quarta-feira, julho 30, 2014

¡Que venga el toro! - ALEXANDRE SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 30/07


A análise do banco nada tem de controverso; é o óbvio, amplamente noticiado, que virou objeto de censura


Antes de tudo, um alerta: para quem não sabe, fui economista-chefe do Santander entre 2008 e 2011, demitido após discussão pública com o então presidente da Petrobras. Digo isso porque quero hoje tratar do imbróglio que envolveu o banco na semana passada, quando foi publicada análise relacionando o desempenho da presidente nas pesquisas eleitorais ao comportamento da Bolsa, do dólar e de outros ativos.

A análise nada trouxe de controverso. Aqui mesmo na Folha, no dia 19, lia-se na página B3: "Bolsa chega ao maior nível em 16 meses", notando que "as ações de empresas estatais dispararam na BM&FBovespa e impulsionaram o principal índice da Bolsa brasileira nesta sexta-feira (18), após pesquisa Datafolha ter apresentado empate técnico entre a presidente Dilma Rousseff (PT) e o senador Aécio Neves (PSDB)". Acrescentou ainda que, "desde que começaram a ser divulgadas pesquisas apontando perda de espaço da presidente (...), o mercado de ações nacional, que caía e acentuava queda (...), mudou de tendência".

O governo e o partido podem não concordar com a avaliação do mercado, mas, conforme descrito pelo jornal, trata-se de um fato: para bem ou para mal, a percepção é que uma mudança de orientação de política econômica terá efeitos positivos sobre as empresas brasileiras, em particular as sujeitas a controle acionário governamental.

E é bom notar que o tal mercado pode ter as preferências ideológicas que quiser, mas, na hora de comprar ou vender uma ação, o que menos interessa é ideologia; é sempre a perspectiva de lucro que move esses agentes. Posto de outra forma, ninguém rasga dinheiro em nome de suas convicções políticas.

O texto do banco, enviado a correntistas com renda mensal superior a R$ 10 mil, supostamente mais propensos a operar no mercado financeiro, nada mais fez do que compartilhar esses fatos, e por um motivo muito claro. Bancos têm um dever fiduciário com seus clientes: não podem omitir ou distorcer informações relevantes para sua tomada de decisão.

Em particular, a opinião das áreas de pesquisa deve refletir exatamente esse tipo de preocupação. Analistas não estão certos o tempo todo, mas é claro que suas conclusões não devem ser guiadas pelos interesses da instituição financeira. Não por acaso as regras buscam (nem sempre com sucesso, diga-se) isolar a pesquisa econômica das posições próprias do banco e mesmo de áreas que gerenciam as aplicações de clientes (fundos de investimento), precaução devidamente apelidada de "muralha da China".

Nesse sentido, a decisão de demitir os analistas que expuseram, mais que uma opinião, um fato representa uma violação desse procedimento. A alegação de que a análise conteria "viés político ou partidário" não se sustenta diante da própria diretriz interna que "estabelece que toda e qualquer análise econômica enviada aos clientes restrinja-se à discussão de variáveis que possam afetar a vida financeira dos correntistas". Não há, como se viu, a menor dúvida de que as perspectivas acerca da eleição presidencial são mais que relevantes para afetar a vida financeira dos clientes.

A consequência desse comportamento é óbvia (e aqui falo em termos gerais, não do banco em si). Se a autonomia da pesquisa é ameaçada, a credibilidade da análise fica comprometida, a despeito das qualidades do analista. Quem, de agora em diante, pode confiar em relatórios se não sabemos a que tipo de filtros estes se encontram sujeitos?

O maior perdedor é o debate econômico, ainda mais numa conjuntura em que --em face de desafios nada triviais no futuro próximo-- ninguém se aventura a discutir a sério o que precisa ser feito para colocar a economia brasileira de volta nos eixos. Se até o óbvio, amplamente noticiado (ainda bem!) pela imprensa, vira objeto de censura, pouco falta para que fujamos da controvérsia como quem tem um miúra nos calcanhares.

GOSTOSA


Cavalo de pau. Sim ou não? - CELSO MING

O ESTADÃO - 30/07


Não dá para afirmar que o governo Dilma tenha cometido erros apenas pontuais na condução da política econômica, como o represamento das tarifas de energia elétrica e de combustíveis ou a adoção de técnicas esquisitas de contabilidade criativa.

Se a presidente for conduzida a um segundo mandato também não bastarão correções pontuais de política econômica. Mudanças mais profundas terão de acontecer para virar o jogo, porque os erros foram também mais profundos, embora Dilma continue negando, como fez nessa segunda-feira na sabatina realizada pelo jornal Folha de S.Paulo em Brasília.

Mas como providenciar mudanças profundas se, nos primeiros quatro anos, as autoridades - e não apenas a presidente Dilma - insistiram em dizer que não há nada de errado com a economia e os programas de assistência social (Bolsa Família, por exemplo) tiveram tanto êxito que compensam eventuais equívocos cometidos ao longo do caminho?

A desoneração dos encargos trabalhistas, que contemplou apenas um punhado de setores, custou R$ 50 bilhões em renúncias tributárias só no primeiro semestre deste ano e deverá superar os R$ 100 bilhões até o fim de 2014. É mais do que o governo federal arrecada em um mês. E, no entanto, ninguém conseguiu ver os resultados. A indústria continua empacada, entulhada em estoques, perdendo competitividade todos os dias, despedindo mais gente do que contratando.

O programa de concessões de serviços públicos, destinado a empurrar os investimentos em infraestrutura, não consegue decolar. O erro não foi só tentar tabelar o lucro (Taxa Interna de Retorno) das empresas vencedoras dos leilões, mas a incapacidade do governo de gerenciar o processo e de apressar a concessão de licenciamentos ambientais.

O erro de fundo foi estratégico: foi não ter estratégia. O governo Dilma tentou inovar, desvencilhar-se do tripé original (inflação na meta, câmbio flutuante e formação de superávit primário de 3,1% do PIB) e tudo o que conseguiu foi desarrumar a economia. O resultado é a sucessão de avanços miseráveis do PIB, inflação mais perto dos 7% do que dos 6%, finanças públicas desorganizadas, investimento em queda, aumento do rombo das contas externas (déficit em conta corrente) e tombo generalizado dos níveis de confiança. Isso aí nada tem a ver com ideologia ou com concepção de linha administrativa. Tem a ver com divórcio entre políticas adotadas e resultados a serem alcançados.

Dentro do governo ainda há aqueles que sustentam que a economia só precisa de alguns ajustes e não de um cavalo de pau. Talvez não precise de tudo isso, seja lá o que signifique, na prática, dar um cavalo de pau. Terão de ser bem mais do que alguns ajustes.

A retomada da confiança do investimento, do crescimento sustentável e do controle das finanças públicas não pode mais ser alcançada com experimentos. Exige a volta à solidez dos fundamentos. Mas como justificar essa eventual reviravolta sem reconhecer os erros passados e sem contrariar aqueles que justificaram e continuam justificando a chamada Nova Matriz Macroeconômica?


O BRASILEIRO É ANTES DE TUDO UM BOSTA!


Argentina não é mais aquela - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 30/07


Um calote dos vizinhos deve afetar menos as finanças do Brasil desta vez, mas não sairá de graça


A ARGENTINA pode estar em calote hoje. O Brasil é um dos países mais frágeis entre "emergentes" maiores, escreveu o pessoal do FMI num relatório divulgado ontem.

A produção de más notícias domésticas continua em ritmo notável, ainda que não desastroso. Risco de tumulto na vizinhança e degradação da imagem econômica brasileira certamente colaboram para deteriorar a nossa situação. Mas pouco, provavelmente. Pior mesmo é que a confiança de empresários (indústria e comércio de São Paulo) ainda cai, assim como o total de crédito concedido a taxas de mercado, sem direção do governo, como se soube ontem.

A Argentina tinha até hoje para chegar a um acordo com credores que ganharam na Justiça dos EUA o direito de receber na íntegra dívidas repudiadas no calote de 2001, para resumir de modo breve uma história enrolada. Sem acordo ou pagamento (impossível), a Argentina dará oficialmente outro calote.

