quarta-feira, abril 04, 2012

A competitividade da indústria brasileira - ANTONIO C. DE LACERDA


O Estado de S.Paulo - 04/04/12


A questão da competitividade da indústria brasileira tem gerado intenso debate. O próprio governo federal tem reconhecido a prioridade do assunto, o que ficou especialmente claro na recente reunião da presidente com ministros e representantes do empresariado do País e no anúncio de ontem de medidas para incentivar o setor. Também se nota uma crescente mobilização incluindo os sindicatos dos trabalhadores, que corretamente têm encarado a deterioração do setor como uma ameaça.

A questão é que nos tornamos um enorme mercado consumidor, o sexto maior PIB do mundo, mas, por condições desfavoráveis de competitividade sistêmica, grande parte da demanda doméstica vem sendo atendida com o aumento das importações. Embora seja uma saída confortável no curto prazo, desperdiçamos divisas, empregos, renda e impostos, que poderiam agregar valor localmente. Isso é especialmente importante num quadro internacional de menor crescimento das economias.

A participação da indústria de transformação no PIB foi reduzida a menos de 15%, num claro processo precoce de desindustrialização. Enquanto isso, o coeficiente de importações cresceu em todos os segmentos, especialmente naqueles que exigem maior sofisticação, como o de máquinas e equipamentos, por exemplo, em que chega a 40% do total. O déficit comercial de produtos de elevada tecnologia atingiu US$ 80 bilhões em 2011 e continua se ampliando.

Mas alguns dos aspectos importantes sobre a questão ainda estão longe de um consenso. Sempre há quem busque desqualificar qualquer iniciativa, seja de política industrial, por parte do governo, ou de mobilização, pelos empresários e trabalhadores. A maioria dessas análises desconhece a estrutura industrial, assim como a lógica das decisões empresariais. Vale lembrar que o País se abriu ao mercado externo desde o início dos anos 90, mas não oferece, até hoje, decorridos mais de 20 anos, um ambiente competitivo em condições isonômicas com os nossos países concorrentes.

Uma visão ingênua do processo está em circunscrever os graves problemas enfrentados pela indústria do País como se fossem apenas demandas setoriais, corporativas. Engana-se quem imagina se tratar de um problema localizado. As empresas têm como se adaptar, aumentando o seu conteúdo importado. No limite, podem se transformar em meros representantes locais de indústrias oriundas de outros países. Embora sob o ponto de vista individual, microeconômico, a estratégia possa prolongar a viabilidade do negócio, é obvio que se trata de uma prática insustentável no longo prazo e danosa ao País.

No que se refere à desoneração tributária, financiamento e outros itens cruciais para as decisões empresariais, embora bem-vindas, as medidas anunciadas ontem não trazem novas vantagens competitivas. Os nossos concorrentes, como os chineses e coreanos, por exemplo, contam há muitos anos com condições melhores que as oferecidas no Brasil. Quanto ao financiamento, por exemplo, para citar um item importante, os produtores de bens de capital naqueles países têm acesso a linhas cujo juro cobrado é zero. Isso significa que tudo o que fizermos representa um avanço, mas não nos torna mais competitivos diante dos concorrentes externos.

O Brasil não pode abrir mão da sua indústria. Ao contrário de países como o Chile, cuja população total é inferior à da área metropolitana da cidade de São Paulo, ou mesmo a Austrália, não podemos nos dar ao luxo de viver da produção e exportação de commodities. Além disso, não há por que abdicar da indústria de transformação, justamente o diferencial que nos proporcionou o grande salto dado pela economia brasileira no século passado. O desafio do Brasil é, em vez de retroceder, avançar no processo, agregando mais valor em todas as cadeias produtivas, e incorporar novas tecnologias para diminuir a dependência de importados, assim como ampliar e diversificar nossas exportações.

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