sexta-feira, abril 11, 2014

Oito anos de Mantega - ROGÉRIO L. FURQUIM WERNECK

O Estado de S.Paulo - 11/04

O ministro Guido Mantega completou oito anos de permanência na pasta da Fazenda. O fato enseja reflexões sobre o que ocorreu desde 2006, quando o ministro Antonio Palocci teve de ser substituído. Como foi possível que as oportunidades extraordinariamente promissoras, abertas no mandato inicial do presidente Lula, acabassem redundando em desempenho econômico tão lamentável como o que vem marcando o governo de Dilma Rousseff?

Na resposta a essa indagação, é importante focar no que interessa. Não faz sentido perder tempo com atribuição de culpa ao ministro Guido Mantega. É preciso ir mais fundo. E entender como o Planalto passou a se pautar por objetivos e critérios que permitiram que Mantega fosse mantido à frente do Ministério da Fazenda ao longo de três mandatos presidenciais.

No final de março de 2006, quando Lula teve de nomear um substituto para Palocci, seu governo atravessava um momento peculiar. A economia vinha tendo excelente desempenho. Mas o Planalto ainda estava às voltas com a crise do mensalão, que havia descabeçado o PT e deixado o governo vulnerável e extremamente fragilizado.

O objetivo central do presidente passara a ser conter o desgaste da crise e, com sorte, conseguir ser reeleito. Nesse quadro, seria certamente importante tirar o melhor proveito possível do bom desempenho que vinha tendo a política econômica. Mas sem esticar a corda mais do que o necessário. Em meio à adversidade, passara a ser fundamental manter o PT coeso e o Executivo pouco dependente do Congresso.

Foi nessas circunstâncias que Lula se permitiu uma extravagância. Tendo passado mais de três anos sob os rigores que lhe impunha o doutor Palocci, o presidente decidiu que já era tempo de nomear um ministro da Fazenda que jamais lhe dissesse não e lhe deixasse as mãos livres para cuidar da reeleição. O capricho não lhe parecia arriscado. O círculo virtuoso que lhe legara a boa gestão da política econômica parecia cada vez mais consolidado. Tudo que seria exigido do novo ministro era cuidar do piloto automático.

Na verdade, essa era a história que, na época, se contavam os mais otimistas, para tentar se convencer de que tal extravagância não passaria do final do primeiro mandato. Ledo engano. Para grande apreensão de quem quer que havia acompanhado sua trajetória, Mantega foi mantido no cargo no segundo mandato. Um Ministério da Fazenda fraco, tripulado por um ministro dócil e afinado com a ministra Dilma Rousseff havia se tornado um arranjo extremamente conveniente para a consolidação de uma inédita preponderância da Casa Civil na formulação e na condução da política econômica.

Na esteira do desmantelamento da equipe montada por Palocci, as ideias que haviam norteado a política econômica entre 2003 e 2005 passaram a ser frontalmente contestadas pela Casa Civil, coadjuvada pela Fazenda e pelo BNDES. O agravamento da crise econômica mundial, em 2008, foi o ensejo que faltava para que o governo desse outra orientação à política econômica, sob a bandeira de uma "nova matriz" desenvolvimentista.

Abertas as comportas do expansionismo fiscal, com a criação de um gigantesco orçamento paralelo no BNDES, o baque da economia em 2009 foi logo superado. O PIB cresceu nada menos que 7,5% em 2010, ainda que à custa de forte aceleração da inflação. E Dilma acabou eleita presidente.

A confirmação de Mantega como ministro da Fazenda do novo governo não chegou a surpreender. A mudança relevante deu-se em nível mais alto. A responsabilidade pela formulação e pela condução da política econômica, que antes cabia à ministra-chefe da Casa Civil, foi assumida pela própria presidente da República.

O desfecho dessa longa história é bem conhecido. Crescimento pífio, inflação estourando o teto da meta, contas públicas desacreditadas e grave desequilíbrio nas contas externas. Lula reclama de que "poderíamos estar melhor". Claro que sim. Mas agora é tarde. O País está colhendo o que Lula e Dilma plantaram nos últimos oito anos.

A inflação e o estrago - CELSO MING

O Estado de S.Paulo - 11/04

O Banco Central (BC) bem que gostaria de interromper o ciclo de alta dos juros, como transpareceu do texto da Ata do Copom, ontem divulgado. Mas terá de lidar com uma inflação ainda mais braba do que com aquela com que contava.

Também em dezembro, entendia que dava os trâmites por findos, mas vieram a estocada de janeiro e as seguintes. Por isso, prosseguiu com a alta dos juros básicos, ainda que a doses mais baixas, de 0,25 ponto porcentual por vez.

O BC foi surpreendido pela inflação de março. Tanto foi que seu presidente, Alexandre Tombini, se sentiu obrigado a dar entrevista ao Jornal Nacional mesmo antes da divulgação da Ata, coisa que nenhum diretor do BC faz regularmente. A Ata do Copom está ultrapassada pelos fatos.

À parte a virulência inesperada, o BC lida com três problemas. O primeiro é que desde abril de 2013 puxou os juros básicos em 3,75 pontos porcentuais ao ano e, no entanto, a inflação está nos mesmos níveis existentes no início do processo, o que espalha dúvidas sobre a eficácia da política monetária.

O segundo problema é que o governo não ajuda. Cerca de 25% dos preços dependem de aprovação prévia do governo - caso dos combustíveis, da energia elétrica e dos transportes urbanos - e, portanto, não são alcançados pela política de juros. Pior, quanto mais alta a inflação, mais o represamento dos preços administrados tende a provocar distorções e expectativas de remarcações no resto da economia. Como foi apontado na Coluna de ontem, em 12 meses os preços livres (os outros 75% dos preços) rodam a quase 7,0% enquanto os preços administrados estão a 3,4%.

O terceiro problema é que o BC não conta com outros instrumentos que poderiam ser acionados. Da política fiscal (controle das despesas públicas), que poderia ser um antídoto poderoso, não espera grande coisa porque, em fase eleitoral, o governo quer mais é gastar.

À falta de melhor discurso, Tombini fez coro ontem com as declarações do ministro da Fazenda, Guido Mantega: o de que as atuais estocadas são temporárias, porque provêm do choque de alimentos provocados pela seca. Isso não explica por que, dos nove grupos de preços que compõem a cesta de consumo, seis estouraram o teto da meta em 12 meses.

É verdade, o choque dos alimentos tem impacto temporário. O problema é que a economia brasileira está excessivamente exposta a choques, num ambiente global de inflação baixíssima. Há o choque da energia elétrica e, para junho, quando o impacto da alta de preços dos alimentos em consequência da seca poderá ter-se esgotado, já se prevê o impacto de alta devido ao aumento de demanda acionado pela Copa do Mundo. Em Copacabana, o Cornetto da Kibon já está sendo cobrado por R$ 15 e as passagens aéreas subiram 26,5% apenas em março.

E, fato curioso, no principal parágrafo da Ata (o de número 32) está dito que "na presença de níveis de confiança relativamente modestos, os efeitos das ações de política monetária tendem a ser potencializados". O BC parece festejar o baixo nível de confiança, na medida em que derruba a demanda, o investimento e a atividade econômica, o que ajuda a combater a inflação. Por essa lógica, se você quer derrubar a inflação, destrua o nível de confiança na economia.

Ele é o cara - ILIMAR FRANCO


O GLOBO - 11/04

A bancada do PT só vai decidir na semana que vem, mas o Planalto já está trabalhando para que o ex-líder da bancada José Guimarães (CE) seja o vice-presidente da Câmara, na vaga aberta com a renúncia de André Vargas (PR). São dois os argumentos usados em favor do petista: ele fez uma gestão ecumênica na liderança da Câmara e deu provas de elevada fidelidade ao Palácio.

Cartão de visita
O Planalto pediu que o Senado aprove o Marco Civil da Internet com urgência, para que a proposta já seja lei quando ocorrer o Encontro Multissetorial Global sobre o Futuro da Governança da Internet, dias 23 e 24, em São Paulo. Mas há senadores aliados protestando contra a pressa do governo. O relator do projeto na CCJ, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), reclama: "Acho profundamente injusto ser imputado ao Senado um prazo para que nós não exerçamos na plenitude, não o nosso direito, mas o nosso dever". Os senadores alegam que não são responsáveis pela demora da Câmara em decidir.


“PT e PSDB estão cada vez mais simbióticos! Aí está o Pimenta da Veiga, beneficiado pelo Marcos Valério do PT, dizendo que seu indiciamento pela PF é ‘eleitoral’. Igualzinho aos petistas em relação à Petrobras”
Chico Alencar, deputado federal (PSOL-RJ)


Bons cabritos
O ex-presidente Lula cobrou uma reação dos petistas diante da ofensiva da oposição. O ministro Guido Mantega (Fazenda) e o presidente do BC, Alexandre Tombini, deram sinal de vida direto da reunião do FMI, em Washington.

Fim do sonho
O ex-governador Sérgio Cabral e o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) não foram os únicos a ficar abalados com o ex-presidente Lula. Marcelo Crivella (PRB) e Anthony Garotinho (PR), candidatos ao governo, também não gostaram. Lula deu a entender, para os blogueiros, que fará campanha para o candidato do PT, Lindbergh Farias.

Bate-papo
Após o lançamento de sua chapa à Presidência, no final da tarde de segunda-feira, o socialista Eduardo Campos e a vice Marina Silva (Rede) vão ficar à disposição de internautas e das redes sociais para responder a perguntas.

Correndo contra o relógio
Enquanto Eduardo Campos (PSB) anuncia a chapa com Marina Silva em Brasília, a presidente Dilma vai ao Porto de Suape lançar ao oceano o navio Dragão do Mar. O governador João Lyra Neto (PSB) vai ter de escolher entre participar do evento da presidente ou do marcado por Campos.

Um novo round
Sobre sua ausência em programa de rádio, para tratar da legislação das drogas, o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) explica que "tentei remarcar o debate", pois ocorreu um conflito de agendas. E diz que não teme enfrentar esta discussão.

O resgate
Ao contrário de José Serra e Geraldo Alckmin, o candidato do PSDB ao Planalto, Aécio Neves, quer o ex-presidente Fernando Henrique na TV. No sábado, em inserção de 30 segundos, FH dirá que chegou a hora da mudança e da juventude.

