quarta-feira, abril 03, 2013

Jardim ampliado - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 03/04

O governo Dilma se prepara para anunciar este mês uma proposta para a regularização fundiária do Jardim Botânico, no Rio, objeto de uma interminável polêmica.
O Ministério do Meio Ambiente diz que este relatório do Iphan que propõe manter 316 invasores é apenas um parecer técnico e não uma resolução do governo.

E mais...

A ministra Izabella Teixeira garante que está empenhada em fortalecer o Jardim Botânico:
- Eu quero aumentar a área do Jardim. Estamos de olho num terreno próximo com esse objetivo.
Vamos torcer. Vamos cobrar.

Caso Murilo Rosa

A 14ª DP já encontrou os culpados pelo vazamento de fotos íntimas e pela chantagem contra o ator Murilo Rosa.
São dois homens, moradores de São João de Meriti. Um deles é menor de idade. As fotos foram capturadas durante bate-papo no UOL.

Segue...

A Lei Carolina Dieckmann, que pune com prisão e multa a invasão de computadores, só entrou em vigor ontem. Sendo assim, os gatunos não devem ser presos.

Corrida pelo óleo

Magda Chambriard, da ANP, comemora que 71 empresas de 21 países, inclusive do Brasil, estão inscritas para o próximo leilão de blocos para exploração de petróleo.
O interesse deve-se, em parte, ao fato de o último leilão ter sido em 2008, e, também, porque as áreas ofertadas são muito boas.

Navalha na carne

A editora da Igreja Universal demitiu quase 200 pessoas.

O FORA DA LEI

O motorista deste Renault Sandero, de cor cinza-escuro e placa LPN 4904, do Rio de Janeiro, acionou, na manhã de sexta, na Av. Sernambetiba, na Barra, uma sirene, como se fosse uma ambulância ou um carro de polícia, para vencer o engarrafamento. Não é o único que faz isso, infelizmente. Volta e meia surgem histórias semelhantes pela cidade. Segundo dados do Detran-RJ, o veículo é oficial e pertence à SEC. Na sigla do governo do estado, SEC quer dizer Secretaria estadual de Cultura, mas o órgão diz que não tem nada a ver com o Sandero. No entanto, uma coisa é certa: o licenciamento do veículo expirou em 2009, e ele não poderia estar circulando nas ruas l

De olho no julgamento

O ator Osmar Prado e um grupo do Mudh, movimento de direitos humanos presidido pela atriz Dira Paes, estão em Marabá, no Pará. Vão acompanhar o julgamento dos assassinos do casal de extrativistas José Cláudio e Maria do Espírito Santo.

Eles foram mortos em 2011, após denunciarem ações de madeireiras. Três homens são acusados do crime.

Carteirinha falsa

A Polícia Civil investigará as compras de meia-entrada para o Rock in Rio. A organização do evento está passando à Delegacia de Defraudações informações de quem já comprou ingresso.
Agora, a polícia vai checar com as instituições de ensino se as carteirinhas são verdadeiras.

Rock engajado

Abanda inglesa The Cure, que toca amanhã, no HSBC Arena, no Rio, fechou acordo com a Anistia Internacional.
Antes do show, ativistas vão recolher assinaturas para uma petição, que será entregue a Dilma, pedindo mais atenção ao acesso das mulheres aos seus direitos sexuais e reprodutivos.

GG do samba

A grife D"Samba, especializada em estampas para quem gosta do ritmo, lança dia 15 agora um tamanho de roupa masculina para, digamos, fofões.
Vai se chamar... tamanho Arlindo Cruz, veja na etiqueta da foto.

"Teje preso"

O presídio Bangu II, porta de entrada do sistema carcerário do Rio, recebeu só no mês de março 1.966 detentos.
A cadeia serve de triagem. Lá, os presos deveriam receber papel higiênico, escova de dente e sabonete.
Mas, em março, faltou material.

Ai, meu dedo

A 7ª Câmara Cível do Rio condenou o motorista Altemar Rimon Pinto e a cooperativa de vans dele a indenizar em R$ 6 mil, por danos morais e estéticos, a idosa Maria da Graça Sant"Ana.
Ela teve amputado um dedo da mão direita quando o motorista fechou a porta do veículo.

Nike no Aterro
A Prefeitura do Rio fechou um acordo com a Nike para reformar o Campo 1 do Aterro do Flamengo. A expectativa é reinaugurar o campinho em junho.
A gigante americana terá escolinhas de futebol durante o dia.

Pomar olímpico


O Parque Olímpico dos Jogos de 2016 terá um pomar.
Entre as instalações esportivas, serão plantados 28 cajueiros, 16 jabuticabeiras, 45 goiabeiras, 60 coqueiros e sete palmeiras de açaí.

Ponto Final

Deve ser terrível viver num país onde a maior parte da mocidade prefere a estabilidade do emprego público do que arriscar na iniciativa privada.


Recebendo as visitas - MARTHA MEDEIROS

ZERO HORA - 03/04

Sempre me fascinou a maneira como tanta gente recebe amigos em casa de forma absolutamente desestressada. As visitas chegam sem avisar, abrem a geladeira, se esparramam no sofá e está tudo certo, desde que sejam íntimas. Se não forem íntimas, tornam-se.

Nesse aspecto, minha educação foi mais cerimoniosa. Gosto de ser avisada que virão à minha casa, até para ter tempo de me preparar: comprar algumas flores, abastecer a geladeira, deixar a música no ponto. Adoro receber, desde que me deem a chance de esperar meus convidados como acho que devo. Na contramão da maioria das pessoas, prefiro a previsibilidade ao ataque surpresa.

Não sei de onde vem essa formalidade, deve ser cultura familiar. Lembro de ouvir recomendações quando criança: trate bem as visitas. Mesmo eu não conhecendo alguns amigos dos meus pais, era obrigatório ir até a sala, de pijama e dentes escovados, cumprimentar os adultos e dar boa-noite. Podia ser aborrecido, mas não havia negociação.

Então, ficou incrustada em mim essa reverência prestada a todos os que nos visitam – mandam os bons modos oferecer ao menos um copo d’água, convidar para sentar, ser atencioso e procurar causar uma boa impressão.

Talvez seja por isso que a cada vez que ouço a notícia de que um turista estrangeiro sofreu alguma selvageria em nosso país, sou tomada pela vergonha. Óbvio que qualquer crime, contra qualquer pessoa, é chocante e inadmissível, mas o turista atacado me parece ainda mais indefeso do que nós: ele não conhece as manhas das nossas cidades, não fala nosso idioma, está aqui apenas para se divertir, e de repente sofre um assalto brutal e tem sua dignidade profundamente atingida, como foi o caso do casal de namorados que há poucos dias entrou numa van em Copacabana e acabou sofrendo abusos por seis horas nas mãos de delinquentes.

Cadê o copo d’água, a atenção?

É só assistir aos telejornais para perceber que o Brasil não mudou tanto quanto apregoa. Manicure mata criança, motorista atropela e foge, torcedores se agridem. E proliferam os roubos de carros, arrastões em restaurantes, depredação de caixas eletrônicos. Difícil nossas atrações turísticas competirem com o produto brasileiro mais divulgado lá fora: a violência.

Claro que existe o vice-versa: nem sempre brasileiros são recebidos no Exterior com tapete vermelho, como demonstram os casos de deportações sumárias e assassinatos inexplicáveis, a exemplo do garoto que recebeu vários eletrochoques disparados por policiais canadenses ou o famoso episódio envolvendo Jean Charles, que foi abatido a tiros num metrô de Londres.

Mas não atenua. Sigo muito envergonhada. Se vieram pacificamente até a nossa casa e abrimos a porta, que façamos a gentileza de deixar o cachorro preso.


Crédito de coraçõezinhos - RUY CASTRO

FOLHA DE SP - 03/04

RIO DE JANEIRO - Presidentes da República têm esse problema. Tudo que dizem é público. Veja a presidente Dilma. Uma inocente sugestão ao chefe de cozinha do Planalto, de que gostaria de um suflê de chuchu desidratado para o jantar, pode vazar e dar a entender que temos em Brasília uma flora intestinal com problemas -quando, na verdade, a presidente quer apenas descansar das bombas que é obrigada a ingerir todo dia em suas viagens pelas províncias.

Imagine então suas declarações sobre economia. Dependendo de como são interpretadas, podem levar o país para um lado ou para o outro. Foi o que aconteceu outro dia, na reunião dos Brics, na África do Sul. Dilma disse algo sobre inflação e taxa de crescimento do Brasil que alvoroçou indevidamente o mercado de juros. Pronto, mais um aborrecimento -culpa, claro, da imprensa.

E posso calcular sua decepção ao ver uma de suas melhores frases recentes -a de que, se alguém culpasse os raios pelos apagões, devíamos dar gargalhadas- ser desmentida pelo ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), o qual concluiu que o apagão de dezembro, que deixou 12 Estados no escuro, foi causado por... raios. E agora, vamos rir de quê?

Presidentes são assim mesmo, contundentes quando não devem ou peremptórios sobre o que não entendem. Faz parte do emprego. Donde não é justo que exijamos deles uma infalibilidade que, hoje, já não se espera nem do papa. Pelo mesmo motivo, em termos jornalísticos, talvez nem tudo que dizem -já que não é para valer- deveria render manchete ou primeira página.

Em compensação, raro o dia em que não se vê, em jornal ou TV, Dilma fazendo para plateias o famoso gesto do coraçãozinho com as mãos. É reconfortante. Uma governante tão pródiga em coraçõezinhos merece um crédito, não sei se de confiança, mas de carinho.

Só falta vontade - LYGIA V. PEREIRA

O GLOBO - 03/04
"Professora, os camundongos melhoraram!",exclamou meu aluno, eufórico com os resultados de seu experimento. Os animais com defeitos na coluna tratados com uma nova droga ficaram retinhos! Esse era um dos raros momentos para os quais os cientistas vivem: o experimento deu certo! O ano começara muito bem!

Mas aquilo era só o começo: se a nova droga funcionou, agora temos que entender como. E para isso desenhamos novos experimentos, que requerem a compra de novos reagentes. Tudo bem, o projeto é financiado pela Fapesp e pelo CNPq, dinheiro neste caso não é o problema - pode encomendar!

