terça-feira, abril 03, 2012

Também quero proteção - MÁRIO SANTAROSA

ZERO HORA 03/04/12


Todos os setores econômicos com alguma dificuldade estão pedindo e ganhando alguma facilidade ou proteção estatal. Menos o consumidor final, que é quem paga a conta das benesses mal explicadas. Também quero um programa compensatório para mim e todos os brasileiros que têm que pagar mais caro que um americano ou europeu por uma série de produtos do dia a dia, fora a diferença de qualidade. As “desamparadas” montadoras nacionais precisam ser protegidas, na versão oficial e lobista, com altas taxas de importação. Por que, então, ao mesmo tempo ganham vantagem para trazer modelos de veículos de suas fábricas no mundo e remetem lucros recordes às matrizes?

Querem, agora, me obrigar a só beber vinho nacional, colocando barreiras e novas taxas na importação do produto estrangeiro. Inclusive sobre os tipos e variedades que nunca conseguiremos produzir aqui por questões de solo e clima, na mesma qualidade e preço. Quem olha os investimentos e a prosperidade das nossas vinícolas fica em dúvida sobre os argumentos de que estão sendo ameaçadas. Mas tenho certeza quando meu gosto ou meu bolso estão sendo agredidos por bebida daqui ou de fora.

Automóveis e vinhos são dois exemplos mais recentes de que o cidadão comum merece um programa especial, quem sabe uma dessas MPs que o governo despeja a toda hora. E não adianta esperar pela concorrência do capitalismo à brasileira, pelo qual é mais fácil conseguir um benefício governamental do que conquistar o consumidor para obter lucro. O que a maioria dos setores que agora choram fez durante todo o tempo em que o Brasil foi uma das economias mais fechadas? Qual foi o esforço tecnológico na melhoria dos produtos, em retribuição ao que pagamos a mais por mercadorias inferiores? Não se cobrou, como não se exige agora, que o consumidor, a quem é entregue a fatura do benefício, seja compensado, mais adiante, através de preço ou qualidade. O cidadão, na realidade, funcionou como sócio capitalista da empresa, porque entrou com dinheiro, através de imposto, ou comprando mais caro. Se não for possível a participação acionária, há outra forma: penalize-se pesadamente quem fizer reajustes abusivos pela falta de concorrência externa e se refestela embaixo da saia governamental.

Apesar do apelo por proteção, resta pouca esperança, no momento, de sermos atendidos. Não deixemos, entretanto, de gritar por socorro. Se outros já ganharam benefícios, com argumentos duvidosos, por que não eu e tu, que temos certeza de estar sendo lesados?

A taça está na CBF - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 03/04/12
Final feliz. A CBF já incorporou à sua coleção esta Taça Fair Play, que a seleção de Parreira ganhou na Copa de 2006.
A entidade comprou de um particular que tinha arrematado, como se sabe, a peça num leilão da Receita Federal. O Leão alegou que a taça ficou em seu depósito porque ninguém da CBF tinha ido buscar.

Calma, gente!
O presidente do TJ, Manoel Alberto Rebêlo dos Santos, disse ontem, durante sessão do Órgão Especial, que havia recebido uma representação do CNJ, contra o TJ, assinada pelo procurador-geral de Justiça do Rio, Cláudio Lopes.
Só que o procurador, segundo o desembargador Manoel Alberto, havia enviado um ofício avisando que a assinatura dele no documento era... falsa.

Caras-pintadas
Hoje, alunos da faculdade de Letras da UFRJ vão fazer um ato às 7h30m contra... os mosquitos.
No protesto pacífico, os estudantes usarão raquetes, inseticidas e repelentes. A manifestação está sendo organizada pelo Coletivo Ao Pé da Letra, que faz oposição ao centro acadêmico da faculdade.

Festa dos Silva
Lula vai receber a família sábado, em São Bernardo do Campo, SP, para festejar o aniversário de dona Marisa, que completa 62 anos.

A História de Mora
A série de reportagens do nosso Jorge Bastos Moreno sobre Ulysses Guimarães deve sair em livro pela Rocco.
O acordo foi conduzido pela agente literária Luciana Villas-Boas, ex-diretora da editora Record.

Encantadores de vida
O banqueiro Eduardo Moreira, ex-Pactual, vai estrear na literatura com “Encantadores de vida” (Record). Conta sua história de superação após duas quedas graves: de um cavalo e correndo para pegar um táxi.
Narra ainda sua experiência com dois mestres —- o americano Monty Roberts, treinador e autor do best-seller “O homem que ouve cavalos” e o brasileiro Nuno Cobra, treinador de Ayrton Senna e autor do sucesso “A semente da vitória”.

Aliás...
Roberts e Cobra assinam o prefácio do livro.

Joãosinho, o filme
Paola Oliveira será Zeni, mulher de Fernando Pamplona, no filme “Trinta”, sobre Joãosinho Trinta (1933-2011). Pamplona foi mestre de Joãosinho.


Matheus Nachtergaele, que fará o papel principal, está tendo aulas de dança, no Rio.

UMA BARRACA da Feira Hippie de Ipanema vende estas lindas bonecas de pano. Elas são praticamente iguais, mas não no preço. As brancas custam R$ 85, e as negras, R$ 65. A simpática senhora que estava à frente da barraca domingo não conseguiu produzir um argumento convincente para explicar a diferença de preços. Uma pista, talvez, esteja em outra nota da coluna, publicada no Natal de 2006. O gerente da loja Amigão, de Madureira, não escondeu que vendia bonecas brancas, do mesmo modelo e fabricante, pelo dobro do preço porque a procura de bonecas negras era pequena

Novela no samba
“Horário nobre” é o nome do enredo da São Clemente para o carnaval de 2013.
A escola da Zona Sul vai festejar as novelas da TV Globo e seus personagens mais famosos, como Viúva Porcina, Dona Redonda, Odorico Paraguassu e Sinhozinho Malta.

Coelhinha saliente
A loja de, digamos, artigos de saliência A2 Ella, em Ipanema, renovou às pressas seu estoque de “kit coelhinha” com a proximidade da Páscoa.
O kit que faz sucesso custa R$ 314 e vem com fantasia de coelhinha, venda para os olhos e um ovo, que não é de chocolate. É um vibrador.

Au, au, au
Lembra a história do cachorrão american staffordshire terrier que atacou uma vovozinha de 81 anos e um fox paulistinha, no Barra Bali, na Barra, no Rio, como saiu aqui dia 5 de março? Voltou a atacar na noite do último domingo. Sem focinheira, avançou em uma menina de 6 anos e em um shitsu, dentro do condomínio.

Virou nome de sala
Sidney Miller (1945-1980), compositor morto aos 35 anos, será lembrado em 17 de abril pelo Instituto Moreira Salles, no Rio, com um show em que Joyce Moreno cantará músicas do seu repertório.
Ele, que chegou a ser comparado a Chico Buarque, tinha Nara Leão como sua principal intérprete.

Maltratados sim, discriminados nunca! - TUTTY VASQUES

O ESTADÃO - 03/04/12

O Brasil pode até ter bons motivos para submeter visitantes espanhóis a regras mais severas de controle de imigração, mas, a despeito da justificativa de reciprocidade entre países soberanos, maus tratos a passageiros em nossos aeroportos nunca foi – e nem será – exclusividade de qualquer nacionalidade em trânsito. O próprio turista brasileiro sofre sem nenhum privilégio toda vez que viaja de avião.
O espanhol que a partir de agora visitar o Brasil não deve pensar na chegada a Cumbica ou ao Galeão que está penando no aeroporto só porque veio do país ibérico. Nada disso!
Ingleses, portugueses, norte-americanos, alemães ou soteropolitanos, não importa a procedência, basta ser passageiro para passar por poucas e boas no calvário entre o avião e o táxi.
Nossas autoridades aeroportuárias podem ser tudo – incompetentes, relapsas, negligentes e mal preparadas –, mas não há notícias de ações discriminatórias para maltratar mais a uns que a outros em solo.
Não é porque um em cada quatro turistas espanhóis está à procura de emprego que as coisas vão piorar pro lado deles.
Podem chegar sem susto, desde já advertidos de que aeroporto aqui no Brasil é complicado mesmo!

Até tu, companheiro?E o Stepan Nercessian, hein?! Para parte da esquerda de Ipanema, o deputado estadual pelo PPS no Rio é, mal comparando, uma decepção tão grande quanto o Demóstenes Torres no meio conservador. Banhavam- se na mesma Cachoeira!

Los hermanosRaúl Castro foi se queixar ao irmão Fidel:
Não aguenta mais recepcionar Hugo Chávez no aeroporto de Havana.
"No seu tempo, presidente da República tinha mais o que fazer!"

IrreconhecívelAmigos de Felipão estão preocupados.
Também, pudera!
O técnico do Palmeiras deu agora para achar que a arbitragem e a vitória do adversário foram “justas”.
Só falta chamar a imprensa para um churrasco.

Pode?Articula-se na Câmara dos Deputados um projeto de lei que proíbe a venda de bebidas alcoólicas a menos de 100 metros das escolas e faculdades. Precisa ver se a Fifa concorda, né?

Devagar com o andorOu os assaltantes de caixas eletrônicos aprendem a mexer com dinamite ou vão acabar implodindo São Paulo, caramba!

Trem da alegriaO governador, o prefeito, o secretário de Segurança e o arcebispo do Rio foram a Roma neste fim de semana para entregar uma réplica do Cristo Redentor ao papa. Segundo Sérgio Cabral, foi “uma demonstração de que o povo do Rio de Janeiro está ansioso para recebê-lo em 2013”.O carioca deve estar orgulhoso de seus líderes políticos, né não?! 