O "evento de crédito" não deve mexer com a finança mundial, provavelmente nem com a brasileira, embora as sequelas do calote devam deteriorar a situação argentina, segundo até os raros observadores ponderados da economia dos vizinhos.

Desde 2001, a Argentina está fora do mercado de crédito mundial, praticamente não se financia lá fora. Logo, esse calote não vai afetar dívidas novas, que praticamente inexistem. Além do mais, apesar da desconfiança em relação a países emergentes "frágeis" ou "vulneráveis", a finança mundial não deve associar os problemas desses "emergentes" aos da teratológica situação argentina. Isto é, não deve haver "contágio".

No entanto, os argentinos esperam desvalorização adicional do peso, o que deve dar em mais inflação e recessão algo maior. A Argentina, como se sabe, compra muito produto industrial do Brasil. Comprava, aliás. Deve comprar ainda menos, com calote e mais crise.

Neste semestre, as vendas brasileiras para a Argentina caíram 25,5% em relação ao primeiro semestre de 2013. As exportações de carros caíram 47%. As de caminhões, 44%. De autopeças, 39%. Quem vende tratores, pneus, sapatos, máquinas e matéria-prima de plásticos também pena.

Não é um desastre extenso, mas atrapalha bem, como parece óbvio, dado o peso da indústria automobilística.

O FMI fez ontem algumas manchetes de noticiários "em tempo real", mas chove no molhado. Repete diagnóstico vulgarizado desde meados de 2013: países com inflação e deficit externos altos estão mais sujeitos a tensões quando vier o aperto monetário nos EUA, em 2015. O Brasil está nessa lista, com África do Sul, Argentina, Índia, Indonésia, Rússia e Turquia.

No caso de reação tumultuada da finança à mudança dos juros americanos, pode haver menos crédito externo, venda de ativos brasileiros (juros sobem, ações caem, real se desvaloriza), como se viu na reação demente do "mercado" a um indício de aperto americano, de maio de 2013 ao início deste ano.

Tudo isso, Argentina, FMI, tensão financeira, aperta o nosso calo. Mas nosso problema principal é ter dado tiros no próprio pé (consumo, inflação, juros e deficit externo e fiscal altos).

Missão e desafios no caminho do agronegócio - LUIZ CARLOS CORRÊA CARVALHO

O ESTADÃO - 30/07


Ao analisar o acelerado processo de crescimento populacional, da renda per capita e da urbanização na Ásia, em especial na China, maior comprador mundial de commodities agrícolas, tem-se a confirmação do desafio que é hoje denominado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) como de segurança alimentar. Afinal de contas, recentes estimativas da consultoria McKinsey dão conta de que a China terá, em 2025, nada menos do que 221 cidades com 1 milhão de habitantes. Somado às 23 cidades chinesas que deverão ter mais de 5 milhões de pessoas, chega-se a um aumento na população urbana da China na ordem de 330 milhões.

É mais gente vivendo nas cidades, com novos hábitos de consumo e maior renda. Resultado: maior demanda por carnes, leite e ovos, fibras, etc. A dimensão do potencial explosivo de consumo futuro pode ser medida por uma colher de açúcar. Há dois anos, o consumo anual per capita de açúcar no interior da China era de 2kg por pessoa, enquanto nas cidades era de 20kg. Em nível global, para os próximos dez anos, teríamos de aumentar em 44 milhões de toneladas a produção anual de açúcar, mais do que o Brasil produz atualmente. E esse quadro vai além: hoje, no mundo, 14% das commodities como cana, milho, trigo e os óleos vegetais - soja, canola e palma - são para a produção de biocombustíveis. E vai crescer!

Por esses dados, tem-se a noção da missão que o futuro reserva para o agronegócio brasileiro. E tal missão foi ainda mais magnificada pela recomendação da FAO e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de que o Brasil deverá responder por, pelo menos, 40% do fornecimento de alimentos projetados até 2050. É, indubitavelmente, a janela de oportunidade mais clara que temos hoje em âmbito mundial no horizonte de curto e de médio prazos.

Em razão dessa proposta desafiadora, espera-se, tanto do setor privado envolvido no processo produtivo quanto do governo, uma atitude moderna, arrojada e colaborativa, no sentido de considerar este segmento estratégico para o Brasil. Afinal, ele responde por 25% do produto interno bruto (PIB) e por cerca de 40% das exportações brasileiras. Na condição de grande celeiro tropical, o Brasil é, hoje, o terceiro maior exportador agrícola do mundo, atrás somente dos Estados Unidos e da União Europeia. Além disso, o produtor rural desempenha um papel vanguardista no que diz respeito à questão da sustentabilidade e no uso de tecnologia, pois tem conseguido ampliar a produção somente com ganhos de produtividade, sem aumento da área plantada.

Essas conquistas se devem a uma visão sistêmica e ampla dos negócios ligados ao campo, que foi incorporada aos processos produtivos pelos empresários por meio de atividades sofisticadas nas áreas de biotecnologia, mecanização e tecnologia da informação. Trata-se de uma realidade bem distante daquela vivida no passado.

O conceito das cadeias produtivas, lançado por Harvard e incorporado à realidade brasileira há cerca de 20 anos, envolvendo os elos que vão de bens de capital e insumos, passando pela produção agrícola e industrial, indo à distribuição, atacado e varejo, incluindo ainda as exportações, explica o peso e a importância da cadeia agroindustrial na economia do País.

Essa dinâmica impressionante do agronegócio brasileiro decorre da necessidade vital de ganhar competitividade. É um desafio que não se pode perder de vista no presente e no futuro, com a manutenção dos investimentos em pesquisas e em inovação. Existem no País vários casos de sucesso para exaltar a capacidade empreendedora de pequenos, médios e grandes agricultores. Fizemos uma mudança monumental na forma de produzir em solos quimicamente mais pobres do Cerrado, com o sistema de plantio direto na palha, a produção conjunta de etanol e de bioeletricidade e a integração lavoura, pecuária e floresta. Não é pouca coisa e isso se deve à enorme criatividade brasileira.

Para que todos esses avanços se traduzam na continuidade da posição vanguardista que o País ocupa no cenário agrícola mundial, é necessário haver bastante harmonia entre os atores privados e o governo, que deve funcionar como um facilitador. Atuando assim, não teríamos, por exemplo, uma situação em que nossa produção de grãos praticamente duplicou em dez anos sem contar com a equivalente expansão da infraestrutura de transporte, armazenamento e logística.

Essas deficiências anulam os ganhos de competitividade alcançados no campo. Não podemos, por exemplo, ter descontinuidade de políticas públicas, assim como não é compreensível a existência de tantas instâncias que são, em tese, responsáveis pela formulação e pela aplicação da política agrícola. Precisamos dessa sinergia para estarmos em condições de relevância geopolítica no século 21 e em condições de atender às expectativas do mercado global.

Todos esses pontos estarão em debate no 13.º Congresso Brasileiro do Agronegócio, que será promovido pela Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) no dia 4 de agosto, em São Paulo, com o tema Agronegócio Brasileiro: Valorização e Protagonismo. No evento será analisada também uma proposta de ação elaborada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e entregue aos representantes dos três candidatos à Presidência da República mais bem posicionados nas pesquisas eleitorais.

Nossa expectativa é de que o Brasil aproveite este momento extraordinário de mudanças globais, num cenário de franca revolução do uso sustentável de recursos naturais, para reafirmar sua posição de protagonista e líder desse processo transformador da geopolítica mundial.

Banco Central, dr. Jekyll e Mr. Hyde - MARCELO CURADO

GAZETA DO POVO - PR - 30/07


A existência de coordenação na política econômica é um dos elementos mais importantes para uma boa gestão na área. Por exemplo, se o problema a ser enfrentado num determinado momento é o nível elevado de inflação, o Banco Central e o Ministério da Fazenda devem agir de modo coordenado para atingir esse objetivo. Numa situação como esta, cabe ao Banco Central reduzir a liquidez e ampliar a taxa de juros; e, ao Ministério da Fazenda, aplicar uma política fiscal contracionista, reduzindo, por exemplo, os gastos do governo.

