quinta-feira, agosto 15, 2013

Menos gasolina, mais ônibus - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 15/08

Projeto de prefeitos de baixar preço do ônibus exige que governo reinvente política de combustíveis


PREFEITOS de cidades grandes, entre eles Fernando Haddad, de São Paulo, querem que o governo federal repasse para as prefeituras o dinheiro de um tributo que servia, em tese, para atenuar a variação do preço dos combustíveis e, em teoria, para financiar melhoria no transporte público. A ideia, em tese e teoria, é boa, em termos sociais e ambientais.

Na prática e na política, porém, sua implementação é um problema.

O tributo é a Cide, Contribuição para a Intervenção no Domínio Econômico. Desde junho de 2012, está zerado, pois o governo quer evitar alta de combustíveis e inflação.

A Cide existe desde 2001. Na prática, serve para reduzir a variação do preço dos combustíveis. Se o preço de mercado da gasolina, que é internacional, sobe, o tributo pode cair, e vice-versa. O governo podia assim compensar a variação do preço internacional com a contribuição, regulando o preço doméstico.

Para usar bem o instrumento, seria preciso reajustar os combustíveis quando fosse ultrapassado certo limite de variação do preço internacional. De outro modo, se o preço mundial continuasse a subir e o doméstico ficasse "tabelado", o tributo teria de cair a zero, perdendo eficácia e função, como agora.

Isto posto, se o dinheiro da Cide cair no cofre das cidades, o governo ficará sem instrumento de atenuar a variação do preço mundial da gasolina, por exemplo. Cada pulo do preço mundial seria sentido diretamente pelo consumidor final.

Pode ser boa coisa: consumiríamos de acordo com o preço "correto". Pode ser ruim: variações excessivas e frequentes podem criar certa desordem numa economia como a brasileira; é provável ainda que, como agora, o governo relutasse em autorizar aumentos, criando ainda mais problemas.

O governo poderia repassar apenas parte da Cide para as prefeituras, uma "parcela fixa", o que reduziria o efeito pretendido pelos prefeitos: baixar as tarifas de ônibus e os gastos com subsídios.

A conversa sobre tributos não pega bem, mas no caso é conveniente.

Como lembra o economista Paulo Rabello de Castro, um "imposto módico" sobre combustíveis fósseis (como diesel e gasolina) também compensa parte dos danos ambientais e sociais (congestionamento) causados pelo uso do transporte individual, um custo que não está no preço de mercado dos combustíveis.

De resto, gasolina e diesel mais caros incentivam o uso do etanol, o que tem benefícios ambientais e econômicos (temos um parque agroindustrial e tecnológico muito importante no setor).

Relembre-se que a Petrobras ora perde dinheiro com a importação de gasolina, vendida abaixo do preço por aqui (o país não tem refinarias suficientes; as novas estreiam apenas a partir de 2014, se tanto). Menos receita, menos investimento. Mas o problema não para aí, como observa Rabello de Castro: fica prejudicado também o crédito da empresa, que "é induzida a buscar recursos no BNDES. Assim se reduz a oferta de crédito para todas as demais empresas brasileiras".

Para que a proposta dos prefeitos dê certo, sem criar problemas novos, o governo teria de mudar sua política de combustíveis inteira (e não só). Ou criar uma, pois a atual é uma sucessão de remendos que distorcem o mercado com o fim apenas de maquiar a inflação.

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