sábado, junho 06, 2015

Blatter abre caminho para Dilma - GUILHERME FIUZA

O GLOBO - 06/06

FBI jamais entenderia como uma mandatária pode permanecer imune a investigações num cenário desses



Joseph Blatter deu no pé porque sentiu o FBI nos seus calcanhares. Como os investigadores americanos já sabem que a Fifa é uma central de negociatas, o presidente reeleito da entidade achou melhor botar a viola no saco. No Brasil é diferente. Dilma Rousseff sentiu a Polícia Federal nos seus calcanhares, e os investigadores brasileiros já sabem que o governo do PT é uma central de negociatas. Mas a presidente reeleita não deu no pé, porque aqui não tem FBI. E com o silêncio das panelas, está dando até para ouvir o ronco do gigante.

Uma década após o estouro do mensalão, o Brasil ameaça engolir também o petrolão — o que seria o salvo-conduto definitivo para a ladroagem progressista e humanitária. Nestor Cerveró, o primeiro brasileiro a proibir uma máscara de carnaval, foi condenado por comprar um apartamento em Ipanema com propina do petrolão. O ex-tesoureiro Vaccari está preso, acusado de ajudar Dilma Rousseff a alugar um palácio em Brasília (temporada de quatro anos) com propina do petrolão. Mas, nesse caso, a inquilina não está sendo sequer investigada. Como se vê, há propinas e propinas.

As delações premiadas da Lava-Jato já se cansaram de apontar que seria impossível operar um esquema com a dimensão do petrolão, por mais de dez anos, sem a cobertura do Planalto. O FBI jamais entenderia como uma mandatária pode permanecer imune a investigações num cenário desses. Ainda mais havendo indícios claros de dinheiro do esquema em suas duas campanhas presidenciais. E fartas evidências de formação de caixa pelo seu partido com dinheiro roubado da maior empresa nacional — graças a diretores protegidos pelo grupo governante.

Nota de esclarecimento ao FBI: a presunção de inocência da presidente é absolutamente normal na conjuntura institucional brasileira. A Corte Suprema é bem fornida de militantes premiados por anos de lealdade aos seus padrinhos. E o processo da operação Lava-Jato é presidido segundo esse padrão de isenção. Entenderam, prezados ianques? De que vocês estão rindo?

Em perfeita sintonia com os puxa-sacos petistas que foram ser felizes para sempre no Supremo, o procurador-geral da República arremata a ópera da inocência — diante da qual a opinião pública se curva, reverente, babando na gravata. Resta a Dilma subir em sua bicicleta e pedalar solene diante de uma imensa placa “Lava-Jato” — proporcionando a foto emblemática do Brasil-2015. Segue a legenda oficial: “Obrigada, otários, pela sua compreensão”.

Deve ser uma delícia sentir o vento do Planalto no rosto ao ritmo das pedaladas ciclísticas e fiscais ladeira abaixo (rumo à recessão), sem o menor risco de topar com a gangue da faca. Além de mais quatro anos para reger a orgia petista, o mandato presidencial dá direito a pedalar com um aparato de seguranças — e a escolta de um carro oficial, caso sua excelência se canse e prefira as facilidades do petróleo (sem precisar chamar o Vaccari). Quem sabe até dando uma carona ao companheiro Blatter, que ficou a pé.

Seria o mínimo, considerando a carona valiosa que a Fifa deu ao governo petista. Além da oportunidade de construir os estádios mais caros da história das Copas, com a bolsa BNDES irrigando empreiteiras amigas, o balcão do companheiro Blatter fez o favor de tirar o Morumbi da Copa do Mundo. Assim abriu-se o caminho para o milagre do Itaquerão, mais um sonho bilionário de Lula realizado pela Odebrecht — ou o contrário, dá no mesmo. A CPI do Futebol pode ser mais uma oportunidade para o gigante abrir um dos olhos, ver que os companheiros estão metendo a mão no seu bolso, bocejar uma palavra de ordem e voltar aos seus sonhos de anão.

Blatter pediu o boné porque seus cúmplices deram com a língua nos dentes, expondo seu esquema de eternização no poder. Já o esquema de eternização do PT no poder vai bem, obrigado — e os cúmplices podem dar com a língua nos dentes à vontade. O homem-bomba das empreiteiras, Ricardo Pessoa, disse aos investigadores da Lava-Jato que deu R$ 7,5 milhões à campanha de Dilma no ano passado para não perder negócios com a Petrobras. Aí o barulho foi grande: era o gigante roncando.

Indignados com a indiferença da plateia, Dilma e seus amigos da pesada subiram o tom: depois de Erenice estrelar o escândalo tributário da Operação Zelotes e Rosemary ser denunciada por improbidade administrativa, Fernando Pimentel roubou a cena. O governador de Minas — também conhecido como consultor sobrenatural — teve seu braço-direito, o empresário Bené, preso por suspeita de associação criminosa. Entre as acusações contra o amigo do amigo de Dilma está a origem suspeita de dezenas de milhões de reais em receita de sua gráfica, que atende ao PT. Diante do presépio petista, talvez o FBI achasse que está sendo injusto com a Fifa.

A renúncia de Joseph Blatter após sua reeleição foi um gesto pedagógico. Ou o Brasil se inspira nele, ou assume que quer tomar mais quatro anos de pedaladas. E facadas.

