domingo, junho 17, 2012

‘Speak serious’ - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 17/06



Os ingleses driblaram a matemática ao dizer que economizaram meio milhão de libras no orçamento dos Jogos de Londres. Omitiram que o orçamento triplicou desde o dossiê da candidatura, passando de 3,4 bi para 9,3 bi de libras. Ou seja, economizaram só um pouco num orçamento que cresceu três vezes.

Aliás...

Deve ser terrível viver num país onde o governo maquia números em seu benefício.

Calma, gente

Sobrou para o querido Jorge Fernando. A 2+ Câmara Cível do Rio condenou os produtores de “Boom” a indenizarem em R$ 20 mil duas espectadoras da peça. Mariana Yusim e Paula Batalha alegam que chegaram ao teatro atrasadas e foram alvo de piadas de Jorge, dando a entender que seriam gays. Dizem que apareceram num DVD da peça e viraram motivo de chacota.

Nada de propaganda

Como haverá eventos oficiais na HSBC Arena e no Vivo Rio, a ONU negociou a troca dos nomes das casas de shows para Arena da Barra e Anexo do MAM, respectivamente, na Rio+20.

Rio+300

O Itamaraty trouxe 300 diplomatas para a Rio+20. Um maldoso diria que a Casa — como no verso de Vinicius, que foi diplomata — pôs para trabalhar até gente que nunca trabalhou. Com todo o respeito.

Ele merece
Nosso Bussunda completaria 50 anos dia 25 agora. Para homenageá-lo, a turma do Casseta e Planeta vai fazer um “videochat” em sua homenagem. Nada de chororô. Será um batepapo animado para lembrar histórias do craque do humor.

O DOMINGO É
 de Ivete Sangalo, 40 anos, a cantora baiana toda bela que será Maria Machadão na nova versão de “Gabriela”, a novela baseada na obra de Jorge Amado, que entra no ar amanhã. Seu conhecido bom humor contagiou equipe e elenco, que não economizam elogios à sua atuação. Como Maria Machadão,dona do cabaré Bataclan, Ivete vai pôr ordem nas “mulheres-damas” de Ilhéus e animar a vida dos cavalheiros da cidade. Anima eu

Viva Casão!

A Globo Livros lança em 2013 um livro sobre Walter Casagrande Júnior, 49 anos, o ex-atacante que virou comentarista de TV. É escrito pelo jornalista Gilvan Ribeiro e conta, inclusive, o drama que levou Casão a uma clínica de recuperação de drogados.

Arte do Brasil

Com os brasileiros invadindo Nova York, o famoso Museu Guggenheim separou uns US$ 2 milhões para comprar quadros de artistas latino-americanos.

Aliás...

Outro dia, o economista parceiro José Roberto Afonso disse que os brasileiros em Nova York preferem lojas a museus. Mas Adriana Rattes, secretária de Cultura de Cabral, discorda: “Ouvi de um diretor do MoMA que os brasileiros já são os estrangeiros que mais visitam o museu.”

Máquina de madeira
A Companhia das Letras vai lançar “A máquina de madeira”, quinto romance de Miguel Sanches Neto. A ficção parte da história verídica do padre paraibano Francisco Azevedo (1814-1880), que seria o verdadeiro inventor da máquina de escrever. O fato é documentado nos anais da Exposição Nacional de 1861, organizada por Dom Pedro II. Veja na gravura.

Gabriela na Flip

João Ubaldo Ribeiro, uma das estrelas da Flip passada, voltará à festa do livro, em julho. Vai participar de uma conversa na Casa da Cultura sobre o conterrâneo Jorge Amado, que faria 100 anos dia 10 de agosto, com Walcyr Carrasco, autor da adaptação para a TV do clássico “Gabriela, cravo e canela”. A mediação será do coleguinha e escritor Edney Silvestre.

‘Chayenês’

Cláudia Abreu, a Chayene da novela “Cheias de charme”, da TV Globo, que chama todos por nomes de bichos — entre os quais, um tal “curica”, que já até pegou nas redes sociais —, tem se inspirado na “Grande Enciclopédia Internacional Piauiês”,de Paulo José Cunha.

Gois explica...

Curica vem a ser uma ave pequena, mas, no Piauí, o termo é usado como deboche para tratar as queridas domésticas.

Brasileiro joga muita comida fora
Em tempos de Rio+20, a coluna resolveu abrir a lixeira do brasileiro. Achou muita... comida. Pesquisa do Banco Mundial, publicada em março, mostra que 61% do nosso lixo é orgânico, ou seja, de restos de alimentos. Os resíduos recicláveis (plástico, papel, vidro, metal) somam 35%. Para se ter uma ideia, nas lixeiras alemãs, apenas 14% são de material orgânico. Na nossa vizinha Argentina, os restos de comida correspondem a 40%. Já nos EUA são 25%. Em outros países desenvolvidos, a média sobe um pouco, mas não se aproxima da nossa marca (26% no Japão, 29% na Itália, 32% na França, 34% em Portugal, 49% na Espanha).

Só no primeiro trimestre, osgaris do Rio recolheram por dia cerca de 8t de lixo — 5,035t nas residências e 3,09t nas ruas. No cruzamento dos dados da Comlurbcom os do Banco Mundial, vê-se que os cariocas, em média, jogam fora, todo dia, cerca de 5t de comida. Nova York, com 2 milhões de habitantes a mais que o Rio, produz cerca de 14t diárias de lixo. Mas só 3,5t são restos de comida.

O diretor-executivo da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública (Abrelpe), Carlos Silva, enfia a mão nessa lixeira:

— É questão cultural. Até quem tem pouco dinheiro compra frutas, legumes e carne por baixo preço. Em outros países, é diferente. A comida é mais cara e não há tanta variedade. Suécia e Alemanha, por exemplo, não produzem fruta no inverno por causa do frio. Então, importam, mas fica caro. Antes de descartar alguma coisa, é preciso pensar se isso não teria alguma utilidade para alguém. Essa nova cultura tem de ser ensinada às crianças para que o desperdício acabe — diz Silva.

O coordenador de Resíduos Sólidos da Secretaria do Ambiente do Rio, Osmar Dias Filho, concorda:

— No Rio, cada pessoa descarta, em média, de 800g a 900g de resíduos por dia. É um lixo pesado, pois tem muito material orgânico. Com certeza, poderia ser melhor aproveitado. Falta conscientização.

A atriz Vera Holtz, que em “Avenida Brasil”, a novela TV Globo, vive Mãe Lucinda, moradora de um lixão, acredita que a história na telinha vai ajudar:

— O meu lixão é fictício, é quase uma poesia. Mas é uma forma de aproximar as pessoas do assunto. Sinto que há uma pontinha de luz, e algumas pessoas vão mudar de atitude, vão cuidar melhor de seu lixo — aposta.

Tomara.

A vacina de Dilma - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 17/06

Quem deu uma pausa no dia a dia da CPI do Cachoeira e prestou atenção nos movimentos da presidente Dilma Rousseff percebeu suas apreensões. Nada a ver com a Delta, a turma do guardanapo na cabeça ou qualquer outro personagem que tenha passeado em Paris ou se sentado no banco dos depoentes da comissão. O que tem tirado o sono de Dilma é a economia. Não por acaso, passou a semana anterior à sua participação na cúpula das 19 maiores economias do mundo e da União Europeia, o G-20, tratando do tema. Pela primeira vez, chamou os governadores para uma reunião conjunta no Planalto. Dilma vê o PIB nacional derretendo e as obras paralisadas. Busca agora uma “vacina” para que a responsabilidade recaia sobre o cenário internacional e não sobre as falhas de gestão em sua própria equipe.

Esta semana, ela deu vários indícios de que fará tudo o que estiver ao seu alcance para que os brasileiros vejam os problemas nacionais apenas como reflexo externo. Afirmou pelo menos três vezes que não dá para comparar o Brasil a países onde o desemprego de jovens chega a 54%, caso da Grécia. Os discursos invariavelmente trazem embutidas citações diversas sobre a crise europeia. Na reunião dos governadores, por exemplo, lembrou que não há luz no fim do túnel da Europa. Em Belo Horizonte, questionou a eficiência do aporte de 100 bilhões de euros aos bancos espanhóis. Ou seja, reforça sempre que as medidas por lá não estão adiantando no sentido de debelar ou mesmo reduzir problemas.

Por falar em debelar…
Grande parte das citações de Dilma sobre a Europa faz levantar uma desconfiança no meio político a respeito de que o discurso dela é, no geral, uma vacina capaz de acabar ou amortecer críticas atuais e futuras. Afinal, ninguém, nem mesmo a oposição, mencionou que o Brasil chegará ao caos grego, com o desemprego de 54% de seus jovens. Ou seja, a presidente pedir que não se faça essa comparação, como fez recentemente, soa no mínimo estranho já que não se vê o Brasil nesse patamar. Afinal, pode-se dizer tudo da oposição, mas não que seus principais atores apostem contra o país, como às vezes, os petistas tentam fazer crer.

Algumas preocupações dos políticos sobre a eficiência do governo são reais. Esta semana por exemplo, o senador Blairo Maggi (PR-MT), que não pode ser classificado como um “doidinho da oposição”, lembrava que há um ano o Congresso Nacional aprovou a execução do trem de alta velocidade que ligaria São Paulo ao Rio de Janeiro. O investimento previsto à época foi de R$ 30 bilhões. O senador considera que esses recursos, se separados para essa obra que não saiu do papel, deveriam ser destinados à construção de ferrovias e conclusão de outros projetos em andamento na área de infraestrutura. Ele não deixava de colocar a sua preocupação com a paralisia de obras importantes e com a escassez de recursos para fazer o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) andar a contento.

Por falar em papel…
Blairo levou para o plenário o que muitos na base do governo discutem nos bastidores: as obras por aqui estão devagar quase parando e é preciso dar novo fôlego à infraestrutura. Se há recursos — e a presidente não se cansa de dizer que o país tem força interna para debelar a crise —, a oposição agora tentará levar ao grande público a ideia de que o problema central do governo é mesmo a falta de gestão, ou seja, capacidade para fazer deslanchar os projetos. E é aí que Dilma trata de se vacinar para não permitir que os oposicionistas lhe tirem a imagem de grande gestora.

