sexta-feira, abril 26, 2013

Retaliação mensaleira - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 26/04

A PEC que submete algumas decisões do STF ao Congresso foi proposta antes do julgamento do mensalão, mas sua tramitação e aprovação na CCJ não escondem o desejo de vingança dos condenados e seus apoiadores


A Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) da Câmara Federal aprovou anteontem um peculiar projeto de Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que tomou o número 33. De autoria do deputado petista piauiense Nazareno Fonteles, que a apresentou em 2011, a PEC 33, de tão grotesca, deveria ter poucas chances de prosperar no Congresso Nacional e de se tornar parte da Constituição Federal em razão da agressão que promove à cláusula pétrea, imutável, da separação dos poderes, princípio basilar da democracia. Entretanto, é importante que a sociedade se mantenha alerta contra esta mal disfarçada tentativa de assemelhar o Brasil às pobres nações vítimas de totalitarismos tão canhestros quanto os inspirados no chavismo venezuelano.

A proposta de emenda prevê que as declarações de inconstitucionalidade proferidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) relativas a emendas à Constituição, bem como as súmulas vinculantes, devam ser submetidas ao crivo do Congresso – isto é, só teriam validade se referendadas pelo Legislativo. Evidencia-se, desta forma, claro sintoma da disposição de atentar contra a norma constitucional da coexistência independente e harmônica dos poderes republicanos, na medida em que invade a inquestionável prerrogativa do Supremo de servir como guardião da Constituição e de dar a última e definitiva palavra sobre a constitucionalidade das leis. A PEC chega a propor que, em caso de divergência entre Congresso e STF, a questão seja submetida a plebiscito sob o argumento de que, se todo o poder emana do povo, que o povo, então, seja chamado a dar a última palavra.

Embora a PEC tenha sido apresentada um ano antes de se iniciar o julgamento dos réus do mensalão, não é de se descartar a sensação de que sua aprovação consiste em uma retaliação contra o Judiciário, já que foi colocada em tramitação na CCJ da Câmara no exato momento em que o STF se prepara para finalizar a penalização dos condenados pela participação na quadrilha responsável por um dos maiores escândalos de corrupção da história do país. A hipótese de que se trata de uma retaliação foi aventada até mesmo por ministros da Corte, ideia que ganha contornos verossímeis quando se vê que, entre os membros da comissão que a aprovaram, encontram-se dois dos mais notórios réus deste processo, os deputados petistas José Genoino (que fez questão de manifestar seu apoio à PEC 33, apesar da votação simbólica na CCJ) e João Paulo Cunha.

O caráter teratológico da proposta transcende, porém, à suposta tentativa de retaliação. O atentado contra a democracia vai muito além deste ocasional e episódico objetivo, pois seus termos apresentam o mesmo DNA de outras tentativas patrocinadas pelo PT, como a que prevê, por exemplo, o controle da mídia. A mordaça que pretende impor ao Judiciário parece fazer parte do projeto petista de perpetuação no poder e é em tudo similar às infelizes medidas bolivarianas postas em prática em alguns países da América Latina sob inspiração de seu mentor, o recentemente embalsamado líder venezuelano Hugo Chávez.

Não se pode conceber que a discussão sobre a PEC 33 prospere a ponto de chegar a votação em plenário, embora se deva acreditar que, nesse caso, seria derrotada pelo bom senso da maioria parlamentar. Nesse sentido, note-se que o próprio presidente da Câmara, deputado Henrique Alves, parece ter se dado conta do absurdo em que estava se metendo: ele afirmou, ontem, que não pretende colocar a PEC em trâmite enquanto não tiver segurança quanto à sua constitucionalidade.

Não basta. É preciso que a sociedade se mobilize contra a agressão – não apenas porque pisoteia uma cláusula imutável que sustenta a democracia, mas, sobretudo, porque representa inominável retrocesso a um tempo a que jamais devemos voltar – o da ditadura de grupos ou partidos que produziu tantas excrescências históricas, como o comunismo, o nazismo e o fascismo.


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