domingo, junho 09, 2013

Os malefícios da campanha eleitoral antecipada - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 09/06

A base parlamentar ficou mais instável e há o perigo de, diante das dificuldades na economia, Dilma agir como candidata quando deve ser presidente


Políticos gostam de antecipar campanhas eleitorais para aproveitar momentos de altos índices de popularidade. A presidente Dilma se enquadra no caso, mas consta que foi seu patrono e mentor, o ex-presidente Lula, que decidiu puxar o calendário de 2014 com um de dois objetivos ou ambos: esvaziar o "queremismo" que se alastrava no PT e base aliada, a favor de sua recandidatura e/ou ofuscar a repercussão da descoberta do esquema de lobby montado em altas esferas do poder por Rosemary Noronha, chefe de gabinete da representação da Presidência em São Paulo, emprego obtido por interferência do próprio Lula. Objetivos atingidos: os saudosos de um Planalto afável e mais aberto a barganhas baixaram o vozerio pela volta de Lula — pelo menos por enquanto — e o caso Rose, coincidência ou não, perdeu espaço no noticiário.

E, como previsto, o resultado da antecipação da campanha tem sido funesto para a administração Dilma. Interesses político-eleitorais passaram a contaminar votações no Congresso e induziram a oposição a agir com o único objetivo de prejudicar Dilma, a adversária a ser batida em 2014, independentemente do mérito dos projetos encaminhados ao Legislativo. Aconteceu na MP dos Portos, cujo objetivo de reformar um elo fraco da frágil infraestrutura não poderia ser atacado pela oposição, pois foi ela, no poder, que executou a primeira fase deste projeto de modernização.

A campanha precoce fragmentou ainda mais a base parlamentar. Houve o inevitável e também prematuro ensaio de lançamento do dissidente Eduardo Campos (PSB), governador de Pernambuco, a 2014, e a gelatinosa base do governo ficou mais instável, PMDB à frente. O Congresso passou a enxergar e avaliar todas as iniciativas do governo pelas lentes de 2014. Tudo isso somado ao recrudescimento da inflação, com o consequente aumento das incertezas em relação a 2014, injetou nos partidos governistas razoável dose de preocupação com o futuro. Quem pode garantir que a popularidade da presidente continuará em níveis elevados no segundo semestre do ano que vem?

O senso de oportunidade de Gilberto Kassab e seu PSD é um espelho do momento. Isso foi demonstrado na curiosa explicação de que o pessedista Guilherme Afif assumiu o ministério da pequena e média empresa na "cota pessoal" de Dilma, não como representante do partido. Explica-se a pirueta: se a economia degringolar e a reeleição ficar um projeto arriscado, Kassab e partido ficam livres para aderir à oposição à primeira hora. Se não, Afif funcionará como bilhete de entrada do partido na aliança do segundo mandato. Espertezas da política brasileira.

Outro efeito da antecipação da campanha é deixar aberta a possibilidade de as urnas contaminarem a política econômica, tornando-a refém da busca por votos. Seria um erro suicida. Antecipar a campanha foi um equívoco também porque Dilma, nesta hora de dificuldades na economia, precisa ser mais presidente e menos candidata.

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