quinta-feira, junho 20, 2013

Procura-se um bom candidato ao TC - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 20/06

O Tribunal de Contas deveria ser um lugar para cidadãos competentes e preocupados com o bom uso dos recursos públicos, e não uma opção para políticos se encostarem por décadas e prestar favores a colegas


“Dr. Continhas”, um personagem fictício criado para tornar didática a explicação sobre o que é e para que serve o Tribunal de Contas do Paraná, cumpre perfeitamente a missão que lhe foi dada quando se abre a página principal que a instituição mantém na internet. Diz o Dr. Continhas: “É o órgão responsável pela fiscalização do uso do dinheiro público, do estado e dos 399 municípios paranaenses, em complemento à atividade fiscalizadora do Poder Legislativo (Assembleia Legislativa e Câmaras de Vereadores). Além de controlar todo volume de dinheiro público investido pelo governo do Paraná e prefeituras, o TCE também informa à comunidade o resultado destas contas públicas, isto é, se o dinheiro público foi aplicado corretamente e se os serviços oferecidos à população têm qualidade”.

São irretocáveis o didatismo e a sabedoria desse Dr. Continhas. De sua explicação é que se pode extrair o motivo pelo qual o Tribunal de Contas (do Paraná e de quaisquer outros estados) goza de precário prestígio e respeito perante a sociedade. A grandeza e a importância de suas obrigações constitucionais, quase invariavelmente, não correspondem à forma como são preenchidas as cadeiras de seu colegiado de conselheiros – na verdade juízes da correta e honesta gestão dos recursos públicos.

Supõe-se que, para bem cumprir os altos deveres que lhe estão afetos, um Tribunal de Contas deve ser constituído por pessoas que, indiscutível e concomitantemente, reúnam atributos muito especiais: notório conhecimento técnico dos procedimentos relativos ao manejo das contas públicas, ilibada reputação e total isenção pessoal e política em relação aos gestores públicos aos quais compete fiscalizar. Desde logo vê-se, portanto, que indicações, eleições e nomeações feitas pelos próprios entes fiscalizados, isto é, pelo governador e pela Assembleia Legislativa, não seguem os critérios mais adequados e recomendáveis para a escolha dos conselheiros.

Embora essas cortes tenham papel eminentemente técnico, a composição de seus membros obedece a critérios políticos que deturpam seu desempenho e colocam sob desconfiança o resultado de seu trabalho. Não é por outra razão, portanto, que pelo menos quatro dos atuais sete conselheiros são ex-deputados estaduais, amigos ou participantes ativos de campanhas eleitorais daqueles que os colocaram na posição. Não surpreende, pois, que as prestações de contas ofertadas pelos fiscalizados sejam invariavelmente aprovadas, constando dos julgamentos meras e repetitivas “recomendações” ou “ressalvas” nunca cobradas de modo efetivo.

Nos dias que correm, há uma vaga de conselheiro em aberto no TCE-PR decorrente da aposentadoria compulsória de um de seus membros, ex-deputado e ex-presidente da Assembleia Legislativa. Para ocupá-la, embora ainda não esteja aberto o edital de inscrições, já se apresentaram dois atuais deputados – ambos da base de apoio do Executivo. Como contraposição a esta realidade imutável, deve-se aplaudir a salutar decisão dos servidores do corpo técnico do Tribunal de apresentar também a candidatura de um dos seus. Apesar das quase nulas chances de vitória, considerando a prevalência do corporativismo que leva os deputados estaduais a sempre escolher um colega para o posto, a iniciativa pode servir para estimular novas candidaturas de pessoas efetivamente comprometidas com uma avaliação honesta das contas públicas.

O fato de serem os deputados estaduais a eleger os conselheiros não seria um problema, se não fosse pelo corporativismo, pelo fisiologismo, pelo nepotismo, pelo compadrismo, pelo companheirismo e por tantos outros ismos que guiam os parlamentares hoje, e que nem de longe se coadunam com os princípios basilares sobre os quais deve se assentar a administração pública, tais como a impessoalidade e a moralidade. São princípios, dentre outros, que estão claramente explícitos no artigo 37 da Constituição Federal. O Tribunal de Contas deveria ser um lugar para cidadãos competentes e preocupados com o bom uso dos recursos públicos, e não uma opção para políticos se encostarem por décadas e prestar favores a colegas.

Quem sabe o Dr. Continhas possa também contribuir para essa causa.

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