quarta-feira, fevereiro 12, 2014

Os donos do dinheiro e o Brasil - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 12/02

BC americano, assim como o 'mercado', acha que o Brasil é frágil e deve se 'ajustar' e se 'reformar'


OS DONOS DO DINHEIRO grosso e líquido, os financistas do mundo, passaram a achar que o Brasil é uma economia "frágil" desde maio do ano passado, mais ou menos quando ficou claro que a economia mundial mudava de rumo, dada a mudança nos EUA.

Os donos da maior e mais importante torneira de dinheiro do mundo, o banco central dos Estados Unidos (o Fed), acham que os donos do dinheiro estão certos.

Quase não haveria como esperar conclusão diferente, que consta do Relatório de Política Monetária do Fed, texto que o BC americano tem de enviar todo semestre ao Congresso deles e que foi publicado ontem.

O Fed afirma que os donos do dinheiro, os investidores, não tratam os países "emergentes" de modo indiferenciado, farinha do mesmo saco. Isto é, quanto mais frágil a economia emergente, mais sua moeda se desvalorizou entre abril de 2013 e fevereiro deste ano de 2014; maior o aumento das taxas de juros cobradas do governo de cada um desses países.

E daí? O governo brasileiro diz que o Brasil tem sido jogado de modo indevido no mesmo saco de gatos fracos dos emergentes. Assim que a manada enlouquecida dos "mercados" se acalmasse, perceberia que a economia brasileira é mais sólida, com o que seria atenuado o vandalismo dos financistas no nosso mercado, sempre segundo o governo.

Recorde-se que o Fed praticamente repete a avaliação do bancão americano Morgan Stanley, que inventou e popularizou a história dos "cinco frágeis", chamados de "cinco fracotes" nesta coluna em agosto de 2013. Eram as economias mais sujeitas a apanhar e que apanhavam nos "mercados": Brasil, África do Sul, Índia, Indonésia e Turquia.

Os indicadores de fragilidade, segundo a avaliação do Fed, simplezinha e convencional, são: 1) Deficit externo (saldo em conta-corrente, diferença entre exportação e importação de bens e serviços); 2) Dívida bruta do governo em relação ao PIB (ao tamanho da economia); 3) Taxa média de inflação nos últimos três anos; 4) Variação do crédito para o setor privado como proporção do PIB (nos últimos cinco anos); 5) Razão entre dívida externa do país e valor de um ano de exportações; 6) Tamanho das reservas internacionais em relação ao PIB.

O Fed amassou esses números em um único índice, que comparou com as taxas de desvalorização da moeda e do preço dos títulos dos governos de 15 "emergentes" mais relevantes (entre abril de 2013 e fevereiro de 2014). A relação entre "fraqueza" e desvalorizações parece gritante, como já havia notado o Morgan Stanley em meados de 2013.

Mais deficit externo, mais inflação, dívida externa grande, aumento rápido do crédito, dívida pública alta, tudo isso teria sido levado em conta pelos financistas no momento de pensar se era o caso de dar o fora de um país. De fato, ou em teoria, esses são em geral fatores de desvalorização da moeda e de alta de juros (e, pois, de prejuízo para o investidor).

Na ponta baixa da curva, no grupo dos países mais frágeis e que, portanto, apanharam mais, vêm pela ordem de insucesso: Turquia, Brasil, Indonésia, África do Sul e Índia. Os mesmos da metade do ano passado.

O que fazer, segundo o Fed? O de sempre: governos devem gastar menos, reduzir a inflação e fazer "reformas".

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