GOSTOSA


Paudurecência matinal


Pizzolato de volta para casa - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

 GAZETA DO POVO - PR - 06/06

Será alentador ver o único dos mensaleiros condenados pelo STF que ainda não foi levado ao cumprimento da pena atrás das grades no Brasil
 


A decisão final da Justiça italiana de extraditar o mensaleiro Henrique Pizzolato, tomada na quinta-feira (4), tem significado mais importante do que pode imaginar a vã filosofia: foi uma lição que o Brasil recebeu sobre como respeitar tratados quando diante de casos em que se requer que cidadãos condenados por crimes cometidos em seus países de origem neles cumpram a pena. Exatamente como no caso de Pizzolato, o ex-diretor do Banco do Brasil incluído entre os membros da quadrilha de mensaleiros condenada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012, no histórico julgamento relatado e presidido pelo ex-ministro Joaquim Barbosa.

Do mesmo modo não procedeu o Brasil em 2010 quando solicitado a extraditar para a Itália o homicida Cesare Battisti. Mesmo após entendimento favorável do STF à extradição, por decisão do então presidente Lula em seu último dia de mandato, foi dada a Battisti a condição de refugiado político, evitando assim seu envio ao seu país natal. Já o Ministério da Justiça da Itália no caso Pizzolato preferiu respeitar à risca o acordo bilateral de extradição com Brasil. Na decisão, a corte levou em conta que, mesmo possuindo cidadania italiana, Pizzolato não é um cidadão com residência fixa na Itália, ou seja, não tem vínculo com o país a não ser de origem.

Condenado a 12 anos e 7 meses de prisão por ter se utilizado do cargo para alimentar o mensalão com R$ 74 milhões nos anos de 2003 e 2004 e se apropriar de propina pessoal de R$ 336 mil, Henrique Pizzolato serviu-se de passaporte falso para fugir para a Itália, onde imaginava estar a salvo em razão da dupla cidadania. Descoberto em fevereiro de 2013 em seu esconderijo em Maranello, Norte da Itália, acabou preso pelas autoridades locais para responder, entre outros crimes, por falsidade ideológica. Enquanto isso, os juízes decidiam sobre a legalidade do pedido de extradição feito pelo Brasil.

Após inúmeras apelações do réu e correspondentes recursos brasileiros, a Justiça da Itália por fim confirmou, a extradição de Pizzolato – com a única condição de que ele cumpra sua pena em condições dignas, isto é, sem se misturar aos presos comuns que habitam o Presídio da Papuda, em Brasília. Os advogados do brasileiro ainda ensaiavam um novo recurso, desta feita ao Conselho de Estado italiano, providência que desde logo foi considerada incabível pelo Judiciário do país.

Deu-se, deste modo, o penúltimo capítulo da saga que envolveu Henrique Pizzolato, militante petista que construiu sua carreira política no Paraná. Além de presidir no estado a Central Única dos Trabalhadores (CUT), braço sindical do PT, concorreu por três vezes a eleições majoritárias – uma a vice-prefeito do município de Toledo, uma a governador em 1990 e a última a vice-governador no pleito de 1994, na chapa liderada por Jorge Samek, atual presidente da Itaipu Binacional.

Pelos serviços prestados ao partido, em 2003 foi guindado pelo então presidente Lula à diretoria de marketing do Banco do Brasil, a partir do que – segundo os inquéritos que instruíram a Ação Penal 470 – pode transferir dinheiro público para contas do publicitário Marcos Valério, principal operador do mensalão e condenado a mais de 40 anos de prisão, juntamente com outros 23 réus envolvidos na compra de parlamentares para garantir a maioria da base do governo federal.

Nos próximos dias deveremos assistir ao último capítulo desta novela, ou seja, a viagem de volta de Pizzolato da Itália para o Brasil para cumprir a condenação, que, provavelmente, será acrescida de penas complementares decorrentes da fuga e da perda de benefícios de progressão. Benefícios dos quais, aliás, já se valeu a maioria dos mais notórios participantes do esquema – dentre eles o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares, que já alcançaram o privilégio de poderem trabalhar fora e de não passarem o dia recolhidos à Papuda. De qualquer modo, será alentador ver o único dos mensaleiros condenados pelo STF que ainda não foi levado ao cumprimento da pena atrás das grades.

Promiscuidade - ALBERTO DINES

GAZETA DO POVO - PR - 06/06

Com apenas uma hora de depoimento numa delegacia no Brooklyn nova-iorquino, atraiu o FBI americano, desmontou a Fifa, enfiou no xilindró suíço quase uma dezena de cartolas da periferia futebolística mundial, no meio da qual se exibia impune e lampeiro uma estrela de primeira grandeza: o ex-governador do maior e mais rico estado brasileiro, ex-presidente da CBF e agora seu vice, José Maria Marin. Seis dias depois, o terremoto destronou o indestronável imperador do futebol, Joseph “Sepp” Blatter.  


O autor desta formidável façanha não é cartola, não é político, não se escondia na sombra: jornalista esportivo no interior de São Paulo (São José do Rio Preto) ralou, ralou, ralou, subiu, subiu, subiu, criou uma empresa de marketing esportivo com o sugestivo nome de Traffic, traficou favores,intermediou negócios de milhões, converteu-se em baronete da mídia interiorana e com o aval do Congresso e do governo obteve em 2003 uma rica concessão de televisão (TV Tem, afiliada da prestigiosa Rede Globo). Segunda a Folha de S. Paulo desta sexta, a emissora atende 318 municípios no rico interior paulista.

J. (de José) Hawilla – Jotinha para os íntimos –“colabora” com o FBI desde o final de 2013. Réu confesso, um ano depois, acertava com as autoridades judiciais americanas o pagamento de uma multa de 151 milhões de dólares.

