar assoberbado pelo mensalão, o que não parece razoável. Essa demora poderá redundar na extinção da punibilidade dos crimes de falsidade ideológica e uso de documento falso, devido à ocorrência da chamada “prescrição retroativa”.

À época vigiam os parágrafos primeiro e segundo do artigo 110, do Código Penal, que rezavam, respectivamente: “§ 1º A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada”, § 2º “A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa”. Mesmo a lei tendo sido alterada para definir que não pode, em nenhuma hipótese, "ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou da queixa”, vale o que ela dizia à época.

As penas previstas para os tipos penais de falsidade ideológica – tratando-se de documento público – e uso de documento falso, de natureza particular, são de um a cinco anos de reclusão, e se a pena de cada um daqueles crimes não exceder a quatro anos, será o bastante para a prescrição retroativa operar. Já a pena do crime de peculato é bem mais severa: dois a doze anos de reclusão. Se a pena aplicada for no máximo de quatro anos, o raciocínio é o mesmo. Resta saber qual será a atitude do Supremo Tribunal Federal, cujo plenário deverá julgá-lo por ser presidente do Senado.