A sensação que se tem hoje, justiça seja feita, é que tanto Dilma quanto seus opositores têm razão em parte. A crise internacional, especialmente, na Europa, chega aos calcanhares dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), ao ponto de a agência Standard & Poor’s ameaçar rebaixar o grau de investimento da Índia. Obviamente, o Brasil tem bases mais sólidas do que a Índia e não é possível dizer que se um tem problemas os outros também terão. Mas a preocupação da presidente em proteger e alertar é correta. Não por acaso, a cúpula dos cinco países tem um encontro hoje em Los Cabos, antes da reunião do G-20 para tentar afinar o discurso e os apelos à União Europeia para que tomem cuidado com os reflexos de suas medidas nos lugares do planeta que ainda seguram o desenvolvimento mundial.

Mas não dá para deixar de concordar com os oposicionistas que apontam falhas na gestão como responsáveis por atrasos em obras governamentais. Afinal, está na hora de o país definir melhor suas prioridades. O PAC hoje tem tanta obra e tanto penduricalho que é impossível cumprir tudo a contento. E, se continuar nessa batida, por mais que Dilma tente listar a demora com reflexos da burocracia ou da crise externa, ficará difícil manter o papel de gestora com G maiúsculo. Esse parece ser, por enquanto, o pomo da discórdia hoje entre governo e oposição. Resta saber quem vencerá essa guerra dos discursos. A presidente, com a máquina de governo e toda a atenção, leva vantagem.

A presidente tenta passar ideia de que os problemas nacionais são reflexo da crise internacional. A oposição tenta colocar a culpa na incompetência gerencial do governo. Ambos têm razão

Coragem - MARTHA MEDEIROS

ZERO HORA - 17/06


A pior coisa do mundo é a pessoa não ter coragem na vida.” Pincei essa frase do relato de uma moça chamada Florescelia, nascida no Ceará e que passou (e vem passando) poucas e boas: a morte da mãe quando tinha dois anos, uma madrasta cruel, uma gravidez prematura, a perda do único homem que amou, uma vida sem porto fixo, sem emprego fixo, mas sonhos diversos, que lhe servem de sustentação.

Ela segue em frente porque tem o combustível que necessitamos para trilhar o longo caminho desde o nascimento até a morte. Coragem.

Quando eu era pequena, achava que coragem era o sentimento que designava o ímpeto de fazer coisas perigosas, e por perigoso eu entendia, por exemplo, andar de tobogã, aquela rampa alta e ondulada em que a gente descia sentada sobre um saco de algodão ou coisa parecida.

Por volta dos nove anos, decidi descer o tobogã, mas na hora H, amarelei. Faltou coragem. Assim como faltou também no dia em que meus pais resolveram ir até a Ilha dos Lobos, em Torres, num barco de pescador. No momento de subir no barco, desisti. Foram meu pai, minha mãe, meu irmão, e eu retornei sozinha, caminhando pela praia, até a casa da vó.

Muita coragem me faltou na infância: até para colar durante as provas eu ficava nervosa. Mentir para pai e mãe, nem pensar. Ir de bicicleta até ruas muito distantes de casa, não me atrevia. Travada desse jeito, desconfiava que meu futuro seria bem diferente do das minhas amigas.

Até que cresci e segui medrosa para andar de helicóptero, escalar vulcões, descer corredeiras d’água. No entanto, aos poucos fui descobrindo que mais importante do que ter coragem para aventuras de fim de semana, era ter coragem para aventuras mais definitivas, como a de mudar o rumo da minha vida se preciso fosse. Enfrentar helicópteros, vulcões, corredeiras e tobogãs exige apenas que tenhamos um bom relacionamento com a adrenalina.

Coragem, mesmo, é preciso para terminar um relacionamento, trocar de profissão, abandonar um país que não atende nossos anseios, dizer não para propostas lucrativas porém vampirescas, optar por um caminho diferente do da boiada, confiar mais na intuição do que em estatísticas, arriscar-se a decepções para conhecer o que existe do outro lado da vida convencional. E, principalmente, coragem para enfrentar a própria solidão e descobrir o quanto ela fortalece o ser humano.

Não subi no barco quando criança – e não gosto de barcos até hoje. Vi minha família sair em expedição pelo mar e voltei sozinha pela praia, uma criança ainda, caminhando em meio ao povo, acreditando que era medrosa. Mas o que parecia medo era a coragem me dando as boas-vindas, me acompanhando naquele recuo solitário, quando aprendi que toda escolha requer ousadia.

Supremo Tribunal, supremos problemas - MARCO ANTONIO VILLA

FOLHA DE SP - 17/06


Antes da posse, o ministro vai ao Senado. Só elogios. Une-se aí ao empreguista STF, com 235 recepcionistas, vira celebridade. E "lê" milhares de casos ao ano


Ao longo da história republicana, a atuação do Supremo Tribunal Federal esteve, quase sempre, em desacordo com valores democráticos.

Em um país como o nosso, de uma enraizada cultura autoritária, a omissão do STF foi perversa. Basta recordar o silêncio cúmplice com relação às graves violações dos direitos humanos durante o Estado Novo e durante a ditadura militar.

Em vez de o STF ser uma espécie de tribunal da cidadania, ele foi, neste mais de um século de vida, um instrumento de desprezo da ordem democrática. Fui também um elemento de reforço da impunidade, doença maligna que permeia o cotidiano brasileiro.

A Constituição de 1988 atribuiu ao STF um conjunto de competências. Ele foi transformado, na prática, em um tribunal de última instância, quando a sua função deveria ser estritamente interpretar o texto constitucional.

Assim, só em 2011 a Corte teve 102 mil decisões, das quais 89 mil foram monocráticas, ou seja, tomadas por apenas um ministro. Dentre essas, 36.754 foram exclusivamente do presidente do STF.

Mesmo com a existência da súmula vinculante, causa estranheza que um só ministro tenha proferido tantas decisões.

Imagine o leitor que se um processo tenha, em média, cem folhas -algo que, para os nossos padrões, caracterizado pela prolixidade, é considerado curto- e que o presidente tenha julgado originalmente somente um terço dos processos, cerca de dez mil, para facilitar as contas. Ele teria de ler 1 milhão de folhas. Será que leu?

O STF tem muitos outros problemas. Um deles é a escolha dos ministros, uma prerrogativa constitucional do presidente da República.

Cabe ao Senado aprová-la. As sabatinas exemplificam muito bem o descaso com a nomeação. Todos são aprovados sem que se conheça o que pensam. São elogiados de tal forma pelos senadores que fica a impressão que estão, com antecedência, desejando obter a simpatia dos futuros ministros frente a um eventual processo. Em síntese: as sabatinas são uma farsa e desmoralizam tanto o Senado como o STF.

No Brasil, estranhamente, os ministros acabaram virando celebridades. Dão entrevistas a toda hora e sobre qualquer assunto.

Um deles chegou a "abrir sua casa" para uma reportagem e tirou uma foto deitado na cama ao lado da sua esposa! Tem ministro poeta, outro é empresário de ensino, tem ministro que foi reprovado em concurso para juiz -duas vezes, e mesmo assim foi alçado ao posto maior da carreira, mas sem concurso, claro-, tem ministro que chegou lá devido à sorte de quem era vizinho da sua mãe. Pior ainda são aqueles que ficam alguns anos como ministros e retornam à advocacia, usando como grife a passagem pelo Supremo.

O STF padece também de um velha doença nacional: o empreguismo. São quase 3.000 funcionários, entre efetivos e terceirizados. Não é improvável que, se todos comparecerem no mesmo dia ao trabalho, as instalações da Corte não sejam suficientes para abrigá-los.

Como são 11 ministros, a média é de 272 funcionários para cada um. E o mais estranho são funcionários que não estão diretamente vinculados à função precípua de julgar, como as 235 recepcionistas e os 403 seguranças -deve ser a Corte mais segura do mundo.

Essa estrutura custa para a União uma bagatela da ordem de R$ 500 milhões ao ano.

Um bom momento para o STF reencontrar a cidadania é o julgamento do mensalão. Poderemos assistir como cada um dos 11 ministros vai agir. Pode ser que, finalmente, a Corte rompa com seu triste passado de conluio com o Executivo e seja um instrumento de defesa dos valores democráticos.

Um piscar de olhos - LUIZ FERNANDO VERISSIMO

O ESTADÃO - 17/06


Tive uma idéia para um curta. Começaria em um close de dois olhos, que piscariam. E só.

Tive uma ideia para um filme de curta-metragem. Começaria com um close de dois olhos, que piscariam. E só. O resto do filme seria tomado pelos créditos, ou o que nós do ramo chamamos de roll-up. Assim:

Escrito e dirigido por Luis Fernando Verissimo.

Baseado livremente em Critica da Razão Pura, de Immanuel Kant.

Produzido com recursos das leis de incentivo fiscal (todas) do BNDE, do Ministério da Cultura e, suspeita-se, do Carlinhos Cachoeira.

Os produtores desejam agradecer (ironicamente) à Gerdau e à Petrobras por não terem dado um tostão para o filme. Vocês serão lembrados na entrega dos Oscars.

Os produtores desejam agradecer a seus familiares o colírio e o rímel gentilmente doados, assim como aos amigos o fornecimento de pizzas e refrigerantes durante a filmagem, além do apoio moral.

Atores convidados:

Brad Pitt, Mariana Ximenez, Meryl Streep, Anthony Hopkins, Shakira, Clint Eastwood, Penelope Cruz, Selton Melo, Wagner Moura, Rita Cadilac, Mat Damon, Claudia Raia, Shreck E Cristopher Plummer. (Nenhum aceitou o convite.)

Em breve: Um Piscar de Olhos – Parte II.

Breve em DVD : Um Piscar de Olhos – The Director´s Cut.

O diretor aceita debater o filme com os críticos, desde que ninguém vá armado.

Na verdade este seria o meu segundo filme. Fiz o primeiro quando tinha uns nove anos e arranjei uma caixa de charutos vazia. Entre parênteses: ninguém, entre os meus parentes, fumava charutos. Não sei como consegui a caixa. Que, a começar pelo seu cheiro, era um manancial de prazeres.

Decidi fazer da minha caixa de charutos um projetor. Consegui – também não me lembro como – uma lente e abri um buraco na lateral da caixa para colocá-la. Atrás da lente iria uma fonte de luz. Depois de muito pensar decidi que uma vela bastaria para projetar o filme. A alternativa seria uma lâmpada mas isto envolveria um fio, uma tomada e uma boa explicação quando descobrissem que eu tinha roubado a lâmpada de um abajur da sala. A vela era primitiva mas faria o serviço, lançando na parede através da lente o filme que passaria de um rolo a outro (também improvisados).

