sexta-feira, fevereiro 17, 2012

O mesmo topete de sempre - BARBARA GANCIA

FOLHA DE SP - 17/02/12


Lembrei que em 1979 eu tive um Corcel 2 da mesma cor de jaboticaba que o topete do Paul McCartney no Grammy



PLANETAS DESGOVERNADOS cruzam os céus seguidos por uma penca de cometas incontinentes. Falta pouco para o Armageddon e os sinais de que o flagelo cósmico vem vindo estão aí.

Ou será que o leitor acha normal ver Sir Paul McCartney participar do Grammy com aquela cara de vela derretida, batendo palminha na primeira fila, sem que milhões de pessoas vomitem em flashmob quando ele surge na tela? Como é possível aceitar que o sujeito transforme os Beatles numa marca de sabão em pó e ainda por cima vire um boneco de "Jornada nas Estrelas - A Segunda Geração" sem que isso cause comoção mundial?

Veja: nada tenho contra próteses. De espécie alguma. E o leitor é testemunha da minha falta de preconceito com perucas de todos os tipos, usadas por gente bem mais importante do que Sir Paul McCartney. Eu por acaso comentei a peça que orna a cabeça de nosso encantador ministro do Supremo, Luiz Fux? Quem sou eu para implicar com apliques, tranças, dreadlocks e bigodes alheios, não é mesmo? Que acelere, Ayrton quem deseja emular membros da alta corte britânica. Se cabelo fosse importante, não nasceria nos recônditos mais profundos.

O problema é quando um ícone da infância se transforma em José Sarney diante dos seus próprios olhos, no domingo à noite, em gloriosas 32 polegadas, em HDTV, enquanto você deglute sua marguerita.
Fiquei deprimida ao ver Paul abanando os bracinhos. Deu para perceber que o hoje rei da falsa modéstia nunca carregou o baixo do quarto do hotel até o elevador. E lembrei de um Corcel 2 que eu tive em 1979. Tinha a mesma cor de jabuticaba que o topete que ele usou no Grammy.

Mas bem que Nostradamus previu que o culto à personalidade ia fazer a humanidade terminar danada numa bola de fogo. E a Bíblia conta a história da mulher de Lot. Deus ordenou que ela parasse de olhar para trás a cada esquina para ver as revistas nas bancas. Quem mandou ficar reparando na capa da "Contigo", hein, madame Lot? A senhora foi prevenida de que seria transformada num ovinho de sal Cisne.

Dito e feito, o Todo-Poderoso flagrou-a bisbilhotando o novo corte de cabelo da Danielle Winits na capa da "Caras" e tascou-lhe um feitiço daqueles. Para piorar o castigo, colocou um chapéu vermelho (de amish playmobil) na cabeça dela. Pobre senhora Lot. Vaidosa como um cisne, acabou parecendo um patinho feio. Por dentro sal Cisne e, por fora, um ovo de chapéu de padre.

Há 2.000 anos salga refeições, um castigão. E pensar que olhava as revistas porque era casada com o chato do Lot, que ia de casa para o templo, do templo para casa. E ela sonhando em ir ao Grammy, ao Oscar, em passear de lancha com o Eike.

Também parei na banca nesta semana. Mas em vez de ficar petrificada ou com torcicolo, fiquei com labirintite. Imagine você que vi o Abílio Diniz duas vezes estampado em capas de importantes revistas mensais masculinas. "Ué?", pensei. "Será que ele comprou a Apple?" Nada. Numa das revistas, Abílio usava toda sua conhecida profundidade intelectual para ensinar a viver. Na outra reportagem, dava lição de tática futebolística.

Que bom que o mês que vem tem capa com o César Cielo e depois com o Bill Gates. E depois vem a comemoração pelo primeiro ano da morte do Steve Jobs. Não aguento mais o topete do Abílio. Digo, do Paul McCartney.

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