Neste momento demos de cara com a maior barreira para o desenvolvimento científico do Brasil: a burocracia envolvida na importação de produtos para pesquisa. Os diferentes fornecedores pediam de 60 a 90 dias para nos entregar os reagentes! Ou seja, ficaríamos por até 3 MESES sentados em cima daqueles resultados tão empolgantes, de braços cruzados sem fazer nada...

Não foi nenhuma surpresa, esta é a realidade do pesquisador no Brasil. Um questionário feito por colegas da UFRJ em 2010 revelou que 99% dos cientistas brasileiros dependem de produtos importados para pesquisas. Todos esperam de um a 24 meses (sim, dois anos...) pela chegada dos produtos importados, que além disso ficam presos na alfândega, fazendo com que 76% dos entrevistados já tenham tido material perdido durante o processo...

Não é de se espantar que 90% dos pesquisadores brasileiros já tenham mudado os rumos de seus trabalhos ou até mesmo desistido de algum experimento por causa de problemas com importação. O Governo diz que está tudo funcionando muito bem com o programa Importa Fácil, mas 91% dos entrevistados não concordam, e seguem penando para fazer ciência no país.

Enquanto isso, pesquisadores nos EUA e Europa esperam em média 1-2 DIAS para receber os mesmos reagentes. Nós temos capacidade intelectual de 1º mundo, mas infelizmente apoio administrativo e legal de 3º mundo para importação de insumos para pesquisa... Sem agilidade, como o Brasil pode ser competitivo em ciência?

O mais irônico é que as limitações todas são impostas pelo grande financiador de nossas pesquisas, o governo federal. Este diz valorizar tanto a atividade de pesquisa que está gastando centenas de milhões de dólares no programa Ciência Sem Fronteiras, enviando estudantes brasileiros para estágios fora do país. Porém, criou um labirinto legal para importações que não distingue um pesquisador de um potencial contrabandista. E, assim, dá um tiro no pé, impedindo o desenvolvimento.

Há esperança! Os deputados federais Romário e Mara Gabrili começaram a estudar essa situação kafkaniana, e agora trabalham em um projeto de lei para facilitar a importação de insumos para pesquisa. Temos todos um objetivo em comum - melhorar a ciência no Brasil. Vamos então juntar forças para elaborar um instrumento legal realmente eficaz, que transforme a forma de se fazer pesquisa no país. Não é difícil, não pedimos mais verbas, só precisamos de vontade política.

PEC & Pague - ANTONIO PRATA

FOLHA DE SP - 03/04

Encontrei Vanda, que cozinhava e lavava roupa em casa quando eu era criança, depois de dez anos


VANDA VINHA do interior da Bahia e de dentro de um livro de Charles Dickens. Caçula de nove filhos, aos sete anos foi dada pela mãe, incapaz de sustentá-la, a uma conhecida. Trabalhou de graça na casa da mulher até os 15, então pegou um ônibus e fugiu para São Paulo. Quando eu ou minhas irmãs a importunávamos com nossas demandas de criança mimada, nos contava histórias da infância de gata borralheira, fazia-nos apertar seu nariz, quebrado por uma das filhas da "patroa" com um rolo de amassar pão e nos expulsava da cozinha: "Sai pra lá, peste, e me deixa acabar essa janta!".

Vanda cozinhava, limpava, lavava roupa e passava. Morava num quartinho nos fundos da casa, ao lado do tanque e da máquina de lavar roupa, aonde era vedada a minha entrada. Às vezes, a via pela porta entreaberta: de bobes na cabeça, falando ao telefone ou pintando as unhas dos pés, sob o lusco-fusco da TV preto e branco.

Nos fins de semana, arrumava-se toda e ia para a casa de umas primas, na periferia. Um domingo, levou-me junto, para um churrasco. Lembro de ter me saído estranhamente bem no futebol com os meninos da rua, lembro de mulheres curiosas pegando no meu cabelo loiro, lembro das gargalhadas que explodiram quando apontei a carne na grelha e perguntei se era picanha.

Levei muitos anos para entender a graça da minha pergunta. Levei muitos anos, também, para entender por que não nos referíamos à Vanda como "nossa empregada", mas como "a moça que trabalha lá em casa" -tentativa inútil de contornar o incômodo daquela anacrônica e persistente relação.

Vanda viveu e trabalhou conosco por 15 anos. Depois que crescemos e saímos de casa, minha mãe e meu padrasto resolveram não ter mais uma empregada morando lá. Falaram com amigos e arrumaram outra família para Vanda trabalhar. A patroa nova foi pegá-la uma noite, depois do jantar -a mudança da Vanda coube no porta-malas do carro.

Fiquei dez anos sem vê-la. Em 2011, caminhando por uma praia do litoral norte, ouvi um grito: "Tunim!". Ali estava ela, fazendo um castelo de areia, com os filhos da patroa. "Meu menino, meu menino!", ela repetia, me abraçando e chorando -eu fiquei tocado, mas não chorei. Naquela tarde, contou-me que ia se aposentar e voltar pra Bahia, onde estava terminando de construir uma casa, com suas economias. Ano passado, ela voltou: aos 60 e tantos anos, pela primeira vez desde os sete, dormiu num quarto que não pertencia a seus patrões.

Estranha sensação ao escrever esta crônica. Parece que falo da minha infância de menino de engenho, no interior de Pernambuco, no século 19, não da infância de um filho de jornalistas, numa casa geminada no Itaim Bibi, no final do século 20. Estranheza que confirma a profecia de Joaquim Nabuco (relembrada por Caetano Veloso, em "Noites do Norte"): "A escravidão permanecerá por muitos anos como a característica nacional do Brasil".

Característica que, lentamente, vamos deixando para trás, no início do século 21. Lentamente, pois ser empregada com FGTS, caixa de supermercado ou atendente de telemarketing ainda é muito pouco diante do que a vida pode oferecer -mesmo comendo picanha ou tomando banho com sabonete Dove.

Espaço e movimento - TOSTÃO

FOLHA DE SP - 03/04

Tardelli é o elo entre a inteligência espacial e cinestésica de Ronaldinho e as finalizações de Jô


No empate entre Paris Saint-Germain e Barcelona, Messi fez o primeiro gol e foi substituído, no intervalo, com problema muscular. Se tivesse jogado o segundo tempo, teria chance de fazer mais gols, por causa do avanço do time francês. O primeiro gol do PSG foi em claríssimo impedimento. Thiago Silva e Daniel Alves foram brilhantes. Lucas só atuou bem no primeiro tempo.

Todos os treinadores e armadores deveriam assistir aos jogos do Barcelona só para observar Xavi jogar, como ele faz a passagem da bola de um lado para o outro, de pé em pé. Xavi quase não erra passes porque é craque nesse fundamento e porque nunca dá o passe para o jogador marcado. Espera sempre o momento exato para tentar o passe decisivo.

Corinthians, São Paulo e Atlético-MG jogam hoje e amanhã, pela Libertadores. Corinthians e São Paulo fizeram um bom jogo no domingo. Cada equipe com seu estilo. O São Paulo, com muita troca de passes, enquanto o "inglês" Corinthians, com duas rígidas linhas de quatro jogadores, próximos à área, privilegiava o contra-ataque. Essa disciplina tática foi importante para a conquista de títulos.

O São Paulo jogou bem, graças ao desprendimento e talento coletivo de Jadson, fora de posição, pela direita. Mesmo assim, foi brilhante no gol. Ganso teve mais uma boa atuação. Pena que toca a bola e não avança para recebê-la.

O Atlético-MG melhorou muito com Tardelli. Ele é o elo, a ponte, entre os passes espetaculares de Ronaldinho, a velocidade de Bernard e o centroavante Jô. Antes de Tardelli, a maioria das jogadas ofensivas era pelo alto. Tardelli não é um centroavante, um meia de ligação nem um ponta. Ele é uma mistura de tudo isso. Toca e avança. Dribla, dá passes e faz gols.

Falta à seleção um atleta com esse estilo, com talento coletivo, agregador em campo, que aproxima jogadores de posições diferentes. A seleção possui volantes que marcam, meias-atacantes que driblam em velocidade e um centroavante fixo. Tudo compartimentado. É necessário misturá-los, sem perder a organização tática.

Pelas características, Ganso e/ou Ronaldinho preencheriam esse vazio, esse elo entre os setores. Ronaldinho, por não ser tão veterano, deveria ser o mestre da seleção, como é no Atlético-MG. Ganso seria, no imaginário de todos, o herdeiro da inteligência espacial e cinestésica (relativa ao movimento) de Ronaldinho. Ambos não estão na seleção principal. Só agora Ganso voltou a ser titular no clube. Quando foram escalados, não foram bem. Muitas coisas não se explicam. Acontecem.

O futebol brasileiro e a seleção precisam aprender e gostar de jogo coletivo. Hoje, com poucos craques, ele é importantíssimo. Essa dificuldade é, em parte, reflexo do narcisismo e do individualismo da sociedade.

Rumo ao desastre comercial - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 03/04

Com indústria empacada, custos em alta, infraestrutura em frangalhos e consumo acelerado, o Brasil avança para um desastre comercial. Quase todas as grandes crises brasileiras, desde o começo do século passado, foram detonadas por problemas nas contas externas. Desta vez, os primeiros sinais de alerta surgiram em 2007, antes da recessão global. Os maus resultados de 2013 mostram a continuação de uma tendência. Além disso, os números oficiais contam apenas uma parte da história. Sem a contabilidade criativa da Petrobrás, o déficit acumulado nos primeiros três meses teria sido maior que os US$ 5,15 bilhões registrados oficialmente. Falta incluir nas contas US$ 1,8 bilhão de importações de combustíveis. Depois, a instalação de uma plataforma foi inscrita como exportação (no valor de US$ 802 milhões), por uma esquisitice do regime aduaneiro aplicado ao setor de petróleo.

Os problemas importantes vão muito além da estranha contabilidade da Petrobrás. As distorções que ela causa acabam neutralizadas com o tempo e com alguma informação. Os desajustes de maior consequência afetam todo o sistema produtivo e têm sido agravados por uma política econômica equivocada. Um dos mais visíveis e mais comentados é o sistema tributário, cheio de distorções e mal administrado. Esse item aparece em posição destacada em toda análise da competitividade brasileira, sempre acompanhado pela infraestrutura deficiente, pela baixa qualificação da força de trabalho, pela ineficiência do setor público e por mais uma série de desvantagens comparativas. A tudo isso se soma a perda de capacidade produtiva da Petrobrás, refletida no forte aumento da importação de combustíveis.