Substituto à alturaChama-se Wilder o primeiro - suplente de Demóstenes no Senado. Wilder Pedro de Morais, dizem, não fica nada a desejar ao titular!

O pacote legislativo para a indústria - RAYMUNDO COSTA

VALOR ECONÔMICO - 03/04/12

Dentre as 16 propostas em tramitação no Congresso consideradas mais importantes para a indústria, duas devem ser votadas ainda este ano. Hoje o governo federal lança seu pacote de incentivos à recuperação do setor, tecido basicamente pela desoneração de impostos e a criação de novas linhas de financiamento. As medidas exigidas do Legislativo são complexas politicamente, mas a tendência é de um saldo favorável à indústria, no fim de 2012.
A agenda legislativa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), divulgada semana passada, contém a posição da entidade sobre 131 projetos em tramitação no Congresso. É uma referência do que pensa a indústria em todo o país, desde a poderosa Fiesp às representações menores. Dentre essas propostas, a própria entidade destacou as 16 consideradas prioritárias para a redução de custos e desburocratização do setor.
O cientista político Cristiano Noronha, da empresa de consultoria Arko Advice, analisou o estágio de tramitação de cada uma das 16 proposições. Sua conclusão é que a indústria será atendida em pelo menos sete projetos: os dois que serão votados provavelmente este mês, e cinco sobre os quais a posição da CNI é contrária e que devem ser recusados ou ficar na fila à espera de conjuntura mais favorável.

Maioria da Câmara quer Estados no Código Florestal
Os dois que devem ser aprovados são Código Florestal e o projeto que trata da guerra dos portos. A votação do código ainda em abril faz parte do acordo entre governo e Câmara firmado, semana passada, para a aprovação da Lei Geral da Copa e do novo regime previdenciário dos servidores públicos. O outro é o que uniformiza as alíquotas do ICMS nas operações interestaduais com bens e mercadorias importados do exterior. O projeto deve ser votado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado nesta semana. Depois segue para análise da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e votação do Plenário.
"Como o governo já prepara medidas para desonerar a indústria, dificilmente trabalhará para aprovar projetos como o que extingue a cobrança adicional de 10% sobre o saldo do FGTS, nos casos de demissão sem justa causa", afirma Noronha. "No limite, [a multa de 10%] acaba sendo uma garantia contra o aumento do desemprego, face aos altos custos de se demitir um empregado no Brasil".
Alguns dos projetos prioritários têm chance muito pequena de votação conclusiva este ano, caso, por exemplo, do marco regulatório das agências reguladoras. O texto será analisado por comissão especial ainda a ser constituída. Antes de ir para o Senado, precisa ser votado pelo plenário da Câmara. São várias as proposições nesta situação. Mais chance tem a indústria em relação aos projetos que a CNI relacionou como contrários aos interesses do setor.
Exemplo clássico é o projeto do deputado Inácio Arruda (PCdoB-CE) que reduz de 44 para 40 horas a jornada de trabalho e aumenta a remuneração extra da hora extra de 50% para 75% do valor da hora normal. Está encaminhado para votação no plenário da Câmara. Aprovado, terá de ser referendado no Senado. "São pouquíssimas as chances de ser votado em 2012", diz Noronha. "O projeto vai na contramão da intenção do governo, que é estimular a economia".
Outro exemplo da mesma extração com baixa chance de chegar ao plenário, apesar de originado no Executivo, é o que "visa adotar a Convenção 158 da OIT que protege o trabalhador contra a demissão imotivada". A proposta já foi rejeitada na Comissão de Relações Exteriores e Trabalho. Atualmente, aguarda manifestação da Comissão de Constituição e Justiça. Não só a possibilidade de votação é baixa, como é "grande a perspectiva de rejeição".
A CNI propõe ainda a reforma da Lei de Licitações e que o registro eletrônico de frequência dos empregados (ponto eletrônico) não seja obrigatório. A reforma é polêmica e dificilmente será aprovada, em caráter definitivo, ainda em 2012. Já o texto que flexibiliza o ponto eletrônico, do ex-deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP), "no melhor cenário, pode ser votado pela Câmara, mas pouca chance de ser aprovado de forma conclusiva neste ano", segundo a prospecção de Cristiano Noronha na agenda e tendências demonstradas em votações nas comissões técnicas do Congresso.
A; FSB Pesquisa entrevistou 220 deputados de 18 partidos com representação na Câmara sobre dois aspectos polêmicos do Código Florestal. Registrou uma fotografia presumível, mas até agora empírica: o governo Dilma Rousseff deve enfrentar outra votação difícil com o Código Florestal. "Há uma tendência (54% dos entrevistados concordam e 44% discordam) favorável à delegação de poderes aos Estados para definirem as áreas adequadas de recomposição das matas às margens dos rios".
A decomposição partidária demonstra que o PT, partido da presidente, é majoritariamente (85%) contrário à delegação. Já no PMDB registra-se amplo apoio (83%) à medida, seguido de perto pelo PP (81%).
A questão - informa a FSB Pesquisa - também apresenta "forte relação com o eixo esquerda-direita, na medida em que os deputados de esquerda são mais fortemente contrários à delegação de poder aos Estados, enquanto que os de direita são mais favoráveis à delegação". Em números: pela esquerda, PPS (83% dos entrevistados discordam), PCdoB (75%), e PV (67%). Na outra margem, o DEM está igual ao PMDB no índice de aprovação (83%), os dois seguidos pelo PP (81%), PR (69%), PRB (63%) e PSC com 60% No recém-criado PSD a aprovação é de 58$%, a mesma do PSDB. "Relação semelhante aparece na opinião sobre a recuperação de ao menos 15 metros das margens de rios com largura de até 10 metros". A proposta é considerada adequada por 57% dos entrevistados, 16% avaliam que ela é "insuficiente" e 20% consideram-na "excessiva". Conclusão da FSB: "Os dados sugerem que o governo não tem o controle dessa votação".

Foro da vergonha - CAROLINA BAHIA


ZERO HORA - 03/04/12

Escândalos como o de Demóstenes Torres (DEM-GO) trazem à tona distorção que representa o foro privilegiado. O advogado do Senador goiano o aconselhou a não renunciar para aproveitar o benefício reservado às autoridades. Deixar o processo para ser julgado pelo STF virou estratégia de defesa de políticos encrencados. Eles contam com a demora clássica em julgamentos desse tipo. Até lá, pensam eles, a opinião pública já esqueceu. Demóstenes é hoje um morto-vivo no Congresso. Está politicamente acabado, mas tenta jogar com o tempo a seu favor. Prefere deixar que o DEM abra o processo de expulsão e que o Conselho de Ética do Senado leve adiante o pedido de cassação.

Brasil Maior
À frente da Marcopolo, o gaúcho José Martins é um dos empresários que desembarcam hoje em Brasília para conferir de perto as medidas de estímulo à indústria. Martins teve encontro reservado com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, na semana passada, quando fez o apelo por juros mais baixos nos financiamentos do BNDES e pleiteou a isenção do INSS para os fabricantes de ônibus em troca de 1% do faturamento.
- Sabemos que não há como fazer reforma tributária de uma hora pra outra - lamenta.

Conselho
O espírito da Semana Santa tomou conta do ministro das Cidades, Aguinaldo Ribeiro. Ao lançar a campanha de redução de violência nas estradas, ele preparou uma mensagem especial para aqueles que acompanhavam o evento:
- Neste feriado, mais do que nunca, temos que dar atenção ao Cristo. Se beber não dirija - concluiu.

Contra o tempo
Reunidos ontem no cafezinho do Senado, Ana Amélia (PP-RS), Randolfe Rodrigues (PSOL-AP, foto, à esquerda) e Pedro Taques (PDT-MT) assinaram ofício na tentativa de antecipar para amanhã a reunião do Conselho de Ética. O objetivo é acelerar a análise do processo contra Demóstenes, por quebra de decoro. O órgão, no entanto, ainda precisaria escolher um presidente, já que o cargo está vago desde 2011. Às vésperas da Páscoa, a chance é quase nula.

PARA CONFERIR ali adiante - Didático
Ministros do PT gravaram vídeos explicando aos candidatos às eleições municipais quais são os principais programas do governo Dilma e como essas ações podem ser exploradas na campanha. O material foi exibido no final de semana, durante encontro do partido. As apresentações ficarão disponíveis em um site, abastecendo as equipes petistas.

Planos
Já existem lideranças do PMDB apostando que Ibsen Pinheiro busca a vaga de vice na chapa de José Fortunati à prefeitura de Porto Alegre porque quer uma vitrine para 2014. O foco seria sua candidatura ao Senado.

O domínio dos cara de pau - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 03/04/12


Difícil saber se corrupção cresceu, mas desfaçatez e dano político causado pela bandalha parecem maiores



NAS TEMPORADAS em que se acumulam os vazamentos de histórias de corrupção, a gente se pergunta o motivo de a publicidade da bandalheira ter aumentado.

Houve rebuliço nas quadrilhas, desentendimentos, que espargem vinganças? As correições e polícias diversas estão (subitamente?) mais produtivas? A safadeza é tão maior que passou a escapar pelo ladrão (vaza pelo cano de escoamento de excessos de líquidos, para quem não conhece a origem da expressão)?

