quinta-feira, setembro 13, 2012

Abraços e beijinhos - MARCELO COELHO

FOLHA DE SÃO PAULO - 13/09


Não falta saber nem rigor a Barbosa; falta disposição para não ver intenções malignas a todo instante


QUANDO SE fala em "bate-boca", a impressão é que todos os envolvidos são desequilibrados ou perderam o controle.

Se houve "bate-boca" na sessão de ontem do Supremo, a responsabilidade coube exclusivamente ao relator do mensalão, Joaquim Barbosa.

Podemos admirar muito a minúcia com que ele analisa o escândalo e concordar com todos os seus votos.

Mas traços desagradabilíssimos da sua personalidade confirmaram-se ontem. Qualquer pessoa, no lugar de Ricardo Lewandowski, teria reagido de forma muito mais violenta do que ele ao ser atacado como foi.

Lewandowski começou tratando de duas acusadas do crime de lavagem de dinheiro, cuja situação, disse, era completamente diferente da dos outros réus. Ou seja, anunciava que iria condenar muita gente no final de seu voto.

Ayanna Tenório já tinha sido absolvida na segunda-feira. O problema era Geiza Dias, funcionária da SMPB, agência de Marcos Valério.

Tratava-se, disse Lewandowski, de personagem menor, subalterna, "transeunte" nos feitos da organização. Era ela quem informava, junto ao Banco Rural, o nome das pessoas que iriam sacar os cheques emitidos por Marcos Valério.

Lewandowski distribui cópias da carteira trabalhista de Geiza: ela ganhava cerca de R$ 1.500 mensais.

Pouco, para um crime tão sofisticado como o de lavagem de dinheiro. Leem-se trechos da correspondência eletrônica entre Geiza e funcionários do Banco Rural. Terminavam com abraços e beijinhos.

Conclusão de Lewandowski: havia certa "candura" da parte de Geiza, mandando esses emails, sem ocultar nada.

"Candura": o termo incluía uma provocaçãozinha amigável. Joaquim Barbosa já tinha estrilado quando o revisor usou a palavra em outra absolvição.

Tudo bem. Foi quando Lewandowski soltou o raciocínio fatal. Era importante ver o lado dos advogados, afirmou, porque é disso que se fala quando se requer a presença do "contraditório" no processo.

Barbosa interrompeu. "Vossa Excelência está insinuando que não levo em conta o contraditório no meu voto?" A pergunta não tinha razão de ser. Mas Barbosa foi daí para pior: reclamou de outros comentários de Lewandowski sobre o andamento "heterodoxo" do julgamento e pediu que ele se ativesse ao próprio voto, emitindo-o "de forma sóbria".

Como assim? Não estou sendo sóbrio? A reação de Lewandowski se fez sem elevar a voz. Explicou que estava dizendo isso apenas em atenção aos estudantes de direito que visitavam o tribunal etc...

Não era o lugar para preocupações acadêmicas, insistiu Barbosa. Houve panos quentes de Celso de Mello e Ayres Britto. Sempre fofinho, Lewandowski ainda disse que estava aprendendo com todos os votos, tal e coisa.

Barbosa continua, insaciável: todos temos suficiente saber para dar nosso julgamento.

Sem dúvida. Não falta saber, nem falta rigor, a Barbosa. Mas falta um mínimo de tranquilidade e disposição para não ver intenções malignas a todo instante. Qualquer hora, sentencia Lewandowski a vários anos de prisão também.

Um comentário:

Anônimo disse...

a reação de Lewandowski pareceu muito mais de cinismo do que de candura.