Erros de diagnóstico e ações oficiais mal planejadas têm agravado o quadro. A maior parte dos incentivos fiscais tem favorecido muito mais o consumo que a produção. O crédito oficial tem beneficiado especialmente algumas estatais, com destaque para a Petrobrás, e alguns grupos privados escolhidos para ser vencedores. Não se vê, nessa política, nenhuma preocupação séria com a eliminação de gargalos estruturais, com a melhora das condições gerais de competitividade e com o envolvimento de mais empresas na exportação.

Incentivos fiscais mal concebidos, parciais e voltados principalmente para o consumo estimulam mais a importação que a produção interna, além de comprometer a arrecadação sem consertar o sistema tributário. Incentivos têm sido renovados de tempos em tempos - é o caso do IPI sobre automóveis - sem criar um horizonte para o planejamento.

Incapaz de cuidar das principais questões, o governo tem aumentado as barreiras para proteger a indústria. Assim favorece mais a sustentação de preços altos do que a adoção de planos de investimento e de modernização. Mas o protecionismo tem efeito limitado, por causa do escasso poder de competição da indústria. O Brasil poderia importar muito mais, com uma economia mais aberta, e ao mesmo tempo exportar muito mais, se o governo se preocupasse com os níveis gerais de eficiência.

No primeiro trimestre deste ano, a exportação foi 3,1% menor que a de um ano antes e, a importação, 11,6% maior, considerando-se a média dos dias úteis. Esse descompasso se manifestou já em 2007, quando a receita comercial aumentou 16,1% e a despesa, 31,5%. A tendência foi interrompida em 2009, com o impacto da crise, e retomada em 2010. Em 2011 as vendas cresceram pouco mais que as compras (26,8% contra 24,7%) e no ano passado a deterioração se intensificou. O Brasil importou quase o mesmo que no ano anterior, 1,4% a menos, enquanto a exportação encolheu 5,3%.

Alguns analistas apontam a valorização do real como grande problema do comércio exterior e da indústria, mas em 2012 o dólar subiu e o saldo comercial piorou. É perda de tempo concentrar a atenção no câmbio quando todos os fatores estruturais deixam o produtor brasileiro em desvantagem. Nem o competitivo agronegócio é imune a esses fatores. O setor é eficiente, mas suas cargas ficam empacadas no caminho dos portos.

Revoguem-se as disposições contrárias - ROSÂNGELA BITTAR

Valor Econômico - 03/04

Com a nomeação de César Borges, do PR, para o Ministério dos Transportes, a presidente Dilma já pode dar por encerrado o ciclo de mudanças nos comandos do governo a que se propôs neste início de terceiro ano de mandato. Entretanto, ainda é nebulosa a filosofia que presidiu a mexida em que saíram técnicos de reconhecida atuação e entraram políticos de partidos antes varridos na denominada faxina ética do primeiro ano, num fazer e desfazer sem fim da escola de Macondo.

A lógica da composição do gabinete mudou nos governos do PT. Antigamente, trocava-se um ministro por outro cuja simples menção ao nome apontava para uma política pública, uma região ou um Estado aliado do governo, ou para a representação de uma indústria onde dominava um partido e que levasva o partido e a indústria ao posto para reforçar a aliança política de apoio ao governo Agora, qual o critério?

A presidente Dilma acatou o desenho de governo feito pelo ex-presidente Lula, seu antecessor e criador, e formou o primeiro governo muito à imagem e semelhança dele, que tinha representantes pessoais fortes nos postos estratégicos. Esses começaram a cair quando ela resolveu ceder ao clamor moral que as denúncias sucessivas provocavam, e boa parte da tropa lulista foi defenestrada.

No segundo ano, seguiu com alguns técnicos em lugares estratégicos, como a Aviação Civil, que necessitava de gestão para superar apagões aéreos e levar adiante as concessões; a Petrobras, onde também foram identificados desvios para a política partidária; o ministério dos Transportes, sempre um reconhecido balcão de negócios, entre outros postos para onde seguiram representantes mais discretos dos partidos da base. Os políticos aliados, da rede colhida no mensalão ou não, ficaram um bom período sem poder impor caminhos à presidente, com uma estudada discrição.

Este ano, o terceiro do mandato, é de campanha da reeleição na rua, estrategicamente, por enquanto, centrada no Nordeste e nas medidas de caráter geral e popular, orientadas pela técnica de publicidade, para sensibilizar todas as regiões.

Perderam a vez as opções mais técnicas para dar lugar novamente aos políticos de carreira. O presidente do PDT, Carlos Lupi, reassumiu o Ministério do Trabalho com Manoel Dias, um preposto. O PMDB pegou a Secretaria da Aviação Civil, dando o que fazer ao ministro Moreira Franco, que se declarava ocupante de um cargo que não conseguia eleger um vereador, a Secretaria de Assuntos Estratégicos.

Políticos que a presidente Dilma costuma ouvir afirmam que é agora, no terceiro ano, que ela está certa. Segundo esse raciocínio, o que houve, no começo, foi uma subestimação da política, das alianças, da frente heterogênea formada desde o primeiro ano de Lula.

Depois das demissões, foi o ano de julgamento do mensalão, os políticos ficaram se medindo de cima abaixo. Dilma deixou a política no seu curso, longe dela, e o senador Aécio Neves abdicou do papel que se esperava dele, de líder da oposição. Abriu-se, então, um vácuo para o governador Eduardo Campos, que não se fez de rogado e o preencheu. Os políticos, que faziam peregrinação ao gabinete de Lula, passaram a fazer ao de Eduardo, que ocupou o lugar do governo e da oposição para efeitos de articulação política com os partidos e os governadores. Vinha de uma significativa vitória sobre o PT, na eleição municipal, as atenções todas se voltaram para ele. Para os próprios analistas que gravitam na órbita do Planalto, não foi Eduardo Campos quem foi atrás disso, foi isso que foi ao encontro dele. A política, diz um integrante muito fiel da base aliada, vai atrás de quem oferece a ela uma chance. Bonito de se dizer, alto, algo com um significado tão baixo: o de que foi preciso, para engatar a campanha da reeleição, voltar à relação promíscua com os partidos tal como eles se apresentam.

O que ocorre agora é uma tentativa de retomar, rápido, o espaço ocupado por Eduardo. Aí, volta qualquer um para o governo: o PR para os Transportes (saíram de lá mais de 20 "autoridades" na faxina ética), o PMDB fica com a Aviação Civil, o PT e os evangélicos mantêm seus espaços e a presidente passa a dar ouvidos aos sindicatos, aos movimentos, às redes sociais, a tudo o que pode virar instrumento de campanha. Afirma-se que não haverá diferença para a eficiência da gestão. Com Wagner Bitencourt, egresso do BNDES, a aviação civil não se recuperou do apagão, quem sabe não se recupera agora, dizem os otimistas conselheiros da presidente, com alguém, como Moreira, que já foi governador do Rio e prefeito de Niterói? Sem ironias.

Lupi reassume o controle do Ministério do Trabalho e sua criação de sindicatos e farta distribuição do dinheiro do trabalhador, deixando sem emprego um simbólico representante do brizolismo, o filho. E daí, de novo? Quem sabe o que se quer mesmo além de uma base unida? A gestão, o projeto, não estão em questão. Como diz o político ligado à presidente, não dá para separar a gestão da política, e os políticos, chegando lá, fazem o que for para fazer.

Todos os presidentes trabalharam com a base de apoio que tinham no Congresso. É o que a presidente Dilma está tentando fazer agora, filosofa-se, com dois anos de atraso.

O recuo na política de desoneração de automóveis, depois de haver definido, com aparente segurança, normas permanentes há apenas três meses, é muito mais um salve-se quem puder do que quer fazer crer o Ministério da Fazenda. Na falta de argumento que fundamente as medidas por um prazo maior do que o curtinho trimestre, chega a ser abuso da boa fé dizer que a crítica parte de quem não quer redução de imposto, como fez esta semana uma autoridade daquele gabinete. É muito mais, também, do que contar com a demanda do consumidor já saturado de carro e de dívida. É imprevisibilidade na veia, que resulta em queda do que resta de credibilidade.

Advogados e juízes - ROGÉRIO MEDEIROS GARCIA DE LIMA

O ESTADÃO - 03/04

O ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal, apontou o "conluio" entre juízes e advogados como o que existe de "mais pernicioso" na Justiça brasileira. As declarações foram feitas durante sessão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), quando foi aplicada penalidade de aposentadoria compulsória a um juiz do Piauí acusado de beneficiar advogados (Folha de S.Paulo, 20/3).

No dia seguinte, este jornal divulgou o vazamento de e-mail remetido pelo desembargador Tourinho Neto para o advogado Jorge Hélio, ambos integrantes do CNJ. A notícia apontou a suspeita de tentativa de favorecimento à filha de Tourinho Neto, a juíza federal Lilian Tourinho (O Estado de S. Paulo, 21/3).

Não estou certo de que o ministro Joaquim Barbosa se tenha expressado de forma genérica, mas a generalização não é justa para com a imensa maioria dos advogados e juízes brasileiros. A polêmica, todavia, poderá abrir saudável debate sobre o atendimento a advogados pelos juízes.

Em 2009 surgiu acirrada controvérsia em torno de um projeto de adoção de dispositivo regimental para disciplinar o recebimento de advogados pelos ministros do Supremo Tribunal Federal. Pouco antes, em dezembro de 2008, participei do Curso de Administração Judiciária, Administração Pública e Sistema Judiciário Norte-Americano, ministrado pelo Dean Rusk Center for International and Comparative Law, da Universidade da Geórgia (EUA).

Fomos informados de que os juízes da Suprema Corte dos Estados Unidos não recebem advogados para tratar das causas em andamento naquele tribunal. Nas demais Cortes e nos juízos de primeiro grau, federais e estaduais, o advogado somente é recebido pelos magistrados para entrevista previamente agendada e desde que acompanhados pelo advogado da parte contrária. Caso o magistrado receba advogado para examinar alguma medida de emergência, tem a obrigação de dar imediata ciência, por qualquer meio de comunicação disponível, ao advogado da outra parte.