Estamos numa dessas temporadas, que começou com a derrubada de ministros e prossegue aos borbotões, nas bandalhas "menores" (de impacto insuficiente para derrubar ministros, melhor dizendo). Com as esquisitices, digamos, que o Conselho Nacional de Justiça e corregedorias de tribunais descobrem. Temos agora a volta desse Carlos Cachoeira e seus respingos em Goiás e no Congresso. As propinas na Saúde.

Até esquecemos a história recente das emendas na mui pouco investigada Assembleia de São Paulo. Os rolos em série no governo do Distrito Federal. Ou na Prefeitura de Campinas. Não estamos falando nem de cafundós, da série infinita de escândalos de Roraima, por exemplo.

Estatísticas de malfeitorias, quando há, são quase irrelevantes, pois imprecisas ou subjetivas, como as desses rankings internacionais de "corrupção percebida". Difícil medir a coisa, pois um malfeito corrupto é multidimensional.

Dinheiro pequeno nas alturas da República equivale a quantos assaltos desses de que ouvimos vez e outra nos computadores do INSS? Além do dinheiro envolvido, deveríamos avaliar ainda o grau de descontrole democrático implicado num roubo, numa propina para a nomeação de fulano, na compra de parlamentares? Um escândalo isolado de grau 1, digamos, vale a metade de dois escândalos de grau 1 ou a acumulação de bandalhas deve ser composta (multiplicada), de modo a medirmos a aproximação de uma "crise geral do sistema" (ou, em outros termos, sinal de que a mãe Joana tomou conta da casa)?

Valeria a pena o esforço de medir, se possível? Talvez não.

Mesmo a multiplicação de instituições para vigiar e punir não foi capaz de controlar a bandalha num cercadinho de tamanho aceitável.

Decerto, sem polícias (e a Federal melhorou, diga-se, para quem não se recorda dos anos 1990), promotores e procuradores, novas corregedorias, tribunais de contas etc., a coisa poderia ser pior. Mas não é disso de que se trata aqui.

Talvez seja o momento de perguntar se teremos (correições, imprensa, organizações civis) capacidade de controlar um Estado tão grande e miriademente enrolado, de resto nesse contexto político-cultural, digamos, de institucionalização insolente da cara de pau.

Lei da Ficha Limpa? Pode melhorar. Mas é um incentivo à tentativa de manipulação de tribunais de segunda instância, atentemos.

Medidas públicas de eficiência do governo? Pode ser. Dado certo insumo, poderíamos esperar tal produto -discrepâncias grandes seriam inépcia braba ou roubo.

Ainda assim, é pouco. Algo mais grave aconteceu. Considerem a desfaçatez das demandas, dos acordos políticos, da desordem política e administrativa provocada com o fim explícito de explorar feudos do Estado. Era pior? Mas foi piorando.

Rede de intrigas - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 03/04/12


A ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) está possessa com o ex-ministro Luiz Sérgio. Tudo por causa de sua declaração de que houve "malfeito" no Ministério da Pesca em licitação para a compra de lanchas. A avaliação no Planalto é que o petista deu munição à oposição, que agora recorre à Comissão de Ética Pública. A manifestação é vista como um petardo na disputa que levou às substituições de Luiz Sérgio, na Pesca, e de Cândido Vaccarezza, na liderança do governo na Câmara.

Um tiro mortal na oposição?
Os políticos não acreditam que houve negligência da Procuradoria Geral da República, por ter segurado sem tomar providências, desde 2009, a investigação sobre a relação do senador Demóstenes Torres (DEM-GO) com Carlinhos Cachoeira. Avaliam que a revelação destes fatos agora cumpriria a função política de atenuar a responsabilidade dos petistas no escândalo do Mensalão, que este ano será julgado pelo STF. Além disso, dizem, que o governo Dilma ao vazar estas informações deu um tiro na cabeça da oposição, que transformou o combate à corrupção e a moralidade sua única bandeira na opinião pública.

"Bandido perigoso tem que ir para a cadeia. O Democratas não bate palmas e nem passa a mão na cabeça de corrupto ou de qualquer outro criminoso” — Demóstenes Torres, senador (DEM-GO), no programa nacional de TV do seu partido em 15 de dezembro de 2011

OUTROS TEMPOS. Em agosto do ano passado, quando o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) era um respeitável integrante da bancada da oposição no Congresso, ele participou ao lado de líderes do PSDB, do PPS e de seu partido do lançamento da uma campanha na internet para instalar no Congresso a CPI da Corrupção. O envolvimento do senador com Carlinhos Cachoeira desarmou a oposição ao governo da presidente Dilma.

Silêncio
Duro com os governistas, o presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP), silencia no caso do envolvimento do correligionário Stepan Nercessian (PPS-RJ) com Carlinhos Cachoeira. O site do PPS esconde a embaraçosa pauta.

Julgamento
O STF marcou para dia 12 o julgamento da constitucionalidade dos planos Collor I e II. Desta decisão depende o ressarcimento de poupadores prejudicados pelos expurgos inflacionários e confisco de moeda provocados pelos planos.

Em busca de oportunidades
A secretária de Estado americana Hilary Clinton despachou para o Brasil uma das principais integrantes de sua equipe. Reta Jo Lewis, que atuou na realização das Olimpíadas de Atlanta e na Copa do Mundo dos Estados Unidos, está percorrendo todas as 12 cidades sedes da Copa de 2014, e reunindo-se com autoridades locais, para conhecer as possibilidades de negócios e de investimentos para empresas americanas no Brasil.

Comodidade
Os ministros que despacham no Planalto não gostam quando o vice Michel Temer assume a Presidência. É que ele não se instala no gabinete da presidente Dilma, permanecendo no prédio anexo. Eles são obrigados a caminhar até lá.

Pente-fino
A consultoria Macroplan fez pesquisa sobre a profissionalização da gestão pública nos estados. Constatou avanços nas áreas de planejamento e orçamento. As piores avaliações ficaram com transporte, obras públicas e segurança.

EFEITO KASSAB. A exemplo do que já ocorre com o PT, a Executiva do DEM decidiu ontem que cabe a ela decidir sobre eventuais coligações com o PSD.

OS SERRISTAS preferem que o vice da chapa de José Serra seja do PSD do prefeito Gilberto Kassab, do que um tucano ligado ao governador Geraldo Alckmin.

DECLARAÇÃO do líder do PSDB, Álvaro Dias (PR), ao anunciar que faria representação no Conselho de Ética Pública sobre a gestão petista no Ministério da Pesca: "O próprio ex-ministro (Luiz Sérgio), que é do PT, critica o malfeito".

X-tudo ambiental - XICO GRAZIANO


O Estado de S.Paulo - 03/04/12


Passadas duas décadas desde que se realizou a Rio-92, a Organização das Nações Unidas (ONU) resolveu organizar no Brasil uma nova conferência mundial. Concebida para avaliar o desenvolvimento sustentável, a Rio+20 ameaça ser um fracasso. Sua complexa agenda virou uma torre de Babel.

A primeira conferência mundial sobre meio ambiente foi realizada em 1972 na capital sueca, a cidade de Estocolmo. Lá nasceu o importante Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Começavam a ser conhecidos, cientificamente, os limites da Terra para a explosão populacional humana. Consequências ecológicas do crescimento econômico.

Importante relatório da ONU divulgado 15 anos depois, intitulado Nosso Futuro Comum, definiu as bases do conceito que virou mantra na atualidade: o desenvolvimento sustentável. Derivada da noção pioneira de "ecodesenvolvimento", proposta pelo economista polonês naturalizado francês Ignacy Sachs, a expressão propunha conciliar a economia com a ecologia. Mais tarde, na Cúpula da Terra (nome original da Rio-92), ampliou-se a compreensão sobre o tema, consagrando o famoso tripé da sustentabilidade: ecologicamente equilibrada, socialmente justa e economicamente viável.

Ao se incorporar à temática do desenvolvimento econômico, a causa do ambientalismo, antes restrita aos idealistas e aos visionários, ganhou importância. A sociedade global mudava a compreensão sobre o seu devenir. O crescimento predatório, que emite notas promissórias contra o futuro, perdeu cartaz, abrindo espaço para o surgimento da "economia verde", novo paradigma da civilização.

Em tese, tudo resolvido; na prática, imensas dificuldades. As nações jamais consolidaram passos subsequentes, necessários para obter governança global sobre o meio ambiente. As empresas, por seu lado, perderam tempo tratando a sustentabilidade apenas como uma jogada de marketing, pouco modificando os processos tecnológicos de produção. Entre as pessoas, a conscientização ecológica jamais ultrapassou as elites da sociedade. Em consequência, anda atrasado o enfrentamento consistente da crise ambiental.

Falta também clareza sobre a ideia central. Desde que se formulou o conceito de desenvolvimento sustentável, suas três dimensões - ambiental, social e econômica - disputam espaço político em sua agenda. Se, num primeiro momento, a luta ambiental se robusteceu ao ser incorporada aos processos decisórios da economia, aos poucos o ambientalismo passou a dividir o seu ativismo com grupos centrados nas desigualdades sociais. Uma sociedade miserável, afinal, não pode ser considerada sustentável.

Especialmente nos países emergentes, como o Brasil, os dilemas elementares do crescimento - emprego, moradia, energia, transportes - exigem obras que pressionam fortemente as variáveis ambientais. Nesse sentido, o preservacionismo radical, coerente nos países ricos, por aqui soa como elitista. Por isso a ideia de sustentabilidade, mais ampla, ganhou espaço, forçando o ambientalismo a ser realista. Mais do que eloquentes palavras, ações concretas.