O PMDB do Senado vai indicar um funcionário de carreira da Casa para a vaga do TCU que tinha como candidato o senador Gim Argello (PTB-DF).

Boca no trombone - VERA MAGALHÃES - PAINEL


FOLHA DE SP - 11/04

As reclamações de falta d'água que chegam à agência reguladora de saneamento de São Paulo cresceram 115% no primeiro bimestre em relação ao mesmo período de 2013. O dado contraria informação do governo do Estado de que as queixas à Sabesp permanecem estáveis. A Arsesp, instância alternativa para a comunicação de usuários, recebeu em janeiro e fevereiro deste ano 355 críticas sobre interrupção de abastecimento, contra 165 nos primeiros dois meses do ano passado.


Hedge A explicação de que as queixas se mantêm estáveis tem sido usada por Geraldo Alckmin (PSDB) para negar a existência de racionamento não assumido.


Contra Nem toda a cúpula do Palácio do Planalto gostou das três horas de entrevista de Lula a blogueiros. Os mais fiéis a Dilma Rousseff criticaram a exposição do ex-presidente, que teria atiçado a militância pelo seu retorno.


Pró Por outro lado, o governo já começou a seguir a sugestão do ex-presidente de ampliar os canais de comunicação com os eleitores. Ministros, entre eles Guido Mantega (Fazenda), vão aumentar o número de entrevistas para explicar ações da gestão.


Bê-a-bá A ida de Dilma a Porto Alegre hoje para participar da formatura de alunos do Pronatec visa aumentar a divulgação do programa de ensino técnico. Pesquisas revelaram que, apesar de ser uma das principais vitrines da campanha à reeleição, o programa é desconhecido.


Nitidez 
Sondagens qualitativas feitas pelo PT mostraram eficácia maior da propaganda de Aécio Neves (PSDB) que a de Eduardo Campos (PSB) no grupo de indecisos amplo (que inclui quem vota branco e nulo). O tucano foi mais identificado como de oposição ao governo federal.


Café com leite Aécio defendeu ontem em almoço com deputados tucanos paulistas que a convenção do PSDB para oficializar sua candidatura à Presidência aconteça em São Paulo.


É carioca O tucano desenhou também um quadro dos palanques no país. Disse ter certeza de que, ainda que o PMDB do Rio apoie Dilma formalmente, parte do partido estará com ele no Estado.


Caixa postal Nestor Cerveró cortou comunicação com a oposição. Tucanos acham que ele foi convencido a não depor na Câmara na próxima quarta-feira sobre a compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras.


Procuração Diante do sumiço, o líder do PSDB, Antônio Imbassahy (BA), quer que o Ministério da Justiça e a Procuradoria-Geral da República ouçam o ex-diretor.


A jato O PMDB levou menos de 24 horas após a desistência de Gim Argello (PTB) para indicar o consultor legislativo Bruno Dantas para o TCU. O nome foi sugerido em almoço com Dilma ontem.


Intensivo A maratona de contatos de Ricardo Berzoini com a base aliada fez com que se formasse até fila de espera na Secretaria de Relações Institucionais. Os encontros levam no máximo 30 minutos, sem prorrogação.


Pressão Parentes das vítimas do acidente da TAM de 2007 protocolaram na Justiça Federal parecer do criminalista Pierpaolo Bottini que reforça o pedido de condenação da ex-diretora da Anac Denise Abreu por dolo eventual.


Visita à Folha Marco Antonio Zago, reitor da Universidade de São Paulo, visitou ontem a Folha, onde foi recebido em almoço. Estava com Vahan Agopyan, vice-reitor, Margarida Kunsch, diretora da Escola de Comunicações e Artes, e José Coelho Sobrinho, professor da ECA.

com BRUNO BOGHOSSIAN e PAULO GAMA


tiroteio
"Enquanto uma dona de casa de Guarulhos tem água um dia sim, dois não, Alckmin aumenta em 22% o consumo de seu palácio."

DE EMÍDIO DE SOUZA, presidente estadual do PT-SP, sobre o aumento de uso de água no Palácio dos Bandeirantes em janeiro, durante crise de abastecimento.


contraponto
Milagre eleitoral


A deputada estadual Célia Leão (PSDB) chegou atrasada ao almoço oferecido pela bancada tucana ao presidenciável Aécio Neves, ontem em São Paulo.

Ela, que é paraplégica desde 1974 por causa de um acidente de carro, se queixou das escadarias para alcançar o salão em que acontecia o encontro, no segundo andar de um restaurante nos Jardins.

Ao cumprimentar o tucano, relatou as dificuldades para subir ao local, mas emendou:

-- Não se preocupe, para ver o presidente eu até ando se for preciso!

De rounds e bodes - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 11/04

Aliados da presidente Dilma Rousseff consideram que, apesar dos pesares, ela venceu a primeira batalha sobre a CPI da Petrobras. Mal ou bem, ainda que a comissão seja instalada, tudo ficou para depois da semana santa. O tempo que o governo queria, conseguiu. De quebra, o fato de André Vargas sair de cena e o enterro da indicação de Gim Argello para o Tribunal de Contas da União (TCU) servirão para que o governo agora venha com tudo no sentido de enterrar qualquer investigação congressual sobre as denúncias envolvendo a megaestatal do petróleo. Falta combinar com os fatos.

Reforço…
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, designou mais três procuradores para a força-tarefa encarregada de preparar a denúncia contra os envolvidos na Operação Lava-Jato, que chamuscou o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, o doleiro Alberto Youssef e derreteu o mandato do deputado André Vargas (PT-PR). Conclusão dos congressistas: se há seis procuradores trabalhando nisso, sinal de que a lista do doleiro é extensa.

…Providencial
O MPF deve ter mesmo muito trabalho. As investigações anteriores sobre Alberto Youssef indicam que a especialidade do doleiro é esquentar dinheiro desviado do setor público. O setor privado entrava apenas como coadjuvante.

Mata ou empurra
Quem conhece a ministra do Supremo Tribunal Federal Rosa Maria Weber usa uma expressão que ficou famosa durante o processo do mensalão para se referir à possibilidade de a ministra julgar os recursos sobre as CPIs em favor do governo: “Ela não é de matar os processos no peito”. O mais provável é que leve o caso para decisão do plenário.

De grão em grão…
Os tucanos comemoraram o ingresso do PMDB da Bahia na campanha da oposição já de olho em outros estados que podem tirar os peemedebistas do palanque de Dilma Rousseff. O próximo alvo agora é o PMDB do Rio de Janeiro.

O berço da campanha
Aécio Neves tem ido pelo menos uma vez por semana a São Paulo. Eduardo Campos, depois do lançamento em Brasília e uma palestra no Rio, fará um périplo pelo interior do estado. Sem um candidato da terra da garoa na disputa presidencial, cada voto ali será disputado com toda a garra daqui até outubro.

Pausa pré-eleitoral I/ O governador do Ceará, Cid Gomes (foto), tirou uns dias de férias, enquanto seu irmão, o secretário Ciro Gomes, levou a matriarca da família para uma viagem à Rússia. O perigo é o senador Eunício Oliveira, candidato a governador, e o deputado José Guimarães, pré-candidato ao Senado, se acertarem até a volta da dupla.

Pausa pré-eleitoral II/ Dilma Rousseff pode se preparar para — o que tudo indica — uma Páscoa tranquila. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, vai à China com um grupo de parlamentares. Na comitiva, está o líder do PMDB, Eduardo Cunha.

Esforço, onde?/ Os parlamentares garantiam na semana passada que esta que está chegando ao fim seria de esforço concentrado em Brasília para acelerar as votações. Segunda
foi fraco e ontem estava um quase deserto, igual a todas as demais quintas-feiras. Conclusão: se esse
foi o esforço, vale o bordão: “Imagina
na Copa!”

Vai que é tua/ Antes de assumir a relatoria do processo contra André Vargas (PT-PR) no Conselho de Ética, o deputado Júlio Delgado consultou o PSB. Recebeu sinal verde de
Eduardo Campos.

Passou recibo/ O fato de Dilma Rousseff marcar uma visita a Pernambuco no mesmo dia em que Eduardo Campos e Marina Silva selam a chapa em Brasília foi visto como um sinal de que a candidatura do socialista preocupa.

Redução de energia - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 11/04

O governo convocou ontem uma reunião de todas as autoridades do setor elétrico para discutir a crise. Eles avaliaram o cenário de ter que iniciar ao final de abril uma campanha de restrição voluntária de consumo de energia, com foco no setor industrial. O ONS orientou formalmente as empresas hidrelétricas para desligarem as turbinas à noite para poupar água nos reservatórios.

Apesar de o governo continuar negando que haja crise de abastecimento, ela tem se agravado. O ONS havia dito em fevereiro que o nível dos reservatórios do Sudeste tinha que estar, ao final de abril, em 43% para evitar o risco de racionamento. Agora, informou que chegará ao final do mês em 36,5%. Ou seja, ficará abaixo do que ele mesmo havia dito que era o limite de segurança. Foi por causa desse número que a reunião foi convocada e foram contatadas empresas eletrointensivas.

Algumas hidrelétricas do sistema Eletrobrás estão seguindo a determinação de desligar as turbinas à noite e liga-las de manhã. Ainda que este seja um procedimento que ocorre de vez em quando, não deve ser feito com essa periodicidade diária. Por isso, a Cemig negociou com o ONS para não ter que cumprir essa determinação. O risco de queima de turbina é muito grande. Outro problema que pode decorrer desse liga-desliga é ambiental: em época de muita produção de peixe, eles acabam se aproximando de área na qual não chegariam se a turbina estivesse ligada. Quando as máquinas são religadas aumenta muito a morte de peixes.

O nível de água na hidrelétrica de Três Marias ficará, segundo as projeções, bem abaixo do ponto a que chegou no pior momento do racionamento de 2001. A projeção é que em setembro pode chegar a 3,5% do volume útil, o que levaria a empresa a ter que desligar as máquinas. Em 2001, chegou a 8,5%.

Há quem diga no setor que Três Marias terá mesmo que parar, desmontar as máquinas, para aumentar a vazão do rio para alimentar o reservatório de Sobradinho.

O governo tem tentado evitar qualquer campanha de redução de consumo para não dar o braço a torcer neste momento pré-eleitoral. O problema é que o nível dos reservatórios torna a cada dia mais difícil adiar alguma racionalização do consumo. A tendência é tentar esse caminho: redução voluntária e com foco no setor industrial, e, principalmente, das que mais consomem energia. Isso pouparia o consumidor e derrubaria ainda mais a indústria.