Também participou daquele intercâmbio o ministro Jorge Nanclares, então presidente da Suprema Corte de Mendoza (Argentina). Nanclares afirmou que a Suprema Corte argentina editou ato normativo segundo o qual - à semelhança do que vigora nos Estados Unidos - o advogado só será recebido pelo ministro em entrevista previamente agendada e desde que acompanhado pelo advogado da parte contrária. Posteriormente, o Conselho Nacional de Justiça argentino estendeu a referida norma a todos os tribunais e juízos do país.

No Brasil, o artigo 7.º, inciso VIII, da Lei n.º 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) assegura ao advogado a prerrogativa de "dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada". Se aplicado literalmente esse preceito, enfrentaremos enorme dificuldade prática.

Para exemplificar, o Supremo Tribunal Federal tem mais de 70 mil processos em tramitação. O número de feitos em trâmite pelo Superior Tribunal de Justiça aproxima-se da casa dos 300 mil. A 14.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), que integro com mais quatro desembargadores, julgou mais de 12 mil processos somente no ano de 2012.

O que aconteceria se todos os advogados das partes envolvidas nesses processos quisessem ser atendidos por ministros e desembargadores, "independentemente de horário previamente marcado ou outra condição"? Como os cerca de 14 mil magistrados brasileiros, cada qual com milhares de processos sob sua jurisdição, procederiam se todos os advogados pretendessem valer-se da mesma prerrogativa? Como assegurar, inclusive nos tribunais superiores, que todos os advogados tenham atendimento igualitário?

Na prática, procura-se cumprir o dispositivo legal no limite da saturação. Cada minuto do dia do magistrado é precioso para dar conta da desumana demanda de serviços.

De resto, os magistrados têm de se precaver contra o "jeitinho brasileiro". Todo brasileiro se indigna com escândalos fartamente noticiados. Todavia eles são a "cara" do Brasil. Sérgio Buarque de Holanda definiu o brasileiro como "homem cordial". Tem sociabilidade aparente para obter vantagens pessoais e evitar cumprir a lei que o contrarie (Raízes do Brasil, 9.ª edição, 1976, páginas 105/106).

Muitos dos que xingam duramente os corruptos são os mesmos que elegem políticos almejando benesses pessoais. Diversos homens públicos são identificados com o slogan "rouba, mas faz". Esses eleitores não idealizam os representantes que administrarão e elaborarão leis em nome da comunidade, mas os "amigões do peito" que vão "ajeitar sua vida", conseguir uma "boquinha" sem concurso público, cancelar uma multa de trânsito ou livrá-los de problemas com o delegado de polícia e o fiscal fazendário. São os mesmos eleitores que sonegam Imposto de Renda, subornam funcionários públicos, compram drogas de traficantes ou fazem apostas em jogos ilícitos. Contudo somos todos muito bons, boníssimos. Corruptos são os outros.

Nesse contexto cultural, com 24 anos de dedicação honesta e incansável à magistratura, posso revelar que juízes também recebem pedidos a todo instante. Assusta-me a sem-cerimônia com que são abordados os magistrados no Brasil. Qualquer cidadão tem um parente, amigo ou "amigo do amigo" de um juiz. Usando esses canais, pede "uma mãozinha" no julgamento do seu processo. Como o Poder Judiciário brasileiro é muito lento, é costume admitir pedidos de mera dinamização do andamento de causas. Porém - sinto dizer - na maioria das vezes o "jeitinho" almejado, explícita ou implicitamente, é a decisão a favor do postulante, ainda que contra a lei.

Desemprego limita política monetária - CRISTIANO ROMERO

Valor Econômico - 03/04

Quando declarou que não se combate mais inflação no país com redução do crescimento econômico, a presidente Dilma Rousseff expressou mais que uma convicção: ela fixou limites para o aumento do desemprego, que, em sua gestão, atingiu os valores mais baixos da série histórica. Está claro que se tornou um tabu, em Brasília, tomar medidas que provoquem elevação da taxa de desocupação com a finalidade de combater a carestia.

O Banco Central (BC) está sendo confrontado com esses limites. Na primeira fase de sua atuação nesta gestão (de janeiro a agosto de 2011), recorreu a dois expedientes para controlar a inflação: o aumento da taxa básica de juros (Selic) e a adoção de medidas macroprudenciais.

Em maio de 2011, um dirigente do BC chegou a afirmar, em conversa com o titular desta coluna, que, para reverter o processo inflacionário, seria necessário levar a taxa de desemprego para pelo menos 8% até o fim daquele ano. Naquele mês, o índice ficou em 6,4%. Já a inflação em 12 meses acumulara variação de 6,55%, acima do limite superior do intervalo de tolerância (6,5%).

Em agosto de 2011, o Comitê de Política Monetária (Copom) alegou que o agravamento da crise nas economias centrais teria efeito desinflacionário sobre o Brasil e, por isso, decidiu mudar o rumo da política monetária: em vez de continuar elevando a taxa de juros, o Comitê passou a reduzi-la, levando-a para o menor patamar da história.

Nos meses seguintes, a economia brasileira assistiu a dois fenômenos: a atividade econômica seguiu em processo de desaquecimento e, apesar disso, a taxa de desemprego começou a bater recordes sucessivos de baixa. A inflação, depois de chegar a 7,31% nos 12 meses acumulados até setembro, caiu nos meses seguintes, como previu o BC. Em junho de 2012, recuou para 4,92%, o melhor resultado do governo Dilma.

Uma combinação de desvalorização do real - esta, em grande medida, provocada pelo próprio governo e o BC - com choques de preços agrícolas interrompeu o processo de queda do IPCA, que a partir de julho entrou em rota de aceleração (6,31% nos 12 meses até fevereiro, com risco de superar o teto de 6,5% neste mês).

É do BC a constatação de que a inflação se tornou mais resistente nos últimos meses. E que essa resistência tem relação com o fato de os salários estarem crescido acima da produtividade da economia. Num boxe do Relatório de Inflação (RI) divulgado semana passada, está dito: "A evidência disponível também sugere que o crescimento dos salários em termos reais (...), acima dos ganhos de produtividade, não é um fenômeno observado em alguns segmentos apenas, mas disseminado nos principais setores da economia".

O desemprego vinha caindo desde os últimos anos do governo Lula e chegou a percentuais historicamente baixos na gestão atual. Um fator pode ter sido decisivo para isso: no início do mandato, Dilma aprovou lei instituindo uma espécie de superindexador para o salário mínimo, que passou a ser corrigido com base na variação da inflação do ano anterior, acrescida do Produto Interno Bruto (PIB) real de dois anos antes. Por causa dessa política, o setor de serviços, que já vinha crescendo em ritmo mais forte que os outros, passou a pressionar ainda mais o mercado de trabalho, encarecendo a mão de obra.

No boxe do RI, os técnicos dizem que "os exercícios indicam que a propagação das pressões inflacionárias oriundas do mercado de trabalho depende da postura da política monetária". Em outras palavras, eles indicam que, para impedir que os custos de produção e, consequentemente, os preços de bens e serviços subam em decorrência da escassez de mão de obra, o Copom deveria apertar a política monetária e promover algum desemprego.

É evidente que não é isso que o Palácio do Planalto deseja que o BC faça. É por essa razão que o governo tem lançado mão de diversos expedientes para segurar os preços. O corte das tarifas de energia e as desonerações de impostos diminuem, de fato, a pressão inflacionária no curto prazo, mas não alteram a inflação tendencial. Esta continuará pressionada por problemas do lado da oferta da economia.

Há uma visão dentro do BC benigna em relação ao mercado de trabalho, o que indica que não há consenso, na instituição, quanto à necessidade de um forte aperto monetário neste momento para mudar a trajetória da inflação. Por essa visão, na margem os salários já não estão crescendo tão acima da inflação como nos anos recentes, o que diminuirá adiante as pressões inflacionárias.

Haveria ainda três razões para um certo otimismo. A primeira é a tese de que o mercado de trabalho não está tão apertado quanto parece. Ao estudar o assunto, o BC teria constatado que a participação dos jovens entre 18 e 24 anos no mercado de trabalho diminuiu nos últimos dez anos. Esses jovens estariam estudando mais. As famílias, por causa do aumento de renda ocorrido no período, estariam conseguindo manter seus filhos por mais tempo dedicados à formação profissional.

A segunda razão está relacionada ao fato de o setor de serviços ter aumentado seu peso na economia. Esse setor paga salários mais baixos e emprega mais trabalhadores, embora tenha uma produtividade menor.

O terceiro aspecto seria a retenção de trabalhadores por parte das empresas, mesmo em meio ao baixo PIB. Como a economia pode se recuperar e o mercado de trabalho está aquecido, as empresas teriam optado por usar o fator trabalho com menor intensidade (por meio da redução do número de horas trabalhadas), em vez demitir pessoal e incorrer em custos mais altos de recontratação no futuro. Isso provocou a diminuição da produtividade nos últimos dois anos.

"Você tem aí algumas folgas, em que dá para crescer de forma menos inflacionária, usando mais intensamente o fator trabalho. Na recuperação, a produtividade também é cíclica, portanto, ela vai aumentar. A partir do momento em que o trabalhador trabalha mais horas, ele produz mais produtos. Então, os indicadores de produtividade melhoram com a recuperação da economia", disse uma fonte.

Há também a aposta de que um pedaço de utilização da capacidade na indústria pode ser preenchido de forma não inflacionária.

Para que não se esqueça - CLAUDIO FONTELES

O GLOBO - 03/04
Passados oito meses da definição de seus membros e efetiva instalação, o tempo faz-se propício para que possa partilhar com todos minha vivência nessa missão, ainda que inconclusa, ainda que a retratar experiências não encerradas.

De plano, que se assente, com total certeza, a imprestabilidade da argumentação a bradar o caráter revanchista da Comissão Nacional da Verdade porque dois lados existem e, então, como não se investigar, também, a conduta dos que, politicamente, se opuseram ao Estado ditatorial militar?

Não há dois lados, na verdade não há lado algum, mas uma única realidade, normativamente caracterizada.

Com efeito, como está mesmo na Exposição de Motivos que fundamentou a Lei nº 12.528/2011, que criou a Comissão Nacional da Verdade, com a Lei nº 9.140/1995, ficou assentado que o Estado brasileiro, por seus agentes públicos, cometeu graves violações em detrimento da pessoa.