Problemas de coordenação na gestão da política econômica não são raros no Brasil. Na gestão de Lula os conflitos entre as políticas mais conservadoras do Banco Central e a heterodoxia do Ministério da Fazenda foram amplamente relatados. No entanto, as medidas anunciadas pelo Banco Central, alterando as regras do depósito compulsório e para as reservas dos bancos, colocam o tema da coordenação da política econômica em outro patamar. Para entender o problema, é necessário regressar um pouco no tempo.

Entre julho de 2011 e abril de 2013, o Banco Central, mesmo num contexto de inflação acima do centro da meta, implementou uma política de redução da taxa de juros a qualquer preço. O resultado desse equívoco é bem conhecido. Hoje operamos com a inflação colada no teto da meta. A situação só não é pior em função da ingerência sobre os preços administrados. Em 2013, a variação de 5,91% no IPCA resultou de uma elevação de 7,3% nos chamados preços livres e de 1,52% nos preços monitorados.

Ao perceber o equívoco, o Banco Central mudou de rumo e passou novamente a executar uma política de aperto monetário através da ampliação da taxa Selic. A última ata do Comitê de Política Monetária evidencia a preocupação da instituição com a inflação e sua resistência à queda. Neste contexto, a ampliação da liquidez é uma medida equivocada sob vários ângulos de análise. O mais evidente é que, ao fazê-la, o BC age no sentido contrário da política de manutenção de um patamar elevado para a taxa Selic.

O Banco Central justifica que precisa estimular a atividade econômica por meio da ampliação do crédito. De fato, a medida pode ter um impacto positivo sobre as decisões de consumo, ampliando ainda mais o já temerário nível de endividamento das famílias. Acreditar que o problema do baixo investimento será solucionado com ampliações no crédito é outro equívoco. Não há falta de crédito para a realização de investimentos. O problema é de outra natureza. A expectativa de lucros dos empresários encontra-se deprimida, fruto da deterioração do estado de confiança geral da economia. Em grande medida, este cenário é o reflexo da confusa política econômica administrada pelo Banco Central, mas especialmente pelo Ministério da Fazenda na gestão Dilma.

Em última análise, a medida é mais um capítulo da infeliz gestão da política econômica de Dilma e o “samba de uma nota só” do estímulo à demanda. As medidas anunciadas colocam a discussão sobre coordenação da política econômica em outro patamar: o da incongruência das medidas tomadas pelo mesma instituição. Tal como no romance O médico e o monstro, de Robert Louis Stevenson, o Banco Central assume uma espécie de dupla personalidade, ora buscando agradar àqueles que se preocupam com a inflação, ora preocupado em agradar àqueles que acreditam que falta demanda e que é necessário estimular os gastos no sistema. O resultado desta bipolaridade é o aumento da incerteza e a perda de credibilidade na gestão da política econômica.

Os fatos da crise - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 30/07


A presidente Dilma disse à "Folha de S. Paulo" que "todos nós erramos" e "o mundo errou" ao minimizar a crise de 2008. Ela socializou um equívoco que a maioria não cometeu. O ex-presidente Lula chamou de "marolinha", mas economistas, jornalistas, empresários e até os dirigentes do Banco Central da época entenderam que era uma crise profunda. Basta ler o noticiário do período.

Quem errou na análise deveria assumir que errou. Seria mais tranquilizador, porque haveria menos risco de repeti-lo. Por exemplo, agora ela afirma que: "nenhum país se recuperou". E, de novo, os fatos e os números conspiram contra a convicção da presidente. Os países que enfrentaram o olho do furacão estão em recuperação, e as projeções de crescimento do PIB da Alemanha (1,9%), Estados Unidos (1,7%) e Reino Unido (3,2%) e até do Japão (1,6%) são maiores do que as do Brasil em 2014. O FMI projeta para o Brasil 1,3%. Os economistas pesquisados pelo Banco Central, 0,9%.

O mundo hoje não é culpado pelo nosso fraco desempenho porque Estados Unidos, Europa e Japão estão em recuperação e com juros próximos de zero. A economia externa tem ajudado, mesmo assim o crescimento do país tem encolhido e a inflação não sai do teto da meta. Era o momento de aproveitar e crescer. Depois, quando os juros americanos subirem, haverá menos capital para nos financiar.

Dilma tem razão sobre a taxa de desemprego. Ela veio caindo ano a ano durante todo os governos Lula e Dilma. É a menor taxa desta série: 5% na Pesquisa Mensal de Emprego. O enigma sobre o qual sua administração deveria estar debruçada é: por que, com taxa de desemprego tão baixa, há uma explosão do custo com o seguro-desemprego de 345% desde 2003, quando a inflação do período foi 71%? O aumento da formalização não explica alta tão forte.

Voltando ao crescimento e olhando em volta, o que se vê? Das dez maiores economias da América Latina, o Brasil só cresceu mais do que o México e a Venezuela no acumulado desde o ano da crise. A Venezuela está no descaminho há muito tempo, e o México sofreu o baque de frente da economia americana, da qual é excessivamente dependente. O Brasil cresceu 19,3% no acumulado entre 2008 e 2013. O Chile cresceu 25%; Colômbia, 26%; Equador, 30%; Bolívia, 34%; Argentina, 35%; Uruguai, 37%; e Peru, 43%.

Nesse grupo de dez, nós temos a quinta maior inflação acumulada. Só ficamos melhores do que a Venezuela e a Argentina, que estão com taxas descontroladas, Uruguai e Bolívia.

O Brasil está crescendo menos do que a maioria dos países da região, e com mais inflação que a maioria dos vizinhos. Não é a crise externa que está nos afetando agora. Já nos afetou no passado. Os maiores problemas são feitos por nós mesmos.

A propósito, o Brasil lidou bem com a crise no primeiro momento. Apesar de o ex-presidente Lula ter minimizado o tamanho da onda, o Banco Central não cometeu esse erro. As medidas anunciadas pelo BC foram ágeis, eficientes e amorteceram o impacto. O país crescia a 6%, em 12 meses, quando houve a quebra do Lehman Brothers e toda a desorganização financeira externa, e foi para um quadro recessivo em 2009. Recuperou-se em 2010. Mas ao usar abusivamente de subsídios a setores, alquimias fiscais e estímulo ao endividamento, o país colheu baixo crescimento e alta inflação.

Não há um "pessimismo inadmissível" no país. Há uma constatação de que o quadro é desfavorável. Os sinais são frequentes: ontem foi a Sondagem da Indústria da FGV; na sexta-feira, será a produção industrial do IBGE. Negar o problema não o faz desaparecer.


Terceirizar atividade-fim: é eficiente limitar? - SERGIO LAZZARINI

O ESTADÃO - 30/07


O Supremo Tribunal Federal deve analisar, em breve, julgamentos trabalhistas condenando a prática de terceirização de atividades consideradas, em tese, como "fim" - por exemplo, empresas agroindustriais que contratam prestadores de serviço de plantio ou empresas de telecomunicações que contratam operadores especializados de call center. Como destacado em ótimo artigo por José e Eduardo Pastore em 29/7 no Estado, a decisão pode ter impacto fundamental na legislação trabalhista.

Os críticos da terceirização se baseiam no argumento de que a empresa estaria repassando processos essenciais para prestadores de serviço externos somente para demitir e pagar menores salários. Ainda segundo o argumento, atividades terceirizadas poderiam causar uma "precarização" das relações de trabalho. Esse argumento, no entanto, tem um problema fundamental: como definir com exatidão o que é uma atividade-fim?

Voltando a um dos exemplos acima, uma empresa que processa um produto de origem agrícola precisaria realmente se envolver em atividade de produção rural? Qual seria, afinal, a sua atividade-fim? O processamento e a venda do produto industrializado ou a produção agrícola? Justamente para evitar esse questionamento inconclusivo, há muito o ferramental técnico especializado no tema mudou o foco do debate. A unidade de análise deve ser a transação. E as empresas deveriam organizar a transação da forma mais eficiente possível, independentemente se é considerada "fim" ou não.