Se evitar o racionamento este ano com medidas como essa, o país ainda assim chegará ao fim do ano com um nível tão baixo de água nos reservatórios que complicará o início do próximo governo. O grave problema financeiro das distribuidoras causado pelo custo da compra de energia no mercado livre e mais o custo das térmicas não se resolve com o empréstimo de R$ 11,2 bilhões que será tomado de um pool de bancos pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica. Para se ter um ideia, o Ebitda (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) somado de todas as distribuidoras é de R$ 10 bilhões. Toda a capacidade de geração de caixa das empresas não cobre sequer o preço da energia no mercado de curto prazo. E elas só estão comprando nesse mercado porque o governo geriu mal os leilões de venda e compra de energia, deixando parte das empresas “descontratadas”, como se diz no jargão do setor.

Um dia, todo esse custo será repassado para o consumidor, mas elas têm que carregar esse prejuízo até o repasse. Por isso o governo inventou essa fórmula tortuosa de repassar o dinheiro para elas via empréstimo tomado pela CCEE.

Tudo seria muito mais fácil se o governo tivesse admitido o problema em tempo, iniciado medidas de racionalização de consumo, campanhas de economia de energia. Em vez disso, o governo, para manter a quimera da energia barata como arma de campanha eleitoral, tem elevado os riscos de desabastecimento, e, principalmente, o custo da energia. O governo tenta esconder o fato de que é o consumidor quem vai pagar a conta quando passar o período eleitoral, mas esse já é um segredo de polichinelo.

A falta de chuva foi apenas um dos componentes dessa crise. Ela foi em grande parte causada por erros cometidos pelo governo no gerenciamento do setor elétrico.

O doleiro e o deputado nas asas da corrupção - ROBERTO FREIRE

BRASIL ECONÔMICO - 11/04


A sociedade brasileira mal consegue se atualizar diante da avalanche de denúncias envolvendo a Petrobras, com novidades estarrecedoras dia após dia, e o PT já protagoniza mais um escândalo que atinge o centro do poder. O personagem da vez é o deputado André Vargas, vice-presidente do Congresso e integrante da ala mais ligada a Lula. As conexões criminosas do parlamentar com o doleiro Alberto Youssef, preso pela Polícia Federal na Operação Lava-Jato, tinham como objetivo assegurar a "independência financeira" da dupla às custas dos cofres públicos.

Foi o que revelaram interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça. As relações promíscuas entre Vargas e seu comparsa, detido por participar de um esquema de lavagem de dinheiro que teria movimentado R$ 10 bilhões em operações suspeitas, foram desvendadas a partir da revelação de que o deputado viajou com familiares em um avião particular fretado por Youssef ao custo de R$ 100 mil.

A troca de favores chegaria ao Ministério da Saúde, onde o congressista atuou a serviço do doleiro. Dono de uma empresa de fachada denominada Labogen Química Fina e Biotecnologia e registrada no nome de um "laranja", Youssef se aproveitou do prestígio do amigo no PT e obteve um contrato milionário para o fornecimento de um remédio. Com capital social de R$ 28 mil e folha de pagamentos de R$ 30mil, a Labogen fechou um acordo que poderia chegar a R$150 milhões, dos quais R$ 31 milhões já haviam sido firmados por meio de um vínculo assinado pelo então ministro da Saúde, Alexandre Padilha.

O que chama a atenção é o fato de o ministério ter feito a negociação com um mero intermediário, e não diretamente com o produtor, abrindo brechas para a falcatrua e o ilícito. Trata-se do mesmo Padilha que, em vídeo que circula pela internet, pediu votos a Vargas quando o deputado se candidatou à reeleição para a Câmara Federal. Apoiado por Lula e Dilma, que fincaram na Prefeitura de São Paulo o "poste" Fernando Haddad, o ex-ministro que assinou o contrato sem sequer consultar a ficha cadastral da Labogen será o candidato do PT ao governo paulista. Ao contrário do que os petistas querem fazer crer, Vargas não era um militante qualquer no partido.

Ex-secretário nacional de Comunicação da legenda e entusiasta declarado do famigerado "controle social da mídia", o vice-presidente da Câmara se notabilizou pelo apoio aos mensaleiros condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em fevereiro, durante a sessão de abertura do ano legislativo, o petista provocou o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, ao erguer os braços, de punhos cerrados, como fizeram seus correligionários no momento em que foram presos. O gesto foi historicamente utilizado como símbolo de resistência política das esquerdas durante todo o século XX, mas acabou enxovalhado pelo PT.

Baseadas no Regimento Interno da Câmara, as oposições apresentaram um requerimento ao Conselho de Ética alegando quebra do decoro parlamentar e pedindo punição a André Vargas. A relação indecorosa entre o deputado petista e o doleiro, com a chancela do Ministério da Saúde, é apenas mais um caso de corrupção que se soma ao extenso rol de ilegalidades cometidas nos tempos de Lula e Dilma. Os 12 anos de governo mostraram ao país que o PT não respeita as instituições republicanas e prioriza seus negócios escusos em detrimento dos reais interesses do Estado.

GOSTOSA


Registro de um retrocesso - CLAUDIA SAFATLE

VALOR ECONÔMICO - 11/04

Defesa do controle da mídia fere imagem de Lula


O que mais impactou empresários que nutrem simpatia pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e compartilham do coro "Volta Lula", na entrevista que ele deu para um grupo de blogueiros que apoiam o governo, na terça feira, foi a forma dura e insistente com que o ex-presidente defendeu o controle da imprensa. "Perdemos um tempo precioso e não fizemos o marco regulatório da comunicação nesse país", disse Lula. "Temos que retomar com muita força essa questão da regulação dos meios de comunicação do país. O tratamento à Dilma é de falta de respeito e de compromisso com a verdade", completou, deixando claro que advoga a censura de conteúdo.

A perplexidade pode ser conferida em uma reunião habitual na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), no dia seguinte à entrevista. Segundo relato de um dos presentes, "a entrevista causou mal-estar". Até então se imaginava que a discussão sobre instrumentos de controle da mídia fosse somente uma proposta de um ou dois assessores do ex-presidente. "Mas não, é do Lula!", disse.

No Congresso, o divulgador da ideia que agora passou a ser vista como uma medida de força que conta com o apoio do ex-presidente, era o deputado André Vargas (PT-PR) que, por força de denúncia de corrupção, renunciou ao cargo de vice-presidente da Câmara.

Não foi só pelo ataque frontal que o ex-presidente fez à mídia que a entrevista "assustou" mas, também, pelo fato de que Lula "mostrou que fechou os olhos: não há Petrobras e não houve o mensalão", comentou a fonte.

Na tentativa de compreender os reais motivos que o estimularam a subir o tom da defesa do controle do que é divulgado pela meios de comunicação, concluiu-se que pode ter sido um "erro grosseiro" do ex-presidente que, no entanto, é capaz de criar uma resistência não desprezível "junto a pessoas que estão com ele".

Não é segredo que parte do setor privado é contra a reeleição de Dilma Rousseff e torce para que Lula se coloque como candidato ao Palácio do Planalto este ano.

Logo no início da entrevista de mais de três horas aos blogueiros, ele disse: "Acho que os meios de comunicação no Brasil pioraram do ponto de vista da liberdade, do ponto de vista da neutralidade e agora que vocês [os blogs] tão fortemente conquistaram a neutralidade da internet, têm que começar a campanha para conquistar a neutralidade dos meios de comunicação para eles pelo menos serem verdadeiros. Podem ser contra ou a favor, mas que a verdade prevaleça".

Como exemplo de supostas inverdades, o ex-presidente citou: "Vejo alguns números colocados por pessoas da Petrobras e os números colocados pela imprensa e eles não batem entre si", referindo-se aos dados divulgados sobre a compra da refinaria de Pasadena, no Texas, em uma operação muito controversa e obscura da estatal brasileira. "Estamos sendo conduzidos por uma massa feroz de informações deformadas", acusou o ex-presidente.

No decorrer da entrevista ele voltou ao tema e aumentou os decibéis. "No fundo, no fundo, e vocês todos são pessoas informadas, a imprensa construiu quase que o resultado desse julgamento [do mensalão]. Eu me pergunto como é possível uma CPI que começou investigando o desvio de R$ 3 mil em uma empresa pública [os Correios ], que era dirigida pelo PMDB e que investigava um cara do PTB, terminou no PT? É indescritível!".

Alguns minutos depois, retomou o assunto: "Espero que a história do mensalão seja recontada nesse país e, se eu puder, vou ajudar a reconta-la. Como uma CPI que começou por causa de R$ 3 mil nos Correios terminou no mensalão? Temos que mostrar qual foi o papel da imprensa!". Antes de encerrar, disse: "O mensalão foi o mais forte processo político desse país em que a imprensa teve papel de condenação explícita antes de cada sessão, de cada ato" E concluiu: "Nunca vi nada igual! O massacre era apoteótico!"

Dilma Rousseff, tão logo assumiu a Presidência, em janeiro de 2011, deixou claro que não apoiaria a ideia de um março regulatório da mídia que assessores do ex-presidente deixaram como herança para o novo governo. Dilma foi firme ao negar seu apoio à proposta: "Devemos preferir o som das vozes críticas da imprensa livre ao silêncio das ditaduras".

As críticas à condução da economia que os meios de comunicação veiculam também seriam, em boa parte, fruto de "notícias deformadas", na visão de Lula. Ele contou que em 2007, em um encontro com Mário Soares, ouviu deste que não estava entendendo o que estava acontecendo no Brasil. Com uma pilha de jornais e revistas do exterior debaixo do braço, o ex-presidente de Portugal disse: "Os jornais do mundo dizem que o Brasil é coqueluche, um país extraordinário, e nos jornais brasileiros vejo que o país está acabado!".

Lula convocou Dilma e todos os ministros a partirem para a ofensiva, irem para cima. "Hoje a gente não está só, a gente tem a internet. Cadê o blog da Petrobras que foi tão importante na CPI de 2009?". Ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que deu um conselho: "Guido, você tem que ter uma equipe de alerta. Saiu uma mentira, você tem que falar, usar o direito de resposta". Ele ressaltou alguns bons indicadores econômicos do país - reservas cambiais, a dívida líquida e bruta que diz não serem altas, o aumento da classe média, o crescimento que não é tão ruim. Mas, nesse caso, admitiu: "Poderíamos estar melhor e a Dilma vai ter que dizer isso na campanha, como é que a gente vai melhorar a economia".

