sábado, abril 06, 2013

Quanto vale o fim do medo? - SERGIO GUIMARÃES FERREIRA

O GLOBO - 06/04
O programa das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), iniciado em dezembro de 2008 com a ocupação da favela Santa Marta, já tem quatro anos completos.

O Instituto Pereira Passos promoveu, recentemente, um encontro para discutir a pacificação das favelas, com foco nos resultados de pesquisas em andamento que estudem os efeitos do programa. Na ocasião, o Banco Mundial divulgou o relatório "O retorno do Estado às favelas do Rio de Janeiro". O estudo se baseou em entrevistas com moradores para fazer uma análise qualitativa das diferenças entre favelas pacificadas e outras que na época não estavam com UPP. O Banco Mundial identificou que, dentre os moradores das áreas pacificadas, "a principal mudança associada à vida com a UPP foi a possibilidade de os moradores andarem pela favela com muito mais liberdade".

Oque se percebe pelo estudo é a importância do medo para o cotidiano da vida das pessoas em favelas sem policiamento pacificador. O medo influencia o horário em que se pode andar na rua, como no caso de uma moradora do Borel: "Antes (da UPP), quatro horas da tarde parecia que eles já sabiam a hora certa de começar os tiros. E era a hora mais complicada, porque a gente tinha que buscar as crianças na escola e não podia." Ou o efeito do medo sobre onde as pessoas podem ir: "Hoje, se eu quiser ir lá num canto do Chapéu, eu posso ir tranquilo porque sei que não vou encontrar um grupo armado", relatou um residente do Chapéu-Mangueira. Ou o efeito do medo sobre o direito a um sono tranquilo: "Antes eu ficava com medo até de dormir."

O direito de escolha com quem se engajar em relações comerciais também não existia. Como é bem sabido, o tráfico definia em alguns locais o monopolista na venda de botijão e até na venda de cerveja.

Qual o valor da restituição de todas essas liberdades? Economistas têm utilizado a valorização imobiliária como termômetro. O raciocínio é simples. Sendo a elasticidade de oferta de imóveis baixa, a variação brusca da demanda é quase completamente traduzida em aumento de valor do imóvel. Assim, a variação de curto prazo do preço do imóvel é uma ótima medida do valor presente do ganho de bem-estar esperado que decorre da pacificação.

Alguns estudos tentam estimar o efeito sobre o preço de imóveis de processos de pacificação em países, os chamados "dividendos da paz". Por exemplo, o efeito do acordo de "Downing Street" sobre os preços dos imóveis de Belfast teria variado entre 5% e 16% (Besley e Mueller, 2011).

Casos de aumentos imediatos de mais de 200% no valor dos imóveis transacionados em favelas como Vidigal ou Chapéu-Mangueira dão a medida aproximada do ganho de bem-estar com a mera recuperação de direitos civis básicos? Quais os dividendos da paz no Rio de Janeiro?

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