sábado, dezembro 05, 2015

Não tenho conta na Suíça... - PLÁCIDO FERNANDES VIEIRA

CORREIO BRAZILIENSE - 05/12

Pelo senso comum, as pessoas a favor de um mundo mais justo, ético, fraterno e igualitário são classificadas como de esquerda. As demais, de direita. O dicotomismo simplista pegou: o pobre contra o rico, o operário contra o patrão, o nós contra eles, o socialismo contra o capitalismo. Mesmo que seja apenas da boca pra fora, o político que consegue emplacar de forma eficaz o discurso do bem contra o mal -mesmo que depois o revolucionário se revele um grande pilantra - quase sempre conquista corações e mentes. Principalmente dos jovens que frequentam universidades públicas.

Afinal, os estudantes que não sucumbem à tese dos professores e colegas "cabeças" são ridicularizados, rotulados de reacionários, filhinhos de papai, coxinhas... Nisso, a esquerda é imbatível. Até a igreja que ela tenta destruir adere. Para resistir à máquina de moer reputações no campus, é preciso ter uma formação política e cultural sólida e diversificada. Saber de verdade o que foram e o que são hoje os regimes comunistas, socialistas e fascistas mundo afora. Ter plena consciência de que foram ou são todos ditaduras. E que essas ditaduras, de esquerda ou de direita, se equivalem: na raiz de cada uma, está o totalitarismo. Mas raros são os adolescentes que chegam à faculdade com uma bagagem dessas.

Enfim, lembro que nos tempos de universidade - Católica e UFPE, no Recife - fui simpatizante (na prática, um militante, mesmo sem filiação) do PCB. Desde aquela época, era incrível observar como no PT não se cumpria acordo. Entre eles mesmos, os petistas, as guerras eram mais fraticidas do que entre integrantes da sigla e gente da extrema-direita. Logo, quem participou ativamente do movimento estudantil sabe, mesmo sem nunca ter testemunhado uma negociata entre Cunha e o governo, que a possibilidade de o peemedebista estar falando a verdade sobre as barganhas é muito mais verossímil do que qualquer desmentido palaciano.

Quem conhece o PT desde as raízes também sabe que era grande o risco de ser traído caso fizesse acordo com o partido. Conhece a fábula do escorpião e do sapo? A diferença é que, no caso petista, o escorpião crê em salvação, apesar do gesto aparentemente suicida. Cunha, conta-se, teria descoberto que, ao mesmo tempo em que prometia salvá-lo no Conselho de Ética, em troca do arquivamento do pedido de impeachment de Dilma, o governo petista tramava para levá-lo à prisão. Por isso, quando o PT ordenou que seus deputados não votassem a favor do presidente da Câmara, Cunha não hesitou um segundo em acionar o gatilho do impeachment.

Concluindo: não há mocinhos nesta história, embora muitos espertalhões a soldo e alguns iludidos úteis difundam a tese de que o PT, enfim, estaria se redimindo ao se voltar contra Cunha. Não está nem estava. Nunca, na verdade, existiu esse partido da ética. Mas sempre haverá quem prefira acreditar na versão petista. Senão, sabe, corre o risco de acabar implodido pela patrulha vermelha e virar "reacionário". Ai que medo. Heim, Nelson!

Os pontos de uma crise - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 05/12

A recessão atual era evitável. O crescimento mundial é baixo, a China está desacelerando, os preços das commodities caíram, e os Estados Unidos vão subir os juros, o que eleva o dólar. Mesmo assim, tudo isso junto não explica a queda de 3,2% do PIB, a inflação de 10% e a devastação fiscal. Uma lista incompleta dos erros dos governos Lula e Dilma chega facilmente ao número 10.

1 Quando houve a crise internacional de 2008, o presidente Lula a subestimou. Ao sentir a força da queda, estimulou o crescimento do PIB pelo incentivo ao consumo, ampliando o crédito e reduzindo impostos para alguns setores, como carros e eletrodomésticos. Exagerou na dose. A política foi mantida para eleger a presidente Dilma, em 2010, que não corrigiu os excessos. Eles continuaram no seu governo através de desonerações a alguns setores, entre eles, o automobilístico. Isso afundou o caixa do Tesouro nos anos seguintes.

2 A presidente Dilma Rousseff forçou o Banco Central a reduzir os juros para atender a uma promessa de campanha. Juros baixos são um objetivo desejável, mas se eles são reduzidos para atender o governante podem acabar elevando a inflação. O centro da meta nunca foi atingido no atual governo e agora o índice está em dois dígitos.

3 A Petrobras foi usada politicamente. O presidente Lula mandava fazer investimentos que não eram rentáveis para agradar aliados políticos. Foi o caso das duas refinarias premium do Nordeste, que viraram prejuízo. A Refinaria Abreu e Lima foi feita para adular o falecido presidente venezuelano Hugo Chávez, mas a Venezuela não quis ficar no negócio. A presidente Dilma confirmou todas as escolhas desastradas de investimento quando presidia o conselho de administração ou após a sua eleição.

4 Logo após os anúncios do pré-sal, o governo Lula decidiu mudar o marco regulatório do setor de petróleo e paralisou por cinco anos as rodadas de licitação. O interesse pelo Brasil caiu fortemente quando surgiram novidades no setor, como o gás de folhelho nos EUA, e outras áreas produtivas. O Irã voltou ao mercado depois de décadas de brigas com o Ocidente. O pré-sal deixou de ser relevante para o mundo. O preço do petróleo caiu. Esse tempo já está perdido.