E dediquei-me, então, ao principal. O filme. Seria uma tira de papel de seda em que eu desenharia, quadro a quadro, uma história passada no Velho Oeste americano, com caubóis, cavalos, bandidos, índios, nenhuma mulher e muitos tiros. A duração do filme dependeria da velocidade com que eu acionasse os rolos, mas não havia papel de seda para mais de cinco minutos – o que limitava criatividade do roteirista.

Quantos bandidos e índios seria possível matar em cinco minutos?

Aconteceu o inevitável. Mal começou a projeção do filme pronto, no primeiro quadro, o papel de seda pegou fogo. Em pouco tempo a caixa de charutos também ardia. Cheguei a ver uma imagem fugidia projetada na parede antes do holocausto – o meu projetor funcionara! Por dois segundos, funcionara. Acho que nunca mais tive uma sensação igual à daqueles dois segundos.

Democracia, democracia - JOÃO UBALDO RIBEIRO


O Estado de S.Paulo - 17/06


Nesta minha tão curta passagem por Londres, acho que, voltando do centro para o hotel, não houve dia em que o motorista do táxi deixasse de parar num tráfego de repente lento, para comunicar que nos atrasaríamos um pouco, porque estava havendo uma manifestação de rua. Da primeira vez, era um animado cortejo dos Soldados de Jesus, composto de uma multidão de peles e roupas de todas as cores, marchando, pulando e dançando atrás de alguns carros de som, dentro dos limites de cordas que lembram as que, no Brasil, isolam blocos de carnaval. O som às vezes parecia também de carnaval, com um batuque animado, interrompido de quando em quando por pregadores que, das plataformas dos carros, arengavam para os seguidores e a plateia da rua.

Ninguém buzinava ou, aparentemente, reclamava, inclusive o motorista. Em primeiro lugar, a manifestação estava programada e ele se esquecera de verificar isso, antes de sair para trabalhar. Em segundo lugar, todos tinham o direito de expor e defender suas ideias e convicções de forma ordeira. Ele mesmo nunca participara de uma manifestação, mas participaria, se visse necessidade. Talvez, se algum dia um governante resolvesse propor a proibição de uma crença ou convicção ideológica, ele saísse com os Soldados de Jesus, defendendo a liberdade de todos. Além disso, finalizou, o desfile não deveria tomar mais do que uns quatro minutos ali. Eu também não reclamei, pensando em como, se morasse em Londres, certamente participaria de manifestações, notadamente, como no caso do motorista, as que defendessem a liberdade.

Dentro de quase exatamente quatro minutos, a manifestação se encerrou. Devia haver mais policiais discretamente por ali, mas só vimos uma meia dúzia, de ambos os sexos, sem nervosismo, sem armas, capacetes, coletes à prova de balas ou aparelhos repressivos e às vezes sorrindo e conversando com os participantes. Na rabada do cortejo, em motos de cores alegres e suaves, mais dois ou três, visivelmente despreocupados e cumprindo burocraticamente suas obrigações. E assim ficamos, retribuindo os beijinhos que os Soldados de Jesus, principalmente as muitas crianças, lançavam para nós e logo, depois de acenarmos um bye-bye na direção dos manifestantes, partimos para o hotel.

No dia seguinte, creio que na mesma altura do centro, nova parada.

"Manifestação?", disse o motorista. "Oh, meu Deus, espero que não sejam os gays novamente."

Por que isso, ele era contra os gays? Ele quase se ofendeu. Contra os gays? Não havia razão nenhuma para ser contra os gays, considerava isso inadmissível. Não, senhor, era apenas porque as manifestações dos gays costumavam ser bem maiores e tomariam muito mais tempo para passar que a maioria das outras. Mas agora via que não eram os gays, eram os sikhs, membros de uma religião da Índia, que exigiam justiça para com seus fiéis, perseguidos na terra natal. E, de fato, num instante a rua se transformou num rio de turbantes alaranjados e adereços dourados, enquanto homens, mulheres e crianças desfilavam circunspectamente ao lado do táxi, exibindo em silêncio seus cartazes de protesto.

Perto do hotel, fica Hyde Park, um dos maiores parques urbanos do mundo. Sua beleza e suas atrações são difíceis de descrever, mas não foi por isso que, no domingo passado, resolvi dar um passeio por lá. Melhor dizendo, não fui passear, fui visitar o Speaker's Corner, porque achei que a visita era um bom complemento para a experiência das passeatas. Muita gente já ouviu falar do Speakers Corner, cujo nome pode ser traduzido como "Canto dos Oradores". Há similares em Londres e em outras cidades da Inglaterra e do mundo, mas o de Hyde Park é de longe o mais expressivo e famoso. Não fazem lá concursos de oratória; vê-se e ouve-se gente fazendo discursos.

Qualquer pessoa, inclusive turistas estrangeiros, pode ir ao Speakers Corner, geralmente levando uma plataforma que pode ser de um caixote vazio a uma escada dobrável, para falar o que lhe der na veneta ou o que considerar um recado essencial ao mundo. Basta então subir no caixote e discursar. Os oradores são dezenas e o público, numeroso e participante, de vez em quanto entra em debates exaltados, envolvendo oradores e aparteadores. E a polícia, sempre discreta, comparece, mas não para reprimir ou censurar os oradores e debatedores, mas para garantir que ninguém cerceie a palavra de ninguém ou haja violência, o que, aliás, raramente acontece. Alguns até põem o dedo na cara do oponente, mas não se parte para o sopapo ou o xingamento chulo.

Pode-se falar tudo no Speakers Corner, é como se seus oradores tivessem imunidade parlamentar, não para dispor de foro especial e outros privilégios, mas para expor suas verdades, seus sonhos e revoltas, sua visão do mundo, da política, da religião e do que mais queiram. Pode-se advogar a abolição da monarquia ou do parlamento, a reforma da ortografia, o fechamento do país aos imigrantes, a deportação de todos os carecas, a obrigação de casais sem filho adotarem uma criança, a inclusão de carne de lebre na merenda escolar, a criação de cursos oficiais para gagos e fanhos, a importação de camelos, a instituição de modelos compulsórios de escovas de dentes, qualquer coisa mesmo. Ninguém por causa disso é preso, perde o emprego público, toma tiro ou é perseguido. Simplesmente foi a Hyde Park, deu seu recado, lavou a alma, desabafou, disse o desaforo às autoridades que estava entalado na garganta e voltou para casa em paz. Não é nem de longe a mesma coisa que postar insultos anônimos na internet, é quase um misto de psicanálise com ativismo cívico. Saí cedo, o ambiente ainda borbulhava. Saí porque inveja deprime um pouco.

Sobre o assassinato - DANUZA LEÃO

FOLHA DE SP - 17/06


Na vida real, muitas mulheres que se sabem traídas têm vontade de matar. Algumas até matam


A imprensa tem sido amável e discreta, com Elize Matsunaga; reproduziu o diálogo entre ela e seu (ex?) marido do jeito que ela contou, claro, já que não havia ninguém presente, além dos dois. Ok, jornais e revistas devem ser imparciais, mas existe limite para tudo; em certos casos, até para a imparcialidade.

Marcos Matsunaga estava traindo Elize? Estava, e se todas as mulheres tivessem o direito de matar os maridos que as traem, sobrariam poucos para contar a história.

Ele ameaçou tirar a guarda da filha dela? Todos dizem isso na hora da separação. Foi encontrar a nova namorada no carro (dado por ele) de Elize? Razão para uma certa simpatia pela mulher traída: um absurdo ele usar o carro da própria mulher para sair com a outra. Ela estava visitando a família no Paraná, com a filha e a babá, enquanto ele a traía? Mais digna de simpatia ainda. Seu marido presenteou a nova namorada com um carro? Repetiu o que havia feito com Elize quando a conheceu, ainda casado.

Na hora da briga ele a chamou de prostituta? É melhor mesmo que ninguém se lembre nem do que ouviu, nem do que falou nessa hora, tudo faz parte. Não costumam ser coisas amáveis, mas há muitos que esquecem e até fazem as pazes depois.

Ele a agrediu fisicamente? Nenhuma novidade, também costuma acontecer.

Na vida real, muitas mulheres que se sabem traídas -e sobretudo as que têm uma prova, como o vídeo feito pelo celular- têm vontade de matar. Algumas até matam, a maioria não, mas que muitas têm vontade, isso têm. As que matam costumam ser rápidas; mulher não gosta de ver sangue.

Segundo os jornais, Elize vai ser acusada de assassinato e ocultação de cadáver; não por esquartejamento -esse detalhe não deve existir no Código Penal, como também não deve existir a antropofagia, coisas inadmissíveis na cabeça dos que fazem as leis.

A morte de uma pessoa querida é sempre dolorosa; se for uma morte violenta, mais dolorosa ainda. Se seguida de esquartejamento, nem dá para imaginar o que deve ter sentindo a família de Marcos Matsunaga na hora do enterro. Não existem palavras para avaliar essa dor.

A frieza de Elize é monstruosa. Eu teria medo de deixá-la sozinha com a própria filha, pois ela parece capaz de tudo, e não sei se existe um nome para definir uma doença tão, tão -nem sei o quê. Crimes como esse, confessados e comprovados, não merecem nem julgamento. Não gosto de pensar no que seus advogados vão dizer, na tentativa de absolvê-la; nessa hora, advogados são capazes de tudo. E choca ver que as pessoas não estão dando muita importância ao caso, e que estão tratando Elize como uma pessoa quase normal, com o respeito que se deve dar a qualquer ser humano; só que ela não é um ser humano, é um monstro, e monstros devem ser tratados como tal.

Em outros tempos, certos crimes davam manchetes, e até nomes aos assassinos; quem já era nascido deve lembrar da "fera da Penha".

Nem lembro mais quem ela matou, mas de como ela era chamada não esqueci. Por que será que um crime tão hediondo como o de Elize quase não mobiliza ninguém, nem numa conversa entre amigos?

Está faltando a capacidade de se indignar, e isso é preocupante.