Em outra linha, certas organizações fizeram da sustentabilidade uma estratégia de combate à exclusão humana, fornecendo uma grife aos movimentos ligados à erradicação da miséria e à justiça social. Estes, agora, pegaram carona nos preparativos da Rio+20 e praticamente dominaram a mídia sobre a reunião. Negros, feministas, sem-terra, índios, gays, causas humanitárias variadas imiscuíram-se com o ambientalismo, resultando boa confusão, teórica e política.

Resultado: a Rio+20 perdeu seu foco original, ligado à crise ecológica da civilização. Assim argumentam os cientistas, militantes da causa ambiental, laureados com o prêmio Planeta Azul, uma espécie de Oscar da sustentabilidade. O físico José Goldemberg é um dos que lideram a grita contra essa deformação nos debates pré-conferência, marcada para início de junho. Rubens Ricupero, diplomata cuja ação foi decisiva para o sucesso da conferência de 20 anos atrás, esclarece: "Se a questão ambiental não for encaminhada de maneira satisfatória, se o clima aquecer demais, não teremos nem social nem econômico (...), virá o colapso total".

Para piorar o quadro, entidades (que se julgam) esquerdistas passaram a contestar o tema da economia verde, proposto originalmente pela ONU, argumentando que esverdear os processos produtivos interessa apenas ao capitalismo. Para libertar os povos oprimidos, defendem, será necessária uma nova e ampla "revolução", que, obviamente, ninguém sabe definir qual nem como. Nem onde.

E assim nos aproximamos da Rio+20. Nesse contexto, provavelmente nada de importante nela se decidirá. Uma avaliação séria, se viesse a ser realizada, mostraria que, a despeito de boas ações aqui e ali, a civilização continua caminhando para o colapso. Inexiste uma força coordenadora, decisória, que enquadre a sociedade global na agenda futurista. Essa governança, que poderia ser o grande assunto do encontro no Rio de Janeiro, será provavelmente substituída pelas resoluções de sempre, genéricas, que empurram o problema com a barriga.

A grande conferência da ONU deve configurar, infelizmente, apenas uma grande festa ideológica, cujo brilho até poderá ajudar no avanço da consciência ecológica mundial, mas não deixará marca registrada. Haverá uma mistureba semelhante ao recheio daqueles sanduíches do tipo x-tudo: uma fatia da diplomacia internacional, uma rodela de terceiro-mundismo clássico, pitadas da Via Campesina, pedacinhos de ambientalismo com molho oriundo dos povos oprimidos, um caroço do empresariado inteligente amolecido pelas entidades científicas, tempero blá-blá-blá à vontade.

Fica delicioso, enche a barriga, mas não guarda o gosto de nada.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

FOLHA DE SP - 03/04/12
Exército tem obras demais, diz diretor do Dnit

O diretor-geral do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), Jorge Fraxe, afirmou ontem que o Exército assumiu obras rodoviárias em excesso no país.

De acordo com Fraxe, a instituição terá menos obras daqui para frente.

"O Exército tem de ter o mínimo de obras para que se mantenha adestrado", disse ontem em São Paulo.

"Acho que o Exército brasileiro assumiu obras além do que deve."

Entre elas estão trechos da BR-101 na região Nordeste e e da BR-163 no Pará.

O setor privado já se queixava do número de projetos sob os cuidados dos militares há algum tempo e que poderiam ser contratados para serem feitos por empreiteiras privadas.

Dez por cento dos contratos do Dnit estavam sob a responsabilidade do Exército, aponta a Aneor (Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias).

Fraxe é general da ativa do Exército brasileiro e tomou posse no Dnit após a crise política que atingiu o Ministério dos Transportes em 2011.

"O Exército tem de ter o mínimo de obras para que se mantenha adestrado"

Laboratório fecha fábrica após invasão no final de semana

A produção da Biosintética, controlada pelo laboratório Aché, ficou parada durante a manhã de ontem.

A empresa dispensou 200 funcionários do turno da manhã devido a uma invasão que ocorreu na fábrica na cidade de São Paulo no final de semana.

O Aché informa que "nada foi subtraído". As instalações da fábrica foram reviradas, mas a empresa não soube informar se houve danos em equipamentos nem o volume de produção parado.

Segundo a companhia, só os trabalhadores da planta foram liberados, devido à presença da polícia no local. Mas funcionários da área administrativa também não trabalharam.

O turno da tarde trabalhou normalmente na produção, segundo o Aché.

"A companhia informou a polícia civil, que abrirá investigação", diz a empresa.

O Sindicato dos Químicos de SP, que reúne funcionários, não tinha detalhes sobre o fato. O Sindusfarma, que representa a indústria, também não estava informado.

A Biosintética faz produção de genéricos no Aché.

Comércio... As vendas do comércio atacadista de tecidos em março subiram 4,5% na comparação com fevereiro.

...de pano Em relação a março do ano passado, os negócios cresceram 1,5%, de acordo com levantamento feito pelo Sindicato do Comércio Atacadista de Tecidos, Vestuários e Armarinho do Estado de São Paulo.

Remédio... O presidente da rede Farmácias Pague Menos, Deusmar Queirós, inaugura nesta semana, em Goiânia, sua filial de número 500. É no Estado que a rede vai construir seu segundo centro de distribuição, em Hidrolândia.

...distribuído A rede, que tem planos de abrir capital, possui lojas em 200 municípios, segundo a empresa.

SENTIMENTO ANGLO-SAXÃO

A expectativa de renda e a propensão a comprar caíram em março na Alemanha, país que vem apresentando os melhores índices econômicos na Europa durante a crise.

Pesquisa da GfK mostra que houve retração de sete pontos na expectativa de renda -o indicador ficou em 34,3 pontos (em escala de -100 a 100).

A propensão a comprar teve queda tímida e passou dos 39,2 em fevereiro para 38,6.

A confiança do consumidor da Inglaterra também reduziu em março e atingiu -31 (dois pontos a menos que o registrado no mês anterior).

O índice que mede a expectativa em relação às finanças pessoais caiu quatro pontos e voltou ao nível de março de 2011. A análise da situação econômica permaneceu estável.

Cerca de 4.000 pessoas foram ouvidas nos dois países.

Emprego... Em período de falta de novas obras de construção pesada, o emprego ainda registra alta devido à escassez de mão de obra, diz Hélcio Farias, do Sinicesp.

...pesado A entidade aponta crescimento de 1,20% em fevereiro, com 1.261 contratações ante janeiro. Em fevereiro, o setor empregava 105,9 mil trabalhadores. Nos últimos 12 meses, a alta foi de 9,50%.

JOVENS FORA DA INTERNET

Os clientes de 31 a 40 anos são os que mais compram seguros pela internet, de acordo com dados da Bradesco Vida e Previdência.

A cada cem vendas pela internet, 36 são realizadas por pessoas nessa faixa etária.

Da base geral de clientes, 25% têm entre 31 e 40 anos.

A representatividade dos jovens até 30 anos é maior fora da internet: 26% a 16%.

Na Porto Seguro, também não há predominância dos jovens entre os que acessam via internet, diz Rafael Caetano, gerente de canais eletrônicos.

RIO + QUARTOS

Pergunta de quase todo estrangeiro que pensa em vir para a Rio +20, conferência da ONU que se realiza em junho deste ano: como vão acomodar tanta gente?

Na reunião da OECD sobre o tema, realizada na semana passada em Paris, um membro do governo brasileiro até foi bem aplaudido depois de sua apresentação.

Ficou, porém, a dúvida se o país estará preparado para o evento no Rio de Janeiro.

Informou-se que estarão presentes à reunião que discutirá desenvolvimento sustentável representantes de 53 países e que são esperados aproximadamente 50 mil participantes.

Hotéis do Rio quase não têm mais apartamentos disponíveis. O governo já reservou quartos em Petrópolis e em outras cidades próximas.

NÚMEROS

1,20% foi a alta no nível de emprego da construção pesada em fevereiro

1.261 contratações foram realizadas durante o segundo mês deste ano

Torcida Empresários que se queixam de desindustrialização e concorrência desigual de artigos importados torciam ontem para que o governo anuncie hoje aumento de alíquota de PIS/Cofins de alguns produtos.

Apenas um prefeito - VLADIMIR SAFATLE


FOLHA DE SP - 03/04/12

A pior maldição de São Paulo é seu gigantismo. Por mobilizar um dos maiores orçamento da União, administrar a cidade parece não ser mais algo que tenha valor em si.
Ao contrário, São Paulo é apenas uma passagem, seja para voos mais altos, como a Presidência da República, seja para a utilização de seu peso político na construção de novos partidos, seja para a luta pela construção de hegemonias partidárias.
Há tempos a população paulistana não tem um prefeito, apenas um prefeito -alguém que queira simplesmente administrar a cidade e debruçar-se não sobre as taxas de juros do Banco Central ou dos grandes problemas do país, mas sobre o trânsito infernal da avenida Brasil ou a falta de bibliotecas na periferia.
Não por outra razão, a cidade nunca é referência quando se discute soluções urbanas inovadoras. Não há mais pensamento urbano em São Paulo -isto porque não há um poder público capaz de incentivá-lo e implementá-lo no interior de uma ação integrada de planejamento.
Do ponto de vista da criatividade referente à vida nas grandes metrópoles, São Paulo é uma cidade morta. Seus fios elétricos expostos, seus semáforos que não funcionam e seus ciclistas atropelados lembram como ela está parada no tempo, como alguém que parece desconhecer seu próprio tamanho.
Colabora para isso o fato de, nos últimos anos, o morador da metrópole ter sido obrigado a conviver com a mediocridade administrativa travestida de autossatisfação.
Enquanto as pesquisas eram unânimes em mostrar o descontentamento profundo da população com a metrópole, a ponto de vermos pesquisas em que a maioria dos habitantes afirmava querer simplesmente mudar de cidade, éramos obrigados a ouvir o atual prefeito dizer que daria para si mesmo nota dez. Há de perguntar-se quem precisa de tanta insensibilidade no cerne do governo.
De fato, é difícil para qualquer cidade sobreviver depois de uma série de prefeitos como Jânio Quadros, Paulo Maluf, Celso Pitta e o atual.
Não por acaso, eles representam momentos do desenvolvimento do mesmo grupo político, com concepções muito parecidas para a cidade. Todos eles (à parte Celso Pitta, cuja carreira foi destruída por escândalos de corrupção) entraram na prefeitura olhando para outros mares.
Por isso, a única coisa que a população paulistana pede nessas eleições é que os candidatos mostrem querer realmente administrar a cidade, ter ideias factíveis e detalhadas, do tamanho da real dimensão dos problemas brutais que vivemos no cotidiano.