5 Quando a cotação do petróleo estava alta, o governo Dilma interferiu nos preços internos, impedindo reajuste dos combustíveis. Isso produziu um prejuízo bilionário para a Petrobras, até hoje não recuperado.

6 No governo Lula começaram as transferências de recursos do Tesouro ao BNDES, para que o banco estimulasse a formação de “empresas campeãs nacionais”. Um modelo que já havia dado errado no governo militar. O Tesouro se endividou para o BNDES emprestar, e muito crédito foi concedido de forma controversa. Principalmente, há um erro estratégico. Não é assim que se aumenta a competitividade de uma economia.

7 Quando o ex-ministro Antonio Palocci propôs o déficit nominal zero, a então chefe da Casa Civil Dilma Rousseff fulminou a ideia. Sua política fiscal fez o déficit disparar e atingir 9,5% do PIB.

8 A MP 579 forçou a queda dos preços da energia em 2012 e desequilibrou o setor. O incentivo ao consumo veio quando a seca começou e ajudou a exaurir a água dos reservatórios. Para fechar o rombo das distribuidoras de energia, o governo mandou o setor tomar empréstimos bancários dando como garantia aumentos futuros nas tarifas. Passada a reeleição, os preços saltaram e elevaram a inflação.

9 Para tentar esconder a piora nas contas do superávit, o Tesouro inventou todo o tipo de maquiagem nas contas públicas, como as pedaladas e os decretos de elevação de gastos sem autorização prévia do Congresso. O TCU recomendou a rejeição das contas de 2014 e, agora, juristas pediram o impeachment. O ministro Guido Mantega foi nomeado por Lula e mantido por Dilma no primeiro mandato.

10 A corrupção é o décimo elemento. As descobertas da Lava-Jato mostram erros como decisões bilionárias tomadas por poucas pessoas, ou a compra de uma refinaria velha e enferrujada por um preço muito acima do valor. Foi o fator mais desestabilizador.

O rombo fiscal, os crimes que foram descobertos na Lava-Jato, a inflação alta, o intervencionismo demoliram a confiança na economia. Tudo isso — e outros erros não listados acima — levou o país à pior recessão em 25 anos e à crise política.

O PMDB se move - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 05/12
A decisão do ministro Eliseu Padilha de se demitir "num gesto político", que pode ser seguido por outros ministros do PMDB ligados ao vice-presidente Michel Temer, abre uma nova trilha na disputa política pelo impeachment da presidente Dilma.

O cientista político Carlos Pereira, da Fundação Getúlio Vargas no Rio, considera que esse é o momento da oposição, e vai ser necessário, mais do que nunca, que o PSDB lidere esse processo. Ele lembra que, de acordo com a  literatura sobre impeachment, a consistência e a extensão dos protestos de rua são os aspectos mais importantes para que processos de impeachment sejam bem-sucedidos.

Mas ressalta que outro aspecto também decisivo será apostura do PMDB, pois esse partido também vive um dilema de difícil resolução. Não sabe se deseja continuar jogando o jogo de coadjuvante (do "legislador mediano") ou o jogo de protagonista ("majoritário").

Carlos Pereira acaba de apresentar um trabalho (em coautoria com Samuel Pessoa e Frederico Bertholini) em Tel Aviv, Israel, que exatamente analisa esse dilema. Se, por um lado, o jogo majoritário tem o potencial de gerar os maiores retornos para o PMDB em caso de ser o vencedor, também tem o risco de gerar os maiores custos.

Por outro lado, continuar jogando o jogo coadjuvante do legislador mediano não gera os maiores retornos, mas possibilita retornos suficientes para que as suas principais lideranças continuem sobrevivendo no jogo político.

No momento, o PMDB está dividido, tanto que, na negociação para montar a comissão que vai analisar o pedido de impeachment, ele deve ter quatro deputados favoráveis à saída, e quatro a favor da permanência de Dilma.

Se evoluírem as negociações internas, e outros ministros também saírem do governo, é possível que a maioria da representação do PMDB seja favorável ao impeachment. Segundo o estudo dos especialistas da FGV-Rio, é mais fácil e mais barato para o governo ter um partido forte como o PMDB como coadjuvante na coligação, podendo assim maximizar o apoio político na legislatura com o menor custo possível.

Eles citam estudos recentes que demonstram que aumenta o custo de governar com um Ministério heterogêneo ideologicamente e desproporcional no tamanho, como é o caso do da presidente Dilma, que já teve 39 ministérios, e agora tem 31, abrangendo o largo espectro político que, em teoria, vai da extrema-esquerda à extrema-direita. Se bem que no Brasil não existem partidos extremistas na disputa do poder real, apenas na periferia política, e que surgem na televisão apenas na retórica da propaganda gratuita eleitoral.

No entanto, e é o caso do PMDB, um aliado político de seu tamanho leva o governo ater mais custos reais e políticos. É mais barato comprar um punhado de pequenos partidos do que um dos grandes. Foi esse raciocínio que levou o presidente Lula a montar seu primeiro Ministério sem o PMDB, e, em consequência, aconteceu o mensalão.

No momento, a presidente Dilma está enfrentando um dilema que os analistas da FGV ressaltam em seu estudo: o presidente enfrentará um risco maior sendo muito próximo e muito dependente de um aliado partidário forte.