Praia na montanha - HUMBERTO WERNECK


O Estado de S.Paulo - 17/06


Costumo dizer que Belo Horizonte melhorou muito depois que me mudei de lá, fez agora 42 anos, e não há nisso uma inverdade. Nem minha mãe, se viva fosse, diria o contrário. Tampouco meu pai, ambientalista que nessas quatro décadas ajudou a cidade a se colorir de verde. Quando vim para São Paulo, os dois foram me levar à sórdida rodoviária de então, onde me esperava um ônibus da Cometa para dez horas de estrada ruim. Viagem bem menos confortável do que a que fez Otto Lara Resende quando, em janeiro de 1946, se mandou para o Rio de Janeiro. De mala, cuia e bigodinho, o Otto saiu pelo aeroporto da Pampulha, num daqueles DC-3 veteranos de guerra.

Sou tão antigo que cheguei a voar num desses, na minha estreia aeroviária, aos 5 anos de idade. Na pista, o avião se assentava sobre as rodas traseiras, como um cachorro, focinho rombudo a farejar as nuvens. Entrava-se por uma portinhola junto à cauda, e dentro se avançava por um plano inclinado entre as fileiras - uma poltrona de um lado, duas do outro, e estávamos conversados. Não sei se ali cabiam 20 passageiros. Mas me lembro que a aeromoça (quase escrevo enfermeira), como então se chamava a comissária, distribuía pastilhas e chumaços de algodão para proteger os ouvidos da pressão e do fragor dos motores. Os sacos para enjoo raramente jaziam ociosos na bolsa à frente do passageiro.

Aviãozinho espartano, aquele DC-3 em que o Otto bateu asas, mas ainda assim preferível, 24 anos mais tarde, às trepidantes viaturas da Cometa. Quando perguntei por que tinha deixado Belzonte, ele fez graça, respondeu que não sabia: talvez o preço da passagem da Panair, 220 cruzeiros. Não sei quanto meus pais pagaram para me embarcar naquele ônibus, mas não esqueço o abafamento moral e a falta de horizontes que me expeliram de minha cidade. O panorama hoje é outro. Vai ver que era eu que estava atrapalhando.

O que importa é que aos poucos me reconciliei com Beagá, aonde tenho ido com insistência e assumido prazer. Amigos meus que moram lá dizem que é porque chego com a passagem de volta. Pode ser. Um motivo a mais para não "regredir a Minas", como dizia ter feito o jornalista, escritor e minerador de talentos literários João Etienne Filho, um que saiu, ricocheteou no Rio e voltou. "Eu não mereço", disse o Otto quando nos anos 80 grassou um sarampão sentimental em favor do retorno de nativos ilustres às Gerais. Como ainda não me ofereceram o governo estadual, vou ficando onde estou. Se oferecerem, aí é que não vou mesmo. Em todo caso, já cansei amigos e desafetos com a declaração de que sou mineiro não-praticante.

Serei mesmo? A frequência com que tenho escrito sobre a minha terra vai desmoralizando o rótulo que galhofeiramente pespeguei em mim. Ando mais praticante do que muitos lá encastoados. Há 20 anos fiz um livro inteiro, agora reeditado com cara nova, O desatino da rapaziada, sobre coestaduanos meus igualmente dados a escrever. E hora dessas ainda me animo a desovar mais um, esse exclusivamente sobre Belo Horizonte e que deverá chamar-se Praia de mineiro. Inadimplente literário, daqui aviso a meu editor que já está tudo apurado, faltando apenas escrever. E, a menos que eu seja incompetente a ponto de malbaratar um bom assunto, daí pode sair coisa divertida. A começar por essa obsessão marítima dos mineiros, inconformados que somos com nossa condição - maldição? - mediterrânea.

"Dizem que Minas já teve mar", escreveu Betinho, o sociólogo Herbert de Souza, que era mineiro de Bocaiúva. "O lugar está lá, só falta a água." Que falte, deu de ombros a moçada que num dia de 1977 decidiu dotar de praia o bairro belo-horizontino do Prado. Sim, uma praia na montanha. "Das construções vizinhas, eles trouxeram areia e de suas casas, baldes de água", relatou a Veja. "Em pouco tempo o local estava tomado por moças e rapazes com roupas de banho, óculos escuros, bronzeadores e guarda-sóis." Durou pouco, mas permaneceu como um feito - talvez inédito: que outra cidade pode se orgulhar de uma ex-praia?

Até os deuses erram - MARCELO GLEISER

FOLHA DE SP - 17/06


A sacada genial do filme "Prometheus" é mostrar cientistas alienígenas cujo experimento é o homem


Recentemente, escrevi sobre como civilizações extraterrestres ultra-avançadas seriam indistinguíveis de deuses. Escrevi também sobre a privatização da exploração espacial. Por uma dessas coincidências, os dois temas formam a base do novo filme do diretor Ridley Scott, "Prometheus", que assisti no fim de semana passado.

O intuito do filme é explicar a origem do horrendo Alien, estrela (junto com Sigourney Weaver) do clássico de 1979, também de Scott.

Um aviso: não leia esta coluna se ainda não viu o filme.

Em "Prometheus", descobrimos que a "coisa" foi um erro, resultado inesperado de um experimento genético fracassado. A sacada genial do enredo é que os cientistas são alienígenas (os "Engenheiros"), que também criaram a raça humana.

(O título remonta ao mito grego, no qual o titã Prometeu cria os humanos a partir do barro e rouba o fogo dos deuses para benefício de suas criaturas. Por esse ato, Prometeu é condenado a ter seu fígado devorado eternamente por uma águia.)

Milênios atrás, alienígenas estiveram aqui e nos criaram. Sabemos disso porque um casal de arqueólogos descobre ilustrações com a mesma formação planetária nas ruínas de antigas civilizações: maias, egípcios, sumérios. Os arqueólogos sugerem que as imagens apontam para o local de origem dos criadores.

Felizmente, sendo o final do século 21, temos já meios (pela indústria privada) de alcançar outras estrelas e seus planetas. Um bilionário à beira da morte contrata os arqueólogos para uma expedição até o sistema planetário. Seu objetivo, que não revela, é encontrar nossos criadores para que possam salvá-lo da morte: se nos criaram, devem ser capazes de evitar que morramos.

Logo após chegarem à lua cinzenta e metálica de onde vieram os alienígenas, nossos heróis descobrem a terrível verdade: a lua não era a casa dos ETs, mas seu laboratório remoto, onde desenvolveram uma terrível arma biológica, uma doença projetada para destruir a espécie humana. Pelo jeito, nossos criadores queriam nos destruir.

Só que os ETs erraram e perderam o controle de seu experimento: a doença escapou, evoluiu e os matou antes que pudessem ir para a Terra. "Nossos criadores não eram imortais", comenta David, o personagem mais interessante do filme, um androide inteligente e "sem alma", o único que sabia das intenções do bilionário.

Após muita luta e sangue, sobrevivem apenas duas criaturas: a arqueóloga Elizabeth Shaw e o Alien, que, descobrimos, é um híbrido de um dos ETs criadores e de uma espécie de monstro-polvo, gerado por Shaw e seu amante arqueólogo, após ele ter sido contaminado com a doença. O Alien tem avó humana.

O que nos diz o filme? Que criar novas formas de vida é perigoso; que mesmo inteligências capazes de criar vida complexa cometem erros fatais; que é bom ter cuidado com o que se cria, pois a criação pode suplantar o criador -talvez seja por isso que nossos criadores queriam nos destruir, por ter medo que nós os destruíssemos um dia.

O filme não explica (vem aí "Prometheus 2"?). Mas, pelo que vemos no androide David e em suas intenções dúbias, mesmo inteligências ultra-avançadas são incapazes de se livrar do instinto de dominação.

BRAZIU: CORRUPTO DESDE CRIANCINHA 3


A noite estrelada - FERREIRA GULLAR

FOLHA DE SP - 17/06


Diante da tela em branco, tudo é possível e, por isso, nada é possível, a menos que se atreva a começá-la


Quando, em 1890, Vincent van Gogh (1853-1890) se dispôs a pintar uma noite estrelada e se pôs diante da tela em branco, nada ali indicava por onde começar. Mas acordara, naquele dia, decidido a inventar uma noite delirantemente estrelada, como imaginava frequentemente e não se atrevia a fazê-lo não se sabe se por temer errar a mão e pôr a perder o sonho ou se porque preferia guardá-lo como uma possibilidade encantadora, uma esperança que o mantinha vivo.

Aliás, já tentara antes expressar na tela seu fascínio pelo céu constelado. Um ano antes, pintara duas telas em que fixava a beleza do céu noturno -uma dessas telas mostra a entrada de um café com mesas na calçada e, ao fundo, no alto, o céu negro ponteado de estrelas; a outra tela é uma paisagem campestre sob as estrelas. Mas eram como ensaios, tentativas de aproximação do tema que continuava a exigir dele a expressão plena, ou melhor, extrema, como era próprio de sua personalidade passional.

Para alguns, possivelmente, a mesma personalidade que o impelira, dez anos antes, numa noite de Natal, a decepar a própria orelha e levá-la de presente a uma prostituta do prostíbulo que costumava frequentar. Por que fez isso, não há uma explicação plausível, embora haja muitas, desde a de sentir-se abandonado pelo irmão Theo, que preferia passar aquela noite de Natal com a noiva, até a de punir-se pelo ódio que alimentava contra sua mãe. Mas num ponto todos parecem concordar: só um louco seria capaz de mutilar-se daquela maneira.

Pode ser, mas Vincent van Gogh era uma personalidade difícil de explicar. Tenho dúvida quanto ao diagnóstico que o dá como louco. Sabem por quê? É que as pinturas feitas por artistas ditos loucos -como, por exemplo, Emygdio de Barros ou Fernando Diniz- mostram uma carga de subjetividade, uma estranheza (para não dizer anormalidade) que os quadros de Van Gogh não têm.

Pelo contrário, afora a sua primeira fase, marcada por uma espécie de realismo soturno, as demais, que dariam origem décadas mais tarde ao expressionismo, são de uma limpidez cromática incomparável. Refletem lucidez saudável, e não doença mental. A verdade, porém, é que, segundo consta, certo dia ele quase se envenenou ao espremer bisnagas de tinta dentro da boca. E, no final das contas, deu um tiro no peito e acabou com a vida.

Concordo. Muito bom da cabeça ele não era, mas um pintor genial ele foi, sem dúvida. E uma de suas obras-primas é, certamente, aquela "Noite Estrelada" de 1889.

Imagino o momento em que se dispôs a pintá-la: tem diante de si a tela em branco e pode ser que esteja ao ar livre em plena noite, com velas acesas presas ao chapéu. Mas a noite real é pouca. A noite que deseja pintar é outra, mais bela e mais feérica que a real. Por isso, a tela em branco à sua frente é um abismo. Um abismo de possibilidades infinitas, já que a noite que deseja pintar não existe, mas deveria existir, pois o seu sonho a deseja.

