sábado, maio 24, 2014

No limbo - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 24/05
As pesquisas de opinião que estão sendo divulgadas contêm, todas elas, um paradoxo que até o momento não foi resolvido: como é possível que cerca de 70% dos eleitores queiram mudanças no governo - e a maioria, inclusive, as quer substituindo a presidente Dilma Rousseff -, e ao mesmo tempo ela continue sendo a favorita da eleição, com o dobro de intenção de votos que o candidato mais bem colocado da oposição, o senador Aécio Neves, do PSDB?
Os números internos da pesquisa mostram mais coerência com esse sentimento de mudança do que seu resultado final, e há estudos que indicam que é real a chance de a presidente repetir a atuação do candidato José Serra, derrotado por ela em 2010. Durante muitos meses o candidato tucano ficou à frente das pesquisas, nessa mesma faixa de 40%, mas os indicadores internos das pesquisas já apontavam para sua derrota.

O índice que obtinha era mais produto do recall de suas campanhas anteriores, assim como o da presidente Dilma hoje se deveria à sua permanente presença em atos públicos e ao recall da última eleição. Que indicadores são esses?

A taxa de rejeição da presidente Dilma hoje é estável e bem acima das dos seus adversários mais fortes: ela tem 33% de eleitores que a rejeitam, enquanto Aécio Neves e Eduardo Campos reduzem suas taxas de rejeição à medida que se tornam mais conhecidos - o tucano para 20%, e o socialista para 13%.

A taxa de aprovação de seu governo está no limbo , na definição do cientista político Alberto Carlos Almeida, do Instituto Análise. Ele tem um estudo que mostra que, em 46 de 104 eleições para governador realizadas entre 1994 a 2010 em que havia um candidato à reeleição, todos os que chegaram à eleição com o índice de ótimo e bom igual ou maior do que 46% foram reeleitos.

Ao contrário, os que disputaram a reeleição com a soma de ótimo e bom igual ou menor do que 34% foram derrotados. Como a presidente Dilma tem atualmente 35% de ótimo e bom, segundo a mais recente pesquisa do Ibope, estaria em situação delicada, à beira da reeleição ou da derrota, segundo a forma como os números se comportarem durante a campanha.

Nesse mesmo estudo, o cientista político Alberto Carlos Almeida mostra que 40% a 43% dos candidatos à reeleição nos governos dos estados que chegaram às urnas com índices de ótimo e bom entre 35% e 45% se reelegeram, o que demonstra que a derrota é mais provável nessa faixa de avaliação, embora não uma certeza.

Uma ressalva importante que Alberto Carlos Almeida faz é que é possível melhorar a avaliação no decorrer da campanha. Dilma terá três vezes mais tempo de propaganda eleitoral que o tucano Aécio Neves e sete vezes mais que Eduardo Campos, do PSB.

Há dois exemplos clássicos na nossa curta história da reeleição para presidente da República: Fernando Henrique foi reeleito em 1998 com 43% de ótimo e bom, tendo saído de 38% em julho. E Lula foi reeleito em 2006 com 47% de ótimo e bom, tendo os mesmos 38% nesses quesitos em julho daquele ano.

O que esses indicadores mostram é que a situação da presidente Dilma na atual eleição é mais desfavorável do que a da eleição de 2010, quando tinha no então presidente Lula um fiador a toda prova, com mais de 80% de aprovação popular e uma economia crescendo a 7,5% ao ano, bem ao contrário do que acontece hoje.

Dilma hoje é a candidata da continuidade, quando a maioria quer mudanças, mas caberá aos candidatos da oposição a tarefa de convencer os eleitores de que eles são capazes de realizar as transformações que a sociedade quer, enquanto a campanha governista trabalha com a ameaça que representaria uma mudança de governo na direção errada.

Além de todos os instrumentos de que um presidente da República dispõe em um presidencialismo forte como o brasileiro, a presidente Dilma tem a seu favor uma tendência que marca as disputas eleitorais na América Latina, justamente pelo poder que o Executivo acumula. A revista britânica The Economist ressalta que, desde 1985, somente dois presidentes no exercício do cargo perderam a reeleição na região.

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