sexta-feira, fevereiro 15, 2013

O mundo se move - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 15/02

O anúncio do presidente Barack Obama, de fazer uma aliança comercial transatlântica com a Europa e fechar um acordo transpacífico com os países da Ásia, deveria acender a luz vermelha no nosso comércio exterior. O Brasil está no caminho contrário, de aumentar as barreiras ao comércio e se isolar. Há 10 anos o Mercosul negocia com a Europa, mas há poucos avanços a comemorar.

O prazo para fechar o acordo comercial e de investimentos Norte-Norte, entre Estados Unidos e Europa, é de dois anos. Uma meta agressiva, que dificilmente pode ser cumprida levando-se em conta a complexidade de aprovação por 27 estados-membros. Mas o movimento deve ser entendido pela diplomacia comercial brasileira como o de que o mundo está tentando sair da crise aumentando e não diminuindo o comércio.

- Esse acordo transatlântico muda tudo. No começo, os Estados Unidos viram a União Europeia como um bloco competidor, mas a crise os uniu. Portanto, haverá agora um aprofundamento da relação Norte-Norte - diz Joseph Tutundjian, especialista em comércio exterior.

No ano passado, quando o Brasil elevou para o teto permitido na OMC a tarifa de importação de 100 produtos, o país deu um sinal de que, em vez de apostar em mais liberalização de comércio ou nas negociações multilaterais, estava voltando à natureza defensiva de nossa economia.

O Brasil foi fechado por tempo demais e nunca se abriu completamente. Bombardeou a possibilidade de um acordo que uniria todas as Américas. Aquela pode ter sido mesmo uma má proposta, mas o fato é que como copresidente o país teria bastante influência no rumo da negociação. A reação foi ideológica, como se um acordo comercial nos submetesse ao controle americano.

- O tiro de misericórdia, na época, foi dado pelas autoridades brasileiras contra a Alca. A questão é qual foi a estratégia em seguida. Até agora, tem sido de fazer acordos via Mercosul, em que só se pode assinar qualquer documento quando todos concordam. Uruguai e Paraguai são até liberais, mas nada anda porque a Argentina fica contra tudo. Até agora, fizemos três acordos: Israel, Palestina e Egito, o que não é nada - disse Tutundjian.

Nas conversas de quase uma década com a União Europeia, o Mercosul reage à abertura de áreas e pede o que não vai acontecer. Um pedido, por exemplo, é o fim do subsídio agrícola que a França não deixará.

- O Mercosul quer se proteger contra leis de investimento, contra leis trabalhistas, contra a presença de estrangeiros nas concorrências públicas. Desta forma, a negociação não consegue andar. Estamos isolados - diz o especialista.

Se olharmos o fato de que o comércio com os Estados Unidos murchou na última década e que as exportações brasileiras estão se concentrando em alguns poucos produtos, a maioria, commodities, está na hora de o Brasil mudar a estratégia de comércio. Em vez de ser defensivo, é o momento de ser mais ofensivo e estratégico.

O acordo transpacífico, sobre o qual o presidente Obama falou, vem sendo costurado há mais tempo e, por natureza, é mais pulverizado. Só que, desta vez, está se fazendo uma lista de países com os quais fechar a negociação. Austrália, Nova Zelândia, Cingapura, Malásia, Vietnã e, do lado da América do Sul, Peru e Chile foram incluídos.

- Precisamos nos mexer, sem achar que vamos determinar os rumos do mundo. O fato é que muitos países compram commodities de nós, mas quem compra aviões, celulares e sapatos do Brasil são os Estados Unidos. A economia americana é um pólo de alta tecnologia ao qual deveríamos estar mais ligados. Estamos totalmente na contramão, com medidas como o IPI do carro importado e a elevação de alíquotas - disse Joseph Tutundjian.

O Brasil experimentou a política de mercado interno fechado no passado, e o resultado foi o oposto do que se queria. O governo imaginava que, protegidas, elas investiriam, ficariam fortes e poderiam, no futuro, competir com o produto importado. O que houve foi que elas se acomodaram e perderam competitividade. O comércio nos dois fluxos aumenta renda, emprego, atividade econômica e força as empresas a investirem em inovação e produtividade. O risco é, de novo, o Brasil parar de evoluir enquanto o mundo se move.

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