Ora, por tal razão, que é cristalina, a Comissão Nacional da Verdade deve cuidar exclusivamente de averiguar os fatos consumados por agentes públicos, dado que com a edição da Lei nº 9140/1995, cujo ciclo normativo a Lei nº 12.528/2011 encerra, reiterando o que acima disse, o Estado brasileiro reconheceu como mortos, por seus agentes públicos, "pessoas que tenham participado ou tenham sido acusadas de participação em atividades políticas" (artigo 1º da Lei nº 9140/1995).

Assim, a muitos dos opositores do estado ditatorial militar em momento algum garantiu-se-lhes regular processo. Foram arbitrariamente sequestrados, presos, torturados, mortos e desaparecidos pelos agentes públicos da repressão oficializada.

É fora de dúvida que esses agentes públicos, não importa a posição em que tenham figurado, conspurcaram o bom nome das instituições a que serviam, que com eles não devem ser confundidas.

Não tem cabimento algum dizer-se, nesse passo, que "cumpriam ordens superiores".

Ora, é da tradição do direito universal que só se escusa a alegação de pautar-se no cumprimento de ordem de superior hierárquico quando essa ordem não seja manifestamente ilegal.

Por-se a torturar; dispor-se a matar, inclusive fazendo desaparecer, quem já se encontrava totalmente subjugado, obviamente não escusa ninguém, justo por assim se caracterizarem gravíssimas violações aos direitos humanos.

A Comissão Nacional da Verdade tem o dever legal, portanto, de buscar esclarecer essas situações.

Essa missão é sua, mas necessita empreendê-la com todos.

Por si, e em si mesma, a Comissão Nacional da Verdade não chega a lugar algum.

Eis por que todos nós, membros da Comissão Nacional da Verdade, concretamente já percorremos vários Estados-membros da Federação brasileira, e continuaremos a percorrer os demais, incentivando e dialogando para que Comissões, sejam elas oficiais, sejam elas da sociedade civil, surjam para contínuo trabalho conjugado, e sigam adiante, mesmo após o fim de nosso mandato.

Além de esclarecer - já o disse antes - os mais vários episódios que marcaram o período do Estado ditatorial militar, é missão de todos nós, claro propulsionada pela Comissão Nacional da Verdade, estabelecer permanente rede protetiva da democracia, para que jamais, em solo brasileiro, as gerações presentes e as gerações futuras sejam arrastadas e padeçam dos desmandos brutais e incontrolados do estado ditatorial militar. Creio, firmemente, ser esse o escopo maior devido por todos nós aos que quedaram vitimados pela truculência descomedida do estado ditatorial militar.

O resgate da memória é a garantia do presente livre: unidade na diversidade. O resgate da verdade é a certeza do presente no futuro: novidade na continuidade. 

Seis décadas de provocação - GILLES LAPOUGE

O Estado de S.Paulo - 03/04

À beira de uma crise de nervos, sob os olhos preocupados dos EUA, as duas Coreias desafiam-se há 60 anos, desde o fim da guerra sangrenta que opôs o Norte, comunista, contra o Sul, capitalista, de 1950 a 1953.

Devemos nos preocupar, hoje, quando o ditador do Norte, Kim Jong-un, entra em transe mais uma vez contra os EUA e a Coreia do Sul, como antes faziam seu avô, Kim Il-sung, e, depois, seu pai, Kim Jong-il? À primeira vista, não há motivo para pânico: as duas partes mutiladas do território coreano entram regularmente em erupção, manobram suas tropas como soldadinhos de chumbo, cantam hinos guerreiros e, então, retornam às casernas.

No entanto, cada uma dessas crises de nervos é mais perigosa do que a anterior porque, ao longo dos anos, o Norte não cessou de fortalecer seu efetivo - hoje de 1.160.000 homens - e montar um enorme arsenal com mísseis e bombas nucleares. A crise atual diz respeito a esse arsenal. Em dezembro, Pyongyang lançou um míssil de longo alcance. Depois, em 12 de fevereiro, realizou um terceiro teste nuclear. Em seguida, Pyongyang, sob o pretexto dos exercícios militares realizados anualmente pelo Sul e os EUA, pôs as tropas em alerta e suspendeu comunicações com Washington. Declarou-se em estado de guerra com o Sul - uma decisão inócua, pois, embora as duas Coreias tenham firmado um armistício em 1953, jamais assinaram um tratado de paz.

Jovem e inexperiente, Kim, com seu rosto de bebê, não poupa palavras. Não basta ameaçar a Coreia do Sul (o "irmão inimigo"). Ele ameaça também lançar alguns mísseis sobre os EUA.

Anuncia agora a retomada das operações da instalação nuclear de Yongbyon, dotada de um reator de 5 megawatts, a única fonte de plutônio para o programa nuclear militar. Pouco tempo antes, Kim expôs sua filosofia ao Comitê Central do Partido dos Trabalhadores: "Nosso poderio nuclear é uma força de dissuasão confiável e a garantia da preservação da nossa soberania".

Washington não baixou a guarda. Reforçou a presença aérea, enviando, além dos seus bombardeiros B-52 e dos bombardeiros B2, caças Stealth F-22 Raptor que acabam de chegar ao Sul.

Não devemos esquecer que a cooperação militar entre a Coreia do Sul e os EUA continua estreita: Washington mantém na Coreia do Sul 25 mil soldados (o Japão tem ali 50 mil homens).

Seul leva a situação muito a sério. A presidente Park Geun-hye declara: "Haverá uma resposta violenta e imediata no caso de uma nova provocação". Park Geun-hye não é uma dama fácil de lidar. Ela é a líder dos falcões da Coreia do Sul. Seu ministro da Defesa não excluiu ataques preventivos para destruir instalações militares do Norte.

Resta saber qual é a capacidade de perturbação real do Norte. Não é negligenciável, mas daí a constituir uma verdadeira ameaça contra os EUA há uma distância muito grande. Quando muito, bombas nucleares só chegariam a tocar a ponta do Alasca.

Além disso, mesmo que os diplomatas reconheçam que a tensão atinge um grau jamais visto desde 1953, eles excluem a hipótese mais temível. Juliette Morillot, especialista francesa em Coreia do Norte, considera três hipóteses. A primeira, uma guerra aberta provocada por um bombardeio norte-coreano contra alvos dos EUA, causando uma reação americana fulminante. A segunda hipótese é a de um erro de avaliação da Coreia do Norte, o que acarretaria igualmente uma reação impiedosa. E, finalmente, a mais plausível, escaramuças na fronteira.

Palavras do chanceler - MATIAS SPEKTOR

FOLHA DE SP - 03/04

Brasil precisa obter reconhecimento como ator "nuclearmente responsável"


Na próxima semana, Antonio Patriota vai a Washington para discursar sobre o futuro da política nuclear mundial em uma grande conferência sobre o tema.

A princípio, não deveria haver grande mistério nisso.

Afinal, os objetivos da diplomacia nuclear brasileira são claros: proteger a incipiente indústria nacional de enriquecimento de urânio; mitigar a desconfiança dos vizinhos a respeito do projeto do submarino nuclear; negociar salvaguardas para o submarino se e quando ficar pronto; e eliminar as travas legais que emperram a retomada do programa espacial.

Também cabe à diplomacia nuclear a árdua tarefa de obter reconhecimento internacional do Brasil como ator "nuclearmente responsável". Trata-se de um rótulo que não se ganha pelo mero cumprimento de critérios técnicos, mas tem de ser obtido e mantido em um ambiente altamente politizado e incerto.

E cabe à diplomacia nuclear oferecer uma visão brasileira, concreta e prática, do que seria um ordenamento nuclear minimamente justo e estável. A primeira vez que se tentou algo assim em escala global foi com a Declaração de Teerã, em 2010. Não deveria ser a última.

No entanto, a palavra do chanceler será importante porque, em anos recentes, o programa nuclear brasileiro não tem sido muito bom de relações públicas. Agora, com as atividades nucleares do país em fase de expansão, acertar o tom é tarefa urgente.

Em 2004, por exemplo, Brasília tinha bons motivos quando sugeriu a Buenos Aires uma reavaliação do sistema bilateral de controles nucleares mútuos: a forma em que foi feita a sugestão, contudo, assustou e afastou o vizinho, com repercussões negativas até hoje.

Quando o Brasil limitou o acesso de inspetores estrangeiros às centrífugas de fabricação nacional, em vez de explorar as alternativas propostas pelos nossos próprios cientistas qualificados, politizou-se o tema, levando muita gente boa, mundo afora, a pensar que o país tem muita coisa a esconder. Não tem.

Quando o ex-vice-presidente José Alencar disse que países detentores de bomba atômica têm mais autoridade do que países desarmados, falava uma simples verdade.

Saída de sua boca, contudo, a mensagem levantou suspeitas desnecessárias. Efeito idêntico ocorre cada vez que alguém em Brasília diz, publicamente, ter sido um erro assinar o Tratado de Não Proliferação Nuclear.

Ou quando se busca justificar a construção do submarino nuclear não apenas para capacitação industrial e tecnológica, mas também como instrumento para negar o uso do mar a eventuais inimigos. De Santiago do Chile a Paris, de Nova Déli a Moscou, almirantes que entendem estratégia naval arqueiam as sobrancelhas com perplexidade. Ou preocupação.

Fatos assim obstaculizam o objetivo fundamental, qual seja o de tocar o processo brasileiro de conhecimentos e negócios na área nuclear de forma aberta e transparente, sem gerar tensão à toa.

Falando na capital dos Estados Unidos, algumas palavras do chanceler brasileiro podem fazer um baita bem.

As banais condições de toda democracia - FRANCISCO RAZZO

GAZETA DO POVO - PR - 03/04

Há uma peculiaridade no idioma grego clássico que pode nos ajudar a refletir a respeito não apenas do surgimento da democracia, mas do seu próprio modus operandi: é impossível compreender o que alguém pretende dizer sem ouvir até o fim o que será dito. A sintaxe grega não permite induções do tipo: “ah, tá, já entendi aonde você quer chegar!”, tão típicas do nosso idioma e tão expressivas em nossas disputas intelectuais e políticas. Em grego, ou você escuta até o fim ou vira as costas e deixa seu interlocutor falando sozinho, sem saber o que de fato ele queria lhe comunicar.