Mesmo que, como nos governos de Lula e Dilma eles tenham mantido coalizões partidárias bastante amplas para diluir o poder do PMDB, os pequenos partidos, por sua vez, sugam cada vez mais do governo, sabendo que seu papel é importante, tendo quase sempre desproporcionais compensações.

O Executivo pode também se sentir ameaçado por um partido forte que tenha a capacidade de desafiá-lo, mudando de posição e oferecendo um candidato à sucessão presidencial, advertem os estudiosos. A situação do PMDB no momento é mais desafiadora do que essa aventada pelo estudo acadêmico.

Ele não apenas já vem anunciando que terá um candidato à sucessão de Dilma, como, com a perspectiva do impeachment, começa a se mover para se apresentar como uma alternativa real aos problemas que o governo Dilma enfrenta. 

Reconstrução - ROSISKA DARCY DE OLIVEIRA

O GLOBO - 05/12

Uma quadrilha que ocupou o Estado está sendo desbaratada, e esse fato, em si mesmo, já é um recomeço



Um amigo me diz que o país está acabando. Respondo que não, está recomeçando. Não vou morar em Portugal, como ameaçam fazer tantos desiludidos. Vou ficar no Brasil e espero ver o soerguimento deste país.

O pior já passou, o tempo da impostura, dos falsos heróis, quando o senador petista Delcídio Amaral, que já está preso, presidia a CPI do Mensalão. Quando o deputado petista André Vargas, que já cumpre pena de prisão por roubo, cerrava o punho “revolucionário”, afrontando o ministro Joaquim Barbosa, expropriando, em flagrante desrespeito à memória do país, o gesto de resistência dos que lutaram contra a ditadura.

Uma quadrilha que ocupou o Estado está sendo desbaratada, e esse fato, em si mesmo, já é um recomeço. Os tempos duros que estamos vivendo, com a economia destruída, a Petrobras à beira do abismo, as empresas corroídas pela promiscuidade corrupta com o governo, o desemprego e a violência crescendo nas cidades, são o preço que pagamos por ter, uma maioria de brasileiros, acreditado durante anos que o Partido dos Trabalhadores, nascido de nobres ideais, não poderia abrigar uma quadrilha. Caiu a máscara, já não é possível negar essa evidência. O partido que defendia os interesses dos trabalhadores acabou por objetivamente voltar-se contra eles, destruindo a economia e fazendo milhões de desempregados, como resultado da corrupção em que mergulhou e da gestão irresponsável da política econômica. O PT deixa uma legião de órfãos entre pessoas decentes que confiaram nele e foram ludibriadas.

Não podemos continuar sentindo como se a lama que se espalhou pelo país nos corresse nas veias. Para se reconstruir como nação, o Brasil precisa fazer o inventário de seus ativos que sobreviveram à debacle econômica e moral, voltar a acreditar em si mesmo, em sua sociedade, acreditar em suas instituições. Esses ativos existem e são valiosos.

Uma Justiça que funciona e pune lideranças do mundo político e empresarial é um ativo excepcional de que poucos países podem se orgulhar. Um tentacular sistema de corrupção que o PT, desde a era Lula, instalou como método de governo está sendo desmontado e deslegitimado pela Operação Lava-Jato. O Supremo Tribunal Federal tem confirmado, pela sequência de decisões contrárias às manobras de obstrução da Justiça, o respeito e a confiabilidade que já conquistara no julgamento do mensalão. O STF representa uma segurança contra o arbítrio do poder e do dinheiro.

Temos uma imprensa livre, competente e investigativa, que sempre se insurgiu contra as tentativas de implantação de um “controle social da mídia”, nefasto desígnio de calar os jornalistas. A sociedade brasileira sabe muito bem se informar, debate exaustivamente as notícias que recebe e ainda as põe à prova de outras versões que as redes sociais, com a autonomia e diversidade que lhes são próprias, produzem e difundem.

O Brasil tem uma população honesta, esmagadoramente majoritária, que ganha o seu sustento com trabalho e busca um bem merecido horizonte de melhoria de vida. É ela que aponta a corrupção como o maior problema do país, antes da saúde, da educação e da violência, como revela a pesquisa Datafolha. Acerta em cheio, porque é a corrupção que rouba os recursos da saúde e da educação e que alimenta a violência.

Temos uma opinião pública alerta, que está cobrando o fim do escândalo que é um Eduardo Cunha estertorando na presidência da Câmara de Deputados. Que se mobilizou exigindo que o Senado autorizasse a prisão do líder do governo na Casa. Sem a corrente de opinião que se formou nas redes sociais e interpelou o Senado, talvez os senadores não tivessem, quanto mais não seja por autoproteção, ousado autorizar a prisão de um colega, quiçá de um cúmplice. A vitalidade da opinião pública não está deixando o Congresso fazer o que bem entende. A posição da sociedade será decisiva nos desdobramentos do pedido de impeachment da presidente Dilma.

No momento dramático que estamos atravessando, o mais determinante ativo do Brasil, presente em todas as pesquisas de opinião, é imaterial, é a vontade de virar essa página da nossa história. É a indignação, a revolta, um querer coletivo, que cresce a cada dia e que não vai parar. Nesse querer coletivo vai amadurecer e dele emergir uma nova geração de lideranças, cujo denominador comum é a consciência aguda do drama social brasileiro, o amor à liberdade e o respeito inegociável à democracia. Esse é o perfil dos que, apoiando-se em nossos ativos, empreenderão, na política e na sociedade, a reconstrução do país.