Novas metas fiscais para o Brasil - ILAN GOLDFAJN


O Estado de S.Paulo - 03/04/12


Em time que está ganhando não se mexe. É a máxima do futebol aplicada pelos brasileiros aos mais distintos aspectos da vida cotidiana. Mas o que não se mexe não muda. Logo, não evolui. E para continuar vencendo ao longo do tempo é preciso evoluir. A máxima do futebol vale para o curto prazo, nem sempre para o longo prazo. Em economia a máxima vale também. E nem sempre com políticas vencedoras. A inércia, às vezes, domina a capacidade de mudar.

A política fiscal do País pode ser vista como vencedora. A manutenção de superávits primários por década e meia foi capaz de reduzir a relação dívida/PIB, afastar de vez as dúvidas quanto à sua sustentabilidade e com isso ganhar credibilidade, reduzir o risco Brasil e o custo do financiamento público e privado. A base do time vencedor foi a criação e manutenção da Lei de Responsabilidade Fiscal e dos acordos bem-sucedidos do governo federal com os Estados. Hoje a nossa situação fiscal contrasta com os problemas agudos dos países avançados, principalmente na Europa.

Mas a política fiscal precisa evoluir. Há alguns aspectos em que ela pode ser considerada perdedora. As despesas têm crescido em torno de 13% (6,3% descontada a inflação) na última década e meia. É uma taxa muito elevada. Para atingir as metas de superávit primário foi necessário elevar a carga tributária de tal forma que hoje é um dos maiores entraves à competitividade da economia. A rigidez do crescimento das despesas correntes significou também que a capacidade de investimento do Estado ficou comprometida, resultado cuja reversão é hoje um compromisso explícito do governo, com o intuito de reduzir os entraves (como infraestrutura) ao crescimento. Não obstante o cumprimento das metas fiscais, o governo continua pesando com uma poupança negativa, o que significa que não sobram recursos para investir. Como consequência, para conseguir fazer frente às necessidades de investimento a economia depende de poupança externa (equivalente ao déficit em conta corrente, atualmente em 2% do PIB, e aumentando). Essa dependência é a razão fundamental para a apreciação cambial, que aflige vários setores da economia.

Avaliamos que seria benéfica para o País a adoção de um regime fiscal com base em metas estruturais. Essas metas ajustam o resultado fiscal tradicional para o sobreaquecimento (ou desaquecimento) nas condições econômicas e nas operações extraordinárias. A adoção de metas estruturais poderia induzir maior eficiência da política fiscal e elevação da poupança pública.

Em períodos de forte expansão econômica e/ou rápida elevação nos preços de ativos (ações, matérias-primas, imóveis) as receitas do governo tendem a crescer rapidamente e as despesas públicas dependentes do ciclo (como gastos com seguro-desemprego), a cair. Gasta-se mais nesse período com o conforto de que as metas fiscais não estão ameaçadas. Mas é exatamente nos momentos de bonança que seria desejável e possível recuperar a capacidade de poupar do governo federal. O contrário se dá em momentos de desaceleração. Com a queda nos preços de ativos ou a deterioração de condições econômicas, a arrecadação sofre e há potencialmente mais gastos cíclicos, dificultando a obtenção dos resultados fiscais propostos à sociedade. Nesses momentos o alívio das metas fiscais tradicionais é recomendável. Na ausência desse alívio, o atual regime fiscal estimula a busca por fontes de receitas temporárias.

As metas fiscais estruturais podem evitar tais distorções. Para calcular o resultado fiscal estrutural se ajustam os números observados do orçamento público para os ciclos de atividade e de preços de ativos. Após uma filtragem preliminar dos dados - eliminando operações orçamentárias julgadas não recorrentes -, estima-se o volume de receitas e despesas do governo que seriam observadas caso a economia (e os preços dos ativos) estivesse operando em sua tendência de longo prazo.

Por filtrar a influência das condições econômicas sobre o orçamento público, o resultado fiscal estrutural revela a efetiva postura das políticas orçamentárias, mostrando em que magnitude as decisões governamentais estão contribuindo para a expansão ou contração fiscal observada.

Recentemente, técnicos do Ipea divulgaram resultados sobre as séries fiscais estruturais para o Brasil. Na mesma linha, a equipe econômica do Itaú Unibanco vem trabalhando com profundidade sobre o assunto (ver o trabalho de Maurício Oreng no Itaú Macro Visão Em prol de uma meta fiscal estrutural para o Brasil, no link http://www.itaubba-economia.com.br/content/interfaces/cms/anexos/MACRO_VISAO_FISCAL.pdf, e também no Texto para Discussão do Itaú Unibanco n.º 6 Brazil's Structural Fiscal Balance, em http://www.itaubba-economia.com.br/content/interfaces/cms/anexos/TD6_abr11.pdf).

Nossas estimativas para o período 2000-2011 (até setembro) mostram uma flutuação considerável no resultado primário estrutural (enquanto o resultado primário tradicional, sem ajuste, mostrou relativa estabilidade). A partir de 2000 houve elevação média de 0,8% do PIB/ano, chegando a 4,3% em 2003. A partir de 2004 verificamos queda contínua no superávit primário estrutural do setor público de cerca de meio ponto porcentual a cada ano, trazendo o resultado de 4,2% do PIB em 2004 para 0,8% em 2010. Finalmente, houve uma significativa mudança na postura fiscal em 2011, com o superávit primário estrutural (acumulado em 12 meses) subindo para 2,1% do PIB até o terceiro trimestre.

Em suma, nossas estimativas de superávit primário estrutural revelam que o atual regime fiscal induz um comportamento expansionista em períodos de sobreaquecimento e o contrário em fases de retração. Além disso, o regime incentiva a busca por receitas extraordinárias em tempos de recessão. Acreditamos que a adoção de metas estruturais resultaria em mais eficiência na gestão pública e maior nível de poupança governamental, contribuindo para aumentar o crescimento sustentável do País.

Os desafios da (re)industrialização - LUIZ GONZAGA BELLUZZO


Valor Econômico - 03/04/12


Nos anos 80 do século passado, sob a inspiração de Ronald Reagan e Margaret Thatcher, as políticas industriais e de fomento coordenadas pelo Estado foram lançadas no rol dos pecados sem remissão. No Brasil, o desenvolvimentismo foi alvejado por maldições e imprecações.

A desorganização financeira e fiscal que se seguiu à crise da dívida externa forneceu combustível para alastrar as chamas da purificação mercadista. O apelo à liberalização geral e irrestrita explicitava o fim do consenso em torno do objetivo comum do desenvolvimento fundado na industrialização. Entre as camadas dominantes, o dissenso neoliberal incluía o desconforto com o reconhecimento dos direitos sociais e econômicos consagrado na Constituição Cidadã de 1988. A dificuldade de se reconstituir, em novas bases, um objetivo compartilhado foi agravada pelo enfraquecimento da capacidade coordenadora de um Estado financeiramente prostrado diante da crise fiscal e monetária e dos programas impostos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).

Depois da bem-sucedida estabilização de 1994, os "reformistas liberais" brasileiros apoiaram sua estratégia em cinco pontos: 1) a estabilidade de preços criou condições para o cálculo econômico de longo prazo, estimulando o investimento privado; 2) a abertura comercial imporia disciplina competitiva aos produtores domésticos, forçando-os a realizar ganhos substanciais de produtividade; 3) as privatizações e o investimento estrangeiro removeriam os gargalos de oferta na indústria e na infraestrutura, reduzindo custos e melhorando a eficiência; 4) a liberalização cambial, associada à previsibilidade quanto à evolução da taxa real de câmbio, atrairia "poupança externa" em escala suficiente para complementar o esforço de investimento doméstico e para financiar o déficit em conta corrente; 5) o gotejamento da renda promovida pela acumulação de riqueza na camadas superiores - auxiliada pela ação das políticas sociais "focalizadas" - seria a forma mais eficiente de reduzir a desigualdade e eliminar a pobreza.

Estratégia tem que estimular a ousadia dos empresários, centralizar o capital e elevar o gasto estatal

Na verdade, a privatização desarticulou um dos mecanismos mais importantes de governança e de coordenação estratégica da economia brasileira. O setor produtivo estatal - num país periférico e de industrialização tardia - funcionava como um provedor de externalidades positivas para o setor privado: 1) O investimento público era o componente "autônomo" da demanda efetiva (sobretudo nas áreas de energia e transportes) e corria à frente da demanda corrente; 2) as empresas do governo ofereciam insumos generalizados em condições e preços adequados; e, 3) começavam a se constituir - ainda de forma incipiente - em centros de inovação tecnológica.