Retornando novamente ao exemplo da empresa agroindustrial, imagine que a atividade de plantio ocorra só uma vez ao ano e exija um maquinário muito especializado. Pode ser muito ineficiente para a empresa fazer, ela própria, essa atividade. Uma empresa terceirizada poderia não só usar o maquinário em mais clientes, tornando-o menos ocioso, como também aprender ao longo do tempo como melhor executar a operação por meio de múltiplos contratos de serviço. Se os custos de desenhar, monitorar e fazer cumprir contratos entre o cliente e o fornecedor não forem muito elevados - os chamados "custos de transação", no jargão econômico -, então será mais eficiente para a empresa terceirizar.

Por outro lado, em alguns casos pode ser recomendável integrar uma atividade aparentemente não-fim. Por exemplo, muitos varejistas têm áreas internas de tecnologia de informação que poderiam, a princípio, ser terceirizadas. Mas, dependendo do grau de customização do serviço e do conhecimento exigido às necessidades da empresa, além dos riscos de vazamento de informação proprietária, os custos de transação podem ficar proibitivos. Essa lógica baseada em custos de transação já rendeu ao menos três Prêmios Nobel em Economia (Ronald Coase, Douglass North e Oliver Williamson).

É verdade que esse argumento não diz nada sobre o risco de precarização apontado pelos críticos. Esse risco existe e deve ser cuidadosamente observado. Mas a pergunta relevante é: a precarização é causada pela terceirização ou pela falta de fiscalização de uma determinada atividade? Se uma empresa não adere a práticas trabalhistas adequadas, o melhor remédio é obrigar a empresa-cliente a integrar essa atividade ou punir a má conduta da empresa prestadora de serviço? Na mesma linha, a preocupação com os menores salários exige um entendimento mais detalhado sobre as suas reais causas. Sabemos que salários respondem muito positivamente a investimentos em educação. Nesse sentido, os grupos organizados que se opõem à terceirização poderiam gerar um impacto muito mais duradouro nos salários se pressionarem por mais apoio ao treinamento e qualificação profissional dos funcionários de serviços terceirizados.

Em debates importantes como este, é preciso cuidar para não gerar "soluções" que podem até ter boa intenção, mas que deixam de atacar a raiz do problema e podem trazer efeitos deletérios para a produtividade do País.

Nacionalismo canhestro - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 30/07

De duas, uma: ou há uma conspiração internacional contra o Brasil, ou o governo brasileiro está flertando perigosamente com o perigo, alheio às advertências que partem de todos os lados sobre as fragilidades de nossa economia. Ontem, foi o Fundo Monetário Internacional (FMI) que colocou o país entre as cinco economias mais vulneráveis do mundo, ao lado de Índia, Turquia, Indonésia e África do Sul.

Também a agência de classificação Moody´s divulgou um relatório no qual afirma que a Petrobras é, entre as empresas petrolíferas da América Latina, a que corre o maior risco financeiro porque está sendo usada politicamente para segurar a inflação com o represamento dos preços de combustíveis no país.

E o que respondem nossos dirigentes? Ao mesmo tempo em que vibram com a derrota política que impuseram ao banco espanhol Santander, tratam de declarar platitudes, à espera de que as coisas melhorem por si, sem demonstrar a menor intenção de fazer mudanças no rumo tomado. Ao contrário, consideram que não há o que mudar.

A única concessão feita pela presidente Dilma foi admitir que o ex-presidente Lula errou ao julgar que a crise financeira que estourou em 2008 chegaria ao Brasil como uma marolinha . A presidente Dilma mais uma vez considera inadmissível o pessimismo em relação à economia brasileira, e compara-o ao pessimismo sobre a Copa no Brasil. Para Dilma, não há necessidade de mudanças. Ela nega que a inflação no país esteja descontrolada .

Já o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o FMI comete o mesmo equívoco de outros organismos no passado, quando afirmaram que o Brasil estaria entre as cinco economias mais frágeis. Segundo o ministro, ninguém mais falou nesse assunto e nada aconteceu . Para ele, uma instituição financeira respeitável não faria uma análise dessas. Pois foi a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, que comentou ontem o relatório sobre o Brasil, reiterando que há 15 meses o FMI vem repisando as mesmas fortes recomendações para que reformas estruturais sejam feitas, gargalos sejam reduzidos na economia e que o potencial, a capacidade de o Brasil entregar crescimento seja liberada. E isso não vem sendo feito .

Lagarde repetiu que o receituário para superar os obstáculos, é único: reformas estruturais, conserto dos problemas macroeconômicos como inflação alta, déficits em contas externas, desequilíbrios fiscais. A previsão do FMI é a de que o país será afetado duramente pela retirada de estímulos e pelo aumento de juros, especialmente nos Estados Unidos, se os emergentes continuarem crescendo abaixo do esperado, como ocorre há três anos.

A queda dos preços das commodities é outro fator que pode complicar a vida dos emergentes, alerta o FMI. Já a agência Moodys destaca que a estatal irá enfrentar também riscos políticos substanciais , pois está cerceada pelas políticas de preços para gasolina e óleo diesel . A Moody´s ressalta ainda que o cenário macroeconômico do país tem desacelerado desde a crise de 2009. A expectativa da agência é de crescimento de apenas 1,5% no PIB brasileiro, o que é uma previsão otimista, tendo em vista que a pesquisa Focus, realizada pelo Banco Central, já está em 0,9%.

O tal mercado financeiro está cheio de dúvidas e de advertências à política econômica do governo brasileiro, e nossas autoridades brincam de um nacionalismo canhestro, como se mobilizar sindicatos e militantes políticos para demitir analistas de mercado e desmoralizar banqueiros internacionais fosse melhorar a situação de nossa economia.

Sem fantasia - DORA KRAMER

O ESTADÃO - 30/07


A ex-senadora Marina Silva foi precisa ao definir o que acabara de lhe contar o assessor sobre a expectativa de Edivaldo Manoel Sevino de receber "unzinho" em troca da cessão de sua casa em Osasco (SP) para funcionar como comitê eleitoral da campanha de Eduardo Campos.

"Esse é o padrão a que as pessoas estão acostumadas", disse a candidata a vice-presidente na chapa do PSB, já disposta a recusar a oferta da casa que pouco antes - quando ainda acreditava ser um gesto voluntário - a deixara "emocionada".

De fato, Edivaldo, conhecido como "Piauí", carregador em entreposto de mercadorias na capital de São Paulo, reagiu absolutamente dentro do modelo cultural vigente. Na política, embora não só nela.

Indagado por qual razão resolvera abrir a residência para funcionar como comitê ao molde das "Casas de Marina" de 2010 (agora "Casas de Eduardo e Marina") perguntou se poderia responder a verdade. Encorajado, foi em frente: esperava engordar o orçamento da família.

A questão do voluntariado como ação política não lhe passa pela cabeça. Políticos querem o voto e para isso precisam dar algo em troca. Promessas? As pessoas estão cansadas de ouvir. Portanto, convém não perder a chance que faturar "unzinho" quando ela aparece.

Inadmissível, como qualificou a ex-senadora? Sem dúvida. Fora do modelo das casas-comitê, como uma maneira de doação popular, e distante do conceito da renovação das práticas da política que prega sua campanha? Totalmente.

Mas quem foi mesmo que avisou aos Edivaldos que a coisa ali seria diferente? Aliás, quem os ensinou ou deu exemplos de como seriam as novas regras? Com certeza absoluta não foi nenhum dos candidatos à Presidência nem os partidos envolvidos na disputa.

Ao contrário. Tudo o que fizeram foi se jogarem num festim licencioso chamado por algumas autoridades de apelidos vulgares que andam sendo repetidos por aí para denominar a salada indigesta de legendas País afora, a fim de formar as tais "alianças estratégicas".

Deram-se os braços jacarés e cobras d'água sem o menor constrangimento em troca de minutos, às vezes segundos, no horário eleitoral. O governo federal trocou ministro e não hesitou em "destrocar" diretor indicado por partido (PTB) que desistiu na última hora do apoio à presidente.

Diante disso e dos "milhõezinhos" gastos nas campanhas eleitorais, o "unzinho" de Edivaldo "Piauí", francamente, mostra que na escola onde só tem catedrático ele é calouro no pré-primário.

Não obstante a inexperiência e a falta de traquejo, nosso personagem resumiu num só vocábulo a razão pela qual há tanta dificuldade, se não mesmo uma impossibilidade, de se fazer uma reforma política de verdade.

