quarta-feira, outubro 03, 2012

Administração portuária, a solução - WILEN MANTELI


O ESTADÃO - 03/10


O governo, antes de anunciar o novo pacote de medidas para os portos, vem ouvindo empresas e entidades com o objetivo de colher sugestões para destrancar investimentos e melhorar o desempenho do setor. Vários problemas já foram identificados, entre eles o fato de a administração dos portos, tal qual funciona hoje, não mais responder às crescentes necessidades do comércio exterior.

Está certa a avaliação do governo. A modelagem de uma gestão portuária moderna poderá resolver os principais problemas e gargalos que atormentam os operadores, armadores e usuários. À guisa de solução foram apontadas várias possibilidades. Entre elas, a reestruturação das atuais Companhias Docas, a criação de condomínios e a transferência das administrações portuárias para o setor privado. No caso da privatização, os interessados pretendem transformar os Conselhos de Autoridade Portuária (CAPs) em órgãos consultivos.

Para responder à permanente exigência de produtividade do mercado global, o setor portuário deve incorporar mudanças, sem dúvida. Mas a proposta de mudança nos CAPs precisa ser previamente conhecida e aprofundada, dado que esses órgãos albergam a participação da sociedade. Nos portos em que a administração continuar pública, os CAPs devem permanecer. No entanto, ter-se-á de desconstruir o argumento que pretende justificar a diminuição dos seus poderes a pretexto de eliminar supostas barreiras colocadas pelos operadores portuários à entrada de novos concorrentes e de destravar pedidos de aumentos tarifários apresentados pelas administradoras dos portos.

Esse argumento é desmentido pelos fatos. Se áreas portuárias ociosas não são postas à disposição para novos operadores, a responsabilidade é das próprias administradoras dos portos, às quais incumbe tomar as providências iniciais para a realização de licitações. Mesmo que algum operador específico pretendesse alijar potenciais concorrentes, em face da composição e do processo decisório do CAP, ele não teria nenhuma chance de sucesso nessa empreitada.

A figura do CAP foi criada para democratizar e descentralizar a governança dos portos, antes exercida de forma autocrática pela Portobrás. Sua estrutura é formada por quatro blocos representativos dos principais atores do setor, e o presidente do CAP é um representante do governo federal, que tem voto de Minerva. Como o próprio nome denota, o conselho é uma autoridade, ou seja, tem poder deliberativo, prerrogativa que só pode ser modificada ou cassada pelo Poder Legislativo.

A segunda parte do argumento é igualmente frágil, pois se apoia na falsa premissa de que aumentos de tarifa portuária produzem necessariamente melhorias na eficiência do sistema. A experiência tem mostrado o contrário. Durante o longo período em que as Companhias Docas, respaldadas pela Portobrás, puderam aumentar suas tarifas sem controle externo, o decorrente aumento do custo para o exportador brasileiro não teve contrapartida à altura nem na manutenção e/ou expansão da infraestrutura aquaviária nem na produtividade das operações portuárias. Os acréscimos tarifários foram literalmente "dragados" para cobrir ineficiências administrativas, passivos trabalhistas e uma série de outros desequilíbrios inerentes ao modelo anacrônico de gestão das Companhias Docas.

Porto não é modal de transporte, e, sim, um elo estratégico da cadeia logística do comércio exterior. A natureza dessa atividade se assemelha à do "arranjo produtivo", cujo êxito depende da redução de custos e dos ganhos de escala. Se o governo quer mudar o modelo de gestão dos portos, deve aproveitar o momento para separar as instâncias política e administrativa, cuja contaminação recíproca tem causado prejuízos à sociedade. A autoridade sobre o sistema portuário é prerrogativa do Estado, sem dúvida, mas a administração, esta pode ser privatizada ou remodelada segundo o conceito de parceria público-privada.

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