Se o ex-presidente pretendeu colocar um freio de arrumação no governo e na campanha de Dilma, os excessos do seu discurso vistos até por alguns de seus colaboradores pode ter fragilizado sua intervenção.

O fato de ele dizer que "a Dilma é minha candidata" pesou pouco para os que estão convencidos de que ela pode perder a reeleição e não vislumbram saída para Lula senão lançar-se em sua própria campanha. Para uma fatia de representantes do setor privado que o apoia, a entrevista de Lula aos blogueiros teria mostrado o retrocesso de um personagem que despertou para a política e para a história impulsionado pela cobertura da imprensa e por mais de uma vez se considerou "um produto da imprensa".

A derrota de Dilma e o Corisco - REINALDO AZEVEDO

FOLHA DE SP- 11/04

É o regime democrático que legitima Lula, não é Lula que legitima o regime democrático 

Alguns números da pesquisa Datafolha acenam com a possibilidade de derrota de Dilma. Nem tanto porque o eleitorado já descobriu a oposição, mas porque ainda não a descobriu. Só 1% dos entrevistados desconhecem Dilma --índice que chega a 25% com Aécio e a 42% com Eduardo Campos. Conhecem a presidente "muito bem" 57% --mas só 17% dizem o mesmo do tucano e 8% do peessebista. Não obstante, a rejeição ao trio é de 33%. É óbvio: muitos não votam em Dilma porque sabem quem é ela. Outros tantos não votam em Aécio e Campos porque não sabem quem são eles. E há 72% que querem um governo diferente deste que aí está. Os números perturbaram mais os "Teóricos da Metafísica do Corisco" do que os petistas. 

Quem são esses? É aquela gente que recita a música de Sérgio Ricardo de "Deus e o Diabo na Terra do Sol", de Glauber Rocha: "Mais fortes são os poderes do povo", atribuindo a Lula e a seu PT o monopólio da representação popular. Tais analistas ainda não entenderam --ou a repudiam-- a essência do regime democrático, que não se desdobra numa única direção nem num único sentido. Ao contrário: onde quer que a democracia tenha se fortalecido, o poder é pendular, ora pra lá, ora pra cá, em modelos, na prática, bipartidários. A eventual derrota de Dilma não implica uma regressão. O resultado, qualquer que seja ele, se garantidas as regras, fortalece o regime que permite a disputa e que, ora vejam!, forneceu ao PT as condições para derrotar seus adversários em 2002. O aspecto mais virtuoso de uma eleição é a conservação das instituições, não a agenda vitoriosa. Pinta-se um poste para que ele possa ser velho, não para que pareça novo. É Chesterton, não Azevedo. 

Mas quê... Bastou o fantasma da derrota assaltar a "Metafísica do Corisco", e começou o coro "volta, Lula!". Rui Falcão fez duas ameaças a Dilma. Indagado sobre a irreversibilidade da sua candidatura, mandou ver: "Irreversível, só a morte". Toc, toc, toc. Se a Soberana quiser, tenho arruda aqui. Deve pôr um galhinho atrás da orelha e rezar três ave-marias. A presidente, que já chamou Nossa Senhora de "deusa" --pondo fim ao monoteísmo cristão--, não vai repudiar a heterodoxia. A gente também é meio macumbeiro, né? Em entrevista à Folha, o mesmo Falcão falcoou: "Mas a candidata continua liderando, continua ganhando no primeiro turno, por que você vai mudar?". Ele estabeleceu as condições para que continue candidata.

Lula, claro!, está mais assanhado do que lambari na sanga. Em entrevista à autointitulada, e sincera, categoria dos "blogueiros sujos", avisou que não será candidato, o que corresponde a dizer que o seria se quisesse. Dilma é o estorvo tolerado pela gerência. Um dos, vá lá, entrevistadores ainda sugeriu que, só para confundir os adversários, ele não fizesse tal anúncio: "Deixa eles pensarem...". Seguidores são sempre mais estúpidos do que seu líder. Os abduzidos, na hipótese de que não sejam sicários, são úteis porque, ao emprestar à causa as suas certezas absolutas, podem fazer o trabalho sujo como se fosse missão. A crença cega é a morte da convicção. 

Lula volte a disputar se quiser --o problema seria o que fazer com o cadáver adiado de Dilma, para juntar (Deus me perdoe!) Falcão com Fernando Pessoa. O que acho asquerosa é a ilação de que pleito sem ele não é verdadeiramente democrático. Nos meus estudos sobre o regime militar, esbarrei na pena de então solertes defensores da ditadura --e hoje não menos solertes teóricos do "corisquismo"-- a justificar assim o Ato Institucional nº 1, de 9 de abril de 1964, que cassava mandatos e suspendia direitos políticos por até dez anos: era "a revolução que legitimava o Parlamento, e não o Parlamento, a revolução". É plágio do Marx de "O 18 Brumário", mas tudo bem. 

Pois é... Cinquenta anos depois, em abril de 2014, chega a ser escandaloso ter de lembrar que é a democracia que legitima Lula, não Lula, a democracia.

Marcadas para morrer - DORA KRAMER

O Estado de S.Paulo - 11/04

Para que serve a política? Entre outras finalidades, para dirimir conflitos, construir consensos, acomodar interesses antagônicos, fazer valer a vontade da maioria respeitados os direitos da minoria.

Grosso modo, nessa dinâmica funcionam os coletivos políticos: partidos, diretórios, Assembleias, Congresso Nacional. O exercício da mediação é da natureza da atividade. Pois o nosso Poder Legislativo não só perdeu a capacidade de mediar a si como já não consegue exercer as suas prerrogativas nem firmar a própria autonomia. Transferiu essa função ao Poder Judiciário.

E o faz repetidas vezes, ainda que, quando lhe convém, inverta o raciocínio para reclamar a invasão e usurpação de poderes pelo Judiciário. Logo ele, que não age de ofício. Só pode atuar quando provocado a se manifestar sobre a constitucionalidade de leis ou vácuos legislativos criados pela omissão do Parlamento.

Temos agora de novo em tela um caso típico na proposital barafunda instalada em torno das investigações sobre negócios nebulosos da Petrobrás. A oposição conseguiu assinaturas na forma da lei para investigar irregularidades na compra da refinaria de Pasadena, pagamento de propina a funcionários da estatal por uma offshore holandesa e superfaturamento da construção da refinaria Abreu e Lima.

A situação revidou propondo incluir na pauta da CPI investigações sobre formação de cartel na aquisição de trens do Metrô em São Paulo e irregularidades no Porto de Suape em Pernambuco. Dona da maioria e da presidência do Senado, a bancada governista reinterpretou de forma marota uma antiga decisão do Supremo Tribunal Federal e validou a CPI múltipla.

Muito bem. Oposição e situação recorreram ao STF, quando poderiam solucionar a questão com honestidade, apreço às prerrogativas legislativas, respeito à própria autonomia e reverência à Constituição.

Na Carta de 1988 está escrito que as CPIs se instalam mediante a assinatura de um terço dos deputados ou senadores. Um terço, e não a maioria. A ideia do legislador foi garantir o direito da minoria. A manobra do governo, para a qual se pede o aval do Supremo, caso seja aceita, põe por terra esse princípio.

Pelo seguinte: se a maioria pode incluir qualquer assunto na pauta de uma CPI proposta pela minoria, ela também deixará de investigar o tema ou temas que foram objeto do pedido original, pois terá número suficiente para conduzir os trabalhos como bem lhe convier. Isso quer dizer, de maneira a criar desconfortos à minoria e levar conforto à maioria. Para sempre.

Desse modo não se extinguem apenas as CPIs. Mata-se junto uma parte da política.

Assim é. No oficial reina a paz e a unidade na seara tucana. No paralelo, a avaliação da direção nacional é a de que, se Aécio Neves depender do empenho do governador Geraldo Alckmin, ficará no ora veja em São Paulo.

Conhecedora do estilo autocentrado do governador, a cúpula já havia decidido que a campanha teria coordenação própria independente da estrutura estadual.

Tudo é possível. Nada decidido, mas o zum-zum do momento é a articulação da candidatura de José Serra ao Senado por São Paulo.

Para concorrer a uma cadeira pelo Rio, o PSDB examina com interesse o nome de Ellen Gracie, ex-ministra do Supremo Tribunal Federal.

Sobre a vaga de vice na chapa presidencial, a decisão será tomada aos 45 do segundo tempo. Em data próxima à da convenção de junho, a fim de captar os últimos movimentos do cenário político e adaptá-los à escolha.

Em português claro: com a queda da presidente Dilma nas pesquisas os tucanos voltaram a incluir no radar todas as hipóteses de coligações, inclusive com o PMDB.

Em nome dos partidos - LUIZ GARCIA

O GLOBO - 11/04

O poder, aqui e alhures, oferece tentações irresistíveis para políticos e administradores de caráter frágil


Está feia a coisa em Brasília. Não é a primeira vez, neste governo e em outros que o antecederam. O poder, aqui e alhures, oferece tentações irresistíveis para políticos e administradores de caráter frágil. Quando isso acontece, é de se esperar que os partidos vítimas dessa fragilidade protejam sua reputação e seus futuros mandatos fazendo o que fazem, por exemplo, os empresários que desejam manter a confiança de seus fregueses. É simples, pelo menos em princípio: basta botar na rua os ladravazes — uma definição antiga e um tanto fora de moda. Ela identifica corruptos contumazes e de grande apetite.

No escândalo mais recente em Brasília, o comando do PT pressionou o deputado André Vargas a renunciar ao cargo de vice-presidente da Câmara. Ele é acusado de cumplicidade com o doleiro Alberto Youssef em negócios altamente suspeitos no Ministério da Saúde. A Justiça Federal no Paraná, onde eles agiram, decidiu enviar ao Supremo Tribunal Federal (STF) documentos da Polícia Federal que citam Vargas no âmbito da Operação Lava-Jato.

Porta-vozes do PT dizem que Vargas agiu por conta própria. E teria sido também sua a decisão de se licenciar. Em vista do peso das acusações, não ficará nada mal para o partido agir por conta própria, tomando a iniciativa ouvir o deputado sobre as acusações. É o que já foi decidido, embora porta-vozes do partido tenham insistido, formalmente, em afirmar que ainda trabalham com a ressalva de que ainda exista a obrigatória (formalmente, pelo menos) presunção de sua inocência.