Sem querer, matou a charada: O Brasil é a República do "unzinho". Todo mundo quer levar o seu e isso não leva o País a nada.

Intimidação. "Eu vou ter uma atitude bastante clara em relação ao banco", disse a presidente Dilma Rousseff durante a sabatina conjunta da Folha de S.Paulo, rádio Jovem Pan, portal UOL e SBT, na própria declaração se contradizendo ao não ser clara sobre qual atitude pretende tomar.

O jogo é de nítida intimidação. Primeiro sobre as consultorias de análise de risco da economia. Se cederem ao desejo do Planalto que evidentemente é que não tracem seus cenários, mais exigências virão na tentativa de alcançar outros setores com base na ameaça do uso da mão pesada do Estado.

Indispensável, pois, que não se perca de vista o seguinte: não é o governo quem determina o que é proibido ou permitido. É a Constituição do Brasil.

No artigo 5.º assegura a liberdade de expressão e no 37.º exige da administração pública o cumprimento da legalidade, da impessoalidade, da transparência e da impessoalidade.

Anomalias no caso Santander - FERNANDO RODRIGUES

FOLHA DE SP - 30/07


BRASÍLIA - Está quase tudo errado nesse episódio do Santander. Dilma Rousseff disse ser "lamentável" e "inadmissível" a análise que o banco espanhol enviou a seus clientes prevendo uma deterioração da economia se a petista se estabilizasse ou melhorasse sua posição nas pesquisas de intenção de voto.

É claro que há o direito sagrado à liberdade de expressão. Só que o próprio Santander parece ter uma visão oposta. Arrependeu-se, desculpou-se e demitiu o autor da análise anti-Dilma. Como bem escreveu ontem Clóvis Rossi, "é o clássico modelo de atirar pedras e esconder a mão".

Numa democracia, um banco tem o direito de reclamar em público da política econômica do governo. Nos EUA é assim. Instituições financeiras volta e meia dão opiniões fortes contra a administração federal. Mas talvez nenhum banco ousaria apenas imprimir uma análise no extrato bancário de seus clientes na esperança de que tudo ficasse encoberto.

Aí chega-se à reação despropositada do governo. A presidente da República fez uma ameaça velada ao Santander. Dilma deu a entender que está para aplicar algum castigo. É uma atitude quase medieval. Em vez de reclamar, o governo do PT poderia se preocupar em regulamentar mais o setor. Diferentemente do que propagam os agentes do mercado, falta muito para a fauna financista se comportar de maneira civilizada.

Por exemplo, publicar, como nos EUA, os salários dos principais operadores de empresas com ações em Bolsas de Valores. A regra foi tentada, parou na Justiça e o governo nunca moveu uma palha para destravar o problema. Seria pedagógico saber quais são os vencimentos e os bônus anuais dessa turma do retismo.

Por fim, tem a oposição. Reclamam (com razão) de Dilma querer surfar no episódio. Só que os candidatos anti-PT nada falam sobre como aperfeiçoar as regras de comportamento e de transparência do mercado. Seria esperar demais.

Negócios e ideologia juntos contra ortografia - JOSÉ NÊUMANNE

O ESTADÃO - 30/07


Está nas mãos do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Fux uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) em que sociedades civis de arrecadação de direitos autorais contestam a Lei 11.832, que, na opinião delas, autoriza o Estado a intervir numa atividade que é de exclusivo interesse privado. Antes de a Adin chegar a Fux, o presidente da Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal, Cyro Miranda (PSDB-GO), foi autorizado a criar um grupo de trabalho para apresentar uma proposta de aperfeiçoamento dos Acordos Ortográficos vigentes. De fato, são dois, pois a presidente Dilma Rousseff adiou a adoção do Acordo Ortográfico de Lisboa, assinado em 1990, do ano anteriormente previsto, 2013, para 2018, e permitindo que também se escreva da forma como se escrevia antes.

Paulista de São José do Rio Preto, o senador, empresário e ex-dirigente de Associações Comerciais, entrou na política seguindo no PL o ministro Guilherme Afif Domingos, secretário da Micro e Pequena Empresa. Eleito em 2010 pelo PSDB, tornou-se conhecido como líder de um grupo que se opôs à extinção dos 13.º e 14.º salários para senadores. Ficou famosa sua frase segundo a qual sentia pena de quem dependia de vencimentos de R$ 19 mil mensais com a estrutura de que dispõe o Senado. E foi uma das cabeças do movimento para convencer a presidente a adiar para as calendas a substituição das antigas regras da ortografia pelas previstas na reforma.

Gaúcha de Lagoa Vermelha, repórter de economia de origem e ex-chefe da sucursal de Brasília da Rede Brasil Sul (RBS), da família Sirotsky, filiada à Rede Globo, a senadora Ana Amélia Lemos, eleita pelo PP de Paulo Maluf numa coligação com os tucanos, tornou-se uma fiel escudeira do senador. Nem Miranda nem Lemos tiveram veleidades em autoria literária, linguística ou no ensino do português. Mas adotaram as ideias do professor Ernani Pimentel, que promove na internet pelo site Simplificando a Ortografia um abaixo-assinado a favor de suas propostas.

Ernani Pimentel, fundador do movimento Acordar Melhor, atua de forma prolífica e polêmica na internet, dizendo-se professor de português há mais de 50 anos, linguista, autor e conferencista. Mas ainda não se deu ao trabalho de informar aos militantes pela ortografia simples, tema do livro que também promove, onde se formou, onde se doutorou e onde dá aulas. Nas entrevistas que deu ao astro da TV Globo Jô Soares e a telejornais como Bom dia DF e em seus manifestos contra a reforma proposta pelos parceiros lusófonos, o guru de Miranda e Lemos não perde tempo dando sugestões para simplificar a ortografia. Ele prefere palavras de ordem do tipo "simplificar a ortografia é promover a inclusão social".

Conforme nosso editorial A ortografia no Senado no sábado (página A3), "ele promove um abaixo-assinado pela 'racionalização e simplificação da ortografia', sem especificar, no entanto, o que deseja mudar. Especifica, no entanto, postular uma redução de carga horária de aulas de ortografia. Segundo o professor, hoje são ministradas 400 horas/aula desde o início do fundamental até o fim do ensino médio, e ele deseja que sejam utilizadas em torno de 150 horas". O Google, principal instrumento de difusão de suas ideias, não é pródigo em dados a respeito de sua vida. Nem sequer lhe foi dedicado um perfil de Wikipedia.

Nos textos publicados por Ernani Pimentel em jornais como o Correio Braziliense, pode-se concluir que o mestre do guru dos senadores é o linguista Marcos Bagno. Este, sim, é conhecido e seu livro, Preconceito linguístico, é debatido seriamente no meio acadêmico. Trata-se de uma espécie de bíblia de extremistas de esquerda que consideram os cânones gramaticais expressões da cultura do opressor, pois a língua deve ser um organismo vivo, alterado a bel prazer de quem a fala, o povo em casa e na rua, e não engessada por escritores, críticos e professores.

A ortografia pode ser, de fato, de interesse negocial. A decisão de Dilma de gerar o caos permitindo conviverem a ortografia que se usava e a que resultou da reforma aceita pelos países lusófonos com aval de suas academias de letras criou um paralelismo indesejável em que se vendem dicionários, vocabulários, livros didáticos e de ficção com as duas formas de escrever. É possível que o adiamento do que tinha sido combinado da adoção da nova ortografia tenha, então, interferido na economia popular, por forçar a família pobre a adquirir material escolar novo e desnecessário. Há quem discorde, por isso, da reforma. É o caso do autor destas linhas.

Isso não quer dizer, contudo, que o Senado - cujo presidente, o peemedebista alagoano Renan Calheiros, também não é um reconhecido cultor da "última flor do Lácio, inculta e bela" - possa arvorar-se a mandar reduzir as horas de aula da ortografia e submeter a língua escrita a caprichos ideológicos ou de "mestres" de currículo ignoto. A conexão entre negócios pouco claros e interesses ideológicos é óbvia no caso. O que se consegue reduzindo horário de aulas de ortografia e abolindo o conceito de erro no uso da língua escrita é o contrário do que se prega. Os populistas que querem acabar com o analfabetismo simplificando a forma de escrever (como se isso tivesse que ver com aprender a ler e compreender o que foi lido) são, de fato, elitistas fascistoides que promovem a interdição da norma culta, ou seja, dos tesouros literários, a quem tem dificuldade para aprender a ler e entender.

