sábado, fevereiro 15, 2014

Mais mercado, menos intervenção - ADRIANO PIRES

FOLHA DE SP - 15/02

Em 2003, as autoridades do PT afirmaram que apagões e racionamentos "nunca mais" ocorreriam.


A realidade tem desmentido os petistas. De 2011 ao dia 4 de fevereiro de 2014, já ocorreram 181 apagões acima de 100 MW e 11 superiores a 1.000 MW. Nestes dois primeiros meses de 2014, com o registro de altas temperaturas, a situação se agravou: os reservatórios de água caíram ao pior nível desde 2002 e o consumo de energia bateu recordes.

O que explica esse cenário de tantos apagões? Com certeza não se pode atribuir exclusivamente à falta de chuvas, às temperaturas elevadas nem aos raios. As principais causas são uma política intervencionista, a falta de planejamento e o desrespeito às regras de mercado.

De olho nas eleições de 2014, o governo editou a medida provisória nº 579 em setembro de 2012, posteriormente convertida na lei nº 12.783/2013, que impôs às empresas uma redução de tarifas num momento em que o preço da energia crescia com o uso das térmicas.

A tarifa artificialmente baixa tinha como objetivo agradar os consumidores e controlar a inflação. As indústrias, que seriam as principais beneficiárias, no fundo foram enganadas, já que a maioria delas está no mercado livre, e as tarifas baixas só atingiram o mercado cativo. Quem ganhou mesmo foram os consumidores residenciais, o que acabou por estimular o desperdício.

Seria preciso que o governo lançasse o quanto antes um plano de uso racional de energia. Entretanto, de forma equivocada, ele confunde plano com racionamento.

A insistência em realizar leilões nacionais e com a presença de todas as modalidades de energia concorrendo entre si levaram a um mau aproveitamento da nossa diversidade de fontes energéticas.

Essa diversidade e a dispersão regional --água e gás natural no Norte, vento no Nordeste, biomassa no Centro Oeste e Sudeste, gás natural no Sudeste e carvão no Sul-- levariam a um melhor gerenciamento dos reservatórios das hidrelétricas, que perderam poder de regularização (capacidade de regularizar o abastecimento de energia elétrica) nos últimos anos pelo fato de o governo ter cedido às pressões ambientalistas e, então, passado a permitir apenas usinas a fio de água (de cisternas pequenas).

O governo não soube transformar a vantagem que a natureza nos deu em uma vantagem econômica e competitiva frente a outros países.

A falta de uma solução adequada para a questão dos licenciamentos ambientais e a adoção de taxas de retorno patrióticas embutidas nos preços dos leilões promoveram atrasos e adiamentos em usinas, linhas de transmissão e subestações --15% do parque eólico brasileiro, por exemplo, está parado por falta de linhas de transmissão.

O governo precisa adotar medidas que mudem a demanda, por meio da implementação de um plano de uso eficiente de energia, e estimulem a oferta, com leilões regionais e por fontes e incentivos ao crescimento do mercado livre.

No curto prazo, o governo deveria incentivar a cogeração a gás natural e a biomassa, que são formas mais eficientes. Um consumo médio da cogeração a gás de aproximadamente 2,4 milhões de metros cúbicos por dia, por exemplo, equivale a uma geração de 450 MW, o que economizaria para o país R$ 2,5 bilhões por ano, considerando o custo evitado do acionamento das térmicas.

O PT teve mais de uma década para modernizar e aumentar o nível de segurança do setor de energia. Entretanto, políticas centralizadoras e populistas tornaram o sistema ainda mais frágil e antiquado.

Em vez de, todos os anos, ficar esperando a chuva e temperaturas amenas, o governo precisa implementar o quanto antes políticas descentralizadoras e práticas de mercado. Só assim para que apagões de fato "nunca mais" ocorram.

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