Como começar a pintá-la, se ela não existe? Diante da tela em branco, tudo é possível e, por isso mesmo, nada é possível, a menos que se atreva a começá-la. E assim, num impulso, lança a primeira pincelada que, embora imprevista, reduz a probabilidade infinita do vazio e dá começo à obra -ou seja, transforma o acaso em necessidade.

E assim foi que a sucessão de pinceladas, de linhas e cores, aos poucos definiu uma paisagem noturna que era mais céu que terra: um pinheiro que liga o chão ao céu e, lá adiante, a pequena vila sobre a qual uma avassaladora tormenta cósmica se estende, como se assistíssemos ao nascer do Universo.

POSTOS DE GASOLINA

O governador Sérgio Cabral, que muito tem acertado, erra ao decidir fechar os postos de gasolina da avenida Atlântica. Eles são de grande utilidade aos moradores e à população em geral e em nada interferem na beleza da avenida, que tem quase quatro quilômetros de comprimento. Sem eles, restarão às pessoas que ali abastecem seus veículos apenas dois postos, um em cada extremo do bairro: o da rua Francisco Otaviano e o da praça Cardeal Arco Verde. Este, por ser pequeno, provocará engarrafamentos na entrada da rua Tonelero, principal acesso à lagoa Rodrigo de Freitas. É uma decisão que não traz benefício a ninguém, só prejuízos.

Blindagem insustentável - JOÃO BOSCO RABELLO


O Estado de S.Paulo - 17/06


A Rio+20 impõe uma breve pausa à CPI do Cachoeira que poderá dar ares de êxito ao esforço da base aliada para impedir o avanço nas investigações da Delta Engenharia. Nada mais falso: a rejeição à convocação do empresário Fernando Cavendish, dono da empresa, é politicamente insustentável e apenas dá mais nitidez ao objetivo do PT com a CPI - restringi-la à exposição de adversários políticos.

A quebra de sigilos da Delta, cujos dados estão sendo cruzados, estende à base do governo os efeitos da CPI e a inclui entre as vítimas de uma investigação que achou ingenuamente controlável. Foi um raciocínio aritmético que desconsiderou o mais óbvio: o fórum é político, assim como o processo que nele tramita.

Também não parece viável a adoção de uma tática protelatória, com bloqueio sistemático de convocações essenciais, com o propósito de obter o esvaziamento da CPI pela campanha eleitoral, que esquenta a partir do segundo semestre.

Uma CPI excita qualquer campanha, pela munição que oferece a candidatos, como ocorreu com a que levou ao impeachment do ex-presidente Fernando Collor em 92, ano de campanha municipal.

Há ainda a repercussão política negativa de uma "pizza" em pleno ano eleitoral, o que pode explicar a tentativa detectada na base aliada de transferir para o Palácio do Planalto o ônus da blindagem, sob o pretexto de preservar o governo, cliente preferencial da Delta.

A inidoneidade da empresa, decretada pelo governo, foi o antídoto a essa estratégia. É possível que a CPI não chegue até onde pode, mas ainda vai produzir danos à maioria governista.

Ciro e Quintela na berlinda

Não é consenso na oposição a proposta dos senadores Álvaro Dias (PSDB-PR) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) de afastar os integrantes da CPI que se reuniram com Fernando Cavendish - o senador Ciro Nogueira (PP-PI) e o deputado Maurício Quintella (PR-AL). Alguns preferem constrangê-los como nova votação pela convocação do dono da Delta, rejeitada por apenas três votos de diferença. Até lá, o chamado bloco independente espera ter um resultado parcial do cruzamento dos dados sigilosos da Delta, sobre os quais se debruça na semana de recesso da Rio+20. Por ora, já encontraram

R$ 3 milhões repassados à empresa-fantasma Pantoja, destinados a saques na boca do caixa para pagamento de propinas.

Diária de $ 60 mil

A investigação da Polícia Federal na Assembleia Legislativa do Amapá descobriu, entre outros absurdos, o pagamento de diárias de viagem de R$ 60 mil pagas a deputados. Ou seja, num só dia, o equivalente ao que um trabalhador que ganha salário mínimo leva oito anos para receber. Um pé lá, outro cá

O líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), está convencido de que precisa mesmo concorrer à Prefeitura de Manaus, mas pretende acumular o cargo com a campanha num primeiro momento, já que as eleições esvaziam o Congresso. Para cumprir a lei eleitoral, Braga já suspendeu o programa semanal de rádio que apresentava no Estado.

O retorno

O presidente do PSDB, Sérgio Guerra, e o ex-senador Tasso Jereissati lançam terça-feira próxima, em Manaus, a candidatura do ex-senador Arthur Virgílio à prefeitura da capital. Virgílio cumpriu um exílio político em Lisboa desde a derrota para a reeleição ao Senado em 2010, pela qual o ex-presidente Lula se empenhou a fundo. O acerto foi num jantar em Brasília na semana passada.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO


FOLHA DE SP - 17/07

Empresas mudam cobrança para conter inadimplência
Empresas especializadas em cobrança de inadimplentes, contratadas por companhias como bancos e grandes varejistas, implementaram mudanças em sua forma de atuar em razão da alta do atraso de pagamento no país.

"Nossos contratantes começaram a mexer mais em suas políticas de cobrança para melhorar seus índices. Quem não tinha tomado providência, agora corre para criar fórmulas que melhorem as negociações", diz Jair Lantaller, presidente do Igeoc, instituto que reúne empresas de recuperação de crédito.

"Para nos adaptarmos a essa demanda, temos de treinar os operadores", afirma.

Entre as medidas estão alongamento de prazos, redução de juros e flexibilidade na análise das propostas de renegociação dos clientes, segundo Claudio Kawasaki, da Siscom, empresa que também trabalha com recuperação de crédito.

"Cresceu a inadimplência de pessoas físicas e jurídicas. Houve excesso tanto de novos consumidores, que assumiram muito crédito, quanto dos bancos, que deram."

A empresa de recuperação é contratada a partir de 30 dias de atraso.

MAIS PARCELAS
Para driblar a alta da inadimplência, a Losango negocia o parcelamento das dívidas em até 24 meses, além dos três anos para pagamento que podem ser concedidos no momento em que o consumidor toma o crédito.

"Analisamos cada caso. Se o cliente teve um imprevisto, como a perda do emprego, temos uma flexibilidade maior", diz Hilgo Gonçalves, presidente da companhia, promotora de vendas do grupo HSBC.

Gonçalves afirma não ter notado mudanças no setor devido à queda dos juros.

O QUE ESTOU LENDO
Jackson Schneider vice-presidente da Embraer

Responsável pela área de relações institucionais da Embraer, Jackson Schneider lê a "Montanha Mágica", do alemão Thomas Mann.

A ideia da leitura veio, de certa forma, de uma viagem a Davos, na Suíça, cenário da obra e onde o executivo esteve em janeiro passado para participar do Fórum Econômico Mundial.

"Fui a um jantar no antigo sanatório onde se passa a história, há muito transformado em hotel", relembra o vice-presidente da fabricante de aeronaves.

Schneider destaca "a mudança da visão de mundo do personagem principal do livro, Hans Castorp".

Segundo o executivo, que foi também presidente da Anfavea, "Castorp se humaniza à medida que seu estado de saúde piora".

PISO ÚNICO NO RS
O primeiro shopping center do grupo Westfield Almeida Junior será construído em Canoas (RS).

A empresa é uma joint venture formada em 2011 com a união entre a australiana Westfield e a catarinense Almeida Junior.

O empreendimento receberá aporte de R$ 250 milhões e terá 200 lojas em um único piso.

"É o modelo de projeto da nossa empresa. Dá facilidade ao lojista e oxigena todo o shopping", afirma o CEO do grupo, Jaimes Almeida Junior.

A companhia tem outros quatro shoppings em operação e um em construção, que deverá ser inaugurado em setembro.

Todos são em Santa Catarina e foram desenvolvidos pela Almeida Junior antes da joint venture.

O grupo elaborou um projeto de expansão para outras regiões do país. Dois empreendimentos estão em análise para São Paulo e um para o Rio de Janeiro.

COMÉRCIO TRAVADO
O Brasil é o nono país em adoção de medidas restritivas no mundo, de acordo com levantamento do GTA (Global Trade Alert).

Hoje há 54 ações brasileiras em vigor contra o livre comércio mundial.

Metade das medidas afeta diretamente a China.

Em seguida, aparecem Estados Unidos e Alemanha, prejudicados por 21 e 17 ações implementadas pelo governo brasileiro, respectivamente.

A Argentina, por sua vez, é o país que mais afeta os interesses comerciais do Brasil, com 66 medidas em vigor.

Todos os parceiros do Brics (Rússia, Índia, China e África do Sul) estão entre os nove países que mais causam prejuízos ao Brasil.

Entre as ações que dificultam as exportações brasileiras, 16% são de natureza tarifária, segundo o GTA.

Cozinha A rede de restaurantes Divino Fogão, que tem hoje 117 franquias no país, irá abrir 24 unidades até o final do ano. Os pontos comerciais já foram comprados, todos em shopping centers.

Comida leve A Seletti investirá R$ 17,5 milhões até o final do próximo ano para a abertura de 23 unidades no país. No período, será inaugurada a primeira loja da rede no Nordeste.

Previdência A carteira de ativos sob gestão da Brasilprev chegou aos R$ 55,7 bilhões em abril. No mesmo mês do ano passado, ela somava R$ 41,5 bilhões -alta de 34,2%. A empresa tem hoje 1,4 milhão de clientes.

Dentro da Sumaúma - MIRIAM LEITÃO


O GLOBO - 17/06


O município tem o nome de Alta Floresta. Mas em 2009 entrou na lista das 40 cidades que mais destruíam floresta. Tem seis mil nascentes, mas em 2010 ficou sem água. Foi o fundo do poço para a cidade no norte de Mato Grosso. A partir daí, começou uma luta por mudança de atitude. No Diário Oficial da semana passada, Alta Floresta conquistou algo com o qual vinha sonhando: saiu da lista dos 40 municípios que mais desmatam.