Rosiska Darcy de Oliveira é escritora

Os profissionais - DEMÉTRIO MAGNOLI

FOLHA DE SP -05/12

Dilma não está só. À sua volta, operam profissionais do discurso político, que definiram uma estratégia eficaz contra o impeachment. "Agora, é ela contra ele", anunciou o ministro Jaques Wagner, referindo-se a Dilma e Eduardo Cunha. O Planalto e o PT juntaram-se novamente, após os estremecimentos provocados pelo caso Delcídio e pela ensaiada barganha no Conselho de Ética. A estratégia é identificar o pedido de impeachment à figura do presidente da Câmara, conferindo uma falsa sintaxe à polêmica sobre as acusações contra a presidente. A aposta na mentira e no ilusionismo deriva do desespero, mas obedece a um cálculo político preciso.

"Não possuo conta no exterior. Não paira contra mim nenhuma suspeita de desvio de dinheiro público." Isso foi escrito por profissionais, não por Dilma. A linha do "ela contra ele" carece de sentido lógico, pois a peça do impeachment acusa a presidente de crimes de responsabilidade, não de desonestidade pessoal. Contudo, o deslizamento discursivo faz sentido político, ao menos no contexto da baixa política em que está imersa a nação. Os profissionais jogam suas fichas no impacto público da admissão do processo de impeachment por uma figura marcada pelo sinete da desonestidade e, ainda, nas espessas camadas de sombra que cobrem a denúncia contra a presidente.

O fim justifica os meios? Dilma tem uma irrefreável atração pela mentira, como se viu tantas vezes, notadamente na campanha eleitoral. "Eu jamais concordaria com quaisquer tipos de barganha, muito menos aquelas que atentam contra o livre funcionamento das instituições democráticas do meu país", disse a presidente, lendo palavras escritas pelos profissionais, logo depois de assistir ao fracasso da barganha articulada com Cunha. A nova mentira seria facilmente desvendada se a oposição não fosse conduzida por amadores e, às vezes, por amadores inescrupulosos. Contudo, depois de um longo ensaio de aliança entre a oposição e Cunha, as águas turvaram-se a ponto de restarem à tona apenas as versões.

No cadafalso, Cunha pratica o esporte do confusionismo. Implicado no escândalo da Lava Jato, provável beneficiário do esquema do "petrolão", o antigo aliado do lulopetismo presta um último (e involuntário) serviço ao enrolar-se na bandeira do impeachment. Cunha contesta Dilma, assegurando que é ela quem mente sobre a barganha frustrada. "Ele contra ela" –o ainda presidente da Câmara reforça a chave discursiva selecionada pelos profissionais. O impeachment perde força na proporção direta da difusão da crença de que o conflito opõe uma presidente honesta e incompetente a um facínora corrupto. Tudo seria diferente se, desde o início, a oposição tivesse dito "Fora Dilma! –e leva o Cunha junto com você".

As "pedaladas fiscais" são tão graves, para o país, quanto misteriosas, para o grande público. Não se assemelham ao Fiat Elba de Collor, às contas suíças de Cunha ou ao striptease em rede nacional de Delcídio. No tribunal da política, Dilma conserva oportunidades não desprezíveis. As suas chances aumentaram quando, a partir de julho, os grupos organizadores das manifestações pró-impeachment revelaram-se muito mais tolerantes com Cunha que com ela. Os profissionais sabem disso, pois lêem o que está oculto nas fímbrias das sondagens de opinião. Não por acaso, desde anteontem, o PT avançou à linha de frente do "Fora Cunha", ocupando uma trincheira esvaziada pela oposição.

O impeachment não será decidido exclusivamente na arena do discurso. Há uma economia que afunda. Da Lava Jato, esperam-se revelações sobre os vasos comunicantes entre a Petrobras e a campanha eleitoral da presidente. "Ela contra ele" não é uma varinha mágica capaz de dissolver o espectro que ronda o Planalto. Mas é tudo que tem um governo que abandonou o país para cuidar de sua própria salvação.

A roda girou - IGOR GIELOW

FOLHA DE SP - 05/12

BRASÍLIA - Apesar da vantagem teórica na Câmara, o governo iniciou com reveses sua batalha para tentar manter Dilma na Presidência. A começar pela discussão do impeachment em si, dado que evitá-la foi agenda central do Planalto este ano.

Mais grave é o início do desembarque do PMDB de Michel Temer. Rompendo o padrão usual de discrição do vice, o processo começou com a estrondosa saída de Eliseu Padilha.

Mas nem tampouco isso virou um incêndio sem controle: com o PMDB nominalmente governista, o jogo tem sempre sutilezas inconfessáveis.

A roda, contudo, já está a girar. Temer é visto como inimigo no Planalto, e as lealdades congressuais são fluidas. Eduardo Cunha pode estar morto para o mundo exterior, mas da porta para dentro na Câmara ele é uma entidade bem corpórea.

A oposição debate assustada prazos e sonha com uma "rua" que parece bem incerta. Há bem mais do que um burburinho entre os donos do PIB sobre a conveniência de ver acabado o ciclo ruinoso do PT.

Vestais gritam que Cunha conspurcou todo o processo por deflagrá-lo pelos motivos torpes conhecidos, de resto resultado de um dos últimos grandes erros que o Planalto terá cometido sob Dilma se o impedimento prosperar, mas o pedido de impeachment em si é legítimo –se o suficiente politicamente para ser aceito, caberá à Câmara decidir.