Quando a direção da entidade suíça passou a exigir dos países-sede das Copas do Mundo estádios, equipamentos e serviços urbanos de altíssima qualidade estabeleceu-se o padrão Fifa. O megaescândalo agora revelado tem exatamente este extravagante e formidável padrão e só começou a ser desmontado graças a uma casualidade: além da mansão de 15 mil metros quadrados em Rio Preto, o exigente Jotinha reside numa propriedade avaliada em oito milhões de dólares na exclusiva Sunset Island, Miami, Flórida, Estados Unidos da América do Norte – paisinho onde há 241 anos as promiscuidades, por mais extensas e sólidas que sejam, costumam ser atalhadas pelas autoridades.

O segredo que tornou a sucursal brasileira da Fifa invencível e inexpugnável é exatamente a promiscuidade. Convivência espúria, conivência despudorada, a CBF é uma traficante de vantagens e privilégios. Embora conste no artigo 1.º dos Estatutos que “goza de peculiar autonomia não estando sujeita a qualquer ingerência estatal”, a CBF tem efetivamente mais poder do que o Ministério dos Esportes. Entidade de direito privado, suas veladas conexões com o Judiciário e o Legislativo a colocam acima do bem e do mal, imune a CPI’s e investigações do Ministério Público.

Blindagem decisiva para garantir sua imunidade, impunidade e sobrevida são os laços que a CBF mantém com a mídia, especializada ou não. A fulgurante carreira do Jotinha Hawilla é paradigmática: em apenas 36 anos o indomável profissional demitido por participar de uma greve delirante que tanto prejudicou a categoria, acerta com a Justiça americana o pagamento de uma multa de quase R$ 500 milhões.

Por mais animado que esteja o Congresso neste momento dificilmente conseguirá identificar, enquadrar e desmontar a promiscuidade que intoxica a mais importante instituição da vida nacional – quase uma religião – o futebol. Para recuperá-la, desintoxicá-la e injetar um pouco de otimismo será indispensável o empenho de outra lendária instituição que carece de façanhas para tirá-la de uma de suas maiores crises: a mídia.

Coisa nossa - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 06/06

Condenado fazendo comício político, usando blog para comentar os acontecimentos, dando orientações sobre votações no Congresso, são coisas nossas e apartidárias. Não é apenas José Dirceu quem tem blog, seu delator Roberto Jefferson também, e ambos participam ativamente da política, dando palpites sobre o que está acontecendo, contra ou a favor do governo.

Jefferson, mesmo em prisão domiciliar, está de bem com a vida depois de ter casado em grande estilo, com direito a tirar um sarro de seu mais famoso inimigo. Ao lembrar a frase emblemática dirigida a Dirceu em transmissão pela televisão - "Você provoca em mim os instintos mais primitivos" -, ele disse a sua noiva que ela lhe inspirava "os mais deliciosos instintos primitivos".

Em seu blog, ele afirma através de interpostas pessoas que o governo beneficiou a empreiteira Odebrecht com os financiamentos do BNDES. Já Dirceu tem aparecido abatido, e continua às voltas com outro processo, o do petrolão, onde é investigado pelo Ministério Público pelas consultorias que deu a empreiteiras envolvidas na Lava-Jato, que seriam meros disfarces para propinas vindas da Petrobras.

Ele tem usado seu blog para se defender, acusando o doleiro Alberto Youssef de inventar as denúncias contra ele. Mas também participa da discussão política, ora defendendo a posição do governo contra o aumento da maioridade penal, ora rebatendo a tentativa do Congresso de controlar as nomeações nas estatais.

Mas pelo menos eles fingem algum constrangimento, e os blogs são escritos por "amigos" e "assessores", mesmo que o que se lê ali seja claramente a opinião pessoal dos condenados.

Pois o petista João Paulo Cunha, o ex-presidente da Câmara condenado por peculato e corrupção no processo do mensalão, foi flagrado pela "Folha" em uma reunião política em Osasco, seu reduto eleitoral. Digo flagrado porque os companheiros que atenderam ao convite para "bater um papo ao sabor da conjuntura e outras lembranças" recebiam instruções para não fotografar nem postar notícias nas redes sociais, e, portanto, o encontro não era para se tornar público.

Ele cumpre a pena em regime aberto em Brasília e recebeu permissão para ir a São Paulo comemorar seu aniversário. Os condenados pelo mensalão tiveram seus direitos políticos suspensos e não podem se candidatar a nada. Mas, ironicamente, há uma discussão sobre se podem ou não se filiar a partidos políticos, ou se podem participar de reuniões partidárias.

Outro condenado, Valdemar Costa Neto ignora eventuais restrições e faz reuniões políticas do PR, que ainda controla, orientando o partido sobre como votar no Congresso. Ao que se sabe, apenas as transgressões mais óbvias são punidas.

Flagrado tomando cerveja com amigos em um bar da Zona Sul de BH, o ex-deputado federal Romeu Queiroz, condenado a seis anos e seis meses de prisão por envolvimento no mensalão, perdeu os benefícios de trabalho externo e saídas temporárias.

João Paulo Cunha, por exemplo, fez ampla análise política da situação, admitindo até que o PT errou no mensalão, e voltou a errar no petrolão. Não entrou em detalhes sobre esses erros, sem deixar claro se estava admitindo os crimes pelos quais foi condenado, ou se o erro a que se referia era o de terem sido apanhados.

De qualquer maneira, a comemoração do aniversário de João Paulo Cunha foi bastante proveitosa para ele como líder político. Reuniu sua tropa política para estabelecer estratégias para a eleição municipal de 2016, e, hoje, tinha marcada reunião com grupos de sindicalistas.

