quinta-feira, outubro 04, 2012

Recuo do comércio mundial - ALBERTO TAMER


O Estado de S.Paulo - 04/10


A globalização que levou a economia mundial a crescer por mais de uma década está encolhendo com a forte desaceleração do comércio mundial. Ninguém mais pensa no parceiro comercial, todos se defendem para evitar a recessão. O FMI deve confirmar esta semana que o PIB mundial este ano vai ficar mesmo em 3%, e isso, se a zona do euro não afundar ainda mais. E a OMC informou que o comércio mundial não vai crescer mais do que 2,5%, ou seja, 5% menos do que em 2011. Não contem com ele para recuperar a economia mundial.

A alternativa é o consumo interno, mas isso implica diretamente ou não, em estímulo à produção local e defesa de mercado. Comprem de nós, não deles!

Protecionista é você! Nesse novo cenário de "salve-se quem puder,"os ânimos se acirram e todos se acusam de protecionistas. Até os bancos centrais, coitados, entram na história... É esse o novo cenário do comércio mundial, o que se pensava poderia salvar o mundo. EUA e Europa acusam o governo de transformar medidas provisórias em "política industrial protecionista". Eles estão de olho no único mercado consumidor mundial que, ainda vigoroso, cresce 7% ao ano e não dá sinais de arrefecer. Só que a economia brasileira estava crescendo mais de 3%, agora mal e mal chega a 1,6%.

Quem protege mais. Vamos aos fatos e aos números da OMC, levantados para a coluna por Jamil Chade, corrrespondente do Estado em Genebra:

1 - Em 4 anos de crise, o acúmulo de barreiras adotadas por todos os governos já atinge 3% do comércio mundial - US$ 500 bilhões, o equivalente a toda a exportação brasileira e indiana juntas.

2 - Em 4 anos, EUA adotaram mais de 120 medidas protecionistas e a Europa mais de 80.

3 - Desde outubro de 2011, foram adotadas 124 medidas de defesa pelos governos do G-20, afetando 1,1% do comércio desses países. O que mais preocupa, porém, é que barreiras adotadas desde 2008, e que eram tidas como "temporárias", jamais foram retiradas.

Foram 802 medidas. Hoje, o acúmulo de barreiras comerciais no mundo já afeta 3% do comércio mundial e 4% do intercâmbio do G-20. Desde a quebra do Lehman Brothers, foram 802 medidas adotadas e só 18% foram retiradas. Outra constatação da OMC é que países emergentes, como China e Rússia, elevaram nos últimos anos o apoio à agricultura. Pequim passou de um apoio negativo de 2,6% aos agricultores em 1999 para uma situação em que garantia, em 2010, 17% da renda do campo na China. Na Rússia, o governo apoiava o setor com o equivalente a 1% da renda agrícola em 1999. Hoje, é de 20%.

E o Brasil? O que se faz agora no Brasil, é uma tentativa atrasada de defender o mercado interno para recuperar o tempo perdido. Chegou tarde, as medidas estão sendo apressadas e intensificadas, o que explica a reação dos seus parceiros comerciais.

Ao todo, o Brasil adotou 17 novas barreiras contra importações, número que superou todos os demais países, inclusive a Argentina, que é acusada de estar adotando uma postura nacionalista. Além disso, o governo brasileiro anunciou nos últimos seis meses um total de cinco medidas de apoio à indústria nacional. Para comparar, também nos últimos seis meses, Itália, Espanha, França, Alemanha e os demais governos europeus colocaram em prática 13 planos de incentivo às suas indústrias. Mas, nenhum governo isolado chegou perto dos cinco planos do governo de Dilma Rousseff. Estados Unidos e Rússia, por exemplo, adotaram dois planos de incentivo cada.

Defesa. Enquanto a proteção crescia no mercado mundial, o Brasil limitou-se nos últimos dois anos à implementação de medidas antidumping. Em 2010 e abril de 2011, foram 25 ações. Já entre outubro de 2011 e abril de 2012, o número caiu para 16. Mas ainda assim lidera esse tipo de ação. Os europeus adotaram 13, contra doze dos Estados Unidos. No total, países adotaram 73 medidas.

Os números da OMC mostram que estamos entrando em uma nova fase do comércio mundial. O da proteção e autodefesa. A OMC e outras instituições internacionais já alertaram que isso pode aumentar ainda o risco de recessão, pois, na ausência de mercados internos, resta apenas o aumento das transações comerciais entre países. Assunto para o G-20 que promete tudo e nunca resolve nada. Não há dúvida alguma de que, numa economia mundial contraída e recessiva, se defender e proteger seus mercados é o caminho errado. Mas fica a pergunta: já disseram isso para eles, para os Estados Unidos, a União Europeia, a China ( a China, sim!) e o Japão? / COLABOROU JAMIL CHADE

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