domingo, setembro 09, 2012

Julgar com independência - FLÁVIO DE A. WILLEMAN

O GLOBO - 09/09


O juiz não tem o dever de prestar contas das razões que o levaram a deixar de condenar alguém



A imprensa noticiou nos últimos meses a grande discussão jurídica que envolveu a possibilidade de o CNJ controlar diretamente atos de "indisciplina" de magistrados, antes mesmo da atuação das corregedorias locais dos tribunais. A palavra final do STF no julgamento da ADI 4638 pôs fim à controvérsia. Não pairam mais dúvidas sobre as importantes atribuições do CNJ, que não pode controlar o conteúdo das decisões judiciais. O CNJ não é instância recursal para reapreciar a correção e o mérito de sentenças. O CNJ não é um órgão jurisdicional!

O Judiciário nunca esteve imune ao controle de suas atividades administrativas e judicantes. O Judiciário, em sua função administrativa, é controlado pelos Tribunais de Contas e pelo Legislativo; também pode sê-lo pelos cidadãos, por meio de dois importantes institutos constitucionais: a ação popular, que permite a qualquer cidadão questionar atos administrativos de gestão do Judiciário que causem danos ao erário, e o direito de petição, que possibilita a qualquer cidadão noticiar à presidência de qualquer tribunal e ao MP irregularidade da qual tenha conhecimento. No plano das decisões judiciais propriamente ditas, há inúmeras instâncias recursais.

A imprensa tem divulgado o desejo do CNJ de controlar as estatísticas das decisões proferidas pelos tribunais do país, com ênfase no julgamento das ações civis públicas e ações de improbidade que, de um modo geral, buscam punir administradores públicos que causam danos ao erário ou violam princípios da administração pública. Esta atuação do CNJ revela-se de extrema importância, sobretudo para que o Judiciário tenha uma "radiografia" de como estas ações são "processadas" do sul ao norte do Brasil.

Causa estranheza e preocupação a pressão que os magistrados estão sofrendo para justificar os motivos pelos quais não têm condenado agentes públicos, réus em ações civis públicas ou de improbidade administrativa. O juiz, desde que fundamente o seu convencimento à luz dos fatos e do direito, não tem o dever de prestar contas das razões que o levaram a deixar de condenar. Há recurso para os inconformados. Esse constrangimento imposto aos magistrados viola a independência do Poder Judiciário e põe em xeque o estado democrático de direito.

Se comprovado o desvio de conduta, após o devido processo legal, no exercício da função administrativa ou judicante, que sejam os juí-zes punidos exemplarmente. O que não se pode permitir é obrigá-los a julgar predeterminados a condenar, com medo de serem expostos à mídia ou mesmo a um processo administrativo disciplinar no CNJ. Isto não é justiça; é injustiça inconstitucional!

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