Na eleição de 2012, ele era candidato favorito à prefeitura de Osasco quando teve que renunciar devido à condenação no mensalão. O então prefeito Emídio de Souza hoje é presidente do PT paulista e também esteve com João Paulo Cunha trocando ideias sobre "a conjuntura".

As atividades políticas, encobertas ou não, não são restringidas pela Justiça, que tende a ser condescendente com esse tipo de burla da punição. Mas, se os políticos foram condenados justamente por terem atividades políticas irregulares, misturadas a diversos crimes, como permitir que continuem a manter tal atividade que está no cerne de suas condenações?

Reforma federativa urgente - NELSON PAES LEME

O GLOBO - 06/06

De nada adianta a discussão sobre voto distrital se, no Brasil, do ponto de vista da estrutura federativa constitucional originária, o distrito em si simplesmente inexiste

 
No momento em que o Congresso rechaça a proposta do vice-presidente da República que ressuscitava o distritão como fórmula conciliadora entre o voto distrital propugnado pelo senador José Serra e o nosso atual e absurdo sistema proporcional, vale a reflexão sobre alguns impasses insuperáveis nessa discussão quanto à verdadeira esquizofrenia da nossa organização federativa. A divisão territorial do Brasil, em face do sistema federativo vigente, é sério obstáculo para uma reforma política do Estado realmente abrangente e eficiente. Era a tese do maior especialista em direito municipal do Brasil, o saudoso professor mineiro José Nilo de Castro, em seu pós-doutorado na Sorbonne. Temos municípios de mil almas e outros de milhões de habitantes com as mesmas leis infraconstitucionais político-administrativas e tributárias a regê-los como se fossem entes idênticos.

Acresçam-se a isso as disparidades demográficas, com gigantescas megalópoles superpopuladas no Centro-Sul, contrastando com esparsos núcleos populacionais no Centro-Norte, e temos aí mais um ingrediente de uma política totalmente distorcida, a exigir reformas de base em seu arcabouço constitucional. Portugal cabe duas vezes dentro do gigantesco município de Altamira, no Pará, para se ter ideia. E enquanto Roraima tem apenas 15 municípios, Minas Gerais tem mais de 850 dos mais de 5.500 espalhados dessa forma desproporcional Brasil afora. Nosso primeiro desafio, portanto, é a criação de um distrito federado padrão, minimamente administrável, com autonomia político-representativa e articulado com os demais entes federados: União, estados e com os próprios municípios. Precisamos urgentemente repensar a nossa Federação.

Esse é o primeiro grande obstáculo a vencer para partir para o segundo: a implantação do voto distrital misto em universo demográfico tão irregular num país de dimensões continentais. De nada adianta a discussão sobre o voto distrital em si se, no Brasil, do ponto de vista de sua estrutura federativa constitucional originária, o distrito em si simplesmente inexiste. Ora, como implantar o voto distrital, quer puro ou misto, onde não há o distrito, ele mesmo, como ente mínimo federado e o que existe são municípios cada vez mais inviáveis administrativamente, de populações e áreas totalmente díspares e imprevisíveis? Quantos distritos do tamanho do menor município do Brasil, Serra da Saudade, em Minas Gerais, com menos de mil habitantes, caberiam, por exemplo, dentro do mais populoso, São Paulo, com 11 milhões de pessoas?

A mera subdivisão em regiões administrativas, como já se tem ensaiado sem sucesso, nos grandes centros urbanos, também não resolve esse problema de fundo que se procura contornar com inúteis remendos. Isso porque a falta de autonomia e a inexpressividade real desses retalhos improvisados nos gabinetes, pouca ou quase nenhuma eficiência política lhes traz, por falta de legitimidade e representatividade. 


De outro lado, a reforma federativa presume um novo pacto. A própria origem semântica do verbete federativo vem de foedus, que, em latim, significa pacto, aliança. E, nesse sentido, a intangibilidade do pacto constitucional pétreo firmado e consubstanciado no parágrafo quarto do artigo 60 de nossa Carta Magna não proíbe ou exclui, absolutamente, seu aperfeiçoamento, como aqui proposto, por emenda constitucional. Todas as instâncias de participação popular, nesta fase, devem ser bem recebidas a se engajar nessa inadiável discussão sobre a revisão da nossa estrutura federativa como ponto de partida para a recepção do voto distrital em nível nacional, de preferência misto.

Os demais itens da reforma política, tais como o financiamento público ou privado de campanhas; a propaganda (gratuita para os políticos mas paga por nossos impostos); coligações; exacerbado e descontrolado pluripartidarismo; tempo de propaganda; limites éticos dos discursos e da publicidade; a cláusula de barreira; o voto de legenda; as odiosas imunidades parlamentares; e tantos e tantos outros temas candentes devem se submeter a essa prioridade.A parte menos trabalhosa é a implantação do voto distrital em si. Não há falta de modelos e subsídios teóricos. Há mesmo um site especializado (www.euvotodistrital.org.br), dedicado exclusivamente ao tema. Não será difícil, portanto, chegar-se a um consenso no Congresso e na academia.
autorização.

Dolorosa realidade - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE -06/06

Parece um saco de maldades. E é. Mas as notícias cada vez piores que marcaram a semana não partem de banqueiros interessados em tirar a comida da boca dos pobres, como foi propagado pela campanha de reeleição da candidata oficial. Todo aquele discurso foi, na verdade, biombo para ocultar a enorme trapalhada com que o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff atirou a economia brasileira no poço profundo do desequilíbrio fiscal, inflação acelerada, recessão, desemprego e sérias ameaças às recentes conquistas sociais.

