quarta-feira, outubro 28, 2015

O massacre do crédito - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 28/10

Foi um dia de falações sinistras sobre a dívida do governo, que cresce sem limite. Ficou um tanto mais nas sombras o conhecimento do fato que o crédito no Brasil agora encolhe, pela primeira vez desde 2004. Que o valor dos novos empréstimos atingiu outro nível de colapso, em setembro.

O estoque de crédito, o total de dinheiro devido aos bancos, diminuiu, em termos reais, em relação a setembro de 2014, pode-se depreender dos dados sobre o crédito no país, divulgados ontem pelo Banco Central.

Alguém poderá dizer que, em relação ao tamanho da economia, em relação ao PIB, o estoque de crédito até subiu um tiquinho. Pior. O tamanho relativo das dívidas (empréstimos) cresce só porque a economia encolhe ainda mais que o crédito.

Em um ano, o estoque de crédito caiu 0,39%. Na última tentativa do governo Dilma 1 de turbinar o crédito, no pico de outubro de 2012, o total de crédito crescia a 11% ao ano. Crescia praticamente apenas porque a presidente cevava os bancos públicos, nos quais o total de dinheiro emprestado aumentava ao ritmo anual de 22% (nos bancos privados nacionais, a menos de 1%). Nos bancos privados, o crédito já encolhia sem parar desde março do ano passado (praticamente não cresce desde abril de 2013).

O governo engordava o porco do crédito público à base de aumento da dívida pública —em suma, era assim que repassava fundos aos bancos públicos. A estatização de parte do crédito resultou, em especial no governo de Dilma Rousseff, na explosão da dívida pública, um dos motivos dos nossos horrores econômicos de agora.

Ao final do governo Lula 1, os bancos públicos detinham 36,7% do crédito. A crise de 2008, que marcou a virada da política econômica petista, levou o governo a acelerar a concessão de empréstimos estatais, que chegaram a crescer ao ritmo anual de 26% (sempre em termos reais). Ao final de Lula 2, os bancos públicos tinham 41,7% do crédito.

O governo de Dilma Rousseff decidiu aplicar o mesmo remédio, em dose ainda maior, ao mesmo tempo em que reduzia a poupança básica do governo (reduziu o superavit primário e criou mais gastos duradouros). Ao final de Dilma 1, os bancos públicos ficavam com 53,8% do crédito; agora, têm 55,7%. O remédio envenenou o governo, hiperendividado, que não tem como anabolizar a economia com inchaço dos bancos públicos.

A degradação da economia levou os bancos privados a jogar na retranca. A engorda do crédito contribuiu para a deterioração econômica e não deu impulso aos investimentos, que passaram a encolher, mesmo com taxas reais de juro zeradas em muitas linhas do BNDES (e negativas, no Banco do Brasil); o consumo passou a desacelerar. No final das contas, restou apenas mais inflação, dívida pública e juros altos. Essa é parte da história do desastre.

Voltando ao presente, vive-se uma combinação tétrica de redução da massa de rendimentos e do colapso dos novos empréstimos (concessões). Tétrica e acelerada em setembro.

A queda do nível de atividade econômica é dramática, recessão de 3% neste ano, 2% no ano que vem. Muito difícil ver como o Banco Central poderia extrair uns décimos da inflação de 2016 sem jogar o país no que seria o segundo pior período recessivo da República.


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