A tese de "golpe paraguaio" é barata como uísque guarani. Talvez alimente tropas governistas, seja no rede-socialismo ou entre sem-teto e servidores a soldo, mas o apetite de Lula neste particular parece desautorizar os profetas do caos social no tal do "campo progressista".

O grão-petista tem muito a perder, mas também é verdade que ele ainda não resolveu emular pela enésima vez Goebbels no Berlin Sportpalast em 1943 e clamar por uma "guerra total". Se é por exaustão, cálculo cínico ou lição histórica acerca do resultado, é algo a ser determinado.

É hora de voltar às ruas - RONALDO CAIADO

FOLHA DE SP - 05/12

Democracia não é paz de cemitério. A movimentação política que se segue após o anúncio de abertura do impeachment da presidente Dilma Rousseff é saudável, republicana e segura diante da fortaleza de nossas instituições. A abertura de uma comissão especial na Câmara deve escancarar os crimes fiscais cometidos pela nossa chefe de Estado e fundamentar as bases para seu afastamento.

Um dia após o anúncio, na Convenção Nacional do Democratas, em Brasília, pudemos divulgar manifesto com uma mensagem bem clara: é hora de sair às ruas novamente pelo impeachment. Já há todas as condições legais e políticas para a conclusão do processo. Se os brasileiros, como um todo, manifestarem sua decisão pela mudança, o Parlamento seguirá sua voz e seu comando.

Lembro-me de que foi por meio do mesmo recurso –um manifesto– que a então Frente Liberal, comandada pelos saudosos Aureliano Chaves e Marco Maciel, apresentou à nação, em 1984, os pilares de uma insurgência que viria a possibilitar o fim do regime militar e a volta da normalidade política ao país. Orgulho-me em afirmar que esse partido tem história, tem referência e tem a honradez de ter se mantido fiel aos princípios democráticos durante toda a sua trajetória. Não poderia ser diferente agora.

No momento dos grandes protestos que mobilizaram milhões em todo o país neste ano, quando muitos se mostraram desiludidos por não verem uma resposta satisfatória do Congresso, tivemos a coragem de solicitar a antecipação das eleições. Eu fui à tribuna defender a renúncia geral do Parlamento como forma de resgatarmos a credibilidade com a população. Estamos agora colhendo os frutos de nossa coerência. A população reconhece todo esse esforço e confia em nossa atuação.

A partir de agora, uma vez instalada a comissão especial na Câmara que deve analisar o pedido, minha agenda e a de todos que querem tirar o Brasil dessa crise deve ser uma só: caminhar por todos os Estados em prol desse objetivo. É mostrar que o Brasil tem solução rápida, basta tirar o PT do poder que a credibilidade e a esperança voltarão a florescer. Esses são os dois maiores fundamentos que faltam –e o comportamento positivo do mercado um dia após a abertura já deu essa sinalização. Todos anseiam por mudança.

É preciso rapidez. É desesperador saber que 6.000 pessoas perdem o emprego diariamente no país, gerando um cenário de aumento da miséria e da violência. Prolongar esse problema até 2018 significaria mais três anos de recessão, empobrecimento e inflação. Significaria também contribuir para um processo crescente de desobediência civil. O cidadão já reclama que, mesmo com apoio popular, dentro das regras democráticas, com denúncias embasadas, o impeachment não avança.

Por tudo isso tenho trabalhado para derrubar o recesso parlamentar neste final de ano. Não há como explicar à população que, uma vez diagnosticado o mal maior, vamos interromper por um mês o tratamento recém iniciado. Isso é jogar contra, é prejudicar ainda mais a já combalida imagem do Congresso junto à opinião pública. Vou lutar para uma convocação extraordinária que dê condições para a comissão analisar o processo de impeachment com celeridade e que ainda em dezembro se conclua esse primeiro momento.

Aí sim, uma vez conhecido o seu parecer, que o povo possa acompanhar na Esplanada dos Ministérios, um a um, o voto aberto de cada deputado em plenário e depois o julgamento no Senado. De forma democrática o país vai tirar a crise do gabinete presidencial e vislumbrar um novo país, com as instituições ainda mais fortalecidas.

Nova face do autoritarismo - RONALDO VAINFAS

O GLOBO - 05/12

Proposta da comissão do MEC para o ensino da História em 2015 é uma aberração. Mutila os processos históricos globais, aposta na sincronia contra a diacronia



Não é de hoje que o Estado brasileiro tenta estropiar o ensino da História no país. No regime militar, a principal tentativa veio com a obrigatoriedade do ensino de Estudos Sociais, fundindo a História e a Geografia em uma mesma disciplina, em detrimento de ambas. Foi uma decisão do governo Médici, em 1971, no auge da ditadura, restrita ao atual ensino fundamental, antigo primeiro grau. O modelo era o do Social Studies dos EUA, que concebia o estudo da História a partir de círculos concêntricos: família, escola, bairro, cidade, país. Um modelo limitado, ao mesmo tempo individualista e nacionalista. O combate à História como disciplina se alastrou para o antigo secundário, atual ensino médio, com a imposição das disciplinas Organização Social e Política do Brasil (OSPB) eEducação Moral e Cívica. Tais reformas foram executadas nas gestões dos ministros Jarbas Passarinho e Ney Braga no MEC, ambos militares reformados engajados no golpe de 1964.

