domingo, dezembro 30, 2012

A amplitude da corrupção - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADÃO - 30/12


Os números cons­tantes de levan­tamento feito pela Polícia Fe­deral (PF) so­bre as suas in­vestigações de desvios de recur­sos e corrupção em prefeituras de todo o País são impressio­nantes. Embora se refiram a in­quéritos ainda em curso, eles dão uma ideia da amplitude das suspeitas - baseadas em indí­cios fortes o suficiente para mo­bilizar a Diretoria de Investiga­ção e Combate ao Crime Organi­zado (Dicor), da PF - que pai­ram sobre um setor da maior im­portância da administração pú­blica, o dos governos munici­pais. São 3.167 inquéritos que envolvem 484 prefeitos e ex- prefeitos, suspeitos de viola­rem dispositivos do Decreto Lei 201/67. Estão também sen­do investigados 182 servidores, 87 secretários municipais e 63 funcionários que ocupam car­gos em comissão.

Aquele decreto lei caracteri­za os ilícitos cometidos por pre­feitos e vereadores e prevê 23 casos capazes de provocar sé­rios danos ao erário. Por exem­plo, apropriação de bens ou ren­das públicas, desvios de recur­sos em benefício próprio ou alheio, deixar de prestar contas anualmente, efetuar despesas não autorizadas por lei e frau­des em licitações. As penas pa­ra esses delitos vão de 2 a 12 anos de prisão.

O Maranhão concentra o maior número de inquéritos (644), seguido pela Bahia (490), Ceará (296), Piauí (285), Pará (196) e Pernambuco (194). Isto se explica, segundo o dele­gado Oslain Campos de Santa­na, chefe do Dicor, pelo fato de esses Estados, serem mais ca­rentes e por isso receberem mais recursos da União, o que aumenta as oportunidades de fraudes. "São elevadíssimos os recursos que a União repassa pa­ra os municípios, principalmen­te através de convênios na áreas de educação e saúde", lembra ele. Em São Paulo e Rio foram abertos, respectivamente, 96 e 83 inquéritos.

Tanto para ter uma ideia mais precisa da situação quanto para que as investigações possam produzir resultados concretos - isto é, fornecer ao Ministério Público e à Justiça os elementos necessários para eventuais de­núncias e punições é preciso aguardar a conclusão dos inqué­ritos. O que, se for seguido à ris­ca a legislação que regula a maté­ria - o que infelizmente nem sempre é o caso deve aconte­cer em breve. Os inquéritos poli­ciais devem ser concluídos no prazo de 30 dias. Podem ser re­novados por mais 30 dias pela Justiça, desde que por motivo relevante, devidamente expos­to pela autoridade policial

Em entrevista ao Estado, o de­legado Oslain Santana mostra como agem as organizações cri­minosas em relação ao poder público e o perigo representado por cada uma delas. Elas se dis­tribuem por três grupos. Um, de matriz mafiosa, se infiltra no aparelho do Estado e investe mais em corrupção de agentes públicos do que em atos de vio­lência para realizar seus "negó­cios" e ampliar cada vez mais seu poder. "Veja o exemplo do Cadinhos Cachoeira. Come­çou com jogo do bicho e foi se infiltrando no Estado."

Numa outra categoria estão o que a PF chama de "grupos agressivos" que apelam para ações armadas, como ocorre no Rio e em São Paulo. Eles são vio­lentos, mas têm poder eçonômico reduzido, se comparado com o dos outros grupos, e sua infil­tração no aparelho estatal não é profunda.

O grupo que mais preocupa a PF, pelo seu poder e seu raio de atuação, é formado, segundo Oslain Santana, pelas "organi­zações de colarinho-branco ou das elites, pessoas acima de qualquer suspeita, mas que mo­vimentam grandes esquemas". Por isso, são as mais pernicio­sas dô ponto de vista da PF. "Desviam bilhões dos cofres públicos para benefício pes­soal. Tiram dinheiro da educa­ção e da saúde por meio de violações constantes do Decreto Lei 201/67 e da Lei de Licita­ções." Deixando de lado a con­fusão de criminosos de colarinho-branco com as "elites" - citadas de forma vaga, impreci­sa um conceito que ele clara­mente não domina, o delegado Santana tem razão para cha­mar a atenção para a.capacida­de que esse último grupo tem de causar graves prejuízos aos cofres públicos, em vista de seu poder de aliciamento e cor­rupção. É de esperar, portanto, que continue a merecer cuida­do especial da PF.

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