Isso é similar ao neocoronelismo de quem, a pretexto de baratear as obras negando o porcentual a pagar a quem as cria, quer eliminar os direitos autorais, praticados desde o século 18, quando as Revoluções Americana e Francesa consagraram os direitos humanos. Nos dois casos, nega-se ao pobre o direito de saber para ascender social, econômica e politicamente. Para evitar tal ignomínia a lei dá à Academia Brasileira de Letras o encargo de guardiã do vernáculo.


Cacoete autoritário limita análises econômicas - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 30/07


Reação violenta de Dilma, PT e Lula à análise do Santander sobre pesquisas eleitorais lembra críticas à imprensa no mensalão e levará bancos a praticar a autocensura



Podia-se creditar apenas ao estado de nervos no núcleo da campanha da presidente Dilma a reação violenta dela, do seu partido e do ex-presidente Lula à análise feita para clientes preferenciais do banco Santander em que altas da Bovespa são relacionadas a pesquisas eleitorais negativas para o projeto da reeleição.

Para o PT, segundo seu presidente, Rui Falcão, tratou-se de “terrorismo eleitoral”. A própria Dilma considerou “inadmissível para qualquer país”, disse em sabatina na “Folha de S.Paulo”, a interferência do mercado financeiro no processo eleitoral. Já Lula, em um evento na CUT, pediu a demissão da analista responsável pelo texto. Talvez seja o primeiro político de origem no sindicalismo a defender publicamente a demissão de um assalariado.

Mas a explicação para reação tão violenta não é conjuntural. O vozerio petista tem a ver com o cacoete autoritário de frações hegemônicas no partido contra a liberdade de expressão. Mesmo de departamentos de análise de instituições financeiras, as quais, daqui para frente, praticarão a autocensura, como foi obrigada a fazer a imprensa durante a ditadura militar. Talvez este seja o objetivo da resposta petista em uníssono.

A imprensa profissional conhece esta reação típica petista diante de informações que não agradem o partido. Foi assim no escândalo do mensalão, em cujo início o próprio presidente Lula pediu desculpas ao país. Logo depois, ele e partido passaram a negar o malfeito e a acusar a divulgação dos fatos como parte de um projeto “golpista”. O Santander, grupo financeiro espanhol, sabe agora o que significa contrariar o PT. O presidente mundial do banco, Emilio Botín, por coincidência em viagem ao Brasil, acompanha de perto a pedagógica experiência.

Para azar do banco espanhol, no Brasil, em que o Estado tem grande ingerência na economia, o setor financeiro é particularmente vulnerável à ação regulatória dos governos. A mudança de uma resolução do Banco Central, numa penada, pode produzir milhões: em lucros ou prejuízos.

Entende-se, portanto, que mesmo campanhas publicitárias de grandes conglomerados financeiros privados reproduzam um certo ufanismo nacionalista típico da visão que o Planalto tem do país nesses tempos eleitorais. O que aconteceu na Copa do Mundo foi típico.

Em alguma medida, o Brasil de Dilma lembrou a Argentina de Cristina Kirchner. Lá, quando a economia estava subordinada ao truculento secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, escritórios de consultoria que divulgassem estimativas independentes da inflação eram punidos com pesadas multas. Moreno e Casa Rosada queriam impedir comparações com a inflação oficial, manipulada.

O Brasil, felizmente, devido a suas instituições, está muito distante da Argentina kirchnerista. Mas os governos têm cacoetes muito parecidos.

Mau humor na economia - EDITORIALO ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 30/07


Se o mau humor do empresário prejudica o desempenho da economia, todos os brasileiros têm mais um forte motivo para se preocupar - no caso do governo, um motivo eleitoral. O Índice de Confiança da Indústria (ICI) caiu em julho pela sétima vez consecutiva e chegou ao menor nível desde abril de 2009, segundo informou ontem a Fundação Getúlio Vargas (FGV). Foi mais uma confirmação de um estado de espírito dos mais sombrios. No dia 18, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) havia divulgado seu Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei), também apurado em julho. Foi o menor valor da série iniciada em janeiro de 1999.

O leitor pode escolher a série de sua preferência. Estenderá a comparação até janeiro de 1999, momento de uma grave crise cambial, ou abril de 2009, quando o Brasil começava a sair de uma recessão iniciada no mundo rico, no ano anterior, com o estouro de uma bolha financeira. A escolha é livre, mas a conclusão é inescapável: depois de mais um semestre muito ruim, os dirigentes da indústria ainda esperam dificuldades até o fim do ano.

Com mais um semestre de estagnação, a presidente Dilma Rousseff completará quatro anos de um mandato desastroso para a atividade industrial. Segundo a última sondagem da FGV, o Índice de Confiança da Indústria caiu 3,2% de junho para julho e chegou a 84,4 pontos. Esse indicador varia de zero a 200 e valores acima de 100 apontam expectativa de melhoras. A média histórica dos últimos cinco anos é 105,2, na série com ajuste sazonal. Mas até o ligeiro otimismo apontado por esse número já sumiu há muito tempo. Em todos os meses desde agosto do ano passado o ICI ficou abaixo de 100.

Dois componentes entram na formação desse indicador: um Índice de Situação Atual (ISA) e um Índice de Expectativas (IE). O primeiro caiu de 90,1 pontos em junho para 85,8 em julho. O outro, já abaixo de 100 em julho do ano passado, recuou de 84,4 para 82,9 na apuração recém-divulgada.

"O resultado de julho acende uma luz amarela em relação ao terceiro trimestre", comentou o pesquisador Aloísio Campelo Jr., superintendente adjunto de Ciclos Econômicos da FGV. A demanda, segundo ele, continua sendo um entrave importante ao crescimento e foi o fator de maior peso para a piora da avaliação do quadro atual.

Ainda sobrou um leve sinal positivo, de 105,4 pontos, no quesito "tendência dos negócios nos próximos seis meses", mas esse componente também piorou, com queda de 7,6% em relação ao nível de junho. No conjunto, o Índice de Expectativas ficou na área negativa (82,9%), com redução de 16,35% desde julho do ano anterior, na série com ajuste sazonal.

As sondagens da FGV e da CNI sobre a confiança dos dirigentes de indústrias combinam com o cenário geral das projeções econômicas.

Na pesquisa Focus, realizada semanalmente no mercado pelo Banco Central (BC), a mediana das projeções de crescimento econômico chegou a 0,9% na sexta-feira passada. O mesmo levantamento apontou a expectativa de contração de 1,15% do produto industrial. Na última semana, a CNI publicou suas novas estimativas dos principais indicadores econômicos. O novo quadro inclui crescimento de apenas 1% do Produto Interno Bruto (PIB), expectativa pouco melhor que a apurada na pesquisa Focus, e contração de 0,5% do produto industrial. O Ministério do Planejamento cortou de 2,5% para 1,8% sua projeção de aumento do PIB.

O mau humor também chegou ao comércio. Em julho o indicador de confiança dos comerciantes da cidade de São Paulo passou para o terreno negativo. Caiu 2,5%, chegou a 98,6 pontos e ficou 5,4% abaixo do nível de julho de 2013. A informação foi divulgada ainda na terça-feira pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo. Inflação alta, vendas em queda e juros elevados são as causas principais do pessimismo, segundo a assessoria econômica da entidade. Como explicar a coincidência de tantas projeções ruins? Por suas declarações, a presidente Dilma Rousseff ainda se recusa a reconhecer uma economia emperrada e com problemas graves.

Malabarismo eleitoral - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 30/07


Em sabatina, presidente Dilma Rousseff recorre a contorcionismos para comentar ações de seu governo no campo econômico


Se candidatos de oposição evitam anunciar as medidas impopulares que pretendem adotar a fim de mudar os rumos da economia brasileira, a presidente Dilma Rousseff (PT), buscando ser reconduzida ao cargo, faz malabarismo para defender uma gestão considerada ótima ou boa por somente um terço dos eleitores.