Os celebrados efeitos da privatização sobre a eficiência da economia não se concretizaram. Senão vejamos: 1) a indexação das tarifas e preços das empresas privatizadas produziu um aumento expressivo dos custos dos insumos de uso generalizado e; 2) o investimento em infraestrutura passou a correr atrás da demanda, gerando pontos de estrangulamento; 3) as grandes empresas "exportaram" os seus departamentos de P&D e os escritórios de engenharia reduziram dramaticamente seus quadros; 4) e iniciativas importantes, como o Centro de Pesquisas da Telebrás, foram praticamente desativadas.

No debate em curso sobre a situação da indústria brasileira, há quem proclame o "mito da desindustrialização". Mal sabem que a encrenca vai além dos problemas criados pelas importações predatórias, danosas à produção corrente e à ocupação da capacidade já instalada. A dilaceração das cadeias produtivas pelo "real forte" e a estagnação dos investimentos só serão reparadas com o aumento dos gastos na formação da nova capacidade, sobretudo, nos setores novos e intensivos em tecnologia. Isto vai demandar, sim, o exercício do "animal spirits" dos dirigentes empresariais, a centralização do capital, agora disperso em empresas sem a escala requerida para participar do atual estágio da concorrência global e a elevação do gasto autônomo do Estado.

O salto de escala e tecnológico das indústrias brasileiras não vai ocorrer sem políticas adequadas que estimulem o mercado de capitais. A experiência histórica demonstra que isso exige a constituição de bancos universais de grande porte, rigorosamente regulados e supervisionados, capazes de desenvolver instrumentos financeiros destinados para o crédito de longo prazo.

O esperado efeito "acelerador" decorrente desse arranjo vai dinamizar os setores já existentes, cuja "proteção" não deve ser concedida sem contrapartidas de desempenho nas exportações, na inovação tecnológica e na substituição de importações. A economia mundial está diante de capacidade de oferta excedente em quase todos os setores e isso vai tornar ainda mais acirrada a conquista de mercados.

Sobre a utilização dos recursos decorrentes da exploração do pré-sal: a avalanche de moeda estrangeira que certamente advirá da exportação de petróleo ameaça tornar incontrolável o vício nativo cevado nas delícias tão sedutoras quanto e viciosas do câmbio valorizado. O ideal para o país detentor de uma riqueza natural abundante é constituir um fundo soberano e aplicar no exterior os recursos gerados pelas exportações, utilizando no âmbito doméstico tão somente os recursos gerados nas vendas internas e os rendimentos obtidos das aplicações no exterior. Esses fundos são genuinamente "fundos de poupança", poupança de longuíssimo prazo.

Um peso, uma medida - RODRIGO CONSTANTINO


O Globo - 03/04/12


Não existe oposição liberal organizada no Brasil. Há uma clara hegemonia da esquerda entre os vários partidos.

Mas o DEM seria o mais próximo desta bandeira que prega menos intervenção estatal e mais liberdade econômica. E, dentro do DEM, o senador Demóstenes Torres tem sido uma das vozes mais firmes em defesa destes valores, assim como da ética.

Por isso é fundamental usar o escândalo envolvendo o senador e sua mais que suspeita amizade com um contraventor para marcar as diferenças entre a esquerda e os liberais, estes ainda sem representação política.

Quando os homens estão unidos por princípios claros, não há espaço para arbitrariedade. Os princípios servem como critério objetivo para julgar os atos. Em contrapartida, quando se trata de um grupo tribal, o seu membro será sempre tratado com complacência, enquanto os "de fora" serão duramente condenados.

O uso de dois pesos e duas medidas é característica comum a estes grupos, e vale tudo para salvar a pele do companheiro, por mais criminoso que tenha sido seu ato.

Aristóteles dizia que uma sociedade adequada é governada por leis, não por homens. Com isso ele queria dizer que devemos adotar um império de leis igualmente válidas para todos, em oposição ao poder arbitrário que aos amigos tudo dá, enquanto aos inimigos aplica o rigor das leis. Da mesma forma, uma associação adequada é unida por ideias, não por homens, e seus membros são leais às ideias, não ao grupo. A máfia, por exemplo, é o oposto de tal associação, pois seus membros devem lealdade aos demais membros, e não a valores objetivos.

Com esta distinção em mente, fica claro que boa parte da esquerda sempre adotou postura tribal ou mesmo mafiosa. Seus membros são tratados como "especiais", detentores de um salvo-conduto para "malfeitos".

Os fins "nobres" sempre justificam os meios obscuros, e os crimes perpetrados por seus líderes nunca são crimes, ao contrário daqueles realizados pela oposição. São sempre dois pesos diferentes, para se obter duas medidas diametralmente opostas.

Foi assim que um assassino frio e cruel como Che Guevara chegou a se tornar herói, ou a mais longa e opressora ditadura do continente até hoje é defendida. Abro um parêntese para lembrar que tanto Mussolini como Hitler, apesar de tratados como os monstros que eram, porque são vistos como de "direita", eram na verdade coletivistas antiliberais que nasceram na esquerda socialista e sempre condenaram o capitalismo.

Fecho o parêntese.

É com base na mesma lealdade mafiosa que alguns petistas sempre partem para a acusação de uma fantasiosa "mídia golpista" quando escândalos envolvendo seus aliados vêm à tona. Curiosamente, eles logo esquecem esta imprensa "golpista" quando o escândalo envolve a oposição. Dois pesos e duas medidas, a marca registrada da nossa esquerda. Para eles, o camarada não é um "homem comum", mas sim alguém acima das leis. Não se importam com "o que" acontece, mas sim com "quem" acontece.

Os liberais não aceitam esta postura.

No final de 2011, escrevi para a revista "Época" algumas palavras em homenagem justamente a Demóstenes Torres. Não conheço o senador pessoalmente, mas acompanhei suas lutas no Senado. Esteve quase sempre do lado que julgo correto.

Condenou as cotas racistas, denunciou a doutrinação ideológica pelos órgãos estatais, pregou maior rigor penal para combater a criminalidade, atacou sempre o desvio de recursos públicos e defendeu a urgência de um partido que tenha a economia de mercado e sólidos valores morais como plataforma.

Não poderia concordar mais! O que falta em nossa política é um partido que rejeite esta visão predominante de que o governo é uma espécie de deus clarividente capaz de gerar progresso por decreto. Países com mais intervencionismo estatal invariavelmente acabam com menos riqueza e liberdade.

E nada mais absurdo do que combater o racismo com segregação racial.

Logo, Demóstenes mereceu cada elogio que fiz. Afinal, eu focava no "que" foi dito, e não em "quem" o disse. Da mesma forma, agora que gravações comprometedoras vieram a público, enorme decepção à parte, continuo focando no "que" mostram os fatos, não sobre "quem" eles recaem. Defendo uma investigação minuciosa e, se for o caso, a severa punição do senador. Sob meu ponto de vista, ele é apenas um homem comum, um indivíduo como qualquer outro, que deve respeitar as mesmas leis.

Infelizmente, isso é algo que a esquerda em geral e os petistas em particular parecem nunca compreender: a importância de se ter apenas um peso, e uma medida.

Quando a Argentina enlouqueceu - CLÓVIS ROSSI


FOLHA DE SP - 03/04/12

Guerra das Malvinas, dois meses e meio de um delírio coletivo que acabou com a ditadura militar 

Eu era correspondente em Buenos Aires, mas estava cobrindo os conflitos centro-americanos quando forças argentinas invadiram as Malvinas, fez ontem 30 anos.
Quando meu chefe me acordou na Cidade da Guatemala para me anunciar a novidade, achei que ele estava brincando. Não era imaginável que uma ditadura militar já desgastada se atrevesse a desafiar o império britânico, ainda que já não fosse império. Era, de todo modo, integrante da Otan, a aliança militar mais poderosa do planeta.
Liguei para minha mulher em Buenos Aires e ela me contou que o general Leopoldo Fortunato Galtieri, o chefe de turno da junta militar, estava sendo aplaudido nas ruas.
Achei que ela havia enlouquecido. Afinal, meses antes, eu mesmo havia sido testemunha ocular de uma grande manifestação popular em que se gritava: "Se va a acabar/se va a acabar/la dictadura militar".
Não, ela não havia enlouquecido. Os argentinos é que estavam embriagados de um patriotismo equivocado. Domingo, em "El País", o jornalista John Carlin, que também vivia em Buenos Aires, lembrou: "No dia seguinte [à invasão], 100 mil pessoas foram celebrar na praça de Maio, algumas das quais as mesmas que se haviam manifestado poucas semanas antes contra o bêbado Galtieri e seus cupinchas".
Na volta a Buenos Aires, testemunho o apoio à junta militar até dos Montoneros, o grupo guerrilheiro que havia sido praticamente dizimado pela ditadura, como parte do genocídio por ela operado.
Para não mencionar o fato de que os militares dizimaram também a economia argentina.
Se a sabedoria convencional ensina que, na guerra, a primeira vítima é sempre a verdade, na Guerra das Malvinas a verdade foi torturada antes de ser morta.
Afinal, não havia internet nem TV a cabo com notícias 24 horas nem o tal "jornalismo cidadão" como fonte alternativa, e a guerra se travava a 600 quilômetros do ponto mais próximo do continente.
Nesse ambiente favorável à propaganda mentirosa, quando as forças britânicas desembarcaram em uma das ilhas, as Geórgias do Sul, corri para o centro de imprensa que a ditadura montara no Hotel Sheraton com a dura missão de arrancar um fiapo de verdade em muito pouco tempo (era sábado e o jornal, naquela época, fechava muito mais cedo que hoje).
Perguntei de mil e uma maneiras se, afinal, os britânicos haviam ou não conseguido estabelecer um cabeça de praia, como diziam.
O oficial responsável negou mil e uma vezes.
A Argentina, pela propaganda oficial, estava ganhando a guerra até o minuto anterior à rendição, anunciada por Galtieri à multidão que ele próprio convocara à praça de Maio, talvez imaginando que os aplausos colhidos após a invasão continuariam após a derrota.
Era mais uma loucura. A massa, ensandecida, promoveu outra colossal manifestação contra o regime, aos gritos de "Galtieri, borracho/mataste a los muchachos" (a fama de bêbado do general era disseminada; "muchachos" eram os 649 soldadinhos que ele enviara às ilhas para combater).
A ditadura argentina começou a acabar nas Malvinas, após dois meses e meio em que um país inteiro enlouqueceu.

