sexta-feira, fevereiro 14, 2014

Governo não pode mais esconder custo da energia - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 14/02

A Aneel propôs um aumento de 4,6% nas contas de luz para cobrir este ano o custo adicional na geração de eletricidade, decorrendo da utilização das usinas térmicas



A difícil experiência do racionamento de eletricidade em 2001/2002 levou o país a acelerar investimentos em usinas termelétricas. A decisão foi correta, pois, desde que o o país deixou de construir hidrelétricas conjugadas a reservatórios de acumulação de água, a oferta de eletricidade se tornou bem mais dependente, ano a ano, do regime de chuvas. Como não há energia acumulada, quando há menos chuvas, as termoelétricas precisam ser acionadas para suprir o abastecimento.

As térmicas existentes têm uma potência instalada que corresponde a cerca de 20% da capacidade de geração de eletricidade no Brasil. São essas usinas que, no ano passado, contribuíram para poupar água nos reservatórios remanescentes, possibilitando o fornecimento de eletricidade neste verão de poucas chuvas e temperaturas elevadas (seguidos recordes de consumo foram batidos na região Sudeste, onde está parte expressiva da população e das atividades econômicas do país).

As térmicas têm custo alto de operação: muitas delas queimam combustíveis caros e importados (gás natural, carvão, óleo diesel).

Inicialmente, foram concebidas para serem emergenciais, de modo que sua utilização não teria forte impacto sobre o preço final da energia. Mas, no ano passado, ficou evidente que o país tende a utilizá-las mais do que o previsto. Assim, o encarecimento da energia, mesmo que momentâneo, terá de ser cobrado de quem a consome. Em 2013, como governo anunciou, em alto e bom som, que as tarifas da eletricidade cairiam em até 20% para os consumidores (em decorrência das regras impostas a companhias geradoras estatais na renovação das concessões de hidrelétricas), politicamente o governo se viu sem condições de fazer a cobrança no mesmo ano, pois o aumento anularia um pedaço da redução das tarifas, que nem chegara aos 20% propagados.

O Tesouro bancou essa diferença, recorrendo a fundos que tinham sido arrecadados no setor elétrico. Mas essa fonte secou. Este ano, para bancar esse custo, o Tesouro terá de recorrer à receita tributária. A Aneel, agência reguladora do setor elétrico, calcula que seria necessário um aumento d e 4,6% nas contas de luz para cobrir esse custo adicional (cerca de R$ 5,6 bilhões). O governo terá agora que decidir: ou tenta disfarçar mais uma vez, pagando a diferença às empresas distribuidoras de eletricidade, ou permite a cobrança dos consumidores. De uma forma ou de outra, o dinheiro sairá do bolso dos cidadãos.

Porém, no primeiro caso, persistirá uma situação irreal e ilusória, pois o consumidor não terá noção do custo real da energia. Não é por esse caminho, com artificialismos, que a inflação será vencida no Brasil. Trata-se de uma política bumerangue: mais à frente o ajuste será inevitável, e virá com muito mais força.

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