Foi assim na sabatina de que participou na segunda-feira, realizada no Palácio da Alvorada por esta Folha, pelo portal UOL, pelo SBT e pela rádio Jovem Pan. Seus principais adversários na disputa presidencial, Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB), foram entrevistados duas semanas atrás.

Ao comentar a situação econômica atual, Dilma afirmou haver "no Brasil um jogo de pessimismo inadmissível". Comparando as críticas dirigidas ao governo federal com as expectativas que antecederam a Copa do Mundo, disse ser muito grave esse tipo de "especulação contra o país".

O contorcionismo é evidente. Há, como as pesquisas de opinião mostram de forma exaustiva, pouca confiança em relação ao futuro próximo da economia. Não se trata de um "jogo", mas de pessimismo genuíno da população, decerto apreensiva com as mesmas condições observadas pelos analistas.

São reais, e não mera "especulação", os índices pífios de crescimento do país nos últimos anos, ou nos primeiros meses deste 2014. Os preços também avançam de forma concreta, algo que todos percebem em qualquer ida ao mercado.

Em levantamento feito pelo Datafolha semanas atrás, 58% dos entrevistados disseram esperar alta da inflação, ao passo que somente 8% apostaram na sua diminuição.

Não se restringiram à esfera econômica as tentativas de Dilma de dourar a pílula do governo. Ao mencionar as trocas no comando do Ministério dos Transportes, realizadas a pedido do PR --a quem cabe a pasta na coalizão governista--, a presidente afirmou não ter se sentido chantageada no caso.

Sua explicação, no entanto, desafia a lógica, assim como o próprio episódio. Paulo Sérgio Passos assumiu o ministério em 2011, após denúncias de corrupção na pasta. Em 2013, o PR pediu que César Borges ocupasse o cargo. Como ele teria deixado de representar os interesses da sigla, Passos retornou ao posto em junho deste ano.

Tendo os dois em alta conta, segundo afirma, Dilma Rousseff não vê problemas nesse emaranhado. Seria errado, insiste, se pusesse no cargo "uma pessoa na qual eu não confio e [que] não conheço".

Talvez o mantra venha a calhar em outubro deste ano, quando eleitores precisarão optar por candidatos cada vez mais escondidos sob o verniz da publicidade.

Política de subsídios não rende benefícios esperados - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 30/07


O programa de incentivos à aviação comercial regional, necessária ao país, já nasceu com dúvidas e críticas à sua eficácia por incluir rotas já existentes


Um país com dimensões continentais, com um agronegócio em franca ascensão, precisa de fato dar mais atenção à aviação regional. Para isso, são necessários investimentos na infraestrutura aeroportuária e estímulos para que companhias aéreas constituam frotas apropriadas ao atendimento das rotas que aproximem a cidades do interior dos grandes centros.

O governo federal acaba de baixar uma medida provisória (de número 652) com esse intuito, mas o programa já nasce com distorções. É que cem rotas existentes, muitas das quais rentáveis, também serão alvo do programa, e, nesse caso, o governo deverá subsidiar quem não precisa.

Incentivos fiscais e proteção temporária a setores nascentes são políticas admitidas nos acordos internacionais de livre comércio. Sem algum tipo de estímulo fiscal, regiões pouco desenvolvidas têm dificuldades de romper barreiras que as separam do progresso.

Mas a questão no Brasil é que os subsídios se tornaram o principal instrumento do governo federal para dar impulso a segmentos ou a empresas sem que os benefícios para o conjunto da sociedade sejam visíveis.

Por pressão da opinião pública e do próprio Congresso, o governo passou a explicitar o custo fiscal de alguns programas. Nessas contas agora aparecem a diferença entre os juros subsidiados de financiamentos do BNDES e os rendimentos dos títulos do Tesouro que lastreiam essas operações. Em face dessa diferença, o governo contraiu enorme dívida com o banco estatal, que já anda na casa das centenas de bilhões.

As chamadas desonerações tributárias também atingiram o patamar de dezenas de bilhões. Setores e empresas foram favorecidas, e nem por isso a indústria como todo e o conjunto da economia se tornaram mais competitivas. Ao contrário, essa política de favorecimentos fez com a dívida bruta do setor público voltasse a crescer, comprometendo um dos fundamentos que vinham servindo de alicerce para recuperação da economia brasileira.

Essa expansão da dívida bruta ampliou a necessidade de maiores superávits primários nas finanças governamentais. Mas essas ficaram debilitadas pelas políticas de desonerações e subsídios, que não redundaram em crescimento da economia e da arrecadação tributária. Tal dificuldade se refletiu nas expectativas dos mercados, antes positivas, e que passaram a ser negativas em relação ao futuro próximo.

Por essa razão, um programa necessário, como o da aviação comercial regional, dá seus primeiros passos cercado de desconfianças. Se tivesse havido um maior empenho em prol de uma reforma tributária mais ampla, talvez essas questões não estivessem mais sendo discutidas.

Cidadão comum paga mais caro - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 30/07


A inflação em alta não é um problema menor, como pensaram muitos economistas do governo ao dar corda para uma de suas causas mais importantes: o aumento do gasto público, refletido na necessidade de arranjos contábeis para diminuir a má impressão do balanço fiscal. No papel de contribuinte ou de consumidor, o cidadão comum sempre acaba ficando com a pior parte.

Ontem, o Banco Central (não se trata, portanto, de um pessimista qualquer) deu mais uma notícia ruim. Os juros do crédito para as pessoas físicas subiram em junho pelo sexto mês seguido. Passaram para 43% ao ano, uma alta de 0,5 ponto percentual sobre os 42,5% que eram cobrados em maio. É a mais alta em três anos. O aumento ocorreu justamente em uma passagem de mês sem elevação da taxa básica de juros (Selic) pelo BC, que a manteve em 11%. E mais: também em junho, a inadimplência (um dos fatores que pesam na definição das taxas de juros na ponta do tomador) tinha parado de subir, registrando pequeno recuo de 0,2 ponto percentual em relação ao mês anterior.

O que, então, teria levado os bancos a aumentar o spread? (diferença entre o que os bancos pagam pelo dinheiro dos investidores e o que cobram dos que tomam empréstimos e financiamentos). A primeira referência continua sendo a Selic. Ou seja, o custo do dinheiro para o tomador, principalmente a pessoa física, ainda passa por processo de acomodação, resultante do aperto na política monetária, que, em 12 meses, empurrou escada acima a taxa de 7,25% ao ano para a atual, de 11%.

Mas não é só isso. Tão perversa quanto a inflação em alta (em junho, enquanto o BC mantinha a Selic, o IPCA havia ultrapassado o teto de 6,5% da meta prevista para 2014) é a queda na confiança de que o governo - e não só o Banco Central - vai agir para conter a corrida dos preços. Além do dever de casa atrasado com a administração do orçamento fiscal, convém lembrar que há impactos na energia elétrica e na gasolina acomodados sob o tapete de um tempo que já dura mais do que deveria.

E a inflação alta, com perspectiva de continuar como está, sinaliza que mais apertos monetários poderão vir, o que pesa nos contratos de juros, que agora são firmados, para durar um ano ou mais. É certo que nada disso encobre ou perdoa o oportunismo dos bancos, que se aproveitam do cenário de incertezas para aumentar suas margens de ganho. Mas não foram eles que sujaram a água.

O outro lado da moeda dos juros altos provocados pela necessidade de conter a inflação é a contenção do consumo, quando o consumidor é prudente, ou o aumento da inadimplência, quando é inconsequente. Um esfria a economia, o outro provoca mais aumento nos juros. Ambos acabam participando do movimento de retração que resulta no baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e, num segundo estágio, na redução do emprego e da renda. A continuidade ou a mudança dessa situação é a cobrança que não pode faltar aos candidatos ao próximo mandato presidencial.

