segunda-feira, junho 20, 2016

Repactuar sem punir a sociedade - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 20/06

Hoje, o presidente interino, Michel Temer, se reunirá com governadores. Na pauta, a renegociação da dívida de estados e municípios, que soma cerca de R$ 500 bilhões. O encontro foi precipitado com a decretação de estado de calamidade no Rio de Janeiro, na sexta-feira, pelo governador interino, Francisco Dornelles. Sede das Olimpíadas e Paraolimpíadas 2016, a Cidade Maravilhosa não tem recursos para honrar os compromissos decorrentes das competições que começam em 5 de agosto.

Há meses, o governo fluminense não consegue pagar em dia e integralmente os salários do funcionalismo, aposentados e pensionistas. Unidades de saúde foram fechadas ou têm negado atendimento aos cidadãos. A Polícia Civil restringiu o uso de combustível. O Instituto Médico Legal recusa corpos na unidade principal. A situação é de calamidade na maioria dos serviços sob responsabilidade do poder público.

A retomada das negociações ocorre a 7 dias do fim do prazo de dois meses fixado pelo Supremo Tribunal Federal, em 27 de abril, para que governos federal e estaduais chegassem a uma solução para o impasse, que levou à judicialização do débito. Na Corte, há 15 pedidos de estados e um da prefeitura de Bauru (SP) para que seja revisto o cálculo das dívidas, considerando a aplicação de juros simples e não compostos, como hoje é cobrado. Com a alteração do indicador de correção, como querem os governadores, a dívida dos estados seria reduzida em mais de 90%, e passaria dos atuais R$ 427,4 bilhões para R$ 42 bilhões - perda inaceitável pela União.

A equipe econômica passada rechaçou a proposta, sob o argumento de que o governo federal paga juros sobre juros nos contratos de crédito. Avaliava que atender às exigências dos estados seria decisão equivocada e perigosa, com risco de criar incerteza jurídica no país, mergulhado em crise econômica sem precedentes e com baixa credibilidade entre os protagonistas do mercado.

O impasse é mais uma das graves consequências da ineficiência e da corrupção que, há anos, corroem as contas públicas. A gastança desmesurada, com o aval da União aos que não tinham lastro para honrar os compromissos, se transformou numa enorme bolha que estourou. Por trás, os inconfessáveis interesses agora expostos à nação por meio da Operação Lava-Jato. Hoje, a asfixia é nacional. "O desperdício na administração pública é tão grave quanto a corrupção", ressaltou o professor da Universidade de Brasília e especialista em contas públicas José Matias-Pereira, ao editor e colunista Vicente Nunes, do Correio.

Dificilmente, a conta impactará no bolso dos governantes que levaram o país ao estado de calamidade em que se encontra. Mas é inaceitável que os contribuintes sejam punidos por meio de mais impostos, considerando os precários e ineficientes serviços públicos que lhes são oferecidos. A sociedade brasileira não tem dúvida de que a combinação perversa de incompetência e desvios de recursos públicos foram a força motriz para o descontrole das contas públicas.

Repactuar a forma de quitação dos débitos é medida urgente para tirar as unidades da Federação da insolvência e lhes devolver capacidade de investir na recuperação de setores essenciais à vida dos cidadãos, como saúde, educação, segurança, mobilidade e outros. Porém, é fundamental que as autoridades econômicas e chefes de Executivo levem em conta que o contribuinte não suporta mais ser espoliado pela incompetência e irresponsabilidade dos predadores do setor público, menos ainda reformas que levem à perda de direitos e conquistas.

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