A verdade é que, historicamente, a democracia não surgiu como um valor em si mesmo, mas apenas como um tipo de governo “no qual a ‘maioria’ detém o poder”, isto é, em que os homens que eram considerados livres detinham a possibilidade de resolver assuntos da cidade por meio do uso da palavra persuasiva (peithein) que se justifica (logon didonai) em uma discussão (dialegesthai) em que há claramente disputa (agon) de opiniões (doxa) e não mediante o uso arbitrário da autoridade do berro ou da espada.

Percebe-se que ela tem seus riscos e que, portanto, não é perfeita – foi duramente criticada por Platão, sobretudo por ter sido a principal responsável pela morte de Sócrates. Entretanto, a democracia originou-se em oposição à aristocracia ou em oposição às antigas monarquias guerreiras, caracterizando-se, assim, principalmente por codificar em escrita as suas leis; a essas, sim, portanto, atribuía-se um valor em si, enquanto a democracia propriamente dita era tão somente o meio pelo qual se estabeleciam as leis.

Duas eram as condições necessárias para a consolidação da democracia em Atenas, a saber: a isegoria e a parresia. A primeira marcava a fundamental característica de igualdade no direito à palavra: todo homem livre tinha o direito de manifestar-se na ekklesia, isto é, na assembleia. A segunda condição definia fundamentalmente a possibilidade concreta de dizer livremente aquilo que se quer dizer, pois era o que marcava precisamente a condição e a consolidação do estatuto de um homem se tornar cidadão.

Voltemos à democracia brasileira: a verdade é que, historicamente, apenas brincamos de democracia. A nossa, comparada à tradição ocidental cujo pilar é a Grécia, goste-se ou não, tem alguns meses de vida; é uma criança que ainda nem aprendeu a falar – e, pelo jeito, a escutar. E o problema, mais grave ainda para quem faz da democracia “um valor em si”, é que no Brasil não passamos pelo processo da Aufklärung, tão caro à consolidação do Estado Democrático de Direito no Ocidente europeu, cuja finalidade foi, em última instância, tentar resolver conflitos de natureza religiosa emergentes da Reforma, da Contrarreforma, da culturas árabe e judaica etc.

Toda essa polêmica sobre o deputado Feliciano e os “direitos humanos das minorias” é uma consequência direta dessa falta de cristalização da tradição ocidental nas nossas relações culturais, em geral, e nas relações políticas, em particular. Mesmo as supostas conquistas dos movimentos de 68 deixam a desejar aqui no Brasil, já que sempre vivemos com a raspa do tacho do que há de pior no mundo em termos de fantasias ideológicas. Em suma, eis o drama do formalismo institucional diante da inaptidão de um ethos cuja expressão máxima se dá na simplicidade do senso comum – pois, sejamos francos, toda essa polêmica se resolveria com um gesto absolutamente banal: deixar o interlocutor terminar de falar enquanto atentamente ouvimos e nos preparamos pra discordar. Lembremo-nos de que aqueles que berram, isto é, balbuciam gritos, foram qualificados pelo grego de “bárbaros”.

Algo de podre no reino das obras - ZUENIR VENTURA

O GLOBO - 03/04
Não quero ser alarmista, mas se o Engenhão, com pouco mais de seis anos, teve que ser interditado por causa de ferrugem no arco da cobertura, o que dirá o Elevado do Joá, com seus 40 anos de existência, sujeito à maresia e a uma duvidosa manutenção? A Coppe já deu a resposta. Através de laudo técnico, diagnosticou que "o estado de degradação estrutural pelo avanço da corrosão compromete a segurança do viaduto". Tudo bem que foram tomadas providências emergenciais para os reparos parciais. Mas será que isso resolve? Engenheiros acham que não. O professor Miranda Batista, que coordenou o estudo, é taxativo: "A vida útil do Joá acabou. A reforma que a prefeitura promete fazer cobre apenas as áreas onde o problema é visível. Mas 60% delas não podem ser fiscalizados." O vice-presidente da Associação Brasileira de Pontes e Estruturas (ABPE,), Ubirajara Ferreira da Silva, também defende a restauração completa do elevado. "O que o prefeito propõe é atuar com base na incerteza", ele acusa.

Eduardo Paes alega que, como restam de fato incertezas sobre as reais condições de conservação nas partes internas da construção não visíveis por falta de acesso, é mais econômico realizar as obras que, ao longo do tempo, forem apontadas como necessárias. Mais econômico, sim. O trabalho inteiro custaria mais de R$ 100 milhões. Em compensação, a solução não seria muito mais segura? O relatório dos técnicos não deixa dúvidas quanto à gravidade do desgaste estrutural dos "dentes de apoio das vigas". Quem já viu um filme parecido com final trágico, como a queda do Elevado Paulo de Frontin, em 1971, não passa hoje pelo Joá despreocupadamente. Como desabafou a jornalista Leda Nagle: "Não posso ficar calada, fingindo que não sei que o viaduto está corroído e ameaçado."

É evidente o perigo que oferecem nossas obras públicas. O Engenhão, além de tudo, não suporta nem ventos de mais de 60km; o Joá, com estrutura soltando pedaços, é uma situação de risco; prédios do Minha Casa Minha Vida desabando antes de inaugurar; o BRT Transoeste, de apenas nove meses, tendo que refazer o asfalto da pista. Enfim, não dá para não se assustar. Quaisquer que sejam as causas - defeitos no projeto, falhas na execução, precariedade de material, falta de fiscalização, descuido com a manutenção ou tudo isso, a verdade é que há algo de podre com as nossas edificações oficiais, e a culpa talvez não seja apenas da engenharia.

Brasil, brasil - ROBERTO DaMATTA

O Estado de S.Paulo - 03/04

Escrevi um livro chamado O Que Faz o brasil, Brasil? e descobri que muita gente lia o seu bizarro título como O Que Faz do Brasil, Brasil?. Nele, eu confrontava um "brasil" como espaço geográfico e um "Brasil", um coletivo que legisla sobre si mesmo. Num nível mais complexo, eu queria confrontar - num momento difícil, pois o livro veio à luz em 1984 - práticas sociais seculares tidas como inocentes (amizade, comida, festas, trabalho, religiosidades) mais do que as instituições recorrentes nas conceituações do Brasil, as quais teimavam em reduzi-lo a Estado e a "governos" propondo, nas entrelinhas, um regime ideal a ser um dia milenariamente realizado.

Daí, talvez, o tema da conspiração, o qual, ao lado da comida, do futebol, do fuxico, da "versão verdadeira", do compadrio e do carnaval, é um dos traços mais constantes das representações do Brasil. Dela surge a crença na inveja, no "mau-olhado", como provam as pulseirinhas usadas pela presidente Dilma, que, suponho, deve ser materialista.

Cresci ouvindo conspirações. A primeira era a do Diabo contra a castidade. O erotismo nas suas formas mais banais revelava a presença do Demo em nossos pobres banheiros que só tinham água fria. O Diabo deturpava nossos pensamentos e, tal como a presidente Dilma disse para os jornalistas, manipulava os nossos sentimentos. De fato, na hora de dormir, pensávamos na Gabriela e, em vez dela surgir no seu vestido rendado, ela aparecia nua, denunciando o pecador oculto dentro do rapazinho inocente.

Um dia, conversando sério com um amigo, pensamos em amputar nossas mãos. Ele havia feito a tentativa de paralisá-las, mas o resultado promoveu um pecado ainda mais delicioso, porque "minha mão parecia ser de outra pessoa!", disse num lamento.

Mais tarde, já frequentando um curso de História que, diziam, não levava a coisa alguma e era destinado a incapazes e mocinhas, um colega mais politizado - um realista - me ensinou como os Estados Unidos tinham um plano conspiratório contra o Brasil, o qual era encabeçado por Gene Kelly, Donald O'Connor e Debbie Reynolds por meio de um manifesto chamado Cantando na Chuva.

O mundo não era o que eu via, era um lugar de conspirações e deturpações. De lutas veladas do Bem contra o Mal em suas mais diversas encarnações, e somente o confronto no espelho da "conscientização" nos livraria de uma inocência útil.

Passei, pois, de pobre pecador solitário a inocente útil coletivo, aliado inconsciente do grande Demônio chamado Estados Unidos que todos nós, inclusive os meus mentores, consumíamos em filmes, moda e livros, desbragadamente.

Ainda hoje um lado meu diz que tudo conspira. De uma certa perspectiva, o filme é um mero musical, mas do ponto de vista da tela trata-se de uma maldita conspiração. Mude-se o ponto de vista e o mundo muda de figura: a música que canta o amor eterno vira ideologia. O mesmo com a pintura de Victor Meirelles, Parreiras, Pedro Américo e de Amoedo (apreciada pelo meu avô Raul) e com os livros de Machado de Assis, um dos meus mentores ideológicos que considerava um alienado porque ele não fora capaz de denunciar a "luta de classes" existente no Brasil.

Esse era um mundo de verdades e mentiras no qual víamos os problemas políticos e sociais como doenças e imposições das quais podíamos nos livrar tomando os remédios e as medidas apropriadas. Nele não havia contradição de valores, mal-entendidos, má-fé nem consequências não previstas de falas e comportamentos. Você, diziam, tem direito de fazer o que quiser, porque é livre, mas não pode casar com uma negra; não há nada de mais em adotar políticas opostas para um mesmo problema, como nada impede que o Congresso Nacional coloque na Presidência de uma Comissão de Ética um homofóbico fundamentalista. Deus só fazia o bem e o Diabo, o mal. Não se suspeitava do seu nível de interdependência, aliás, sabia Santo Agostinho.

Vivi um Brasil que desconhecia a força das pequenas coisas - das comidas, da saudade e das festas de aniversário: dos favores e dos amores. Um Brasil crente que as "criadas", as "amas" e as "aias" eram parte da família.

Saudosismo? Nada disso. Quero, isso sim, ajudar a ver o Brasil "inocente" cara à cara com o das conspirações. Um Brasil que, pelo que vejo, ainda se pensa que pode resolver tudo pela lei e pelo decreto.