A dependência de Cuba - EDITORIAL FOLHA DE SP


FOLHA DE SP - 03/04/12


O fracasso do planejamento econômico central em Cuba parece ter sido, afinal, reconhecido até pelos chefes da ditadura. Pragmático, Raúl Castro dá curso a uma abertura à iniciativa privada e aos investimentos externos.
O objetivo é dar algum dinamismo à economia cubana, ao mesmo tempo em que se preserva inalterada a ordem política. É improvável, porém, que essa reforma "chinesa" encontre ali sucesso similar ao obtido, por exemplo, pelo Vietnã.
O país do Sudeste Asiático, ainda sob domínio do Partido Comunista, foi citado como exemplo bem-sucedido de abertura para o mercado por Pavel Alejandro Vidal, da Universidade de Havana, em entrevista a esta Folha.
Desde meados dos anos 1980, dirigentes vietnamitas têm estimulado a instalação de empresas manufatureiras. A partir da década de 1990, o produto do país cresceu, em vários anos, a velocidades comparáveis às da China.
O economista cubano aponta, no entanto, o limite imposto às expectativas dos irmãos Castro.
Há uma questão de geografia econômica: o Vietnã está na Ásia; Cuba, na América Latina. A economia vietnamita se insere na divisão da produção de manufaturas do leste asiático. Sua mão de obra barata estimula investimentos em indústrias baseadas no uso intensivo do trabalho, que se deslocam para lá desde a China, onde o salário dos operários tem crescido. Os principais parceiros comerciais do Vietnã são a própria China, o Japão e a Coreia do Sul.
Cuba, de sua parte, está isolada, entre outras razões, por força do injustificável embargo imposto pelos EUA. Depende agudamente da Venezuela de Hugo Chávez.
O petróleo, comprado em condições facilitadas do parceiro sul-americano, ressalta Vidal, representa metade das importações cubanas. Em contrapartida, a ilha exporta o serviço de mais de 30 mil médicos para socorrer a "revolução bolivariana" de Chávez.
Se o caudilho venezuelano deixar o poder, por qualquer razão, Cuba perderia seu favor e receita anual de US$ 6 bilhões -o triplo do que lhe traz o turismo. O impacto seria catastrófico, como o da decadência do comunismo, que extinguiu a ajuda da União Soviética.
Apesar da retórica reformista, Cuba reincide num erro. Raúl e Fidel Castro se mostraram lentos até aqui na reação à derrocada soviética e, em lugar de acelerar a volta da economia de mercado, atrelaram o destino do país ao de um líder estrangeiro de futuro incerto.

Riscos vividos - MIRIAM LEITÃO


O GLOBO - 03/04/12


Começa a haver desabastecimento na Argentina, a inflação é crescente, apesar de manipulada, e o governo quer controlar a imprensa. Mas, 30 anos depois, a Argentina em nada lembra o país devastado econômica e politicamente que entrou na guerra por um delírio do ditador.
A presidente, Cristina Kirchner, disse que a Guerra das Malvinas não foi decisão do povo argentino. Não foi.
Coube ao povo apenas pagar a conta, como sempre.
O então ministro das Relações Exteriores do Brasil, Ramiro Saraiva Guerreiro, vestiu o robe e foi falar com os jornalistas. Ele admitiu no seu livro de memórias que foi uma das raríssimas surpresas que teve em sua vida profissional. "Acostumei- me a prever com razoável precisão como os Estados se comportariam na cena internacional." O chanceler brasileiro em 1982 estava voltando de uma viagem à China, passara por 13 fusos horários, e dormiu em Nova York. Foi acordado pelo porta-voz Bernardo Pericás, que lhe disse: "Ministro, a Argentina invadiu as Malvinas, e os jornalistas brasileiros que o acompanharam à China gostariam de ouvir seus comentários." Ele não teve tempo de pensar, mas definiu com precisão milimétrica o que fazer: apoiar a Argentina, mas não a guerra. Estava fora de questão brigar com os argentinos. Fora longo o trabalho de recompor as relações, afastar as desconfianças, e firmar o acordo que pacificou a região desde o início da construção da Usina de Itaipu. Brigar com a Inglaterra, não havia por quê. O ministro disse então aos jornalistas que o Brasil apoiava o direito da Argentina sobre o arquipélago desde 1833, quando, na regência, o nosso ministro plenipotenciário em Londres avisou à corte de St. James que o país era contra a invasão das ilhas pelos ingleses. Ao mesmo tempo, defendia solução negociada.
Foram dias tensos para a diplomacia brasileira. Em maio, o presidente, João Figueiredo, tinha viagem marcada aos Estados Unidos, que apoiaram imediatamente a Inglaterra. Não ir seria entendido como gesto político. Ir seria uma inutilidade, porque só haveria um assunto, Malvinas. Ele foi e deu um recado: "Se houvesse algum ataque ao território continental argentino, os latino-americanos, que estavam dando apoio à Argentina em sua reclamação, mas evitando agir como se se tratasse de uma agressão britânica ao continente que os obrigasse à ação de defesa coletiva, seriam provavelmente forçados a reagir muito além de suas intenções." A história foi contada por Guerreiro em seu livro "Lembranças de um empregado do Itamaraty".
Havia muitos riscos para o Brasil naquele conflito.
Um era ter que tomar partido.
Quando um avião britânico pousou no Galeão, a Argentina queria que a aeronave fosse retida até o fim do conflito; os ingleses, que ela fosse liberada imediatamente.
O avião foi retido por um tempo que não significasse uma afronta aos ingleses, mas que fosse um recado aos argentinos de que o Brasil não ajudaria a Inglaterra.
O Brasil temia uma vitória argentina porque isso fortaleceria o governo de Galtieri.
Ele seria louco o suficiente para arranjar outro inimigo externo.
E o Chile já estava escalado, pela disputa no Estreito de Beagle. Havia generais nos governos daqui e de lá, mas aqui o processo de abertura estava bem adiantado. Na Argentina, havia uma devastação em todos os sentidos. A ruína econômica pousava sobre 30 mil mortos e desaparecidos.
Galtieri achou que a guerra o salvaria. Foi deposto, e o país pôde abreviar o tempo até a democracia. Margaret Thatcher saiu popular da guerra e se reelegeu.
Trinta anos depois, o que faz a Inglaterra continuar mantendo a posse das ilhas? Eles dirão que assim querem os kelpers, mas Hong Kong foi devolvida à China, após 100 anos de controle, sem qualquer consulta popular. O compromisso feito pela China de manter "um país, dois sistemas" está cada vez mais fraco. Devolveram Hong Kong porque temem a China, não o fazem com as Malvinas porque não temem a Argentina. Os kelpers são descendentes dos ingleses transplantados para lá desde a ocupação em 1833. Em Hong Kong, a maioria é de origem chinesa mesmo. Mas o tamanho do país reclamante foi o mais decisivo.
E de quebra tem petróleo no pedaço. Quanto? Há controvérsias sobre quantidade e qualidade do produto, mas cinco empresas prospectam na área, todas britânicas: Falkland Oil & Gas, Rockhopper Exploration, Desire Petroleum, Borders & Southern, Argos Resources. A Rockhopper Exploration é que está em estágio mais avançado e calcula-se que produzirá a partir de 2016, e ao longo de 20 anos, um total de 448 milhões de barris nos campos que explora. Ao todo, fala-se, segundo o "Telegraph", em potencialmente 4,7 bilhões de barris.
De acordo com especialistas ouvidos pelo jornal inglês, o governo argentino ao elevar o tom de suas reclamações contra a dominação britânica no arquipélago quer assustar os investidores e impedir que as companhias consigam financiar seus investimentos.
A tensão entre os dois países vai continuar. Um olhar 30 anos atrás revela que aquele não foi apenas um conflito extemporâneo. A região correu mais risco do que ficou na lembrança. O melhor é negociar, lembrando que a Inglaterra fica a 12.735 quilômetros de distância do arquipélago. A Argentina, a apenas 482.

Da Petrobrás para a Petrobrás - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 03/04/12


Com o rápido aumento da frota de veículos e a quebra na produção de etanol nos últimos anos, o consumo de gasolina no Brasil em janeiro deste ano foi de 493 mil barris por dia, 36% acima do mesmo mês do ano passado. Em vista desse aumento, a Secretaria de Comércio Exterior (Secex) apresenta agora em separado, em suas estatísticas, o quadro de importação de gasolina. Verifica-se assim que, no primeiro bimestre deste ano, as importações do produto custaram US$ 566,72 milhões, podendo superar US$ 3 bilhões ao fim deste ano. A Petrobrás produz 85% da gasolina consumida no País e importa outros 15%, segundo o diretor de Abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa, que informou que essa dependência de importações só será definitivamente superada a partir de 2013, quando deve entrar em operação a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Essa unidade, no entanto, não vai produzir gasolina, mas diesel, querosene de aviação (QAV) e gás liquefeito de petróleo (GLP). Liberará, entretanto, outras refinarias para produzir maior volume de gasolina.