A cidade que tinha uma péssima história para contar hoje está orgulhosa. Fui abordada por jovens no Centro. Quando contei o motivo de estar ali, uma moça me disse: "O desmatamento não vai voltar." Essa mesma convicção eu constatei na visita ao pecuarista Rodrigo Arpini, que está refazendo a proteção do seu rio, replantando o que foi desmatado em sua propriedade e, ao mesmo tempo, conseguindo aumentar os bois no pasto:

- A conscientização do pecuarista daqui não tem como voltar atrás.

Arpini não é o único a ter essa noção. Das 4.180 propriedades rurais da cidade, 3.500 já têm hoje o Cadastro Ambiental Rural e avançam para outras etapas da regularização ambiental e fundiária. As grandes resistem mais.

A história da relação de Alta Floresta com a floresta é parecida, no início, com a de outras cidades da Amazônia. Primeiro foi o garimpo, depois a exploração da madeira, em seguida, a pecuária. Agora, a ameaça vem das hidrelétricas. Cada ciclo criou ondas de desmatamento. Em 2009, entrou na lista dos municípios que mais desmatam e então começou a perder recursos econômicos. Um grande empreendedor local iria conseguir um financiamento externo e perdeu o negócio. Outro problema ronda o município: a morte súbita de capim no pasto. A falta de água em 2010 acendeu a luz vermelha. O município estava numa lista suja, perdendo financiamento e investidores, com pasto degradado e ficando sem água.

Foi quando a prefeitura e a ONG Instituto Centro de Vida (ICV) iniciaram uma campanha junto aos produtores. Com técnicas de conciliação entre agricultura, pecuária e floresta, desenvolvidas pela Embrapa, produtores foram convencidos das vantagens de uma nova atitude.

A primeira providência da Secretaria de Meio Ambiente foi isolar e proteger as nascentes. A segunda foi reduzir a burocracia e o custo do cadastramento ambiental e rural. Nada disso é fácil. O desmatamento é rentável. O resto do Brasil paga caro pela madeira tirada ilegalmente da Amazônia. Desmatar dá lucro e tem mercado.

Outro município que visitei na Amazônia, para uma série de reportagens do Bom Dia Brasil e da Globonews, foi Sinop. Lá, foi chegar, ir ao Ibama e perguntar se havia novidade. Havia. Naquele dia, o órgão flagrara o maior desmatamento do ano, num município próximo chamado Feliz Natal. O proprietário é Alcides Neto, que tem outras fazendas na região. Nesta fazenda foi apanhado um correntão: 500 hectares já haviam sido derrubados, outros 500 estavam ameaçados.

Localizei o proprietário pelo celular. Ele não quis me encontrar, mas pelo telefone argumentou que tinha arrendado a área, e depois disse que era apenas uma limpeza de pasto. Ninguém limpa pasto com um correntão de 100 metros e 15 toneladas amarrado a tratores. E foi isso que o Ibama viu quando chegou.

O Ibama de Sinop é responsável por 30 cidades de dimensões gigantescas e tem menos de um funcionário por município. Evandro Selva, o diretor do órgão, acha que, por ter poucos recursos, precisa de estratégia. Por isso tenta sufocar o desmatador economicamente, desapropriando tratores e caminhões que encontra na cena do crime.

Desde o começo do ano o Ibama local embargou 7 mil hectares de terra, aplicou R$ 78 milhões em multas e apreendeu 41 tratores. O órgão tem feito doações permitidas em lei. Eu vi um trator sendo doado para a Funai. Será usado para que índios do Xingu façam aceiro, uma proteção da mata. Madeira derrubada ilegalmente está virando escola, hospital e até sede da Embrapa.

Aliás, o órgão lá tem o nome de Embrapa Agrossilvipastoril porque tenta conciliar os três. Tem vários projetos bem sucedidos, mostrando que, com recuperação de áreas desmatadas e uso da agricultura, a pecuária fica mais rentável. A bela sede da Embrapa, feita de madeira doada pelo Ibama, contrasta com o local apertado, cheio de infiltrações, onde funciona o Ibama.

A Amazônia é imensa, cheia de diversidades e contrastes. Repleta de histórias. O governo tem dito que o Brasil é um exemplo para os outros países porque reduziu a taxa de desmatamento.

Da Rio 92 até a Rio+20, o Brasil destruiu na Amazônia 328 mil quilômetros quadrados de floresta. Uma vastidão equivalente à soma dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Ainda temos a segunda maior taxa de desmatamento do mundo, depois da Indonésia. Difícil ter orgulho.

Entrei numa Sumaúma durante as gravações da reportagem. A árvore é enorme e a base do seu tronco se abre, formando verdadeiros cômodos. É perfeita para tempos de mudança climática: retém água nas cheias e a libera na seca. Essa específica Sumaúma fica numa mata perto de Alta Floresta. Tem 500 anos. Dentro do seu tronco, passando as mãos nas suas paredes internas me dei conta de que ela tem a idade do Brasil. Estar dentro daquela árvore é uma emoção que não posso, nem quero, esquecer.

Planos para o futuro - SUELY CALDAS


O Estado de S.Paulo - 17/06


Quando o governo FHC bloqueou os caminhos por onde governadores e prefeitos aumentavam suas dívidas, a situação financeira dos Estados e municípios era caótica. Quase todos estavam falidos, não conseguiam investir um centavo porque a receita tributária inteira era comprometida com o pagamento de salários. Em alguns casos não dava nem para isso. Polícia em greve, crianças sem escolas, hospitais sem médicos - foi o dramático cenário que se espalhava pelo Brasil na época. No caso de Alagoas, o chefe do Poder Judiciário foi a Brasília entregar a chave do tribunal porque os juízes não recebiam salários há meses.

Era o desfecho de anos a fio de gestões desastradas, irresponsáveis, governadores desviando dinheiro de investimento para financiar campanhas eleitorais. E quando o cofre esvaziava, corriam a Brasília para pedir mais. O governo FHC deu um basta e condicionou a renegociação das dívidas dos Estados com a União a novas práticas de gestão dirigidas a organizar as finanças e recuperar a governabilidade com foco na população, não na próxima eleição. A Lei de Responsabilidade Fiscal foi imprescindível para o sucesso do programa. Passaram-se 15 anos, o caos foi superado e hoje os Estados têm orçamentos organizados, melhoraram a arrecadação tributária, aumentaram suas receitas e investem na população. Os Estados vivem situação muito diferente daquela enfrentada por FHC. Hoje, a presidente Dilma pode chamar governadores a Brasília, como fez na sexta-feira, incentivá-los a contrair novas dívidas e colocar os bancos públicos à disposição para financiar projetos de infraestrutura em seus Estados. Eles não vivem mais o aperto de FHC, mas a fartura de Dilma. Só que, para chegar à fartura, foi indispensável o aperto, planejar um programa consistente e uma estratégia de ação capaz de forçá-los a buscar disciplina fiscal e a equilibrar receita e despesa. Governar implica diagnosticar problemas, definir rumos, planejar ações, indicar objetivos, eleger prioridades e pensar o imediato de olho no longo prazo. Sem um rumo definido, o governante caminha em zigue-zague, atirando a esmo, apagando incêndio, fazendo e desfazendo. É a improvisação encobrindo a falta de um bom e consistente programa de governo.

É o que falta ao governo Dilma e o que tem causado o zigue-zague e a improvisação nas ações dirigidas a recuperar o crescimento econômico. Um dos muitos exemplos é essa intempestiva oferta de linhas de crédito do BNDES e do Banco do Brasil para os Estados investirem em obras de infraestrutura. Nada contra - até ao contrário - governos estaduais tomarem crédito de dois bancos públicos, se os bancos privados se retraem aqui dentro e no exterior há escassez até para grandes e lucrativas empresas. Mas, se isso fosse parte de uma bem arquitetada política de investimentos, dentro de um programa para o País previamente definido, os créditos já teriam gerado obras e novos empregos, movimentado as economias regionais e ajudado a recuperar o raquítico PIB de 2011 e do início de 2012. Na improvisação, as chances de funcionar reduzem. A intenção de Dilma pode até não ser política, mas liberar dinheiro para governadores, às pressas e às vésperas de uma eleição, dá munição para a oposição acusar seu governo de cooptar apoio de governadores para seus candidatos e manipular verbas públicas com fins eleitoreiros. Sem contar a desconfiança - fundamentada no péssimo histórico dos políticos brasileiros - de que pode haver desvio de dinheiro do crédito para financiar campanhas de prefeitos aliados de governadores. Isso poderia ser evitado se tudo fosse feito ao longo da execução de um programa de governo.

Dilma já perdeu um ano e meio agindo sem rumo, atirando para todos os lados e errando os alvos. O resultado tem sido um PIB raquítico, a população endividada, investimentos em queda, aeroportos atrasados, o PAC empacado e um futuro incerto. Ainda há tempo de virar o jogo. Mas a dúvida é se seus ministros e a equipe econômica serão capazes de planejar e executar um plano para o futuro.

América Latina+20 - MAC MARGOLIS


O Estado de S.Paulo - 17/06


A se julgar pelos comentaristas e palpiteiros do ramo, a conferência para o desenvolvimento sustentável, no Rio de Janeiro, tem tudo para decepcionar. A redação de seu texto final se arrasta, apesar dos esforços frenéticos dos negociadores nos últimos dias.

Nações ricas e os novos ricos, novamente, ensaiam não se entender sobre quem mais polui e quem deve pagar por isso, reprisando o impasse da última edição do evento há 20 anos. O prego no caixão, dizem os céticos, seria a ausência anunciada do presidente Barack Obama, da chanceler Angela Merkel e do premiê David Cameron - os chefes das nações mais poderosas e poluidoras do planeta.

No entanto, o atestado de óbito da Rio+20 seria prematuro e perigoso. Há muito em jogo. Para se falar apenas da vizinhança, um aumento de 2º centígrados da temperatura do planeta provocaria na América Latina perdas de US$ 100 bilhões até meados do século, segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). São quebras de safra por seca ou emergências climáticas que sobem com os termômetros.

A conta do BID parece injusta. América Latina e Caribe contribuem muito pouco para desequilibrar o planeta. Juntos, produzem apenas 11% dos gases (CO2 e metano) que levam ao efeito estufa. No entanto, com o crescimento mais acelerado e as novas classes médias e pobres emergentes finalmente se juntando à festa, a pegada de carbono latino deve dobrar até 2050 - das 4,7 toneladas de CO2 per capita de hoje para 9,3 toneladas.