A sociedade brasileira reagiu, e a História foi restaurada como disciplina específica, entre 1984 e 1993, em meio ao processo de redemocratização do país. Atualmente, ela integra o currículo mínimo do ensino fundamental e do ensino médio. Os diversos Parâmetros Curriculares Nacionais garantiram a interdisciplinaridade, sem rejeitar a especificidade do conhecimento histórico: a diacronia, as particularidades.

Eis que agora vem à baila a discussão da Base Curricular Comum, urdida pelo Estado desde o primeiro governo lulopetista. Nunca se soube como foram escolhidos os membros da comissão encarregada do trabalho, cujos nomes só agora vêm a público, muito menos as instruções que receberam deste governo cara de pau. O fato é que os trabalhos da comissão foram consolidados em 2014, ano eleitoral, e publicizadas em 2015. O conceito de Base Curricular Comum é, por si mesmo, discutível, ao presumir uma uniformidade de conhecimentos desejáveis, sobretudo em História, para um país gigantesco e diverso.

O mais grave, porém, é a retomada da postura autoritária, ainda que invertendo a chave da ditadura militar. A disciplina História prevista pelo regime lulopetista estabelece para o fundamental I o ensino de sujeitos, grupos sociais, comunidades, lugares de vivências e, por fim, o dos “mundos brasileiros”. Conceitos abstratos e anódinos, impossíveis de serem ensinados a crianças, salvo como doutrina. Os primeiros dois anos do fundamental II prosseguem nesta linha abstrata de “processos e sujeitos”.

Imagine-se o aluno que ingressar no ensino médio com tais “conhecimentos” incertos. E logo no primeiro ano, terá aulas sobre os “os mundos ameríndios, africanos e afro-brasileiros”, matéria aprofundada no ano seguinte, com o estudo dos “mundos americanos”, para culminar com os “mundos europeus e asiáticos” no terceiro ano. Nunca houve, na história deste país, parafraseando o “grande líder”, um ataque deste jaez ao ensino da História.

O ensino da História do Brasil sempre foi problemático entre nós, brasileiros, sendo ora admitida como disciplina específica, ora inserida na História Geral. Reaparece, na versão lulopetista, de maneira desastrosa. A comissão encarregada de formular o currículo comum não se avexa de escrever que “enfatiza-se a História do Brasil como o alicerce a partir do qual tais conhecimentos serão construídos ao longo da educação básica”.

Nem mesmo a reforma do ministro Francisco Campos, em 1931, ou a de Gustavo Capanema, em 1942, ministros de Getúlio Vargas, ousaram perpetrar tal decreto, entronizando o Brasil como o centro do mundo. E o tempo era revolucionário, golpista, ditatorial — depende da interpretação.

A proposta da comissão do MEC para o ensino da História em 2015 é, portanto, uma aberração. Mutila os processos históricos globais, aposta na sincronia contra a diacronia, é fanática pelo presentismo. Incentiva ódios raciais e valores terceiro-mundistas superados. Estimula a ignorância, ao colocar a História ocidental como periférica, na realidade como vilã. Combate o eurocentrismo com um brasilcentrismo inconsistente. É uma aposta no obscurantisamo, inspirada por um modelo chavista de política internacional. Que Deus salve o Brasil desta praga — só apelando a Deus, et pour cause.

Ronaldo Vainfas é historiador

É a hora da sociedade civil - MIGUEL REALE JÚNIOR

ESTADÃO - 05/12

O Estado Democrático de Direito está gravemente ferido. É necessário reconstruir a democracia, da qual um dos alicerces consiste na confiança da população nos agentes políticos que elege. Hoje, justificadamente, essa confiança inexiste no Brasil.

A democracia destaca-se por viver e conviver com as divergências, a serem superadas pelo diálogo e pela persuasão para a formação de uma maioria parlamentar legítima, respeitada pelas minorias. Todavia o confronto de ideias e de perspectivas, próprio da democracia, desapareceu do cenário político, substituído por entendimentos promovidos graças a arranjos financeiros com dinheiro público subtraído de empresas como Petrobrás, Sete Brasil, BR Distribuidora, Angra 3, Belo Monte.

Não se fez política, nem se praticou a democracia. Apenas se transitou num bazar de venda de apoios por dinheiro vivo ou graças à ocupação de cargos na administração, colocando apaniguados em postos estratégicos para obtenção de vantagens ou para demonstração de prestígio. Instalou-se a desabusada prática de exercer o poder para institucionalizar a ação corrosiva da corrupção como normalidade. A democracia foi corroída por dentro ao se obter uma maioria marrom, enlameada pela compra de consciências e do convencimento.

O poder econômico privado aliou-se a administradores públicos venais, abocanhando serviços superfaturados cujos frutos reverteram em parte para deputados e senadores, bem como para seus partidos, visando a assegurar ao Executivo uma maioria comprada. Os partidos da base governista fizeram caixa para enfrentar, com muitos recursos, as futuras eleições.

Formou-se um círculo pernicioso com o dinheiro público desviado desde o mensalão e consolidado no petrolão, pois esses numerários, em conluio com empresários, saíram dos cofres de órgãos do Executivo, pela ação de diretores, indicados por líderes políticos, e foram usados para manutenção de apoio parlamentar ao próprio Executivo.

Uma organização criminosa passou a dominar o País e suas instituições políticas, levando ao cúmulo de se eliminar a divisão de Poderes e o jogo de contrastes de perspectivas próprio da democracia. Parlamentares e administradores uniram-se na festança da fruição do dinheiro público desviado. A corrupção tornou-se o denominador comum por via do qual se compuseram Executivo e Legislativo visando à apropriação de vantagens indevidas de toda ordem.

