quinta-feira, janeiro 23, 2014

Previdência fecha o cerco nas contas públicas - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 23/01

Um déficit acima do esperado, em 2013, leva governo a buscar alternativas de mudanças que sejam palatáveis num ano de eleições



Não fosse suficiente a credibilidade da política fiscal ter ficado abalada devido ao uso da “contabilidade criativa” na maquiagem de estatísticas, há rubricas de grande peso nos gastos públicos cujo comportamento piora ainda mais o quadro. Na terça-feira, o jornal “O Estado de S. Paulo” revelou uma delas: o déficit da Previdência chegou, no ano passado, a R$ 49,9 bilhões, bem acima da expectativa oficial de o saldo no vermelho não se distanciar muito dos R$ 42,3 bilhões verificados em 2012.

Há explicações conjunturais para o mau resultado. Entre eles, o pagamento de passivos criados por decisões judiciais, no valor de R$ 3 bilhões.

Mas é escapismo imaginar que questões tópicas explicam o desequilíbrio crescente da previdência do INSS, da qual depende a grande massa dos assalariados do setor privado.

O sistema tem a conhecida tendência estrutural ao déficit crescente, por razões demográficas. Como o Brasil é um dos pouco países do mundo em que se pode obter o benefício da aposentadoria sem limite mínimo de idade, as pessoas se retiram do mercado do trabalho ainda relativamente jovens (54 anos), enquanto a expectativa de vida, já em 74 anos, continua a subir. O resultado é menos mão de obra ativa contribuindo para o INSS e mais aposentados com a perspectiva de receber o benefício por muito tempo. Não há conta previdenciária que feche.

Nas gestões Lula, avançou-se na reforma do sistema do funcionalismo público, concluída no governo Dilma. O problema do INSS foi apenas atenuado pela criação do “fator previdenciário”, na Era FH, para induzir o retardamento da aposentadoria — à medida que a expectativa de vida sobe, precisa-se contribuir mais para conseguir o mesmo benefício ou aumentá-lo.

Não será neste ano eleitoral que a pauta da idade mínima da aposentadoria será enfrentada. Mas técnicos do governo, diante da deterioração galopante do sistema, acham que alguns pontos laterais, mas nem por isso pouco importantes, podem ser enfrentados em 2014.

Um deles é o cálculo e a administração do auxílio-doença — 18% dos benefícios concedidos em um ano são deste tipo, e a meta é baixar esta proporção para 10%. Há muita margem de ajuste: auditorias, controles, normas. Nos caso dos servidores públicos, o índice chegou a ser 30% e caiu para 4%, diz o jornal.

Outra área onde se pode reduzir muitos gastos são nas pensões por morte. O Brasil tem uma das mais benevolentes legislações neste campo, a ponto de os benefícios já serem 3% do PIB. Libera-se a pensão sem se considerar, por exemplo, o número de filhos dependentes.

Mas mesmo que seja possível executar esta agenda secundária, o próximo presidente terá de enfrentar o tema do limite de idade.

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