sexta-feira, janeiro 10, 2014

Contrário senso - DORA KRAMER

O Estado de S.Paulo - 10/01

Seja de imediato, por ato da ministra plantonista Cármen Lúcia, ou em fevereiro, quando o titular da prerrogativa, ministro Joaquim Barbosa, voltar das férias, o deputado João Paulo Cunha terá a pena oficialmente executada, juntando-se aos 18 condenados já na prisão.

Dos 25 réus sentenciados no processo do mensalão, três tiveram direito ao cumprimento de penas alternativas, um (Roberto Jefferson) aguarda a expedição da ordem de prisão e dois ainda esperam o julgamento dos embargos infringentes, pois foram condenados por um crime só e receberam ao menos quatro votos pela absolvição.

Não foi o que aconteceu com João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara, cuja defesa tentou a tática do João sem braço que não passou pelo crivo do relator da ação e presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa.

Condenado por três crimes - corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro -, nas sentenças relativas aos dois primeiros Cunha obteve apenas dois votos pela absolvição. Embora a exigência legal fale em quatro votos, assim mesmo a defesa apresentou embargos infringentes, conseguindo livrar seu cliente da primeira leva de presos.

Era, porém, questão de tempo (conforme recente decisão de Barbosa considerando os recursos meramente protelatórios) para que Cunha tivesse decretado o trânsito em julgado de duas das três condenações. Por lavagem teve cinco votos a favor e tem direito ao embargo.

Tudo isso para dizer o seguinte: as condenações contrariaram as expectativas da população que, acostumada com a impunidade, respondeu assim a uma pesquisa do Datafolha publicada em agosto de 2012:73% queriam condenações e prisões, mas 43% achavam que o julgamento terminaria em absolvição geral.

Certamente não é a esse tipo de pessimismo que a presidente Dilma tem se referido com revolta.

Força do hábito. O último capítulo de 2013 estrelado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, que usou avião de FAB para ir ao Recife fazer implante de cabelo, causou espanto.

Mas não entre aqueles que o conhecem de outros carnavais, como seus colegas de Parlamento que o elegeram presidente da Casa com 70% dos votos e os que por dever de ofício acompanham sua trajetória desde a estreia no cenário nacional como sócio fundador da República das Alagoas que assolou o Brasil na virada da década dos 80 para os anos 90, sob a chefia de Fernando Collor de Mello e o gentil patrocínio das trapaças de Paulo César Farias.

É o mesmo Calheiros cuja falsa pose de bom moço a tantos incautos iludiu por alguns anos.

O senador não ignora que não poderia usar o avião da FAB para dar um jeito no visual. Mas o fez porque não vê nada demais no uso privado da máquina pública.

Caso impensado. O ataque do PT ao governador Eduardo Campos, chamado de tolo, traidor e oportunista, suscitou uma dúvida no mundo político: foi algo planejado ou fruto de impulso?

Qualquer que tenha sido a razão, a interpretação dos observadores é uma só. Com essa atitude, o PT afasta ainda mais Campos de Dilma, dificulta a possibilidade de apoio do PSB a ela no segundo turno caso seja disputado com o tucano Aécio Neves, facilita a unidade da oposição e neutraliza quaisquer resquícios de petismo restantes da alma da ex-senadora Marina Silva chamada, no mesmo artigo, de "ovo da serpente" e "pedra no sapato".

O PSDB, em particular, adorou a ofensiva. O PMDB registrou como mais uma prova de que é preciso estar sempre armado no trato com um aliado permanentemente em combate como o PT.

Nas cabeças bem pensantes do partido de Dilma, o episódio foi marcado como um erro a ser evitado.

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