Tão grave quanto era o liame tentado entre Presidência da República e presidência da Câmara dos Deputados, com vista a um acordo espúrio para garantia de mútua impunidade: o apoio de deputados do PT à absolvição do presidente da Câmara em troca da rejeição liminar dos pedidos de impeachment. Todavia, ao se recusar o PT a apoiá-lo, Eduardo Cunha acolheu o pedido de impeachment, escrevendo certo por linhas tortas.

A defesa do Estado Democrático de Direito é dever do advogado, como assinala o artigo 2o do novo Código de Ética. Hoje o mais frágil e mais urgente cliente do advogado é o Estado de Democrático de Direito. A sua defesa incumbe a todos nós advogados, bem como às nossas instituições.

Agora não se trata de lutar contra uma ditadura, nem de resistir às afrontas às liberdades civis e políticas, mas, sim, em ir mais a fundo, pois os alicerces, fincados pela Constituição de 1988, apodreceram. É preciso, portanto, reconstruir suas bases. Não é só o governo que está em crise, é o regime democrático que está. Como principais defensores do Estado Democrático de Direito, aos advogados cumpre assumir a dianteira para salvar a democracia, reestruturá-la, não só afirmando a necessidade de punição daqueles que a destroem pelo mal da corrupção, observado o devido processo legal, mas pugnando, mais do que já se fez, por medidas impeditivas da corrosão da democracia.

Os advogados, valendo-se de sua história de lutas, devem exigir, pressionar com força por mudanças de fundo urgentes, para tanto mobilizando novamente a sociedade, já mobilizada pelos diversos movimentos contra a corrupção que levaram milhões às ruas, agora tendo por pauta a reforma estrutural do Estado. Não basta afastar Dilma. É preciso também preparar o futuro.

É hora de nos engajarmos nessa luta pela democracia no Brasil, sem meios-termos, sem receios, conclamando as demais entidades da sociedade civil que congregam administradores de empresas, contadores, engenheiros, médicos, auxiliares de saúde, arquitetos, promotores e juízes, trabalhadores da indústria, comerciários, etc., bem como entidades do terceiro setor e os inúmeros participantes dos movimentos construídos pelas redes sociais, para em uma só voz exigir mudanças no sistema eleitoral, fonte de muitos males, e no regime de governo, com a adoção, pelo menos, de presidencialismo parlamentarizado, visando a facilitar a responsabilização dos governantes.

Cumpre, também, estabelecer eficaz e sério Programa de Integridade, com inamovível e bem qualificado fiscalizador dos demais servidores em cada setor da administração pública, bem como nos partidos políticos, a serem responsabilizados pelos atos de seus membros. A eliminação de dois terços dos cargos em confiança na administração direta e indireta, assim como a aplicação de testes de honestidade e garantia de confidencialidade para informantes de práticas de corrupção são outras propostas positivas.

Além do mais, é importante o fortalecimento dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Ministério Público Eleitoral, para fiscalizar a estrutura de campanha dos candidatos e suas contas durante o processo eleitoral.

Só assim se pode refazer a confiança do povo no processo democrático. Dessa forma, cumpre aos advogados tentar salvar, em conjunto com várias forças sociais, o seu cliente preferencial, o combalido Estado Democrático de Direito. É a hora da sociedade civil!

* MIGUEL REALE JÚNIOR É ADVOGADO, PROFESSOR TITULAR SÊNIOR DA FACULDADE DE DIREITO DA USP, MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS, FOI MINISTRO DA JUSTIÇA

Dominância política na crise econômica - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 05/12

O impeachment pode romper impasses que impedem o Executivo de ter apoio político e base parlamentar para fazer as necessárias reformas estruturais


Forma-se o consenso de que o nó político impede a desobstrução dos gargalos econômicos. Faz sentido, porque, à parte os “desenvolvimentistas”, abrigados no PT e adjacências — os inspiradores da política econômica de Dilma, responsável pela ruinosa situação em que o país se encontra —, há uma razoável concordância, entre economistas, sobre as raízes da crise fiscal brasileira e em torno de terapias para debelá-la. Mas faltam o apoio político e a base parlamentar para aplicá-las.

É a partir desta percepção que se considera positiva a instalação do processo de impeachment de Dilma no Congresso — não importa se por meio de um parlamentar que deverá ser indiciado pelo MP, e corre sérios riscos de perder o mandato. Sobreviva Dilma ou não ao processo de impedimento, espera-se que ele rompa a bolha de imobilismo da qual o Congresso ficou prisioneiro, inflada pelo impasse criado por um governo sem base parlamentar firme e uma oposição sem poder ditar o jogo.

Uma presidente muito impopular e um Congresso fluido, em meio à grave crise fiscal causada pela própria presidente no mandato anterior e na sua passagem pela Casa Civil, criam uma situação tóxica de enorme desconfiança da sociedade diante do futuro. Com razão, pois a desarrumação das contas públicas impulsionou a inflação para a perigosa faixa dos dois dígitos, enquanto a economia como um todo mergulha em severa recessão. Pois empresas não investem, consumidores não consomem.

O impeachment pode romper a letargia que faz o país deslizar para o vácuo de uma depressão, sem que governo e Congresso reajam como necessário. Dilma, se ganhar a queda de braço do impeachment, terá de remontar a base parlamentar do governo, sem abrir mão do PMDB. Partido que lançou, não faz muito tempo, uma proposta séria de ajuste — “Uma ponta para o futuro" —, que a sobrevivente Dilma não poderá manter na gaveta. Poderá, mas seu governo arrastará correntes até 2018, quando provavelmente a oposição voltará ao Planalto.

