sábado, março 22, 2014

As partes e o todo - ALBERTO DINES

GAZETA DO POVO - PR - 22/03

Operadores preferem mirar no varejo, caso a caso, inspirados nas anedotas em torno do mitológico serial killer Jack, o Estripador, que mutilava o corpo das vítimas. Analistas e estrategistas optam pela visão macro, abrangente, horizontal.

Nos próximos meses, precisaremos de uma harmonização dos dois modelos de ação: setorial e conjuntural. O dado mais remoto – a sucessão presidencial em outubro – é também o mais tangível e mais sensível. Seria insanidade acionar as emergências pontuais sem levar em conta as circunstâncias gerais, ou uma fixação exclusiva no cenário eleitoral sem a adoção de um elenco de medidas imediatas, enérgicas, nas diferentes zonas de atrito.

O ex-presidente FHC ofereceu na última quinta-feira mais uma lição de prudência e responsabilidade ao recomendar aos correligionários do PSDB a desaceleração na convocação da CPI para investigar os clamorosos erros cometidos pela direção da Petrobras na compra e venda da refinaria em Pasadena, Texas. Considera bem encaminhada a apuração de ilícitos e/ou incompetências; não quer partidarizá-la, sabe que além da radicalização eleitoral existem forças interessadas em aproveitar-se das lembranças de 1964 para despertar uma polarização latente, mais perigosa.

O governo federal segue a mesma linha cautelosa ao oferecer ajuda ao governador Sérgio Cabral Filho e à sua política de pacificação das favelas desafiada pela orquestração do crime organizado com milícias e políticos fluminenses. O PT tem um pré-candidato ao governo do estado e, mesmo assim, a presidente e seu ministro da Justiça entendem que a “Batalha do Rio” tem prioridade: precisa ser vencida, ou pelo menos controlada, nos próximos 70 dias.

Não se justifica o paroxismo pré-eleitoral que a cada dois anos, em menor escala, e a cada quatro, com grande intensidade, desfigura a administração dos negócios públicos. Numa democracia madura, estabilizada e perene, a disputa pelo poder e a troca do elenco de condutores devem processar-se com naturalidade sem estressar e traumatizar a governança e a governabilidade.

Os fantasmas do golpe de 1964 devem servir de advertência e não como estímulo ao confronto. A maior homenagem que se prestará ao enorme contingente de vítimas diretas e indiretas das ilegalidades cometidas será a normalização das nossas instituições.

Independentemente das bandeiras que empunham e dos níveis em que atuam, operadores e estrategistas não têm outra saída senão a da convivência.

Fantasmas exorcizam-se, sossegam, quando as partes e o todo aprendem a convergir.

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