quarta-feira, dezembro 19, 2012

Clima de fim do mundo - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 19/12


Obviamente, os crentes no fim dos tempos com base no calendário maia não circulam com assiduidade pelos salões da Câmara e do Senado, mas, se o fizessem, sairiam de lá com a sensação de que o mundo está mesmo acabando. Talvez não o mundo, mas o respeito aos rituais regimentais e da boa convivência entre os Poderes.

Ontem, por exemplo, a Medida Provisória 579, sobre as novas regras de concessões de energia elétrica, mal havia sido votada na Câmara e já foi colocada em apreciação no Senado. Sem que sequer houvesse tempo para que os senadores conhecessem o texto. Hoje está prevista uma sessão do Congresso para análise de mais de 3 mil vetos de uma lapada só. Como disse o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), está tudo mais veloz do que nos tempos de Airton Senna.

Para completar, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu deflagrou uma escalada do que chamou de reforço ao presidente da Câmara, Marco Maia, no sentido de não cumprir a cassação automática dos mandatos de parlamentares condenados na Ação Penal 470. Ora, vale lembrar que Dirceu tentou fazer com que o PT decidisse, de forma institucional, deflagrar uma campanha contra a condenação dos réus. Não conseguiu. Agora, nos bastidores, há quem receie que esse caminho de apoio a Marco Maia contra o STF seja uma trilha para levar o PT a essa campanha institucional contra a decisão do Supremo. Ou seja, desobediência.

A classe política está muito preocupada com esse clima de fim de ano que mais parece de fim do mundo. O quadro geral não é nada sereno e, o pior, é que cada um dos Poderes tem a sua dose de responsabilidade por essa sensação de intranquilidade. O Poder Executivo não se mostra disposto, sensível, tampouco dedicado à arte da política como forma de resolver conflitos. O STF, ao contrário, faz ouvidos de mercador ao equilíbrio de forças e se mostra disposto a decidir tudo sozinho. E o Congresso, por sua vez, não cumpre as leis que redige. No episódio dos vetos, ora, se há um prazo para apreciação previsto na Constituição, por que não cumpri-lo à risca?

Enquanto isso, na economia...

Entre os congressistas, há outro tema que preocupa: a definição dos critérios de repartição do Fundo de Participação dos Estados (FPE). O Supremo Tribunal Federal deu um prazo de dois anos para que o Congresso aprovasse uma nova lei a respeito. O dever de casa ficou pendente. A lei atual vale até 31 de dezembro e determina que o Tribunal de Contas da União (TCU) envie ao Banco do Brasil os coeficientes de distribuição de cada estado para 2013.

Embora a distribuição do próximo ano esteja definida, nada impede que alguém vá à Justiça reclamar que esse critério não vale. Ou seja, a legislação está vulnerável e há um receio de que o próprio STF, no afã de resolver, edite em breve as normas para distribuição do FPE. Isso se não houver uma interrupção dos repasses no ano que vem por ordem judicial, o que por si só já representaria o fim do mundo para muitos estados.

Nesse quadro de incertezas não dá para esquecer também da inflação. Muitos consideravam que esse problema estava resolvido para todo o sempre, mas quem vai ao supermercado já percebeu os aumentos nos preços dos alimentos. É um fator que não se pode descuidar. Afinal, dizem os políticos, se o dragão voltar a cuspir fogo e o desemprego ressurgir no horizonte, o brasileiro não precisará de calendário Maia para decretar o fim do mundo. Ele estará logo ali, transformando tudo num salve-se quem puder. E essa situação, sinceramente, nem a oposição deseja.

E nos salões do Congresso...

Quem levou a melhor na CPI do Cachoeira foi o deputado Luiz Pitiman (PMDB-DF). Seu relatório de uma lauda e meia foi o único a conseguir consenso porque não indiciava ninguém e remetia tudo para o Ministério Público investigar. Isso mostra que a única vantagem da CPI foi coletar documentos relativos à quebra de sigilo. Mais um dever de casa pendente no parlamento. É uma pena.

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