Fique à vontade - VERA MAGALHÃES - PAINEL

FOLHA DE SP - 03/04

Dilma Rousseff deve aproveitar a ida à Associação Comercial de São Paulo, no dia 29, para formalizar o convite para Guilherme Afif assumir a nova pasta da Micro e Pequena Empresa, último ato da reforma ministerial. Afif diz a interlocutores que está numa "sinuca de bico" depois que Gilberto Kassab desvinculou a indicação do apoio do PSD ao governo. O ex-prefeito, porém, dá sinais a aliados de que aprova a escolha: "Será um gesto de inteligência política da presidente".

Quem pisca No governo paulista, a ordem é esperar. Embora Geraldo Alckmin tenha em mãos um parecer jurídico sobre eventual afastamento do vice, não quer ser acusado de "expulsar'' Afif. "A iniciativa é dele, não de Alckmin", diz um secretário.

Quem sabe Depois de sucessivas tentativas, sem sucesso, de indicar um ministro, o líder do PTB no Senado, Gim Argello (DF), vai pedir o Ministério da Integração Nacional, hoje sob comando do PSB de Eduardo Campos.

Nada feito Argello será recebido nos próximos dias, mas a oferta no Planalto continua sendo a de uma estatal. Uma possibilidade é a vice-presidência do Banco do Brasil, vaga com a ida de César Borges para os Transportes.

Saudade Após a posse de Borges, hoje, Dilma segue para encontro com o ex-presidente Lula, em São Paulo.

É comigo? Dilma passou toda a fala de Eduardo Campos na reunião de ontem, em Fortaleza, de costas para o pernambucano, conversando com Cid Gomes (CE). Nem nas vezes em que foi chamada pelo nome a presidente se virou para olhar para o aliado.

Lá e cá O pessebista propôs desoneração do PIS/Cofins para companhias estaduais de saneamento, mas Dilma disse preferir desconto na conta de água. Aliados de Campos argumentam que a negativa reforça o discurso da asfixia de Estados e municípios que ele tem repetido.

Efeito colateral Os governadores do Nordeste demonstraram preocupação com o Abril Vermelho, mês de protestos do MST. Eles entendem que, com a seca, o movimento deverá intensificar as ações, principalmente em Alagoas e Pernambuco.

Pessoa jurídica A Rede ingressou com mandado de segurança na Justiça Federal para obter imediatamente seu CNPJ. Os "sonháticos" foram surpreendidos por uma instrução da Receita Federal que condiciona o cadastro da legenda de Marina Silva à obtenção das 500 mil assinaturas para registro no TSE.

Vaquinha Antes de avaliar o pedido de liminar, a juíza responsável pelo caso quis ouvir as razões do governo. Sem CNPJ, a nova sigla não pode alugar imóveis e terá dificuldade para efetuar despesas. Os gastos, por ora, são cobertos por colaboradores.

*Gincan*a Na corrida para se viabilizar até outubro, a Rede impôs metas a seus 6.800 mobilizadores. Cada um terá de entregar 30 novos apoios em postos móveis até domingo. A campanha é chamada "Eu sou mais 30".

Rebelião Partidos da base aliada se articulam na Câmara por uma CPI para investigar operações da Petrobras, como a compra de refinaria em Pasadena (EUA). O PMDB, que perdeu a diretoria internacional da estatal, pilota a iniciativa nos bastidores, com apoio de PR, PSC e PP.

Visita à Folha Benoit d'Iribarne, presidente do grupo Saint-Gobain do Brasil, visitou ontem a Folha. Estava com Carlos William Ferreira, diretor de assuntos corporativos, Meglen Ribeiro Ferraz, coordenadora de comunicação, e José Rubens Pontes, assessor de comunicação.

com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI

tiroteio
"Haddad criou um Conselhão de compadres, pois trata como inimigos os que discordam dele. Mas democracia pressupõe debate."
DE MIGUEL TORRES, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de SP, criticando o fato de a entidade ter sido excluída do colegiado recém-instalado pelo prefeito.

contraponto


Rir para não chorar


Na reunião de ontem com Dilma Rousseff, governadores do Nordeste faziam relatos da seca em seus Estados quando Teotonio Vilela (PSDB) disse que, no interior de Alagoas, há cidades nas quais "as galinhas chegam a por ovos sem nunca terem visto chuva". Ante o espanto geral, explicou que uma galinha põe ovos depois de cinco meses, e há locais onde não chove há dois anos.

-O prefeito de Jacaré dos Homens me disse que, se cair uma chuva repentina, uma galinha dessas pode morrer de infarto, sem saber o que está acontecendo...

Nem a gravidade do tema evitou gargalhada geral.

A importação de engenheiros - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 03/04

Além de médicos, o governo Dilma quer trazer engenheiros de fora para trabalhar no Brasil. O setor produtivo reclama da falta de profissionais no mercado. Por isso, o ministro Aloizio Mercadante (Educação) assinou memorando com o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas para acelerar a validação aqui dos diplomas de lá. A busca desses profissionais inclui Espanha e França.

Tucanos contra o legado de FH
O ex-presidente Fernando Henrique descentralizou a indústria automobilística no país. Hoje, a GM produz no Rio Grande do Sul. Desde 2001, a Ford está na Bahia, e, para atrair a montadora, o então governador Paulo Souto (PFL), aliado do PSDB, concedeu incentivos, como o da redução do ICMS. Doze anos depois, os governos tucanos de São Paulo e de Minas Gerais cobram dívidas da Ford, relativas aos incentivos recebidos, de R$ 1 bilhão e R$ 800 milhões, respectivamente. Sobre isso, um grande empresário brasileiro diz que os tucanos não ficam atrás dos petistas quando se trata de criar "insegurança jurídica" para os investimentos.

Delírio petista
Os petistas subiram às alturas ontem, com os rasgados elogios dos governadores Cid Gomes (PSB-CE), Teotonio Vilela (PSDB-AL) e Rosalba Ciarlini (DEM-RN) às medidas de apoio ao Nordeste anunciadas pela presidente Dilma.

“Nossa! Até chuva está caindo hoje no Ceará. Que maravilha!”

Dilma Rousseff
Presidente da República , ao desembarcar ontem na Base Aérea de Fortaleza, dirigindo-se ao governador Cid Gomes (CE), antes de anunciar a liberação de R$ 9 bilhões para o combate à seca na Região Nordeste

Lavando roupa
Ao defender a desoneração para ampliar o acesso da população à internet, o ministro Paulo Bernardo (Comunicações) não poupa os petistas que são contrários à medida: "Os incluídos que têm internet rápida acham que os outros não precisam ter acesso à internet. É igual aos que vão voar e criticam que tem pobre demais nos aeroportos e nos aviões."

Transparência total
A CNI vai adotar iniciativa que colocará sob pressão todas as confederações patronais e de trabalhadores. Seu presidente, Robson Andrade, decidiu publicar na imprensa um balanço financeiro da entidade, inclusive do Sesi e do Senai.

O Sudeste é o alvo
Para se cacifar na Região Sudeste, o governador Eduardo Campos (PE) vai concentrar suas dez caravanas, batizadas de "Diálogos para o Desenvolvimento", em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Sua caminhada começa sábado, na PUC do Rio, quando reúne filiados, dirigentes, prefeitos, deputados e vereadores do PSB para debater políticas de combate à pobreza.

Na crista da onda
A polêmica eleição de Marco Feliciano para a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara empolga o vice do PSC, Pastor Everaldo. Ele anda falando em concorrer ao Planalto em 2014 e que teria o voto de 5 milhões de evangélicos.

Acertando os ponteiros
O candidato do PSDB à Presidência, senador Aécio Neves (MG), acertou encontro com o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio, para a a segunda quinzena de abril. Na pauta, a atitude do PSDB paulista quanto aos incentivos fiscais da Zona Franca de Manaus.

Benjamin Zymler (TCU) se reuniu com o ministro Garibaldi Alves (Previdência) para aprofundar investigação de pagamentos indevidos pelo INSS.

INQUÉRITOS PARADOS - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 03/04

Como a meta de concluir todos os inquéritos de homicídio instaurados até 2007 foi cumprida por apenas 11 Estados, o comitê gestor da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública prorrogou em dois meses o prazo, inicialmente previsto para abril. "São 83.103 inquéritos em aberto para zerar até 30 de junho", explica a juíza Taís Ferraz, do Conselho Nacional do Ministério Público, que integra o comitê.

INQUÉRITOS 2
Alagoas, Bahia, Espírito Santos, Minas Gerais, Pernambuco e Rio de Janeiro concentram 87% dos inquéritos antigos sem solução. Os gestores estaduais do "inqueritômetro" relatam dificuldades como carência de pessoal e de estrutura das polícias civis.

INQUÉRITOS 3
A boa notícia é que o percentual de denúncias cresceu. No início do mutirão, estava em 8% dos casos, subiu para 20% nos inquéritos até 2007 e chegou a 29% naqueles de 2008. "Isso comprova que as investigações são viáveis e que a autoria dos crimes pôde ser apontada em vários casos, mesmo passados tantos anos", afirma a conselheira Taís Ferraz.

CRUZ VERMELHA
O hospital Aliança, o mais sofisticado de Salvador (BA), está em negociação por um valor estimado em R$ 500 milhões. Em crise, a venda da instituição desperta o interesse de grandes grupos da área de saúde, como a Amil e a Rede D'Or.

Idealizado pelo empresário baiano Paulo Sergio Tourinho, o hospital tem acomodações no estilo resorts de praia decoradas com obras de arte. A assessoria do Aliança informou que o empresário está em viagem e que não iria se manifestar sobre o assunto.

TV CONECTADA
A Eletros (Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos) estima que 60% dos televisores em comercialização no Brasil neste ano serão smart TV -aparelhos integrados à internet. E entre 12% e 15% com tecnologia 3D. Em 2012, as smart TVs eram 40% da produção e os 3D, 10%.

TV CONECTADA 2
A indústria vendeu ao varejo 14,3 milhões de aparelhos de TV em 2012.

É LUXO SÓ
Sai por R$ 1.940 o traslado individual de helicóptero e limusine para a próxima edição do Skol Sensation, no dia 15 de junho, entre o espaço VIP a ser montado no shopping JK Iguatemi e o Anhembi. Há ainda a opção de um pacote por R$ 12.500 para seis pessoas, que inclui transporte, bebidas, petiscos, mesa e garçom no camarote da festa de música eletrônica.