Na quarta-feira, o Banco Central (BC) deu mais uma volta no torniquete da política monetária. Aumentou de novo a taxa básica de juros para 13,75% ao ano. Já é uma das mais altas do mundo, mas a própria autoridade monetária não esconde que o aperto não vai parar por aí. Pura maldade, já que isso reduz o acesso das pessoas ao consumo de bens e serviços? O aumento do custo da dívida pública via pagamento de juros não atira contra o equilíbrio fiscal?

É por essas vias simplistas (para dizer o mínimo) que muitos críticos da alta dos juros fingem não entender o que de fato move a decisão da diretoria do BC. Ninguém duvida de que seria muito mais agradável deixar o consumo correr solto. As pessoas continuariam com a ilusão de viver em país próspero e, portanto, mais propensas a votar na continuidade do governo.

Foi exatamente esse castelo de areia erguido nos últimos anos que ruiu. Agora, passada a eleição, não há mais como esconder os escombros. O aperto nas taxas de juros é, portanto, nada mais do que um dos ingredientes do remédio amargo que a sociedade é obrigada a tomar para se livrar das consequências da equivocada, para não dizer irresponsável, condução da política econômica.

Na mesma quarta-feira, não faltou quem criticasse o Banco Central por não ter acompanhado a divulgação, pela manhã, do resultado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): o desemprego fechou o trimestre móvel encerrado em abril com mais um aumento, passando a 8%. É o nível mais elevado desde o início da série, em 2012.

Somado às baixas taxas de confiança de empresários e consumidores e ao recuo dos investimentos em expansão dos negócios (capital fixo) no primeiro trimestre, o nível de desemprego medido em todo o país pode piorar nos próximos meses. A crítica parte da equivocada comparação com decisões do banco central norte-americano, que tem nos níveis de emprego dos EUA um dos parâmetros usados para decidir sobre os juros. Não somos economia desenvolvida financeira e tecnologicamente como a deles. Não atraímos capitais com tanta facilidade e não temos a mesma capacidade de resposta. 


Por isso mesmo, nem todas as decisões de política econômica tomadas em Washington podem ser replicadas por Brasília. Melhor mesmo é mirarmos sem falsetes a nossa realidade, compreender que não temos saída senão reconhecer o enorme peso dos erros aqui cometidos e enfrentar a dureza do ajuste. Além disso, é fundamental oferecer à sociedade, hoje exposta ao sacrifício, um plano factível de retomada do crescimento na fase seguinte, sem as fantasias e bravatas que nos levaram à calamitosa situação atual.

Os legados do mensalão - IGOR GIELOW

 FOLHA DE SP - 06/06

BRASÍLIA - Há dez anos, a jornalista Renata Lo Prete abria, ao apresentar Roberto Jefferson sem censura nas páginas desta Folha, o capítulo do mensalão na história política brasileira. Encerrado o plantão aqui na Sucursal de Brasília naquele fim de semana, me perguntei internamente algo como: "Onde será que isso vai parar?".

Os efeitos do escândalo ainda se fazem sentir no cotidiano. Se imperfeita, a investigação do caso levou a um julgamento conturbado e sem precedentes: a elite do grupo que comandava o país foi parar na cadeia.
A mão de ferro de Joaquim Barbosa na condução do processo é passível de críticas, mas é fato que um novo padrão foi estabelecido na relação entre sociedade e Judiciário.

Não só para bem. Expectativas maiores também geram inspiração justiceira em alguns magistrados, a exemplo do que já acontecera no passado com procuradores e delegados, mas o saldo é positivo.

A corrupção, claro, não desapareceu. Ao contrário, sofisticou-se, como o esquema desvendado na Lava Jato aponta. Mas parâmetros mudaram: sem o destino do maior punido no mensalão, o operador Marcos Valério, não haveria a oferta de delações premiadas de hoje.

Na política, o legado maior do episódio foi a exposição pública da engrenagem que o PT montou uma vez no poder. A imagem algo romântica do partido estilhaçou-se, iniciando simbolicamente um processo de desintegração que parece atingir seu auge agora, uma década depois.

Por fim, o mensalão marca também o começo de um aparentemente infindável movimento de descrédito na política. Um efeito colateral cheio de contradições, que mistura a crescente apatia com episódios como o junho de 2013, além de estimular ao paroxismo o radicalismo da manada algorítmica das redes sociais.

Afinal, onde aquilo foi parar? Descontando as dores naturais do crescimento, num país um pouco melhor.

Edinho, amor e ódio - DEMÉTRIO MAGNOLI

FOLHA DE SP - 06/06
 

"Todo brasileiro já nasce sabendo conviver com as diferenças", diz a mensagem publicitária da Caixa, ilustrada por um garoto que veste uma camiseta com as cores de todos os times patrocinados pelo banco estatal. A Caixa não prega a tolerância por decisão própria, mas seguindo uma orientação do ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Edinho Silva. O menor dos problemas da campanha publicitária é que evidencia, uma vez mais, a apropriação partidária das estatais. O maior é que difunde um equívoco conceitual: a tolerância não é atributo inato de ninguém.

Guido Mantega, Alexandre Padilha e Fernando Haddad sofreram vaias e ofensas, respectivamente, num hospital, num restaurante e no teatro. A campanha de Edinho foi deflagrada como reação a ocorrências desse tipo, que atingem lideranças do PT. Os malcriados que se aproveitam do clima político nacional para constranger petistas só merecem desprezo: numa sociedade decente, políticos devem ter a liberdade de circular como cidadãos comuns sem serem importunados. Contudo o governo lembrou-se muito tarde da importância do amor –e finge não saber quem moveu o peão das brancas.