Em todo esse lamentável episódio existe uma lição para o PT e outros partidos. Trata-se da necessidade de manter o respeito do eleitorado através da exigência — a sério e permanente — de bom comportamento de seus filiados, não apenas no exercício de mandatos eletivos, mas também no seu trabalho em cargos públicos.

Melhor teria feito o PT (e os outros partidos também) se assumisse uma certa responsabilidade sobre o comportamento de seus membros em cargos públicos — que eles exercem, não se pode esquecer, em nome de suas legendas.

Semana de renúncias - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 11/04

BRASÍLIA - Como diz o ditado, "é melhor prevenir do que remediar".

Ele cai perfeitamente no caso da indicação do senador Gim Argello (PTB-DF) para o Tribunal de Contas da União (TCU), que fiscaliza gastos.

Cai bem igualmente no caso do deputado licenciado André Vargas (PT-PR), que, flagrado voando em avião de doleiro preso e trocando mensagens comprometedoras com ele, vive aquele primeiro momento de autoengano, imaginando ainda possível manter o mandato.

Argello era o homem errado, na hora errada e no cargo errado. Seus próprios pares no Senado lhe impuseram uma derrota constrangedora, negando regime de urgência, direto no plenário e sem sabatina, para a votação de sua indicação para o TCU. Depois, os que seriam seus futuros pares no tribunal autorizaram o presidente, Augusto Nardes, a ameaçar publicamente vetar o seu nome.

Condenado em primeira e segunda instâncias no DF, Argello responde a seis inquéritos (ele diz que são "só" quatro) no Supremo tribunal Federal por uma fileira de crimes, desde peculato até corrupção passiva e ativa. Como frisou Nardes, entre os requisitos para ser ministro do TCU incluem-se "idoneidade moral e reputação ilibada". Seria o caso?

Quanto a Vargas: desconhecido até virar vice-presidente da Câmara, ele deveria ter sido menos impetuoso quando desacatou o presidente do STF, com o punho cerrado, dentro do plenário. Como deveria ter sido mais pudico nas relações com um doleiro bastante conhecido e diante de propostas heterodoxas envolvendo o Ministério da Saúde e de promessas de "independência financeira".

Sem saída, Argello renunciou à indicação para o TCU e Vargas, à vice-presidência da Câmara. Um vai descolar uma candidatura no DF, o outro vai sangrar em praça pública até largar o osso do mandato.

Para prevenir esses vexames, basta escolher ministros do TCU e vice-presidentes da Câmara idôneos e de reputação ilibada. Será tão difícil?

O mundo fragmentado - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 11/04
As comemorações pelos 80 anos do filósofo e pensador da contemporaneidade Sérgio Paulo Rouanet reuniram no Rio, na Academia Brasileira de Letras e na Universidade Candido Mendes, uma série de intelectuais brasileiros e estrangeiros para três dias de debates. A maratona teve início na terça-feira, com uma conversa entre o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o ex-ministro da Cultura no Museu de Arte do Rio (MAR).
Fernando Henrique destacou a capacidade de Rouanet de mobilizar pelo convencimento, pelo diálogo, o que hoje em dia não é trivial . Definindo-o como um democrata , que acredita na razão, no diálogo, Fernando Henrique não deixou de lado o polemista Rouanet, que não quer destruir o antagonista, faz uma crítica para esclarecer, para iluminar .

Na análise de Fernando Henrique, vivemos num mundo em que a fragmentação predomina . A constatação é a de que há uma certa crise por toda parte da democracia representativa , e Fernando Henrique perguntou como é que vamos juntar o ´demos´ (povo) à ´res publica´ (coisa pública)? .

Como manter a soberania da vontade popular, que é essencial, e ao mesmo tempo garantir que as instituições funcionem? . Nessa era de muita incerteza em que vivemos, entender o conhecimento, a liberdade, é mais pertinente que nunca, ressaltou o ex-presidente, destacando que a grande contribuição de Rouanet é exatamente essa, a de dar destaque à razão, à capacidade de se mudar pelo convencimento .

Como se pode exercer o pensamento crítico numa época em que as grandes narrativas estão num processo acelerado de derretimento, as certezas estão se desfazendo, o conhecimento é fragmentado e a indeterminação parece se inscrever na ordem natural das coisas?

Rouanet não concorda com a tese de que a pós-modernidade se definiria pelo eclipse das grandes narrativas. Algumas sobrevivem, lembrou, citando a grande narrativa da religião, que hoje em dia está mais fanaticamente virulenta do que nunca, com o fundamentalismo religioso . Outra grande narrativa que deveria ter desaparecido e não desapareceu, na opinião de Rouanet, é o nacionalismo extremo: Estamos vendo que o nacionalismo está de volta, a guerra da Crimeia está acontecendo de novo pelas mesmas razões: nacionalismos enraivecidos, nacionalismos rivais. Os conflitos da etnicidade estão em evidência pelo mundo .

Fernando Henrique considera que para quem atua politicamente como ele é preciso ter uma narrativa, você não dá sentido às coisas e não muda nada se não acrescentar valores à narrativa . Num mundo de consumismo, de predominância dos mercados, a existência de alguns valores é fundamental para que as coisas não se desagreguem, para que se possa ter uma vida associativa, afirmou o ex-presidente.

Fernando Henrique lembrou Max Weber (sociólogo e economista alemão), que, ao mesmo tempo em que formulou a ética da responsabilidade, formula também a ética das convicções, uma sem excluir a outra. Autonomia com responsabilidade, conciliar os dois conceitos , lembrou Rouanet.

No mundo atual, com a modificação tecnológica que permite o acesso direto da informação e de convocação, não estaríamos na prática resolvendo essa contradição, perguntou Fernando Henrique. Uma pessoa que está só em casa, mas se pertence a uma tribo da internet, está também em conjunto. Não se trata mais do individualismo antigo, as pessoas querem participar, não aceitam mais as formas atuais de participação por delegação, querem participação direta, mas estão isoladas. Não sei se está surgindo uma nova maneira de conciliação desses dois momentos .

Para Rouanet, a ideia da democracia mundial parece fundamental, e sem ela não existe possibilidade de democracia interna, que é prejudicada pela tirania particularista que existe em dois ou três países hegemônicos. Países totalmente democráticos são tiranos no plano internacional , afirmou Rouanet, numa crítica indireta aos Estados Unidos.

O homenageado lembrou que está havendo uma tendência na ciência política de substituir o termo governo mundial por governança mundial , que considera uma tarefa bem mais modesta e bem mais realizável. De uma certa maneira, o mercado leva a isso, comenta Fernando Henrique. A integração global que já aconteceu leva à necessidade de uma governança global, que ainda não conseguimos . Ele lembrou que, nessa última crise financeira, houve tentativas de conseguir regras mais firmes pelo menos de mercado, do sistema financeiro, mas se avançou muito pouco .

Câmara ardente - NELSON MOTTA

O ESTADÃO - 11/04

Entre os novos e honestos que entrarão na Casa, vários vão se corromper, mas quem acredita que algum dos velhos picaretas já instalados vai se regenerar?


A Câmara dos Deputados vai abrir concorrência para escolher uma agência de propaganda para identificar as causas do desgaste de sua imagem e melhorá-la com uma campanha publicitária de 10 milhões de reais. No país da piada pronta, seria só mais uma, se não fôssemos nós a pagar a conta desse deboche com o contribuinte e afronta à inteligência alheia. Nem 100 milhões de reais e Nizan Guanaes, Washington Olivetto e Duda Mendonça juntos fariam o milagre: a própria ideia da campanha suja ainda mais a imagem da Casa.

Logo em seguida ao anúncio ultrajante, como uma irônica resposta da realidade, foram ao ar o voo de 100 mil reais que um doleiro preso pela PF pagou para o então vice-presidente da Câmara, André Vargas, e as relações perigosas entre os dois. Apavorados com a contaminação, o Planalto, Lula e o PT já jogaram Vargas ao mar, outros partidos temem novos nomes, a manada entrou em pânico diante do perigo iminente. As eleições vêm aí e agora as cassações são por voto aberto. Quem condenará quem?

As ações e omissões de cada um numa eventual CPI-bomba, com televisão ao vivo, vão ser mais convincentes, para o bem e para o mal, do que qualquer campanha publicitária. O público acaba percebendo o que eles tentam esconder e as manobras para diluir as culpas, que, no fim, atingem toda a instituição. Mas terminar em pizza no meio da campanha vai ter um preço salgado para todos.

No que se refere, como diz a Dilma, à Câmara, a única certeza é a de Ulysses Guimarães: a próxima será pior. A matemática é triste: entre os novos e honestos que entrarão, vários vão se corromper pelo poder, pelos privilégios e pela vaidade, mas quem acredita que algum dos velhos picaretas já instalados vai se regenerar? Não por acaso, André Vargas estava se preparando para tomar a presidência da Câmara, o ex-presidente João Paulo Cunha está preso, e o próximo pode ser o deputado Eduardo Cunha.

Nossos 10 milhões de reais só vão melhorar a vida da agência de publicidade e piorar ainda mais a imagem da Câmara. Mas eles não ligam, repetem para nós o que o doleiro Youssef digitou a André Vargas: kkkkk.

Teflon inexpugnável - RUY CASTRO

FOLHA DE SP  - 11/04

RIO DE JANEIRO - Pelo que sei, quase todos os povos praticam a cerimônia do batismo. Supõe-se que a imersão do recém-nascido numa espécie de água benta o protegerá pela vida afora. Jesus Cristo, nas águas do rio Jordão, é o exemplo clássico. À falta de um rio nas proximidades do templo, quebra-se o galho simbolicamente numa bacia pouco maior que uma pia doméstica. O que importa é a água, que precisa ser santificada. Ou, à falta dela, alguma substância igualmente protetora.

O menino Lula, na distante Garanhuns (PE), em 1945, parece ter tido direito a um elemento especial em sua água de batismo: o teflon --nome comercial do politetrafluoretileno, substância química composta de resinas usada para impermeabilizar utensílios, principalmente panelas. Com o teflon, os resíduos de gordura, óleo e outras impurezas não pegam --lavou, está limpo. E é inofensiva ao corpo humano, tanto que entra na composição de próteses.