O chef Felipe Bronze comanda o cardápio, que terá como base os ingredientes da cerveja desconstruídos. Tudo branco, a cor do evento.

PÃO AMANHECIDO
A padaria Em Nome do Pão, de Alex Atala, que fornece pães para restaurantes, informou a seus clientes que o serviço será cancelado. Segundo o aviso, a produção agora será apenas para os estabelecimentos de Atala, D.O.M e Dalva e Dito. A assessoria do chef diz que a interrupção é uma questão de "planejamento estratégico".

BOMBOU
Os editais de apoio a produtores e criadores negros, lançados em novembro, receberam mais de 2.300 inscrições, segundo balanço parcial do Ministério da Cultura. O Prêmio Funarte de Arte Negra é o mais procurado, com 1.865 projetos. Em seguida, os de curtas-metragens (292).

Diante da demanda, a pasta avalia aumentar o número de propostas atendidas.

ESCOLA DE ATORES
O ator Lee Thalor deixou o CPT, de Antunes Filho, para criar sua própria companhia teatral. Ele está à frente do NAC (Núcleo de Artes Cênicas), em parceria com o Centro da Cultura Judaica, onde passará a funcionar.

PENÉLOPE CHARMOSO
Rodrigo Faro e outras sete personalidades de destaque em suas áreas de atuação posaram para a edição de aniversário de um ano da "Glamour", hoje nas bancas.
À frente do programa "O Melhor do Brasil", da Record, ele é chamado pela revista de "o novo Chacrinha".
"Essa comparação é uma grande honra. O Chacrinha é um dos maiores ídolos da TV brasileira. Quis me tornar comunicador assistindo a ele e ao Silvio Santos", afirma.
No fim deste mês, Faro vai se encontrar com Silvio Santos no "Troféu Imprensa", no SBT, para receber o prêmio de melhor apresentador de 2012. "Estou indicado neste ano também. Quem sabe não me torno tetracampeão?"

BOA CAUSA A modelo Emanuela de Paula posou para a campanha amfAR, que apoia pesquisas para a cura da Aids. Na sexta, Kate Moss participa do baile da ONG, em SP

RESIDÊNCIA ARTÍSTICA
Os artistas Vik Muniz e Hamish Fulton foram homenageados com um jantar, anteontem, na casa da galerista Nara Roesler, no Morumbi. O empresário Abilio Diniz, do grupo Pão de Açúcar, foi com a mulher, Geyze.

TIM-TIM
A apresentadora Astrid Fontenelle comemorou aniversário, anteontem, com uma festa na casa de Wair de Paula e Eduardo Machado, no Morumbi. Sarah Oliveira e a atriz Maria Ribeiro compareceram.

CURTO-CIRCUITO
A Pace Gallery participa pela primeira vez da SP-Arte, que começa hoje no prédio da Bienal.

A Mandi apresenta coleção na loja do shopping Iguatemi, a partir das 16h.

O Itaú Cultural abre hoje para convidados, às 20h, a "Ocupação Antonio Nóbrega", com curadoria do cineasta Walter Carvalho.

Leis & pessoas - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 03/04

A emenda constitucional das Domésticas promulgada ontem pelo Parlamento parece ter servido de inspiração para outras ações. Uma delas começou a ganhar corpo dentro da comissão especial de consolidação das leis e regulamentação da Constituição, presidida pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) e relatada pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), que se reuniu horas antes de o Congresso inserir na Constituição os direitos dos empregados domésticos.

Por sugestão do deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), a comissão se mostra disposta a criar mecanismos capazes de aproximar as leis das pessoas, sem que pareça uma tortura buscar informações num emaranhado de artigos, incisos, parágrafos e todo o jargão jurídico que termina por afastar o cidadão comum das informações a respeito das leis que dizem respeito diretamente à sua vida. “Ao consolidar as leis não podemos pensar apenas em papel. É preciso levar em conta que vivemos hoje num mundo em que as pessoas acessam cada vez mais informações via telefone celular”, afirma o deputado Miro.

A ideia é começar essa “acessibilidade legal” pela emenda constitucional promulgada ontem. Há tempos um projeto de lei não tem tanta repercussão no Congresso Nacional. Basta ver a sessão de ontem para promulgar o texto. A festa teve direito ao coral do Senado tocando Roberto Carlos. Geralmente, a promulgação de emendas constitucionais tem discursos e, quando muito, o Hino Nacional e ponto. Ontem, entretanto, estava tudo mais pomposo.

A razão para tanto alarde em torno da proposta é a atenção que o cidadão comum dá à proposta. Hoje, no Brasil, todas as classes têm quem alguma relação com trabalhadores domésticos, seja na condição de patrão ou de empregado. Há casos inclusive de empregados domésticos que pagam uma pessoa para cuidar dos seus filhos enquanto estão no trabalho e fazem isso por absoluta falta de creches (Alô, Dilma!!! Onde estão as creches???)

A ideia da comissão é colocar numa mesma página na internet todas as leis ligadas ao trabalhador doméstico, expor ainda ali formulários de contrato de trabalho, de conciliação no caso do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). E, consolidadas as leis relativas a esse tema, expandir para outros setores. Tomara que dê certo.

Enquanto isso, nas campanhas...

Esse embalo adotado pela emenda constitucional das domésticas é considerado a chave para, faltando menos de dois anos para a eleição, deixar a população ciente de que o Congresso existe para servi-la e, muitas vezes, políticos parecem se esquecer desse “detalhe”. Ainda bem que alguns se lembram, ainda que seja apenas nesse período mais próximo da eleição. Ao povo, entretanto, não cabe reclamar dessa janela e sim aproveitá-la da melhor forma possível. Ontem, por exemplo, além da emenda constitucional das domésticas, foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara a proposta que libera biografias não-autorizadas de pessoas públicas. O projeto agora segue direto para o Senado. “Agora, finalmente, teremos liberdade de expressão e de informação”, comenta o relator, Alessandro Molon (PT-RJ).

E no Ceará...

Dilma, mais uma vez, colocou seu palanque em movimento no Nordeste, com o anúncio de R$ 9 bilhões em investimentos. Enquanto isso, Eduardo Campos, num dado momento, lembrou que desde a última reunião, em 2012, o que avançou mais foi a seca. Epa! Olha a crítica à Dilma aí. Não adianta. Daqui para frente, por mais que Dilma e Eduardo digam que vão tratar de 2014 no ano que vem, todos os gestos terão alguma conotação eleitoral. Se for assim, mas as pessoas forem atendidas nas suas necessidades, menos mal. Que venha a temporada de bondades que antecede o ano eleitoral.

Luz no fim do túnel? - CLAUDIO J. D. SALES

O ESTADÃO - 03/04

As recentes declarações da presidente da República sobre a correlação entre inflação e crescimento - que foram imediatamente interpretadas pelo mercado como riscos à autonomia do Banco Central para aplicar suas políticas de combate à inflação - são exemplos dos efeitos que o risco de interferência política e eleitoral impõe à realidade econômica. Desta vez o palco foi a macroeconomia, mas o setor elétrico tem sido submetido a uma saraivada de ingerências da mesma natureza emanadas do mesmo governo e seus aliados.

Em artigo que publiquei neste Estadão no dia 10 de março, tratei de alguns efeitos ligados à implementação truculenta da Medida Provisória n.º 579/2012 (depois convertida na Lei n.º 12.783/2013 e que tratou da antecipação da renovação de concessões de eletricidade), entre os quais chamou a atenção a Resolução n.º 3 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). Aliás, o CNPE é um órgão que deveria se ocupar de diretrizes de longo prazo, e não deveria ter atropelado a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e seus ritos regulatórios.

A resolução acima representa uma ameaça de expropriação do caixa das geradoras de energia ao impor que elas passem a arcar com parte do custo do acionamento de todo o parque termoelétrico nacional, custo que será medido em bilhões em 2013.

Por que a resolução foi emitida de forma tão abrupta, sem audiência pública? Porque o governo se viu diante de cenário aterrorizante para seus objetivos eleitoreiros: a queda propagada de 20% da conta de luz seria comprometida pelo altíssimo custo conjuntural do uso termoelétrico que deveria ser repassado aos consumidores. Afinal, são os consumidores que se beneficiam desse acionamento termoelétrico.

Para agravar ainda mais a situação, o mercado foi surpreendido com a suspensão da liquidação das transações do mercado de curto prazo de energia elétrica referentes a janeiro de 2013 e que deveria ter sido implementada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) em 12 de março. Uma das causas para essa suspensão era a possibilidade de alterar retroativamente a alocação anual da energia (sazonalização) feita pelos geradores. A alteração retroativa da sazonalização, felizmente, acaba de ser bloqueada pela Aneel, após audiência pública, com base, inclusive, nas contribuições da CCEE e de técnicos da própria Aneel.

No meio de tanto desrespeito a regras e de tamanha confusão institucional, é preciso registrar que ainda há instituições e profissionais sérios. Em primeiro lugar, a CCEE reafirmou sua missão técnica e consolidou sua posição de destaque como uma das poucas instituições que se blindam de usos políticos há mais de uma década.

E em segundo, mas em não menos importante lugar, alguns técnicos da Aneel e parte de sua diretoria também merecem crédito por terem emitido um sinal de que o passado ainda é previsível. Na palavra dos próprios técnicos, a suspensão da liquidação traria "consequências comerciais e financeiras severas, de resultados imprevisíveis" e "efeitos extremamente perversos aos agentes e à credibilidade do sistema". E em relação à manutenção da sazonalização, merece registro o fato de que três diretores da agência reguladora contrariaram o relator e apontaram que essa revisão retroativa geraria riscos de criação de um ambiente de insegurança e de instabilidade regulatória.

Uso eleitoral da tarifa, expropriação de caixa de agentes, interferências regulatórias retroativas... São muitas as pressões sobre reguladores e outras instituições do setor elétrico que emergem de interesses políticos e econômicos de curto prazo, sem o menor compromisso com a manutenção de um setor elétrico sustentável.

Portanto, ficam aqui os votos para que esses atores, a exemplo deste último episódio, resistam a tais pressões e nos deem razões para crer que ainda há luz no fim do túnel. O setor elétrico precisa sair dessa fase de trevas que o mundo político lhe vem impondo.