sexta-feira, maio 16, 2014

A CPI da trapaça - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S. PAULO - 16/05
Passou pelo duto que liga o Palácio do Planalto ao gabi­nete do presidente do Senado, Renan Calheiros, a viscosa manobra destinada a transformar em le­tra morta a decisão da ministra Rosa Weber, do Supremo tribunal Federal (STF), que deveria impedir, como solicitara a oposição, que a CPI da Petrobrás a ser instalada na Casa fosse contaminada com a inclusão de ques­tões completamente alheias ao obje­to específico da investigação. Pela enésima vez acaba de ficar demons­trado que jamais alguém perderá di­nheiro apostando na criatividade dos políticos para a trapaça. 
Quando ficou claro para a patota de Calheiros e a tropa de choque do PT no Senado, em linha direta com a presidente Dilma Rousseff, que não conseguiriam obstar "no tapetão" a abertura do inquérito sobre as suspei­tas em relação a práticas da Petrobrás, trataram de desfigurá-lo. A ini­ciativa do PSDB e do DEM, como se recorda, nasceu da confissão da presi­dente de que, na qualidade de titular do Conselho de Administração da empresa, aprovara em 2006 a com­pra de metade de uma refinaria em Pasadena com base apenas em um pa­recer "técnica e juridicamente fa­lho", o que só mais tarde ela viria a descobrir. 

Além do escândalo de Pasadena, on­de a petroleira acabaria enterrando US$ 1,246 bilhão, com um prejuízo contabilizado de US$ 530 milhões, a oposição se voltou para outro caso es­cabroso - a multiplicação por dez dos custos da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco (dos US$ 2,3 bilhões ini­cialmente previstos para os mais de US$ 20 bilhões que deverá custar). Completavam o pacote a história dos US$ 139 milhões em subornos pagos a funcionários da estatal por uma for­necedora holandesa e a denúncia de operações inseguras em plataformas operando em mar aberto. 

O troco dos governistas, que a mi­nistra Weber parecia ter neutraliza­do, foi incluir na agenda da CPI os in­dícios de formação de cartel em con­tratos do Metrô de São Paulo, em go­vernos tucanos, e possíveis irregulari­dades na construção do Porto de Suape, em Pernambuco. O intento era du­plo: sufocar as apurações sobre a Petrobrás desde a ascensão do PT ao po­der - alcançando, pois, a presidente Dilma - e levar ao pelourinho os seus adversários nas eleições de outubro, Aécio Neves, do PSDB, e Eduardo Campos, do PSB. 

Conseguiram o que queriam, tro­cando tortuosamente seis por meia dúzia. Em vez de tratar do Metrô pau­listano, exumaram o episódio do afundamento da Plataforma P-36 em março de 2001, no governo Fernan­do Henrique, e confeccionaram um obscuro nexo entre obras da Petrobrás e o Porto de Suape. A CPI foi ins­talada na quarta-feira. Apenas 1 oposi­cionista, dos 3 que poderiam integrar o colegiado de 13 membros, aceitou fazê-lo. Sob a presidência do peemedebista Vital do Rego e com o petista José Pimentel no cargo de relator, é certo que o inquérito chapa branca nada fará em prejuízo dos interesses de Dilma. 

Numa jogada de aceleração dialéti­ca, por assim dizer, o governo man­dou apressar o início dos trabalhos no Senado para abafar a outra CPI sobre a Petrobrás que a oposição afi­nal conseguiu emplacar, incluindo também a Câmara. Se vingarem as tramóias dos governistas, a sua insta­lação corre o risco de ser adiada pa­ra o fim do mês - a duas semanas, portanto, do início da Copa. Mas, se e quando vier a funcionar efetiva­mente, não apenas remeterá a ante­rior a segundo plano, como terá tu­do para tirar o sono da presidente. De um lado, por sua composição. De outro, pela fartura de material a me­recer investigação. 

Dos 32 membros da CPI farão par­te deputados que só no papel perten­cem à base majoritária, tão duras as suas críticas a Dilma. É o caso do pró­prio líder da bancada do PMDB e prin­cipal criador de casos com o Planalto na Câmara, Eduardo Cunha. Quanto à abundância de prováveis malfeitos, as denúncias se empilham. Ainda on­tem, o jornal Valor revelou que a Pe­trobrás assinou contratos bilionários e pencas de aditivos para as obras da Refinaria Abreu e Lima muito antes da aprovação do estudo de sua viabili­dade. O conselho de administração do empreendimento era liderado por Paulo Roberto Costa, então diretor da petroleira. Em março último, ele foi preso na Operação Lava Jato, da Polícia Federal.

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