sábado, junho 16, 2012

A inércia comercial do Mercosul - ROBERTO GIANNETTI


O Estado de S.Paulo - 16/06


O incremento da competitividade no comércio exterior de qualquer nação deve congregar políticas econômicas eficazes nos níveis nacional e internacional. Internamente, medidas relacionadas às políticas tributária e cambial, bem como ações efetivas em infraestrutura, são essenciais para a manutenção de um ambiente propício à atração de investimentos, que resultem em ganhos diretos no comércio e na expansão dos serviços prestados. Essa estratégia, todavia, deve ser complementada pela busca incessante de complementaridades produtivas em âmbito regional e de acesso a novos mercados nos níveis bi e multilaterais.

Enquanto nosso governo tem corretamente procurado intensificar as ações relacionadas à diminuição de juros e, por consequência, à definição de uma taxa de câmbio mais competitiva aos exportadores, as tarefas a serem realizadas no âmbito internacional estão, em grande parte, estagnadas, sobretudo no que se refere à implementação de uma agenda de celebração de Acordos Preferenciais de Comércio (APC's).

Como se sabe, durante a Rodada Doha da OMC, iniciada em 2001 e atualmente paralisada, o discurso por uma regulação comercial abrangente e que atendesse às necessidades dos países em desenvolvimento fez-se presente por quase uma década. No entanto, concomitantemente a esse processo, mais de 150 APC's foram assinados no mundo, alguns, inclusive, ampliando o escopo regulatório da OMC (OMC plus ou extra). Durante esse mesmo período, o Brasil assinou somente 13 APC's, sendo 8 com países da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi) e apenas 5 extrarregionalmente, com países com pouca expressão comercial em nossa corrente de comércio (Índia, Israel, União Aduaneira da África Austral, Egito e Palestina).

Apesar de a crise financeira de 2008 ter reorientado as diretrizes de política comercial em nível global (haja vista a intensificação de medidas protecionistas em geral), potências e países emergentes demonstram que a negociação de APC's tem sido uma prioridade, sobretudo por conta da possibilidade de ampliação regulatória para além do nível multilateral.

Dessa forma, os EUA, que assinaram recentemente acordos com Peru e Colômbia, e a União Europeia estão engajados em negociações com diversos países, sobretudo os do sudeste asiático. Índia, China, Rússia e África do Sul também buscam ampliar a regulação de disciplinas comerciais em nível bilateral e negociam atualmente com diversos países. O Brasil, sob os ditames da Decisão 32/00 do Conselho de Mercado Comum do Mercosul, a qual obriga os membros do bloco a negociar em conjunto, está atualmente em processo de negociação apenas com a União Europeia.

Sabe-se que, apesar de o nosso país ser chamado recorrentemente à mesa de negociações por diversas nações, geralmente declinamos por conta de dois fatores cruciais: a obrigatoriedade em conciliar os anseios comerciais com os outros membros do Mercosul, os quais podem eventualmente evocar um viés mais protecionista (como é o caso da Argentina) e dificultarem o processo; e a ausência de uma estratégia interna bem definida, que congregue interesses do governo e do setor produtivo nacional no que se refere à assinatura dos APC's.

Especificamente no que diz respeito à agenda conjunta governo-empresariado, um estudo da Fiesp mostrou que, respeitadas algumas sensibilidades, a construção de uma estratégia proativa de acordos pode ser explorada. Dessa forma, o governo deveria ampliar os pequenos esforços até agora empreendidos no âmbito bilateral e prospectar, no setor produtivo, possibilidades concretas de engajamento em negociações bilaterais e regionais. Essa postura nos auxiliaria, inclusive, a estabelecer uma posição mais legítima com nossos parceiros do Mercosul e a pleitear com mais afinco a abertura de negociações de nosso interesse.

Ao contrário da Rodada Doha, em que éramos um dos líderes do processo negociador com propostas criativas e legítimas, no âmbito bilateral encontramo-nos em uma inércia negocial que faz com que se reduza nossa competitividade relativa nos mercados regionais e mundiais. Esse cenário precisa mudar, e a chave para isso está nas mãos do governo e do setor produtivo brasileiro.

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