Pior, a região é altamente dependente dos recursos naturais (destaque para os produtos agrícolas), que são especialmente vulneráveis a baques climáticos. Para evitar desastres, o BID receita investimentos pesados de até US$ 110 bilhões em tecnologia e inovação para combater as emissões de carbono.

Os países em desenvolvimento clamam por um fundo de compensações - fala-se na ordem de US$ 30 bilhões - bancado por países ricos. Com a Comunidade Europeia na berlinda e seus credores também, ninguém está prendendo a respiração.

Isso condena a Rio+20 a estrear natimorta. A ausência de um consenso não significa paralisia. Costurar um pacto a centenas de mãos, como manda o rito das Organizações das Nações Unidas, é um convite à colisão ou, no máximo, a acordos anódinos. Rio, Copenhague, Cancún, Durban, entram e saem cúpulas sem que se avance em compromissos esboçados no Protocolo de Kyoto.

Claro, a desordem climática atravessa fronteiras. Há muito, porém, as nações podem fazer, sozinhas ou em bloco, que não dependem do aval incerto de todos. A China, poluidora emergente, criou um polo de tecnologia verde e lidera o mundo na fabricação de painéis solares. A Europa, mesmo combalida, incentiva companhias aéreas a reduzirem emissões no mercado de carbono. Os EUA inventaram a tecnologia para extrair gás natural de xisto.

A América Latina não está mal na fita. Segundo um relatório do Massachusetts Institute of Technology (MIT), 95% das cidades na região estão cientes da ameaça das mudanças climáticas e fazendo planos para prevenir os impactos danosos. Nos EUA, só 59% das cidades se previnem.

No México, o maduro Plano Verde está prestes a abater 7,7 milhões de toneladas de emissões de veículos até o fim deste ano. No Brasil, diminuiu o desmatamento da Amazônia, o maior vilão do efeito estufa verde-amarelo, enquanto os agrônomos da Embrapa se debruçam sobre pesquisas para criar cultivos resistentes a secas e uma pecuária que não deprede o meio ambiente.

É pouco diante da ameaça. Mas são essas iniciativas, pontuais e coordenadas, que podem melhor e mais rapidamente responder ao desafio de um clima revolto. "Deixar de agir no Rio seria desastroso, mas insistir em um acordo único internacional seria um erro grave", escreveu recentemente uma especialista. "Não podemos depender de políticas globais para resolver o problema de como administrar recursos."

As palavras são de Elinor Ostrom, Prêmio Nobel de Economia, em artigo publicado no dia 12, o mesmo dia em que ela morreu. Desenganada pela gravidade da ameaça das mudanças climáticas, mas também pelo canto das soluções fáceis, propôs um pacto pelo possível. Sua voz fará falta no Rio.

Cuidado com os burocratas verdes - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 17/06


Não tenho dúvida de que animais e árvores nos humanizam, e não lugares cheios de gente do tipo Rio+20. E que temos que cuidar de nossa casa, assim como devemos buscar diminuir o sofrimento do mundo em geral, mas o fato é que não sabemos ao certo o que fazer para isso.

E a burocracia verde, gerada nesta conferência, não descobrirá como fazer isso porque burocracia é sempre parasita.

A máxima da Rio+20 "Mudar o modelo de energia no planeta para energia sustentável" é ainda algo semelhante a discussão sobre sexos dos anjos. Essa máxima implica ideias como "sai fora combustível fóssil tipo petróleo e entra em cena..."

Na prática, quem quer fechar hospitais, parar de voar ou silenciar computadores?

O problema não é apenas a qualidade da energia, mas a quantidade necessária dela e seu custo. Imagino verdes de todos os tipos pregando o fim da exploração de petróleo em seus facebooks dependentes de energia fóssil.

Quanto à humanização (tema recorrente neste parque temático da ONU), ainda penso que família e escola são as melhores formas de aprendê-la. Um estímulo para ter animais e jardins em casa, nas escolas e nas ruas vale mais como humanização do que 50 conferências gigantescas nas quais se discutem siglas, vírgulas e ponto e vírgulas.

Cúpulas internacionais ambientais são como os velhos concílios bizantinos dos primeiros séculos do cristianismo. Esses concílios aconteciam no império bizantino, também conhecido como Constantinopla.

Neles, os caras se perguntavam quantos centímetros Jesus tinha de substância divina e quantos de substância humana. Acho que os concílios ainda ganhariam em eficácia levando-se em conta o sucesso da ideia de que o carpinteiro judeu seja Deus.

Sabemos que a ONU e seus derivados são, como dizia Paulo Francis, grandes estatais ineficientes. Verdadeiro cabide de emprego para um monte de gente, principalmente de países pobres. Dar dinheiro para a ONU é doação a fundo (quase) perdido.

Minha tese, nada científica, é a de que a ONU não seja o melhor fórum para angústias como essas porque ela é basicamente ineficiente. Tudo o que consegue, além de dar chances para seus integrantes beberem e conhecerem os bares da Lapa -como me disse recentemente um colega jornalista- é gerar impostos internacionais que você e eu teremos que pagar.

Qualquer solução para a "energia limpa" virá do mercado e jamais de burocratas e seus pontos e vírgulas.

A questão é: quem defende o planeta dos burocratas verdes?

Simplismo insustentável - JOSÉ DE SOUZA MARTINS


O Estado de S.Paulo - 17/06



A realização de uma conferência internacional no Brasil sobre o desenvolvimento sustentável, convocada pela Assembleia da ONU, em princípio tem uma não pequena importância simbólica. Nosso país tem estado na fronteira de modelos alternativos e opostos de desenvolvimento econômico, entre o real problemático e o possível utópico. Carrega em sua história recente e não muito distante, a da política do arbítrio, as cicatrizes profundas da opção geopolítica e econômica de natureza predatória pela ocupação acelerada de seus chamados espaços vazios, em particular os da extensa região amazônica. Por isso, o Brasil seria o país mais qualificado para expressar ampla e revolucionária tomada de consciência do desastre ecológico e dos efeitos devastadores da predação ambiental. E para dar lições indiscutíveis de criatividade e inovação na contenção do processo destrutivo, de reparação dos danos ambientais e de reorientação de seu modelo econômico. No entanto, não é isso que tem acontecido.

É verdade que foram os movimentos sociais e os movimentos populares que se alçaram na reivindicação de medidas corretivas e de proposição de modelos criativos e alternativos ao modelo dominante. Mas, as inovações propostas pelos movimentos populares nem sempre têm tido o impacto que esperam e que se podia esperar porque mescladas com proposições ideológicas que não constituem condição necessária à mudança pretendida. E, por isso mesmo, afastam aliados que ampliariam o alcance da demanda de mudanças, mas se refugiam em posições tímidas e relutantes.

Nessa perspectiva, a questão do modelo alternativo de desenvolvimento sustentável acaba parecendo pretexto que oculta propósitos diferentes dos aceitáveis por muitos para constituição de uma maioria eficaz. Aquela capaz de opor vigoroso questionamento a obras como a da problemática barragem de Belo Monte, no Pará, e a do canal de transposição de águas do Rio São Francisco. E também ao retrocesso de um Código Florestal que nos leva a um dos piores momentos do passado, o da renúncia do Estado à condição de tutor do bem comum, colocando-o sob o jugo dos interesses privados.

Justamente aí ganham visibilidade as incongruências e contradições de uma esquerda que, tendo chegado ao poder empurrada pela força de uma liderança carismática e, portanto, muito além dos limites de uma legitimidade sensata, não sabe o que fazer com o poder tão facilmente conquistado. Nestes tempos de monarquia invisível, de mandatos equivocadamente hereditários, é compreensível que os eleitos no marco de um ideário, de esquerda, sintam-se tentados, no afã de manter o poder a qualquer custo, a transigir com forças políticas oportunistas. Aquelas que, atadas a valores que estão aquém da democracia, dos direitos sociais e da própria civilidade, facilmente caem na tentação de impor ao país, por meio de um poder que é frágil e que foi conquistado nas facilidades do discurso messiânico, um modelo de economia indeciso entre o ganho racional próprio do capitalismo e o saque.

Não é surpresa, portanto, que o país viva com a corrupção pela goela. O comprometimento do desenvolvimento sustentável pelas vacilações políticas do governo não é estranho à mesma cultura da corrupção se a entendermos como expressão das regras do vade-mécum oculto do atravessamento não só do que é legal, mas também do que é legítimo, num país em que, com alguma frequência, o legal e o legítimo se estranham.

Nos países politizados, e não apenas partidarizados como o nosso, os próprios movimentos sociais já teriam retirado seu apoio aos partidos messiânicos e suas coalizões problemáticas e reacionárias e compreendido que suas bandeiras ideológicas, como neste caso, deveriam erguer-se acima das facções partidárias. É o que lhes daria a liberdade de expressar com vigor não só sua capacidade de agitar bandeiras, mas também a de lograr metas políticas de indiscutível cunho social e a de vergar o Estado aos imperativos da razão e das demandas mais sensatas da opinião pública. Ação política proposta muito além e muito acima do teatro de uma discordância fingida porque lhes é impossível uma discordância efetiva e efetiva se fosse pautada por práticas consequentes de superação dos bloqueios que ataram a esquerda à direita.

A questão do desenvolvimento sustentável fica muito aquém do possível na medida em que os movimentos sociais e populares vacilam quanto a quem podem ser seus verdadeiros aliados. Aqueles que, de maneira racional e sem a pendência de tributos e pedágios ao parasitismo político, possam compreender e viabilizar as metas da sustentabilidade, não só como metas ecológicas, mas também como metas sociais de largo alcance. Um outro mundo é possível, não há dúvida, mas para chegar a ele é preciso política, isto é, práxis inovadora e transformadora, muito além das simplificações do nosso misticismo político. Justamente o que está faltando aos movimentos populares e aos movimentos sociais.

Libera Geral - VERA MAGALHÃES - PAINEL


FOLHA DE SP - 17/06

Os governadores aproveitaram o encontro com Dilma Rousseff na sexta-feira para pedir a inclusão das concorrências estaduais no Regime Diferenciado de Contratações. O instrumento, que flexibiliza licitações, foi criado inicialmente para a Copa, mas foi estendido a projetos do PAC por meio de medida provisória já aprovada na Câmara e que está no Senado. O vice-presidente, Michel Temer, sugeriu -e Dilma topou- que o RDC para os Estados seja incluído na própria MP.

Ainda lembro 
Olhando na direção do governador Antonio Anastasia (PSDB-MG), Dilma Rousseff lembrou que a oposição foi contra o RDC para o PAC durante votação na Câmara dos Deputados.

