domingo, agosto 25, 2013

O eterno redescobrir - ANA DUBEUX

CORREIO BRAZILIENSE - 25/08
Brasília nasceu para mim há 26 anos. Se eu pudesse escolher um verbo para traduzir a minha relação com a cidade, arriscaria este aqui: redescobrir. Porque ruas, quadras, vazios, verdes e céus de tantas cores proporcionam surpresas diárias. E esta sensação do novo que teima em aparecer no meio do caminho se estende além das paisagens, miragens da seca, reflexos das poças de água na chuva. Está também no comportamento das pessoas, nos paradoxos de uma cidade planejada que revela beleza até quando se desorganiza, nos extremos de um centro urbano com qualidade de vida ímpar e favela na porta do poder.
Talvez sejam esses contrastes que a presidente Dilma tenha enxergado ao sair por aí, com uma Harley Davidson emprestada, pregando uma peça na segurança e submetendo-se ao risco calculado - e bem agradável - de enxergar a capital sob outro prisma, longe do trono do Palácio do Planalto ou dos jardins monumentais do Alvorada. Se não é mais uma história do folclore político, sou capaz de apostar que Dilma também redescobriu Brasília.

Mesmo quem nasceu ou vive há longo tempo por aqui sabe que a cidade guarda o encanto de surpreender. Não é à toa que, dias depois de a polícia ter solucionado mais um crime que chocou a capital, quando três jovens atearam fogo e mataram um mendigo, ressuscitando a dor e o estarrecimento do caso Galdino, aparece o morador de rua Adeílson para colocar um ponto final na agonia de uma família. Foi dele a iniciativa de alertar as autoridades de que o rapaz que dormia embaixo de uma árvore na Rodoferroviária era Felipe Dourado, o estudante que estava sumido e mobilizou por dias boa parte da cidade para procurá-lo. Apontado como herói ou anjo, Adeílson também terá uma nova chance. A família de Felipe vai ajudá-lo a sair da mendicância, condição imposta pelo vício em drogas, um flagelo visível por todos os cantos do quadradinho.

Brasília proporciona histórias assim. De vez em quando, uma notícia terrível nos pega de sopetão, agride nossa autoestima, derruba nossa moral e nos faz ficarmos reféns do preconceito, que os moradores ainda sentem na pele. Em outros momentos, a cidade se redime, se une, mostra sua força e seu valor.

Aqui no Correio, temos a grata satisfação de contar essas histórias, sabendo que assim estamos escrevendo e reescrevendo a biografia de uma capital que segue seu curso de metrópole, mas não perde sua singularidade e continua a proporcionar uma sensação única de aconchego aos seus moradores. Ou você nunca ouviu a expressão "não troco Brasília por nada"?

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