Lula, em seus dois governos, produziu uma coleção desses resíduos --alguns já tão remotos, arquivados ou esquecidos que só podem ser reconstituídos com a ajuda do Google. Exemplos: o caso Celso Daniel, a máfia dos Gafanhotos, o escândalo dos Frangos, o Renangate, o caso Waldomiro Diniz (ou escândalo dos Bingos), as acusações de corrupção contra vários de seus ministros, a crise dos Correios, o episódio dos dólares na cueca, a quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo, o escândalo dos Sanguessugas.

E mais a CPI das ONGs, as operações Confraria, Dominó, Saúva, Satiagraha, Furacão, Navalha e Xeque-Mate, os casos Kroll e Rosemary Noronha, o escândalo dos Aloprados e o dos Cartões Corporativos, e sem esquecer o mensalão. Nada disso pegou em Lula. O teflon com que foi batizado era de primeira.

Dilma, parece, não teve esse privilégio. Aliás, nem o fracasso de Dilma corrói o teflon de Lula.

Escolha viciada - EDITORIAL ZERO HORA

ZERO HORA - 11/04

O Congresso tem a chance de sepultar o sistema de conchavos, se adotar um novo modelo de indicação de ministros do TCU.


Os políticos e as instituições não podem desperdiçar as lições contidas na tentativa do senador Gim Argelo de se transformar em fiscalizador de atos do governo, enquanto responde a processos na Justiça. O senador do PTB do Distrito Federal sustentou por alguns dias a pretensão de virar ministro do Tribunal de Contas da União, patrocinada pelo Planalto e por parlamentares de partidos da base de sustentação do governo. Argelo é protagonista de mais um movimento constrangedor de ocupantes de cargos públicos. Seria acomodado numa função que exige habilitação comprovada e conduta moral inatacável. O senador não tem nem uma nem outra. E essas condições são essenciais aos integrantes da Corte, como observou o presidente do TCU, Augusto Nardes, ao fazer um apelo em defesa de candidatos à vaga que sejam reconhecidos pela idoneidade e pela reputação ilibada.

A afronta representada pela candidatura do petebista tem origem num conluio da política. Argelo é governista no Senado, mas nas próximas eleições poderia ser aliado de um grupo que faz oposição ao Executivo no Distrito Federal. Para acomodar os interesses do PTB, em meio a uma reforma ministerial, o político ganharia como prêmio um cargo em que permaneceria, sem incômodos, até aposentar-se. O TCU se prestaria, assim, a uma troca de favores da politicagem miúda, abrigando uma figura cujo currículo está em total desacordo com as atribuições da instituição. O apadrinhado pelo Executivo responde no Supremo às acusações de peculato, lavagem de dinheiro, crime contra a lei de licitações, crime eleitoral e corrupção ativa.

Um órgão auxiliar do Congresso, com o dever de fiscalizar os atos do governo, não pode ter entre seus membros alguém sob investigação. A manobra foi tão desastrada, que a direção do Senado chegou a tentar evitar a sabatina do candidato e abreviar os trâmites de sua aprovação. Todo o processo de indicação conspirou contra esforços que o TCU vem fazendo, no sentido de se alinhar às instituições que se preocupam com a transparência de seus atos. É louvável, nesse sentido, que técnicos do próprio Tribunal tenham manifestado publicamente inconformidade com a tentativa de aprovação do nome de Argelo pelo Senado. E que integrantes do próprio Congresso expressem desconforto com a candidatura enfim fracassada.

É preciso, no entanto, que os próprios políticos façam mais do que se indignar. Dos nove conselheiros do TCU, seis são indicados pelo Congresso e três pelo Executivo. O aperfeiçoamento das escolhas depende de mudanças que podem ser iniciadas com o debate de duas propostas de emenda constitucional apresentadas ao Parlamento. Ambas defendem que os conselheiros sejam escolhidos por concurso público. São propostas que devem inspirar a adoção do mesmo critério também pelos tribunais de contas dos Estados, ainda constrangidos, a exemplo do que ocorre em Brasília, a acolher indicações meramente

Inflação e outros maus sinais - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 11/04

A preocupante alta dos preços de 0,92% em março, a maior variação mensal desde abril de 2003 captada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) - a medida oficial da inflação brasileira, calculada pelo IBGE -, é mais um dado entre os muitos aferidos nos últimos tempos que vão demolindo o cenário otimista montado pelo governo do PT para tentar convencer parte da população de que tudo vai bem na economia.

Embora não tenha citado números, o economista-chefe do Banco Mundial para a América Latina e Caribe, Augusto de la Torre, resumiu com precisão os problemas do País. O Brasil, disse ele, enfrenta uma "combinação difícil" de inflação alta e baixo crescimento. Para rompê-la, o governo deveria adotar uma política fiscal mais austera que abrisse espaço para o Banco Central reduzir a taxa de juros. Como não existem sinais críveis de que, nos próximos meses, o governo Dilma controlará com maior rigor seus gastos - especialmente sendo este um ano de eleição presidencial -, o melhor que os brasileiros podem esperar é que o quadro não piore até o fim do ano.

Não há, porém, nenhuma garantia de que, mesmo sendo essa uma expectativa medíocre, isso venha a ocorrer. Ao contrário, enquanto instituições internacionais e economistas não vinculados ao governo vão revendo para baixo a projeção já modesta (de no máximo 2%) para o crescimento da economia brasileira, a alta dos preços se acelera e se espalha para um grande número de produtos.

Em março, a seca em importantes regiões produtoras pressionou os preços de alimentos essenciais, como o tomate (alta de 32,85%), a batata-inglesa (35,05%), o feijão-carioca (11,81%) e as hortaliças e verduras (9,36%). É possível que a pressão se mantenha por algum tempo, com maior ou menor intensidade.

Mas o fato mais preocupante na variação dos preços no período de 12 meses até março é que a alta não se limita aos alimentos. Ela é generalizada. Dos nove grupos de itens que compõem o IPCA, pelo menos seis (alimentação e bebidas, habitação, artigos de residência, saúde e cuidados pessoais, despesas pessoais e educação) acumulam em 12 meses variação superior a 6,5%, que é o teto do generoso limite de tolerância da política de meta inflacionária.

O IPCA acumulado de 12 meses até março alcançou 6,15%, ainda dentro do limite de tolerância. Mas a persistência das pressões sobre diferentes grupos que compõem o IPCA e a eventual mudança de tendência de outros que até agora impediram alta mais acelerada do índice oficial sugerem dificuldades crescentes para manter a inflação dentro desse limite.

No mês passado, por exemplo, os serviços e bens cujos preços e tarifas são monitorados pelo governo, entre os quais o da energia elétrica, registraram deflação de 0,02%, um resultado notável se comparado à inflação mensal. Essa redução foi fortemente influenciada pela queda de 0,87% na conta de luz, resultante da redução de tributos como PIS/Pasep e Cofins. Mas, com o fracasso da política do governo Dilma de reduzir as tarifas à força e com o uso contínuo e prolongado das usinas termoelétricas - que produzem energia a um custo bem mais alto do que as hidrelétricas -, haverá necessidade de aumentos nos próximos meses.

Serão pressões adicionais sobre um índice já alto demais. Mesmo que, nos próximos meses, a alta mensal do IPCA se desacelere, é muito provável que a variação seja maior do que a registrada em igual período de 2013, o que deve resultar na aceleração do índice acumulado de 12 meses. Esse quadro pode mudar em novembro e, como a inflação de dezembro passado foi tão alta quando a de março, não é impossível que o índice de todo o ano fique dentro do limite de tolerância de 6,5%.

Será mais um resultado muito ruim, que se somará aos que o governo Dilma vem acumulando desde seu início (6,5% em 2011, 5,84% em 2012 e 5,91% em 2013). A manutenção de uma política fiscal frouxa pelo governo petista alimenta a inflação e exige uma política monetária mais dura, mas de limitada eficácia no combate à inflação no curto prazo, como mostram os dados do IBGE. É ruim para todos.

O naufrágio de Argello - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 11/04

O rolo compressor do Planalto e da base aliada para levar o senador ao TCU foi barrado pela oposição e pelo próprio presidente do tribunal


A mãe do ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos, até pode reunir todas as condições técnicas e morais para ocupar uma cadeira de ministra do Tribunal de Contas da União (TCU). Mas certamente não foram esses os atributos que levaram a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, em 2011, a garantir que o Senado elegesse a ex-deputada Ana Arraes para o elevado cargo. Embora com a biografia valorizada pelo fato de ser filha do lendário Miguel Arraes, mais contou a seu favor a oportunista opção de agradar a seu filho, dono de boa bancada do PSB, que precisava ser cooptada com firmeza pelo governo.

O caso de Ana Arraes é mero exemplo do método de aparelhamento político das instituições brasileiras utilizado costumeiramente pelo PT, e da desmoralização das instituições a que nos referíamos em nosso editorial de ontem. Uma nova tentativa do governo federal foi abortada na quarta-feira, quando naufragou a candidatura do senador Gim Argello (PTB-DF) a uma vaga no TCU, para fazer companhia a Ana Arraes.

Político sem votos, suplente do cassado senador Joaquim Roriz, Argello assumiu uma cadeira no Senado em 2007 – período em que viu aumentar a rica coleção de processos que contra ele correm no STF em razão de delitos como lavagem de dinheiro, crime eleitoral, corrupção ativa e peculato, entre outros não menos cabeludos. Agradá-lo presenteando-o com a vitaliciedade no TCU significaria, porém, manter a fidelidade do PTB à base parlamentar da presidente Dilma, à aliança para a sua reeleição e, sobretudo, à manutenção do poder pelo PT e seus companheiros. A vaga “pertencia” ao PMDB, mas a indicação de um petebista foi devidamente costurada entre o Planalto e o presidente do Senado, Renan Calheiros, em mais um episódio de sua subserviência ao Executivo federal.

Como se não bastasse querer levar ao TCU um candidato que obviamente desrespeitava os requisitos de idoneidade moral e reputação ilibada, senadores da base aliada ainda tentaram fazer com que a indicação de Argello fosse analisada com urgência, dispensando a sabatina que, embora não fosse obrigatória por não se tratar de candidato indicado pela Presidência da República, é procedimento muito aconselhável. Por apenas um voto (25 a 24), o requerimento de urgência foi derrotado no plenário, obrigando Argello a ser sabatinado pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado.

