sábado, março 24, 2012

O risco e os átomos - HÉLIO SCHWARTSMAN


FOLHA DE SP - 24/03/12

SÃO PAULO - Ao longo da semana, os experts Leonam dos Santos Guimarães, de um lado, e Ildo Sauer e Joaquim de Carvalho, de outro, se engalfinharam numa controvérsia acerca da segurança da energia nuclear.

Não sei praticamente nada sobre usinas atômicas, mas conheço uma ou duas coisinhas a respeito de polêmicas e da natureza humana. E a verdade é que os membros de nossa espécie, aí incluídos os especialistas, temos dificuldades terríveis para sermos objetivos. Quem evidencia isso muito bem é Paul Slovic, em suas investigações na "heurística do afeto". O nome é complicado, mas a ideia por trás dele não: as pessoas tomam decisões consultando mais suas emoções do que dados e cálculos racionais.

Num experimento de 2000 envolvendo por coincidência a energia nuclear, Melissa Finucane mostrou que a relação afetiva que temos com um objeto altera a percepção dos perigos que ele acarreta. Quem acha que os benefícios da manipulação atômica são altos menospreza seus riscos, e quem não vê utilidade nas usinas magnifica seu grau de ameaça.

Ela também provou que pessoas podem ser facilmente manipuladas: seus voluntários, quando expostos a informações que enalteciam os benefícios da energia nuclear, produziram declarações que minimizavam o risco.

Segundo Slovic, experts não são imunes à heurística do afeto. Eles apenas se valem de argumentos mais sofisticados para justificar suas preferências. Para o pesquisador, há situações em que a visão do público leigo é até mais rica que a dos especialistas. Estatísticas, afinal, registram apenas óbitos e anos de vida perdidos, enquanto pessoas comuns diferenciam entre "boas" e "más" mortes (com ou sem sofrimento), por exemplo.

Numa visão pessimista, Slovic, que é um dos mais respeitados especialistas do mundo em percepção do risco, chega a afirmar que a noção de "risco objetivo" não faz sentido. O corolário é que devemos ser mais críticos em relação à opinião dos experts.

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