Aconteça o que acontecer, o Planalto, passado o impeachment, necessitará de quórum qualificado no Congresso para reformar a Previdência, com o estabelecimento da idade mínima; precisará de apoio político para desarmar o petardo fiscal que é a fórmula de indexação do salário mínimo e sua aplicação em boa parte dos chamados gastos sociais. E ainda terá de rever a vinculação excessiva de recursos do Orçamento. Estas e outras medidas para impedir que as despesas públicas continuem a crescer mais que as receitas e o próprio PIB — um desatino que levou à falência, em reais, do Estado brasileiro — constam do documento do PMDB e de outros textos que circulam nos meios acadêmicos e políticos.

Caso nada de consistente seja feito, a crise econômica persistirá e realimentará a crise política, num círculo vicioso de desfecho dramático.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

PMDB SE MOBILIZA PARA DEIXAR DILMA POR TEMER
Após a decisão do ministro Eliseu Padilha (Aviação Civil) de abandonar o governo Dilma na próxima semana, a tendência do seu partido, o PMDB, é seguir o mesmo caminho, segundo confirmou nesta sexta-feira (4) a esta coluna um dos principais dirigentes do partido. O desembarque sinaliza a mal disfarçada intenção do PMDB de tentar viabilizar a posse de Michel Temer na Presidência da República.

PRÓXIMO DA FILA
Além de Padilha, o PMDB ocupa mais seis ministérios. O próximo a cair fora para se juntar a Michel Temer é Henrique Alves (Turismo).

VENDO PELAS COSTAS
Petistas que perderam o poder no Ministério da Saúde já davam como certa, nesta sexta-feira, a saída do peemedebista Marcelo Castro.

CARRAPATO NO CAMPO
Por enquanto, só Kátia Abreu (Agricultura), que de adversária ferrenha virou amiga de infância de Dilma, reluta em deixar o cargo.

MAIS TRÊS
São também ministros do PMDB Celso Pansera (Ciência e Tecnologia), Eduardo Braga (Minas e Energia) e Hélder Barbalho (Portos).

VICE REJEITOU PRESSÃO DE DILMA PARA ATACAR CUNHA
Submetendo Michel Temer ao habitual “gelo” há meses, a presidente Dilma o chamou na quinta (3), dia seguinte à abertura do impeachment, para pressioná-lo a fazer declarações contundentes desqualificando seu correligionário Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Como sempre preferiu o entendimento ao embate, Temer se recusou a fazer isso, irritando Dilma. Ele também se irritou e saiu no meio da reunião de quinta (3).

SEM CONTUNDÊNCIA
Dilma também exigiu de Michel Temer uma declaração “contundente” contra o impeachment. Ele também preferiu não fazer isso.

FUI!
Sem clima com Dilma, Temer pediu desculpas para se ausentar porque prometera ir com sua mulher a uma consulta médica, em São Paulo.

GRITO DE INDEPENDÊNCIA
A decisão de não ceder à pressão de Dilma foi para Michel Temer um “grito de independência” comemorado pelos aliados mais próximos.

BOLA DO PLENÁRIO
O regimento interno da Câmara dos Deputados define que a comissão especial formada para analisar o pedido de impeachment contra Dilma não vai definir nada: o plenário julga o relatório proposto pela comissão.

RASTILHO DE PÓLVORA
Nesta sexta (4), a proposta de um brinde “ao futuro presidente Michel Temer”, feita por um cidadão, foi saudada com entusiasmo pelos demais clientes do prestigiado restaurante Dalí, de Brasília.

PERNAS CURTÍSSIMAS
Causou embaraço e abatimento desmentido de Michel Temer de uma lorota de Jaques Wagner. O ministro Casa Civil disse a uma emissora de tevê que o vice havia classificado a abertura do processo de impeachment “uma forçação de barra”. Era mentira.

O ESTADO SOU EU
Dilma usou evento oficial, bancado pelo Ministério da Saúde com grana do contribuinte, para fazer campanha contra o impeachment. E pior: era a Conferência Nacional de Saúde, exclusiva para servidores públicos.

PRESSÃO
“Não vejo como Eduardo Cunha se salva no Conselho de Ética, mas a pressão tem sido grande”, afirma o deputado Betinho Gomes (PSDB-PE). O tucano prevê muitas negociações neste fim de semana.

CALENDÁRIO
A oposição prepara um calendário de manifestações favoráveis ao impeachment, paralelo aos organizados pelos movimentos de rua. O primeiro ato, em discussão entre tucanos, será em 20 de dezembro.

MOBILIZAÇÃO NAS REDES
Expoente da oposição na Câmara, Bruno Araújo (PSDB-PE) está impressionando com a repercussão do impeachment nas redes sociais. Em dois dias, seus comentários alcançaram 27 milhões de pessoas.

DITANDO O RITMO
A oposição quer separar o impeachment de Dilma da figura de Eduardo Cunha. “É responsabilidade da Câmara. Quem vai ditar o ritmo do processo é a sociedade”, diz Roberto Freire (PPS-SP).

PERGUNTA NO CADAFALSO
A abertura do processo de impeachment foi um presente antecipado de Eduardo Cunha pelo aniversário de 68 anos de Madame, no dia 14?