Desmoralizado pelos próprios colegas, e tendo de enfrentar na disputa pelo TCU um adversário de perfil técnico, lançado pela oposição, Argello renunciou à indicação, alegando que ela estava sendo “usada como instrumento de disputa política em ano eleitoral” (como se ninguém soubesse disso quando sua candidatura parecia inabalável). Colaborou para seu naufrágio a postura digna e elogiável do atual presidente do TCU, Augusto Nardes, que mandou um recado claro aos parlamentares: não empossaria Argello, ainda que seu nome fosse aprovado pelos senadores.

Enquanto isso, no Paraná, assistimos à volta do ex-deputado estadual Fabio Camargo ao Tribunal de Contas do Estado. Contra ele pesam as suspeitas, ainda sob exame na Justiça, de que foi beneficiário de tráfico de influência para obter a maioria dos votos da Assembleia Legislativa que o elegeu em julho do ano passado, desconhecendo ter ele poucos predicados para assumir a função. Ao contrário do caso de Argello, só a iniciativa de um concorrente inconformado que recorreu à Justiça visando afastar Camargo do TCE – intento que, até agora, teve sucesso apenas temporário – foi capaz de suplantar o silêncio de todas as vozes e as autoridades que poderiam ter evitado a ascensão do ex-deputado.

Nada garante que o auspicioso naufrágio de Argello tenha inaugurado um novo tempo no país. As forças que o queriam no TCU foram vencidas, mas seguem fortes, insistindo em práticas nas quais precisamos colocar um fim definitivo se o Brasil quiser de fato crescer em respeito às suas instituições, rumo a um futuro melhor – esperança que o Paraná também precisa alimentar.

A fraude que faltava - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo- 11/04

A próxima terça-feira pode ser decisiva para a batalha que governo e oposição travam no Senado em torno da amplitude da CPI da Petrobrás. Nesse dia, o mais tardar, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), se pronunciará sobre os dois mandados de segurança impetrados com 24 horas de diferença pelas partes em conflito. Rosa é relatora de ambos os recursos.

O da oposição, apresentado na terça-feira passada, visa a garantir o que entende ser o seu direito de não ter a sua proposta de CPI desfigurada com a inclusão de temas alheios a negócios suspeitos da estatal a contar de 2005. No ano seguinte, o seu Conselho de Administração, presidido pela então ministra Dilma Rousseff, autorizou a compra da Refinaria de Pasadena, cujos obscuros meandros motivaram a iniciativa oposicionista.

Os acréscimos contrabandeados pela base aliada tratam, de um lado, das denúncias de formação de cartel no setor metroferroviário em São Paulo e no Distrito Federal, em governos da oposição; de outro, das alegadas irregularidades em obras no Porto de Suape, em Pernambuco. No primeiro caso, a intenção é contaminar a campanha ao Planalto do senador Aécio Neves. No segundo, o alvo é o ex-governador Eduardo Campos, também pré-candidato à sucessão da presidente.

Já o PT bateu anteontem às portas do Supremo Tribunal para impedir a instalação da CPI exclusiva sobre a Petrobrás, alegando que contém "fatos indeterminados e desconexos". É uma referência à agregação ao caso de Pasadena das suspeitas de suborno de funcionários da petroleira por uma empresa holandesa, além de indícios de superfaturamento na construção de refinarias e da instalação de plataformas sem os devidos componentes de segurança.

Na mesma quarta-feira, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, dominada pelos governistas, aprovou a criação da CPI ônibus, com a qual o Planalto pretende melar a investigação desejada por seus adversários. Eles se retiraram da sessão para não compactuar com a manobra - cujo principal defensor na Casa é o seu presidente Renan Calheiros, do PMDB de Alagoas. "O que se está fazendo aqui", protestou o senador Randolfe Rodrigues, do PSOL do Amapá, "é um estupro do direito das minorias." Na terça-feira para a qual se espera a decisão da ministra Rosa Weber, a matéria irá a plenário.

Não surpreende que o governo tenha acionado o seu rolo compressor. Ninguém menos do que Dilma e o seu tutor Lula defendem a operação abafa. Ela, ao dizer que não recuará um milímetro do que chamou de "disputa política" com a oposição. Ele, ao incitar os seus a combater "com unhas e dentes" a CPI - como se ela se resumisse a uma jogada eleitoral e nada houvesse na caixa-preta da Petrobrás que justificasse uma devassa política.

Mas nem o duo petista foi tão longe - e tão baixo - como Renan. Na ânsia de fazer a sua parte na sabotagem do inquérito da Petrobrás, ele disse que nos anos 1990, ao endossar um parecer do então ministro Paulo Brossard, o STF "pacificou" o entendimento segundo o qual "novos fatos determinados podem ser incorporados ao rol inicial" de uma CPI. É mentira, apuraram os repórteres Andreza Matais e Ricardo Brito, deste jornal. Eles verificaram que a versão do senador deturpa a posição do ministro e altera o contexto em que foi tomada.

O que Brossard sustentou e a Corte aprovou por unanimidade foi que não se pode adicionar fatos novos ao pedido de uma CPI, mas apenas no seu decorrer - e se tiverem relação com o objeto inicial. "A investigação deve recair sobre um fato certo", disse Brossard ao Estado. "Não sobre dois, três temas. De forma alguma!" Portanto, temas distintos, como os dos trens paulistas e do porto pernambucano, teriam de gerar, cada um, a sua própria investigação. Nessa linha, o ex-presidente do STF Carlos Velloso, que participou daquele julgamento, aconselhou os governistas a requerer a sua própria CPI "e não se aboletar ao pedido alheio para fraudá-lo".

Já de Renan só se podia esperar que se aboletasse em manifestação alheia para fraudá-la.

O preocupante avanço da censura judicial - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 11/04

A liberdade de expressão e informação é avalizada pela Constituição, mas país vive anômala situação em que juízes não respeitam a Carta



O fim da censura, ainda no regime militar, e a garantia de liberdade de expressão explicitamente inscrita na Constituição, em 1988 são marcos fundamentais da redemocratização do país. Foram conquistas árduas, que custaram sacrifícios à sociedade. No caso específico do direito à livre manifestação, trata-se de fruto de longo processo, que só se completou bem depois da volta dos militares aos quartéis e da promulgação da Carta: como entulho herdado da ditadura, perdurou como espasmo do autoritarismo na legislação brasileira a Lei de Imprensa, permanente ameaça a jornalistas e veículos de comunicação, até ser enviada ao lixo pelo Supremo Tribunal Federal, em 2009.

O país consagra, portanto, esse princípio inerente ao estado democrático de direito. E, em comparação com outras nações do continente, onde agravos à liberdade de expressão têm sido praticados sistematicamente, o Brasil é um exemplo positivo. Mas essa confrontação, se nos coloca em patamar diverso de Estados com governos autoritários, como Argentina, Venezuela e outros, por outro mitiga uma realidade na qual o exercício do jornalismo profissional e responsável está sujeito a inaceitáveis trancos. Caso explícito do avanço da chamada censura judicial, em geral requerida por agentes públicos contra veículos de imprensa e jornalistas em todo o país.

Os inúmeros casos de proibição imposta à imprensa, uma anomalia num país em que a liberdade de expressão é abalizada pela Constituição, são preocupantes sinais de que tais ataques não re resumem a episódios isolados. O Poder Judiciário, quase como regra em sua primeira instância, tem colocado sob censura diversos veículos brasileiros. Há casos em que jornais são censurados em tribunais de pequenas causas, com três tipos de procedimentos, simultâneos: proibição de citar o nome de agentes públicos implicados em inquéritos, punição financeira até com sequestro de caixa e determinação de impedimento ao veículo punido de recorrer a tribunais superiores.

Caso notório de censura judicial atingiu o jornal “O Estado de S.Paulo”, proibido de publicar qualquer notícia sobre uma investigação da Polícia Federal envolvendo o empresário Fernando Sarney, filho do ex-presidente da República e senador José Sarney. Mas o tacão judicial, sob pretextos diversos, estendeu-se a outras publicações (“Gazeta do Povo”, do Paraná, “Século Diário”, do Espírito Santo, “Jornal Pessoal”, do Pará, além de casos em Mato Grosso, Amapá etc.). Uma preocupante evidência de que a própria Justiça desrespeita a Carta do país.

Neste sentido, é positiva a iniciativa de instituições como ONU, OEA, STF e CNJ de realizar, no Rio, importante debate sob o tema Liberdade de Expressão e Judiciário. É iniciativa bem-vinda para aparar arestas, devolver ao país a plena acepção do direito amplo e irrestrito à informação e restabelecer, em definitivo, o princípio constitucional segundo o qual a liberdade de expressão prescinde de regulamentação.

Populismo líquido - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 11/04
PSDB e PT, nos governos paulista e federal, assumem riscos em demasia para evitar medidas impopulares nas áreas de água e energia
A preponderância do ciclo eleitoral sobre a gestão da coisa pública deixará uma conta salgada para o contribuinte pagar a partir de 2015. Água e energia escorrem pelo ralo do populismo tarifário, que ignora até as leis da natureza.
O mais arraigado dos maus costumes políticos brasileiros --adiar decisões impopulares para não perder votos-- desconhece fronteiras partidárias. PSDB e PT, protagonistas da polarização que rege a vida nacional, têm os pés atolados no fundo dos reservatórios que seus governos deixaram secar.

É compreensível que o governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP), candidato à reeleição, relute em admitir a possibilidade de racionar a água na região metropolitana de São Paulo. Mais difícil de aceitar é a noção de que nada se deixou de fazer para prevenir a situação atual e de que toda a responsabilidade cabe à falta de chuvas.

Dilma Pena, presidente da Sabesp (companhia paulista de saneamento básico), não sem agressividade, diz que a empresa e o governo não descuraram do planejamento e atribui aos críticos falta de estudo e de informação.

Não é um bom argumento para explicar por que o nível da água no Sistema Cantareira, que abastece 8,8 milhões de pessoas na Grande São Paulo, se aproxima da marca de meros 12%, nunca antes atingida. Nem para o fato de que o aumento da produção de água tratada pela companhia tem ficado aquém do avanço do consumo na região.

Mais plausível é que o governo estadual, ao evitar elevar tarifas, venha impedindo a empresa de efetuar os investimentos necessários.