Nos tempos do mensalão, um assessor da deputada Erika Kokay (PT-DF) perseguiu Joaquim Barbosa em restaurantes de Brasília para ofendê-lo. Quando a blogueira cubana Yoani Sánchez visitou o Brasil, chusmas de militantes do PT e do PC do B foram orientados pela embaixada de Cuba a melar os lançamentos de seu livro. Um bando de militantes petistas impediu, pelo vandalismo, a realização de um debate com minha participação na Festa Literária Internacional de Cachoeira (BA). Tais episódios, entre tantos outros, tiveram como protagonistas grupos partidários organizados, não indivíduos isolados. O ódio era política oficial, antes da descoberta do amor.

A tolerância é um aprendizado democrático. Ela só prevalece se o outro não é visto como inimigo, mas como um de nós. A metáfora da Caixa é adequada, pois todos os times pertencem à mesma pátria: o futebol. Contudo, no poder, o lulopetismo ensinou o contrário disso. A pedagogia oficial do ódio assevera que o país se divide em "nós" e "eles". Mais: diz que "eles" não são brasileiros com opiniões políticas diferentes, mas estrangeiros ideológicos. Você será qualificado de racista se divergir das políticas raciais; de inimigo do povo, se contestar o populismo econômico; de agente das multinacionais, se apontar a ingerência partidária na Petrobras; de golpista, se criticar o governo. Na pátria que se confunde com o partido, dissentir equivale a trair.

A súbita irrupção do amor oficial não cancelou o ódio oficial. Dilma Rousseff insiste na fórmula binária dos "predadores internos" (leia-se: os corruptos) e dos "inimigos externos" (leia-se: a oposição) sempre que menciona a Petrobras. A palavra "golpismo" tornou-se marca registrada dos pronunciamentos do PT. A proposta de resolução partidária da corrente petista integrada pelo ministro José Eduardo Cardozo e pelo ex-ministro Tarso Genro denuncia um "golpismo econômico" que estaria materializado nas políticas de ajuste fiscal conduzidas por Joaquim Levy. Edinho é do amor, mas sua chefe e seu partido são do ódio.

Edinho é do amor? Com uma mão, a Caixa lançou sua nova campanha. Com a outra, prossegue sua antiga campanha de financiamento dos blogs oficialistas consagrados à difamação sistemática da oposição, dos críticos do governo e de juízes encarregados dos escândalos de corrupção. Jatos de puro ódio cintilam sob a película do amor.

Suspeito que, tipicamente, algum malcriado sugeriu que Mantega, Padilha ou Haddad se transfira para Cuba. É o avesso simétrico do que ensina há tanto tempo o lulopetismo. Os malcriados aprenderam um método, assimilaram uma linguagem. Dizem, agora, que o "estrangeiro" é o PT. De certo modo, o PT venceu.

O preço da gestão desastrosa - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 06/06

Ainda que consiga atenuar as perdas financeiras e de credibilidade causadas pelo esquema de rapinagem apurado pela Operação Lava Jato, a Petrobrás continuará tendo sérias dificuldades para executar seus programas de prospecção, produção, refino e distribuição, como ela própria reconhece oficialmente.

Os preços dos derivados de petróleo, bem como seu programa de investimentos, continuarão sujeitos a decisões de seu controlador, o governo federal, razão pela qual a estatal poderá ser forçada a colocar em segundo plano a busca de seus objetivos para atender aos interesses do Palácio do Planalto. Isso afeta suas projeções financeiras. A primeira consequência é que ela não conseguirá executar seu ambicioso programa de investimentos contando apenas com o fluxo operacional de caixa. Precisará de dinheiro de outras fontes, como aportes de seu controlador – o Tesouro Nacional – ou financiamentos internacionais.

Também em crise financeira, o Tesouro precisa cortar suas despesas e não terá como financiar os investimentos da estatal no volume e na velocidade requeridos pelo programa de pesquisa e exploração.

O mercado financeiro parece disposto a emprestar para uma empresa que, apesar de sua profunda crise no momento, tem boas perspectivas de crescimento. Mas só empresta a juros em que incorrem as empresas de baixa credibilidade, como é hoje a Petrobrás.

A surpreendente operação de US$ 2,5 bilhões com bônus de 100 anos que a empresa acaba de concluir mostra isso. É sua primeira captação internacional desde março do ano passado, quando o bilionário esquema de corrupção começou a ser conhecido. Mas o custo da operação, de 8,45% ao ano, é o de empresas com classificação ruim pelas agências de avaliação de risco. Empresas e governos confiáveis pagam bem menos, como fez o México, que em abril captou € 1,5 bilhão pagando 4,2% ao ano.

O imenso poço de problemas em que foi transformada por seu continuado uso político pelo governo petista e, sobretudo, pelo esquema de corrupção está em parte descrito com realismo no documento que a Petrobrás encaminhou na semana passada à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), relatando sua atual situação econômico-financeira e apontando os fatores de risco que podem comprometer seu desempenho no futuro próximo.

Trata-se do Formulário de Referência, documento que as empresas que emitem ações precisam entregar à CVM no prazo de cinco meses após o encerramento do exercício financeiro. Ele contém, entre outras, informações sobre mudanças na estrutura de capital, dados financeiros e fatores de risco sobre as operações e os resultados futuros.