A previsão soa otimista, tendo em vista o aumento do consumo de gasolina e a persistência dos problemas não resolvidos quanto ao etanol. A presidente da Petrobrás, Graça Foster, disse recentemente à Folha de S.Paulo que a empresa gostaria de ter menor exposição à gasolina, mas não encontra etanol a preços razoáveis. "Agora, neste ano de 2012, como em 2011", disse ela, "estamos sendo punidos pelas próprias transações do mercado. A Petrobrás entra no mercado, e o que está valendo 10 vira 15. Por 15, não retorna o capital empregado e a gente não vai entrar de cabeça para perder dinheiro em hipótese alguma."

Além disso, há atrasos na construção de quatro refinarias programadas. Na Abreu e Lima, as obras avançam, mas há ainda pendências quanto à participação da Petróleos de Venezuela (PDVSA). A refinaria do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro deveria entrar em funcionamento em 2015, mas deve atrasar com o corte no orçamento de investimentos da Petrobrás. Em situação semelhante estão as Refinarias Premium l, no Maranhão, e Premium 2 no Ceará, previstas agora para 2019.

Para reforçar sua atuação no setor, a Petrobrás decidiu, em anos anteriores, adquirir refinarias já prontas no exterior, de onde provém uma parte de suas importações de combustíveis. Segundo o jornal Valor (28/3), para atender à demanda de sua controladora no Brasil, a refinaria Petrobrás América, instalada em Pasadena, no Texas (EUA), adquirida em 2010 da Astra Oil Trading, vai aumentar em duas vezes e meia as suas vendas de gasolina para o Brasil, que deverão alcançar 9 milhões de barris este ano, em comparação com 3,5 milhões de barris em 2011. As exportações de diesel também vão mais que dobrar, passando de 3,6 milhões para 8 milhões de barris. Essa refinaria utiliza petróleo mais leve, dos EUA, Nigéria e Angola.

A unidade de Pasadena tem capacidade de processar 100 mil barris de combustíveis por dia, capacidade igual à refinaria que a Petrobrás possui em Okinawa, comprada da Sumitomo em 2008, a única refinaria estrangeira no Japão. Outra refinaria da estatal brasileira está instalada em Bahía Blanca, na Argentina, adquirida em 2001 da Repsol YPF, com capacidade de 30 mil barris diários.

O fato de essas refinarias processarem petróleo leve não significa que o óleo pesado produzido no Brasil não encontra mercado no exterior. Os EUA absorveram 40% das exportações brasileiras de petróleo no ano passado, tornando-se individualmente o maior cliente da Petrobrás.

Essa situação mostra que, na realidade, o Brasil não atingiu a autossuficiência em petróleo. Depois de décadas de esforço, o País se tornou um exportador líquido de petróleo em bruto, mas continua altamente dependente de gasolina importada, o derivado que mais consome.

Como já vai se tornando cada vez mais comum, o Brasil avança na exportação de produtos primários, mas tem ainda dificuldades de se firmar como exportador de produtos com maior valor agregado, e a área de derivados de petróleo, como se vê, não é exceção.

O filme 'Pina' é um spa mental - ARNALDO JABOR


O Estado de S.Paulo - 03/04/12


Fui ver o filme de Wim Wenders sobre a vida e obra de Pina Bausch e saí do cinema deslumbrado. Estava mesmo precisando de um pouco de beleza, sufocado pela feiura da calamidade urbana de São Paulo e envenenado pela vida política do País, que balança entre vícios ideológicos paralisantes e a corrupção institucional. Com a crise entre governo e aliados, a política virou uma gincana de obstáculos que impedem o Executivo de governar. Além disso, vivemos longe da beleza, intoxicados pelo furacão de irrelevâncias 'pop' que matam a contemplação muda da arte. E Pina é grande arte. Fui ao cinema em busca de um spa mental. Depois de uns trailers repulsivos de violência para crianças, começou o filme do Wim. Eu andava meio de saco cheio do alemão, desde Asas do Desejo com aquele papo de que os anjos só eram vistos pelas criancinhas. Mas, esse filme é o máximo. Há muito tempo não via algo tão emocionante. Wim parece ter seguido as lições da própria Pina na delicadeza de um teatro dançado. Sua linguagem sem palavras diz mais que conceitos claros.

Jean-Luc Godard disse uma vez que o balé clássico aspira à imobilidade, a uma pose final que atinja um momento 'sublime'. Pina nunca buscou o tal 'sublime', mas só se interessava pela vida concreta (sem realismo, claro), com seus vícios, inibições, medos que impedem encontros definitivos e harmônicos. Seu tema é o desejo humano que resiste, mesmo debaixo do 'mal-estar de nossa civilização'.

Estive com Pina Bausch por alguns minutos, em sua última apresentação em São Paulo. Fiquei tímido e 'tiete' e mal conseguia dizer-lhe algumas frases decentes. Só me ocorriam banalidades sobre seu trabalho, coisas como 'awesome' ou 'cool', equivalentes a 'bem legal' ou 'irado', enquanto ela me olhava, fumando, pálida, pouco antes de sua morte.

Em seu filme, Wim Wenders criou uma mise-en-scène original, tirando bailados do palco e encenando-os nas ruas de Wuppertal. E melhor ideia ainda foi fazer o filme em 3D, o que nos revelou uma coreografia em camadas quase 'cubistas', exibindo closes e 'planos abertos' simultaneamente. É lindo ver toda essa riqueza de ângulos para um tipo de coreografia feita sobre os sentimentos mais comuns de nosso cotidiano: a angústia de viver sem sentido, a confusão de papéis sexuais, a fome de amor, o riso misturado a lágrimas. Bob Wilson disse uma vez: "A importância da obra de Pina será uma das poucas lembranças da arte do século 20". Fellini, outro gênio, chamou Pina para seu filme E La Nave Va e assim falou da grande artista: "O que Pina conta no palco é um teatro dançado que liberta todas as inibições; é festa, jogo, sonho... Mas é um conforto que se esvai aos poucos, porque o que a gente quer é que toda essa harmonia, toda essa leveza não acabe nunca e que a vida seja assim".

Pina Bausch fez uma arte que podemos até chamar de "terapêutica". Dentro de um mundo à beira do trágico irracionalismo que vemos nascer nos impasses políticos internacionais, Pina nos faz esquecer o mundo lá fora, sem nos 'alienar', redesenhando nossa crise absurda pela luz mágica da poesia. E não é apenas o êxtase de uma sinfonia ou de um grande filme; a arte de Pina nos deixa ver a máquina leve que organiza a composição estética, o segredo do processo criativo. Ela não nos emociona apenas; ela nos ensina. Aquela coisa do "beleza é verdade e verdade é beleza" se realiza diante de nossos olhos.

Pina é imensa, porque é das poucas pessoas que conseguiram descrever nosso tempo com angústia e compaixão. Isso: uma rara mistura de melancolia com esperança.

Já vimos na arte do século 20, desde o pós-guerra, o sentimento do absurdo, o horror, a desesperança crítica. Os mendigos de Beckett vagueavam em desertos sem saída. O Estrangeiro de Camus pedia que saudassem sua morte com "vivas" de ódio. Hoje, na literatura, restou um anarquismo sem rumo, detritos masoquistas de uma desesperança superficial, "Kafkas pop", "sub-joyces" despejando um automatismo narrativo porra-louca e superficial.

Pina Bausch, que era filha da Guerra Fria, não estava nessa. Ela sempre deixou um fio de felicidade passar por entre seus bailarinos solitários, desunidos, mal-ajambrados nas tristes roupas comuns, pobres ternos, pobres vestidinhos, desamparados transeuntes do nada para o nada. Pina criou um minimalismo afetivo, sem a frieza rancorosa de tantos artistas "engajados", sem a negra alegria de saudar a morte, de festejar a impossibilidade, o juízo final. Pina exalta a vida mesmo através de uma triste beleza, uma paz dark diante deste tempo que a indústria cultural está deformando com sua feira de ofertas. Pina via com amor nossos clichês e aprofundava-os, mostrando-nos a estranheza escondida sob a familiaridade, como um Brecht lírico da primeira fase (Baal, Selva das Cidades). Ela captava o imperceptível. Seus atores/bailarinos/personagens são quase sempre carentes, sozinhos, tentando alguma forma de encontro. Ver seus espetáculos era uma aula de "grande arte" e, por entre os corpos bailando, percebíamos as influências mais límpidas da arte contemporânea. Vemos Fellini, claro, vemos Chaplin, vemos na cenografia o minimalismo mais espontâneo, sem exibição vanguardista, vemos Mondrian, vemos os Irmãos Marx repetindo as mesmas routines de chanchadas, vemos Beckett curado de sua depressão doentia, vemos um painel amplo do melhor da criação do século 20, tudo interpretado pela espantosa capacidade técnica de seus bailarinos esfarrapados.

Pina humanizava nossos defeitos e nosso ridículo. Seus atores/personagens oscilavam entre desejo e repressão, entre liberdade e medo.

É isso aí. Ao sair do cinema, eu estava oxigenado, purificado, pronto para mais uma temporada no inferno da estupidez nacional.