O paralelismo com a questão da energia elétrica, no âmbito do governo federal, salta aos olhos. Obcecada com a redução do custo da energia, a presidente Dilma Rousseff, também em busca da reeleição, desarranjou significativamente as finanças do setor.

Os preços alcançam patamar recorde no mercado livre. Caras e poluentes usinas termelétricas funcionam a todo vapor, há meses, quando deveriam ser uma reserva emergencial. Represas do Sudeste e do Centro-Oeste --as mais importantes do país-- podem recuar neste ano até o nível de 15,5%, também nunca antes alcançado.

Com isso, o rombo nas contas das distribuidoras anda pela casa dos R$ 12 bilhões e vai onerar as contas de luz de 2015 em diante.

Repete-se, assim, o erro já cometido com a Petrobras. Para conter artificialmente os índices de inflação, o Planalto represa os preços da gasolina. Com isso, incentiva seu consumo em detrimento do etanol e solapa a capacidade da empresa de investir no aumento da produção do pré-sal.

Não será a primeira nem a última vez que conveniências eleitorais ditam um curso insustentável para políticas públicas, como no caso do populismo cambial que ajudou a reeleger Fernando Henrique Cardoso em 1998. A diferença, neste 2014, é que nenhum governo tem o poder de fazer chover.

A guerra inglória pela imagem - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 11/04

O governo vai precisar de uma tropa muito esforçada, se quiser rebater ponto por ponto as más notícias embutidas nos relatórios semestrais apresentados nesta semana pelos departamentos especializados do FMI. O primeiro combatente a se apresentar em Washington, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, ficou na conversa de sempre da austeridade fiscal. Chegou a mencionar o fim das desonerações, como se isso alterasse profundamente a situação das contas públicas. Num arroubo de bravura, fez um comentário otimista sobre a inflação de março e citou uma pressão menor do custo dos alimentos. Foi desmentido em menos de 24 horas. O IPCA aumentou 0,92% em março e 6,15% em 12 meses e os preços dos alimentos subiram 1,92% no varejo, no mês.

O governo brasileiro tem-se mantido na defensiva, há mais de um ano, como se houvesse uma ação internacional organizada para manchar a imagem do País. O FMI tem sido alvo frequente da irritação governamental, assim como o Banco Mundial. Mas a conspiração imaginária é muito ampla. Envolve, por exemplo, o Fórum Econômico Mundial, com seus estudos sobre competitividade. O Brasil sempre aparece em má posição, normalmente por problemas associados a entraves criados pelo setor público. Tributação excessiva e errada, contas públicas em mau estado, insegurança jurídica e instabilidade de regras são mencionadas habitualmente.

O grupo dos inimigos incluiu também, nos últimos meses, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), por causa da inclusão do Brasil entre os países mais vulneráveis a mudanças nas finanças internacionais e nas condições de câmbio. Deve ser tudo combinado, porque são sempre os mesmos países que aparecem nos informes dos organismos multilaterais e nas avaliações de risco financeiro e vulnerabilidade fiscal. Também conspiram participantes de mercado, como a agência de classificação de risco Standard & Poor's.

A lista dos conspiradores foi ampliada, nos últimos anos, com a presença da OCDE, responsável pelos testes Pisa, um sistema de avaliação de estudantes. Os brasileiros têm aparecido entre os últimos colocados, evidenciando para todo o mundo as deficiências da educação nacional. Cada publicação é normalmente seguida, em Brasília, de alguma declaração sobre as notáveis realizações da política educacional.

O FMI é um dos mais persistentes no esforço para irritar as autoridades brasileiras. No Relatório sobre Estabilidade Financeira Global, o País aparece num grupo de países com "alguma vulnerabilidade macroeconômica ou de financiamento externo, como Brasil, Indonésia, África do Sul e Turquia". Empresas em países nessas condições podem ser perigosamente afetadas no caso de um choque financeiro externo.

O primeiro capítulo do relatório trata da possibilidade de um choque desse tipo, resultante do aperto da política monetária nos países desenvolvidos - por enquanto, só nos EUA. Uma prévia ocorreu no ano passado, quando o Fed anunciou, com mais de seis meses de antecedência, a redução dos incentivos monetários. O Brasil foi bastante afetado pela instabilidade cambial. Os efeitos foram atenuados pela intervenção do Banco Central. No caso de um choque violento, tal como descrito no relatório, o Brasil estaria em quarto lugar na lista de países com maior porcentagem de empresas fragilizadas, atrás de Argentina, Turquia e Índia. Esse desastre pode parecer pouco provável, mas seria uma tolice desprezar a hipótese, se o País aparece tão mal.

Mais graves são as advertências contidas no Monitor Fiscal, um relatório sobre as contas de governo. Numa lista de 24 emergentes, o Brasil aparece em quinto lugar entre os países com maior necessidade de financiamento para fechar as contas públicas neste ano. Será necessário o equivalente a quase um quinto da produção de bens e serviços (19,2%) para rolar a dívida (15,9%) e cobrir o déficit orçamentário (3,3%). Os quatro primeiros da fila são Egito, Paquistão, Jordânia e Hungria. A necessidade média dos 24 países é de 9,1% do PIB, menos de metade da brasileira.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

“Sou de esquerda, mas ninguém acredita”
Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente e ex-exilado político durante a ditadura


VETO A ‘CONTRABANDO’ EM MP TENTA PRESERVAR OUTROS

Após a descoberta de “contrabando” que acrescentou à Medida Provisória 627 para livrar os planos de saúde do pagamento de multas por infrações cometidas contra a clientela, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) passou a defender que a presidenta Dilma vete justamente esses artigos polêmicos. Esperteza dele, relator da MP, na tentativa de preservar outros 20 “contrabandos” que lhe são bem mais caros.

ENDEREÇO CERTO

Entre os outros “contrabandos” na MP 627 está isenção de impostos para remessa de dinheiro e até para “ganhos de capital” no exterior.

FAÇA AS CONTAS

A MP 627 prevê Refis para grandes empresas e bancos e isenta de imposto de renda aplicações em fundos de investimento.

MEDIDA VALIOSA

A geleia geral da MP 627 trata até de honorários advocatícios de ações extintas relativas ao parcelamento ordinário de débitos tributários.

MAIS BENESSES

O art. 113 da MP 627 anistia encargos, multas e juros de mora por falta de pagamento da Cofins e do PIS/Pasep de várias cooperativas.

ONU: PORTO DE MARIEL TEM TRÁFICO DE ARMAMENTO

Relatório do Conselho de Segurança da ONU, obtido pela coluna, sobre contrabando de armas para a Coreia do Norte, revela que o porto de Mariel, em Cuba, construído com financiamento brasileiro (US$ 1 bilhão do BNDES), é a “ponte” para exportação do antigo armamento soviético para a tirania comunista na Ásia. A suspeita surgiu após apreensão no Panamá de navio norte-coreano com “açúcar” cubano.

FERRO-VELHO

Velhos MIG soviéticos, tanques, mísseis terra-ar e explosivos integram o ardiloso esquema norte-coreano para enganar autoridades marítimas.

BONS COMPANHEIROS

Uma empresa “laranja” russa da Coreia do Norte registrou um carregamento em nome da Ocean Maritime Management-Brasil.

ESQUEMA

O porto cubano construído com nossa grana pela Odebrecht, amiga de Lula, será administrado por uma empresa de Cingapura. Humm...

MEA CULPA?

A direção do PT parece fazer “mea culpa”: em nota, afirma que estar contra a Petrobras é estar “contra o Brasil”. Deve ser referência ao fato de a Petrobras ter sido a empresa que mais perdeu valor de mercado em 2013, após 8 anos de governo Lula e 3 de Dilma: R$ 34 bilhões.

JÁ ERA

Renan Calheiros liquidou com uma frase uma indicação “técnica” de Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) para ministro do TCU: “Foi um avanço. Da outra vez, ele indicou a mãe do Eduardo Campos”.

CREDIBILIDADE PERDIDA

A Comissão de Direitos Humanos do Senado discute na próxima semana estatísticas do Ipea sobre atuação de polícia política brasileira no regime militar do Chile. Estatísticas do Ipea? Melhor não confiar.

TROCO A CAMINHO

Gim Argello (PTB-DF), que desistiu da indicação para ser ministro do TCU, sente-se traído pelos aliados do PT, cujos galhos está habituado a quebrar. Eles sumiram do plenário do Senado no momento em que se decidiria a sua sorte. Terão troco.

EVANGELISTA EM CAMPANHA

A fundadora do quase-partido Rede agora atende por “Evangelista Marina Silva”. É como a ela se refere o convite nas redes sociais para o culto onde será “preletora”, no Guará (DF), domingo.

17 VEZES MAIS

O MP do DF ajuizou 17 ações no âmbito da Operação Caixa de Pandora, que derrubou José Roberto Arruda. São as mesmas acusações, fatiadas, já ajuizadas pelo MPF. A iniciativa coincide com pesquisas onde Arruda aparece liderando para governar o DF.

BRINCANDO COM FOGO

Setores mais à esquerda do PT defendem a expulsão do deputado André Vargas (PR). Talvez por não saberem do risco que o partido corre, caso o sócio do doleiro Alberto Youssef resolva abrir o bico.

USO ELEITORAL

Tucanos acham que a Polícia Federal está sendo usada eleitoralmente. Ontem, senadores citaram o caso de Pimenta da Veiga, que, depois de indicado pré-candidato ao governo de Minas, passou a ser investigado por fato ocorrido há 11 anos.

SANTO HOMEM

André Vargas garante não haver cometido “ato ilícito”. Exceto receber vantagens de criminoso (jatinho etc.), fazer lobby no Ministério da Saúde...


PODER SEM PUDOR

POBRES CONCURSADOS

Jânio Quadros ficou comovido com o gesto de um amigo que lhe pediu emprego para um sobrinho desempregado, apesar de suas qualidades. De posse de lista de cargos disponíveis, o presidente chamou o amigo:

- Que tal o menino ser o tesoureiro dos Correios, no Recife? Quase 27 mil cruzeiros de ordenado...

- Nossa! Em absoluto! É muito dinheiro. Ele é muito novo para ganhar quase igual a mim. O que tem mais?

- Tesoureiro auxiliar do IAPC, são 15.300 por mês.

O homem recusou de novo. Era muito dinheiro. O presidente explodiu:

- Abaixo disso, meu caro, só com concurso público. Vai querer ou não?