Lobby 1 
A oposição na CPI do Cachoeira quer investigar a atuação da cunhada do senador Demóstenes Torres, Fernanda Coelho, em defesa de Carlos Augusto Ramos junto à Anatel. Em outubro de 2011, ela viajou com o conselheiro da agência Marcelo Bechara para a Espanha.

Lobby 2 
Bechara diz que pagou a viagem e que Fernanda o acompanhou como amiga. Demóstenes confirma a viagem, mas nega que Cachoeira a tenha custeado. Fernanda é amiga de Andressa Mendonça, mulher do acusado de contravenção.

Ossos... 
Dos R$ 3,9 milhões arrecadados pelo deputado Armando Vergílio (PSD-GO) em 2010, R$ 434 mil foram doados por seguradoras. Ele foi superintendente da Susep, autarquia federal da área de seguros, de 2007 a 2010, então na cota do PTB.

... do ofício 
O goiano também recebeu R$ 295 mil da Sol Brascar, empresa que atua na recuperação de carros batidos. Vergílio virou personagem da CPI do Cachoeira porque em sua gestão na Susep Marcelo Limírio, sócio de Carlinhos Cachoeira, venceu leilão do Hotel Nacional do Rio, resultado que agora está sob investigação.

Carona 
A defesa do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) pediu ao senador Fernando Collor (PTB-AL) cópia da representação que ele protocolou contra o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, na CPI. Pretende anexá-la ao processo do mensalão para constranger Gurgel, responsável pela acusação.

Lotação máxima 
A possível aliança do PT com Paulo Maluf contrariou o PC do B, que já preparava o embarque na candidatura de Fernando Haddad e, agora, passou a reavaliar a possibilidade de fechar com Gabriel Chalita (PMDB) em São Paulo.

Vai que cola 
O PC do B se sentiu preterido na composição da chapa, com a escolha de Luiza Erundina (PSB), e fala em indicar Lecy Brandão para vice de Chalita. Para ficar com Haddad, o aliado voltou a insistir no apoio dos petistas a Manuela D'Ávila em Porto Alegre (RS).

Gás 
Erundina não pretende se licenciar da Câmara na campanha. Pediu para ser avisada dos compromissos de Haddad às segundas, sextas, sábados e domingos, pois quer acompanhá-lo no corpo a corpo.

Polivalente 
Osvaldo Garcia, que Maluf alojou na Secretaria de Saneamento do Ministério das Cidades, foi um dos dois nomes que o cacique do PP apresentou para a Secretaria de Habitação de São Paulo, quando pediu para Geraldo Alckmin demitir o tucano Silvio Torres.

Bingo 
Além da novela da coligação para vereador, o PSDB paulistano se consome em outro drama interno: com a saída dos vereadores puxadores de votos, que foram para o PSD e outros partidos, os números mais fáceis de memorizar pelo eleitor estão vagos e são disputados quase a tapa.

Tiroteio
"Depois da faxina fajuta, Dilma Rousseff entrega o saneamento do país para Paulo Maluf. Nada mais coerente."

DE SONINHA FRANCINE, pré-candidata do PPS à prefeitura, sobre nomeação de indicado do PP para a pasta das Cidades em troca de apoio a Fernando Haddad.

Contraponto



#prontofalei 


Ao chegar atrasado à Comissão de Direitos Humanos do Senado para audiência pública que debatia as barreiras impostas pela Argentina aos produtos brasileiros, o economista Newton da Silva, da UnB, se desculpou, mas, ainda assim, o senador Paulo Paim (PT-RS) protestou:

-Pelo menos o senhor veio. Tem gente que confirma e não vem. Pelo menos justifiquem, né: o avião caiu...

Quando percebeu que exagerou no protesto, o senador, que preside a CDH, se corrigiu:

-Tomara que não. Mas diga: o avião atrasou, perdi o ônibus, faltou gasolina. Mas pelo menos justifique.

Da retranca ao ataque - AMIR KHAIR


O Estado de S.Paulo - 17/06


O desafio do governo é crescer 4,5% neste ano, 5,5% em 2013 e 6,0% em 2014. Isso, em plena crise internacional, com a Europa em franca recessão, os Estados Unidos derrapando e China e Índia em forte desaceleração. Não será fácil. Algumas análises apostam em crescimento mais próximo de 2% do que de 3%, e parece que o próprio governo pode desistir de alcançar o objetivo deste ano.

O cenário externo dificulta o crescimento e desinflaciona os preços em todos os países, apontando para políticas de estímulo ao crescimento. Mas qual o melhor caminho a trilhar?

1 - Investimento e Consumo. Duas possibilidades de estímulo são levantadas no debate econômico. Uma é brecar o consumo, pois considera o endividamento e a inadimplência das famílias elevado, e o que se precisa é ampliar o investimento. A outra, que vem sendo trilhada pelo governo, é que deve continuar o estímulo ao consumo, pois ainda há espaço para seu crescimento, e ampliar o investimento.

Nesse debate, há uma clara oposição entre investimento e consumo, como se fossem antagônicos, pois, na teoria, a soma do investimento com o consumo é a poupança gerada num mesmo período. Mas não é tão simples assim. Pode haver uma interação entre consumo e investimento. Por exemplo, maior perspectiva de consumo atrai o investimento, ou ainda, perspectiva de mais investimento pode animar o consumo. Creio que investimento e consumo se interagem e se potencializam. Há, por assim, dizer uma sinergia entre eles.

Na vida da empresa, no entanto, o que mais influi é a interação na qual maior perspectiva de consumo é que a induz a investir, caso sua capacidade de produção seja insuficiente. Decisões de investimento são vitais para o sucesso dos negócios. Por essa razão, essas decisões são balizadas por estudos minuciosos de perspectivas de mercado e das ações da concorrência, onde o marketing tem papel relevante.

Investir por impulso, sem base de sustentação, pode dar certo, mas os riscos são maiores. Erros de avaliação podem levar à falência. Com a globalização e a crise internacional, os problemas crescem e a probabilidade de falência é maior. Nessa conjuntura, que pode perdurar por vários anos, torna-se difícil ao empresário arriscar sua empresa com investimento de retorno sujeito a chuvas e trovoadas.

Assim, pode-se prever um encolhimento dos investimentos em quase todos os países nesta crise. Infelizmente, é o que ocorre no setor privado no País. Nessas situações é que entra o governo procurando animar a economia. Mas como? Ampliando suas despesas e/ou reduzindo seus tributos. A ampliação de despesas pode ocorrer no custeio, no investimento ou em ambos.

A de efeito mais rápido é nas despesas com custeio, pois fazer investimentos no setor público no Brasil é ser obrigado a trilhar longo caminho burocrático, ditado pelo cipoal legislativo que domina a entranha do serviço público. A burocracia infernal anda de mão dada com empecilhos de toda ordem, com destaque para contestação judicial de empresas que podem se sentir prejudicadas numa concorrência, retardando a obra.

O governo federal vai acelerar a despesa de custeio antecipando compras governamentais, que poderão atingir R$ 60 bilhões, poderá ampliar programas de inclusão social e de renda e, como anunciou, estimular os Estados na realização de obras com financiamentos das instituições oficiais de crédito. Nesse caso, com reflexos a partir de 2013.

2 - Motor do crescimento. A corrente que defende toda força ao investimento parece que, para fortalecer seu argumento, precisa combater o estímulo ao consumo. O argumento que usa é o da saturação do consumo, pois considera o endividamento das famílias excessivo e a inadimplência elevada. Assim, o motor do crescimento baseado no consumo deve ser abandonado e substituído pelo investimento.

A presidente refuta essa tese argumentando que existe potencial inexplorado de consumo e que as taxas de juros dos financiamentos baixando abrem ainda mais espaço para o aproveitamento desse potencial. Mas reconhece que deve ser ampliado o estímulo ao investimento público e privado. De certa forma, não vê oposição entre consumo e investimento, mas que ambos devem ser estimulados.

Creio que essa política de reconhecer a importância do consumo e investimento é a mais acertada e que pode favorecer recuperação mais rápida da economia, tanto no curto como no longo prazo. No curto prazo, o que influi mais é o estímulo ao consumo em curso pela redução das taxas de juros bancária. No médio e longo prazos, o que influi é a continuidade da expansão do consumo e a maturação dos investimentos, tanto públicos quanto privados. Não há outro caminho.

É necessário ter os pés no chão. Abandonar a política de estímulo ao consumo pode causar a paralisia da atividade econômica em ambiente de crise internacional e atentar contra o investimento. Seria um desastre. E o governo, felizmente, não vai trilhar esse caminho.

3 - Acelerar. O que importa é acelerar o consumo. É condição necessária para enfrentar a crise. E o mais potente instrumento para isso é a redução das taxas de juros ao consumidor, ainda extremamente elevadas. Segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a taxa média de juros para a pessoa física atingiu o menor nível desde 1995, quando teve início a série. Ela foi de 105,4% ao ano em maio, contra 107,0% em abril.

Mas as taxas do cartão de crédito resistem ao movimento de corte geral, permanecendo em 223% há pelo menos um ano. Apesar da redução da taxa ao consumidor, ela pouco caiu, ficando dez vezes mais elevada do que a praticada nos países emergentes (10%). No nível acima de 100%, o consumidor que usa o crediário paga por um produto o equivalente a dois. É um assalto ao seu bolso e poderoso freio ao consumo e ao crescimento econômico.

Assim, falar em saturação do consumo é desconhecer a importância dos juros na aquisição de um bem ou serviço financiado.

O governo deve continuar a apertar o cerco aos bancos, reduzindo duas das três fontes de ganhos anormais: a dos títulos do governo com taxas balizadas pela Selic e a das tarifas bancárias. É urgente a queda acelerada da Selic e o tabelamento das tarifas com forte redução das mesmas. A parcimônia do Copom na redução da Selic e o não tabelamento das tarifas bancárias é que estão impedindo a prática de taxas de juros civilizadas, pois com a redução dos ganhos nessas duas fontes, os bancos se vêm obrigados a usar mais a terceira fonte, que é ampliar suas operações de crédito, gerando maior concorrência entre eles.

Dificilmente o governo conseguirá ativar a economia para atingir suas metas de crescimento se não atuar rapidamente para colocar a Selic no nível de 5% (dos emergentes) e tabelar as tarifas bancárias. A bola está com o governo. É preciso sair da retranca e passar para o ataque.