No documento, a Petrobrás reconheceu que poderá “não ser capaz de compensar totalmente as perdas acumuladas” entre o fim de 2010 (fim do governo Lula e época da primeira eleição de Dilma Rousseff para a Presidência da República) e o terceiro trimestre do ano passado (já no fim do primeiro mandato de Dilma) por causa do controle do preço dos combustíveis, sempre menor do que o preço do mercado internacional. Estima-se que essas perdas alcancem US$ 80 bilhões.

Na área financeira, não só os novos financiamentos que a Petrobrás venha a obter ficarão mais caros. Nos próximos cinco anos vencerão US$ 76,8 bilhões das dívidas da estatal. Boa parte poderá ser refinanciada, mas a taxas flutuantes, que refletirão o rebaixamento da classificação de risco da empresa. Assim, o custo da dívida tende a aumentar. “A menos que haja aumento dos preços de venda dos produtos de modo a refletir a depreciação, a geração de caixa pode sofrer impacto negativo ao mesmo tempo em que se observa a elevação do endividamento”, alerta o documento encaminhado à CVM.

Em resumo, com fluxo de caixa insuficiente, a empresa precisa de financiamento; mas, tendo tido sua nota rebaixada, o financiamento fica cada vez mais caro. Por sua vez, o reajuste dos combustíveis ajudaria, mas alimentaria uma inflação já muito alta. Assim, investimentos e metas de produção estão ameaçados.

Triste aniversário - MIGUEL REALE JÚNIOR

O Estado de S. Paulo - 06/06

Em 6 de junho de 2005, dez anos atrás exatamente, a Folha de S.Paulo publicava entrevista do deputado Roberto Jefferson, então presidente do PTB, em que denunciava a existência do mensalão. Dizia o deputado ser o número elevado de cargos do PT a fonte geradora do mensalão, pois o “PT tem participação muito maior que a dos outros partidos da base. Tem 20% da base e 80% dos cargos”. Ao final da entrevista, explicava a razão de ser do mensalão, uma mesada de R$ 30 mil paga a deputados do PL, do PP e do PTB, pois era “mais barato pagar o exército mercenário do que dividir o poder. É mais fácil alugar um deputado do que discutir um projeto de governo. É por isso. Quem é pago não pensa”. O deputado ponderava que em 22 anos de mandato nunca vira isso acontecer no Congresso Nacional, sendo que em função desse mensalão se contaminou a base parlamentar.

Jefferson avisou ministros e o próprio presidente do que ocorria, mas só se estancou essa corrupção com a CPI dos Correios. O presidente Lula, nestes dez anos, a cada instante falou coisa diferente sobre o mensalão, indo das desculpas à negação geral do fato, mesmo após o trânsito em julgado da condenação imposta pelo Supremo Tribunal Federal.

Nestes dez anos, a política tornou-se caso de polícia, com prisões, condenações, algemas, delações, fuga e extradição, monitoramento por tornozeleiras eletrônicas. É consequência de se assumir o governo não para cumprir primacialmente um projeto de país, mas para usufruir o poder, ocupando todos os cargos disponíveis e criando novos para acomodar apaniguados. O poder deixa de ser meio para ser fim em si mesmo, preservado por via de corrupção e de larga distribuição de propina, com descontrole fiscal e mentiras deslavadas para iludir o povo visando a ganhar eleições.

Imaginava que a persecução penal aos líderes do PT no processo do mensalão refrearia a ganância, mas se montava, por trás, o petrolão. Instalou-se, então, clima de irresponsabilidade absoluta na administração, imperando a desordem bem própria da mentalidade de tirar o máximo proveito do poder.

Essa irresponsabilidade contaminou o campo delicado das finanças públicas, pois o governo federal - objetivando melhorar suas contas e criar um superávit fictício - contraiu empréstimos com as instituições financeiras públicas para pagamento do Bolsa Família, do programa Minha Casa Minha Vida, do seguro-desemprego, deixando de registrar como passivo essa despesa sem pagar por longo prazo.

O Relatório de Inspeção, para se ter ideia da grandeza dos empréstimos, indica ter o Departamento de Supervisão Bancária informado que ao final de agosto último a Caixa Econômica Federal registrou em seu ativo R$ 1.740,5 milhões em valores a receber do governo federal, de pagamentos relativos a programas sociais (Bolsa Família, abono salarial e seguro-desemprego). E esses empréstimos foram contraídos com bancos públicos sem satisfação da dívida anteriormente assumida, efetivando estes mútuos no último ano do governo em afronta, em tese, ao descrito nos artigos 359 A e 359 C do Código Penal.

Em vez de o governo conter gastos, reduzir ministérios, eliminar cargos em comissão na administração direta e especialmente indireta, atacar a corrupção, ter transparência, valeu-se dos empréstimos contraídos com bancos dos quais a União é controladora, sem registrá-los como despesa, para vender gato por lebre, fazendo crer ao Legislativo, ao Tribunal de Contas, ao País que as contas públicas estavam sob controle e garantindo o crescimento econômico em 2015 com contenção da inflação. Essas deslavadas mentiras levaram a ganhar a eleição e agora à estagnação, à forte restrição do crédito, ao fim das desonerações, ao aumento dos preços, à redução das verbas da educação e da saúde.

Houve pedaladas em 2013, 2014 e neste ano também, mas nada proíbe que se instaure processo por crime comum contra a presidente por ações ocorridas no mandato passado se não estranhas às suas funções (artigo 86, § 4, da Constituição), sendo essas ações exatamente próprias funções presidenciais.

Além de a lei, a doutrina e a jurisprudência indicarem como responsável pelos crimes contra as finanças públicas o chefe do Executivo, cabe lembrar que a presidente da República, economista por formação, sempre demonstrou, enfaticamente, coordenar as decisões no campo das finanças.

