quarta-feira, janeiro 27, 2016

Pero sin perder la ternura jamás - ALEXANDRE SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP -27.01
A decisão de política monetária foi surpreendente e justificada pelo temor da desaceleração da economia global, acerca da qual dirigentes do BC foram alertados em reunião do Banco de Compensações Internacionais (BIS) e cujo efeito mais direto, em sua opinião, seria reduzir a inflação.
Eu me refiro, claro, à reunião do Copom de agosto de 2011, quando o Banco Central, sob a suposição de um "cenário alternativo" (segundo o qual "a deterioração do cenário internacional [causaria] um impacto sobre a economia brasileira equivalente a um quarto do impacto observado durante a crise internacional de 2008/2009"), iniciou um processo de redução da taxa de juros que só cessaria em outubro de 2012, embora expectativas de inflação e as próprias projeções do BC se encontrassem acima da meta.
Não há a menor dúvida de que se tratou de um movimento desastroso: a partir daí o BC perdeu de vez a batalha das expectativas, que jamais voltaram a se aproximar da meta de inflação. O tal impacto da crise internacional nunca se materializou e a inflação superou a meta em todos os anos desde então.
Sim, usei um truque retórico barato, mas a verdade é que não há como deixar de notar as semelhanças entre o que ocorreu à época e a decisão da semana passada, em particular o apelo a fenômenos internacionais para justificá-la aos olhos do público, retórica ainda mais mixuruca do que a minha.
Isto dito, além de o Banco Central ter requentado a desculpa de 2011, a forma pela qual o processo se desenrolou foi vexaminosa. Seu presidente, no dia da reunião, ressaltou o rebaixamento das projeções do FMI para o crescimento brasileiro, aparentemente ignorando que o boletim Focus (publicado, a propósito, pelo BC) já mostrava a mesma piora das expectativas sobre o desempenho nacional.
Não bastasse isso, veio em seguida à reunião, por meio de porta-voz não oficial, com mais um pretexto por ter violado o silêncio às vésperas do encontro: seria para "assegurar que todas as opções estivessem na mesa no dia de abertura do Copom", pois, "se não tivesse feito uma sinalização prévia, a repercussão da decisão (...) teria sido ainda mais negativa". A preocupação comovente com o mercado de renda fixa e seus pobres operadores chega a me enternecer...
Melhor seria, porém, ter se preocupado com outra reação de mercado, já devidamente documentada aqui na Folha: a elevação das expectativas de inflação que se seguiu à decisão do Copom, num eco desconfortável do erro de 2011.
Com efeito, comparando o rendimento dos títulos do Tesouro com e sem proteção contra a inflação, é possível estimar a chamada "inflação implícita", medida imperfeita, mas rapidamente disponível, das expectativas inflacionárias, com a vantagem de representar apostas em que dinheiro está em jogo, quando preconceitos são deixados de lado diante da possibilidade de ganho e perda.
Assim, entre segunda-feira, antes da "sinalização" do Banco Central, e quinta-feira, o dia imediatamente posterior à reunião do Copom, essas medidas subiram em todos os horizontes, mas em particular para os próximos dois a três anos, revelando a piora da percepção quanto à inflação.
A inevitável conclusão é que o BC repetiu o erro de 2011; plagiar a desculpa esfarrapada de 2011 (em que só Delfim Netto acredita) é apenas reflexo da parca imaginação do BC.

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