terça-feira, outubro 13, 2015

Diplomacia pobre - JOSEF BARAT

O Estado de São Paulo - 13/10

Sendo o Brasil um país pobre do ponto de vista material, é natural que a atenção de estudiosos se volte para a pobreza. Trata-se de entender uma sociedade extremamente desigual, onde há ilhas de riqueza em meio à pobreza generalizada. Porém, surpreende a fascinação pela pobreza, sem termos tido, por séculos, a contrapartida de medidas objetivas, consistentes e duradouras para superá-la. Isso porque a pobreza não é somente material, mas também reflexo do “deserto de homens e ideias”, na célebre frase de Oswaldo Aranha. É neste deserto inóspito que a irresponsabilidade, a prepotência, o descaso e a corrupção brotam de forma endêmica e que, ao fim e ao cabo, perpetuam a pobreza.

Mas, se o fascínio pela pobreza não resulta em ações concretas de superação, são abundantes as manifestações de “denúncia”, de “libelos” e de busca de explicações para a sua existência. Nesse sentido, é interessante reportar à“arte povera” que impregna, em grande medida, nossas manifestações artísticas e culturais. A “arte pobre” foi uma expressão criada pelo crítico italiano Germano Celant, ao referir-se ao movimento artístico que surgiu na década de 1960 na Itália. Os adeptos dessa arte utilizavam materiais não convencionais nas formas de expressão visual, como, por exemplo, sacos, jor- nais, resíduos e trapos, visando a “empobrecer” a obra de arte, reduzindo seus artifícios e eliminando barreiras entre a arte e o quotidiano. O objetivo era revelar sua crítica ao “empobrecimento” de uma sociedade guiada pelo acúmulo de riquezas materiais.

No Brasil, o fascínio pela pobreza atinge até hoje indiscriminadamente todos os segmentos da criação artística e cultural e, também, vejam só, os formuladores da nossa política externa. Nada mais charmoso que diplomatas e intelectuais buscando formas de inserir o Brasil numa espécie de diplomazia povera. Daí a insistência em manter o País atrelado a esta união de rotos do Mercosul, a ditadores africanos corruptos e, sobretudo, como vagão de 2.ª classe à locomotiva chinesa. Isso é bom para atender aos anseios da construção pesada e de alguns segmentos pouco competitivos da indústria. Claro que temos uma pujante agricultura, que, no entanto, não controla a demanda e os preços das commodities numa relação colonial com a China.

Mas, concretamente, o que representa essa diplomazia povera para a economia brasileira, além dos mimos concedidos aos empresários amigos? Primeiro, as opções equivocadas da nossa política externa – com escolhas de parcerias irrelevantes – acarretaram um reforço à baixa competitividade de nossos produtos industriais e reduziram sua relevância na pauta de exportações. Com as exceções de praxe, cada vez mais agregamos menos valor ao que nossa indústria exporta. A segun- da consequência é que as decisões de excluir o Brasil dos grandes acordos transcontinentais (Pacífico e Atlântico) deixaram o País fora dos fluxos relevantes do comércio mundial para bens industriais e serviços. Não é por acaso que nosso comércio exterior é reduzido e se está reduzindo ainda mais.

Não há dúvida de que o crescimento das exportações de minério e soja para a China incrementou consideravelmente as nossas exportações e induziu avanços tecnológicos na sua produção e produtividade. No entanto, esse avanço não retirou dessas commodities a sua condição básica de vulnerabilidade ante as oscilações de demanda e preços. Mas a excessiva dependência à demanda chinesa e a teimosia em recusar acordos com blocos e países que poderiam estabelecer fluxos de comércio mais equilibrados conosco puseram a nossa indústria também em situação de vulnerabilidade. Esta resulta da perpetuação da sua baixa capacidade competitiva e da impossibilidade de inserção num mercado dinâmico pelos seus baixos níveis de produtividade e inovação. Com a crise “made in Brazil” e a rápida perda de protagonismo no cenário mundial, é de esperar – como diria o saudoso Millôr – que o fracasso não suba à cabeça dos formuladores da nossa política externa.


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