A reorganização do futebol - EDITORIAL ZERO HORA

ZERO HORA - 30/07


A estrutura arcaica do futebol brasileiro, que compromete a gestão de clubes e federações e praticamente todas as atividades ligadas ao esporte, está sob pressão dos maiores interessados em mudanças. Os atletas são os líderes de um movimento nacional contra a precariedade das administrações, as falhas nos calendários de competições e o desprezo até mesmo por direitos trabalhistas. Mas suas atitudes, que em síntese pregam a democratização do futebol, não são de interesse apenas dos diretamente envolvidos nas questões em debate. São do interesse da sociedade e de todos os que sustentam o futebol como entretenimento, como paixão e como patrimônio cultural do país.
Todos arcam com os custos da incompetência, mantida invariavelmente por dirigentes que se perpetuam nas entidades, repetindo erros, acumulando dívidas e maltratando o mais popular dos esportes. Nesse contexto, é inaceitável que o débito total dos clubes com o setor público tenha chegado a fantásticos R$ 4 bilhões. É uma conta paga pela população, pois os danos são compartilhados entre todos. Os clubes devem impostos, recolhimentos previdenciários, Fundo de Garantia e outras contribuições, como se fizessem parte de um grupo protegido pela impunidade. A irresponsabilidade, agora denunciada com ênfase pelo Bom Senso Futebol Clube, vem fragilizando as entidades e suas relações com atletas, torcedores, patrocinadores e comunidades.
Não há como confiar em clubes que mantêm, em alguns casos por décadas, os mesmos dirigentes. Estes mandatários, por sua vez, são os que eternizam os mesmos nomes no comando de federações regionais e da CBF. É ilusório pensar que os desmandos daí decorrentes prejudicam apenas o futebol. A desorganização, muitas vezes sob a suspeita de irregularidades graves, conspira contra os interesses do público, das empresas e das instituições que sustentam, de alguma forma, as atividades esportivas.
Também é enganoso almejar mudanças a partir das federações e da confederação nacional. As transformações, que poderão desencadear reformas nas estruturas da ponta da pirâmide, devem começar pela base, pelos clubes de todas as divisões, que são o verdadeiro patrimônio do futebol. São os clubes que investem na formação de jogadores, nas categorias de base, e tentam preservar vínculos com torcedores. A maioria depende agora da solução de questões imediatas, como a renegociação das dívidas com o governo, desde que se submetam também a obrigações.
Entidades que não cumprirem exigências elementares da boa gestão devem ser responsabilizadas. É a vez de também os mantenedores do futebol se submeterem a penalidades impostas a qualquer atividade. A democratização, que exige igualmente maior participação dos associados dos clubes nas decisões, além de reformas nos critérios de escolha dos dirigentes da CBF, poderá finalmente sepultar um corporativo, que busca muito mais a perpetuação de poder nas entidades do que a prosperidade do futebol.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

“Se juntar todos eles, não dá uma pessoa tão honesta que nem eu”
Ex-presidente Lula, comparando a sua honestidade com a dos membros da oposição


JANOT OPERA PARA NOMEAR AMIGO

Procurador-geral da República, Rodrigo Janot opera, nos bastidores, para nomear Eugênio Aragão ministro do STF na vaga que será aberta com a aposentadoria de Joaquim Barbosa. Janot anda com prestígio em alta no Planalto após ter arquivado representação que pedia investigação do Conselho de Administração da Petrobras, chefiado pela presidente Dilma na compra superfaturada da velha refinaria de Pasadena (EUA), em 2006.

VAPT-VUPT

Logo que tomou posse na Procuradoria-Geral, Rodrigo Janot nomeou o amigo Eugênio Aragão no cargo de vice-procurador-geral eleitoral.

FEZ AQUELA MÉDIA

Foi bem visto por Dilma o recálculo sobre planos econômicos apresentado por Janot, que rasgou parecer de 2010 de Roberto Gurgel.

JUNTOS NA CAUSA

O parecer de Rodrigo Janot vai ao encontro da tese do governo, favorável aos bancos. O julgamento do caso no STF deve ficar para depois da eleição.

PRETERIDO

Eugênio Aragão, que circula bem entre núcleos petistas, já tentou virar ministro no Superior Tribunal de Justiça, mas acabou preterido para vaga.

DILMA TENTA SE DESCOLAR

O governo “plantou” nos jornais de ontem correção importante no seu discurso sobre o Oriente Médio: destacou que a presidente Dilma qualifica de “massacre” e não “genocídio” o que ocorre em Gaza, em razão da ofensiva israelense. Dilma isola e se descola do aspone lulista Marco Aurélio “Top-Top” Garcia – que usou a expressão “genocídio”, provocando reação de Israel e fazendo do Brasil motivo de chacota.

ANÃO É O ‘TOP-TOP’

O governo de Israel chutou o pau da barraca e chamou de “anã” a diplomacia brasileira por saber que “Top-Top” Garcia a lidera de fato.

VERGONHOSO

Estreito, atrasado, trapalhão, Marco Aurélio Garcia jamais foi diplomata, mas define a política externa desde o governo Lula.

MEDO CÚMPLICE

Subservientes, os diplomatas assistem Marco Aurélio Garcia esfacelar o prestígio construído pela Itamaraty ao longo de mais de cem anos.

USO DA MÁQUINA

A Coligação Muda Brasil representou no TSE contra a presidente Dilma por bate-papo com internautas sobre Mais Médicos no Facebook, em horário de expediente e feito do Palácio da Alvorada, com críticas a Aécio Neves.

QUEM SABE

O presidente do Conselho de Ética, Ricardo Izar (PSD-SP), que levou “bolo” ontem do deputado André Vargas, ainda tem esperanças em um depoimento do ex-petista: “Ele ainda pode depor a qualquer momento”.

HABEMUS PAPA

O papa Francisco, que apelou com veemência por paz no Oriente Médio, poderia tentar negociar com Israel e Hamas. Difícil, mas não impossível: com Lech Walesa, João Paulo II foi decisivo pra derrubar o Muro de Berlim.

FICHA-SUJA

O TRE-DF tem até 10 de agosto para responder pedido de impugnação, impetrado pelo PSOL, contra José Roberto Arruda, acusado na Operação Caixa de Pandora, da PF. A sigla exige aplicação da Lei da Ficha Limpa.

BRIGA ELEITORAL

No Amazonas, aliados do governador Omar Aziz (PSD) não desistiram de tentar retirar o adversário Francisco Praciano (PT) da disputa ao Senado. O petista foi o deputado mais votado do Estado nas eleições de 2010.

CONTRA BENESSES

O Comandante Adonis (PSD-RJ), mais conhecido por pilotar a aeronave na ação que matou o traficante “Matemático”, diz não ter se candidatado a deputado para obter vantagens: “Minha história está associada a trabalho e honra”.

CORRIDA DO CADEIRANTE

Apesar de anunciar agendamento de horário no site, a Shalom rádio-táxi, em Brasília, negou reserva para levar cadeirante ao hospital para consulta. Atendente disse que reserva é só para aeroporto e rodoviária.

DENÚNCIA

O MPF investiga a contratação pela Assembleia Legislativa, por dispensa de licitação, de veículos de comunicação que seriam vinculados a Edivan Amorim (PR), irmão do candidato ao governo Eduardo Amorim (PSC-SE).

POÇO DE MÁGOAS

Apesar do apoio de Luiz Fernando Pezão à reeleição da presidente Dilma, o PMDB no Rio de Janeiro garante que o rompimento com o PT é definitivo.


PODER SEM PUDOR

PALESTRANTE PROLIXO

Vice-governador de Pernambuco nos tempos da ditadura, Barreto Guimarães foi convidado a fazer um perfil de Duque de Caxias pelo Clube de Diretores Lojistas do Recife, que sempre homenageava o Exército Brasileiro na sua reunião na última semana de agosto. Advertido da prolixidade do convidado, o presidente da entidade cercou-se de cuidados: abriu a reunião cedo, aprovou os assuntos da pauta por silêncio dos presentes e dispensou a leitura da ata da reunião anterior.

E mandou servir o almoço assim que Guimarães começou a falar. Mas cometeu o erro de subestimar o apreço do palestrante pelos holofotes. Já estava sendo servido o cafezinho, quando o vice-governador parou, tomou um gole d'água e prosseguiu:

- E, então meus amigos, era Luiz Alves de Lima e Silva, alferes...

Neste dia, teve loja do comércio do Recife que só reabriu às 15h.