Ademais, um dos maiores responsáveis pelas operações de crédito, o secretário do Tesouro Nacional, mantinha reuniões quase diárias com a presidente da República, cuja fama de rigorosa controladora da administração era e é famosa em Brasília, tanto que em tom de blague se diz ser fácil saber o nome dos 39 ministros: Dilma, Dilma... Evidentemente a presidente não pode alegar que medida de tamanha importância e tal valor tenha sido tomada sem seu conhecimento e sua anuência, pois cabe mesmo à presidente da República, de acordo com o artigo 85 da Constituição, a fixação de metas, a afetação dos recursos, a escolha dos procedimentos.

Assim, um dos caminhos para estabelecer a responsabilidade pela irresponsabilidade na condução das finanças públicas, que hoje todos sofrem, é o pedido de instauração de ação penal ou, no mínimo, de investigação criminal. Enviada acusação ao Supremo Tribunal, cabe a este consultar a Câmara dos Deputados se autoriza o processo. Autorizado, a presidente é afastada por 180 dias. O efeito é o mesmo do impeachment, sem ter de passar pela decisão monocrática do presidente da Câmara, que já arquivou, de plano, 30 pedidos de afastamento da presidente.

O caminho escolhido exige serenidade, visando a apurar a responsabilidade criminal da presidente por fatos cuja gravidade independe de qualquer viés político, pois já reconhecidos pelo Tribunal de Contas. Rodrigo Janot agora estuda a questão.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

Dilma aposta na Lava Jato para desgastar Cunha
A presidente Dilma aposta nas investigações da Operação Lava Jato para desmoralizar e diminuir o poder dos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros. Ela foi informada de que o mandado de busca e apreensão da Polícia Federal na Câmara complicou seu presidente. Mas alegações contra Renan seriam frágeis e, ao contrário de Cunha, ele pode até não ser denunciado pelo MPF.

Estratégia
Dilma joga pesado na recondução do procurador-geral Rodrigo Janot. É que ele não gosta de Cunha e, até agora, não a desapontou.

Janot nas paradas
Improvável há alguns meses, a recondução de Janot passou a ser “possível”, especialmente se ele ganhar apoio de Renan Calheiros.

Desestabilização
O Planalto acredita que, se for mesmo denunciado, Eduardo Cunha ficará sem condições de continuar presidindo a Câmara.

Conspirador-mor
O ministro Aloizio Mercadante, que se encarregou de jogar Renan contra Luiz Fachin (STF), agora atua no desgaste de Eduardo Cunha.

Joaquim rejeita carreira política: é ‘desagradável’
Aposentado precocemente do Supremo Tribunal Federal no auge das expectativas para seu ingresso na política, Joaquim Barbosa não tem vontade de ingressar na política. Ele disse em Israel, onde recebeu homenagem de uma universidade local, que no Brasil a política “se tornou numa coisa desagradável”. Tampouco gostaria de estar no STF para julgar o Petrolão: “Nada em vida pública me encanta mais”.

Vida privada
A ausência de obrigações funcionais parece um sonho conquistado. Joaquim Barbosa está gostando do que chama de “vida privada”.

Dolce far niente
Ao se aposentar, Joaquim prometeu a amigos aquecer a cena pública com um livro de memórias e “atuação” nas redes sociais. Desistiu.

Correndo para o abraço
Além da gorda aposentadoria, Joaquim Barbosa se dedica a palestras, pareceres e a ficar acessível a eventos que afaguem o próprio ego.

Esqueceram de mim
Batendo pernas na Itália, o ex-presidente Lula nem pensou na hipótese de visitar o companheiro mensaleiro Henrique Pizzolato, que está na prisão de Modena arrumando as malas rumo a Papuda, em Brasília.

Dá livro, filme etc
O jornalista Matheus Leitão vai transformar em livro a espetacular reportagem sobre como localizou e entrevistou o homem que entregou seus pais – jornalistas Marcelo Netto e Mirian Leitão – aos torturadores, na ditadura militar. A história renderia também um grande filme.

Câmara às moscas
O deputado JHC (SD-AL) foi ontem ao trabalho, mas não havia vivalma na Câmara. No Senado, o ambiente era igualmente desolador. Depois, Ronaldo Fonseca (Pros-DF) fez companhia ao deputado alagoano.

Em campanha
Após o governo articular contra seu projeto de se reeleger presidente da Câmara, o deputado Eduardo Cunha (PMDB) decidiu mudar o comportamento e se aproximar de alguns colegas, inclusive do PT.

Irmãos siameses
Diante da queda de popularidade do governador Rodrigo Rollemberg (DF), o deputado Izalci (PSDB) ironiza: “Ele ainda mantém no governo os assessores de Agnelo Queiroz, que saiu com péssima avaliação”.

Cabo de guerra
Com um pé fora do PSDB, a senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO) vem se desentendendo com o também tucano Marconi Perillo, governador de Goiás. No final de semana passada, ambos trocaram farpas.

Tem volta
A nomeação do peemedebista Vinicius Lummertz para a presidência da Embratur irritou o PCdoB. A escolha foi uma gratificação ao PMDB pela atuação no ajuste fiscal. Irritados, os comunistas já falam em boicote.

Quem paga a conta
Os parlamentares aproveitaram o final de semana para usar o dinheiro público. Comitivas formadas por suas excelências foram para Rússia, Israel e Cuba. Tudo bancado pelo coitado do contribuinte.

Pensando bem...
...Dilma anda tão à vontade em sua bike quanto o seu governo nas “pedaladas fiscais” reveladas pelo Tribunal de Contas da União.