terça-feira, janeiro 10, 2012

Presente francês - GILLES LAPOUGE


O Estado de S.Paulo - 10/01/12


A dupla se refez ontem. O presidente francês, Nicolas Sarkozy, foi ver a chanceler alemã, Angela Merkel, em Berlim, já que o francês e a alemã decidiram, há alguns meses, assumir o comando da Europa.

Qual era a ordem do dia? Salvar a Europa, como sempre, mas Sarkozy dessa vez apresentou uma maneira de sair do buraco. Um remédio milagroso: a taxa Tobin. Essa taxa não é nenhuma novidade. Ela foi imaginada pelo Prêmio Nobel de Economia James Tobin, em 1972, e está parada há 40 anos, apesar de ser defendida por um economista da estatura de Joseph Stiglitz. Os partidários mais entusiastas dessa taxa são evidentemente os integrantes do movimento Attac, e os altermundialistas, que veem nela uma maneira de limitar a voracidade da economia financeira.

Esse é o presente que Sarkozy quer dar à Europa. Mais uma vez esse curioso homem de Estado pega todo o mundo no contrapé: líder da direita e há muito um adepto forçado do liberalismo ao estilo de Margareth Thatcher, antes de se ligar a práticas mais "dirigistas", hoje ele brande bruscamente um ovo que roubou do ninho da ultraesquerda, dos altermundialistas, e propõe que a Europa choque esse ovo.

Atacados por Sarkozy, todos os chefes europeus olham para o outro lado. Os ingleses, cuja economia já não é constituída por fábricas ou pastagens, mas por finanças, são ferozmente contra; os outros países dizem que essa taxa Tobin é estupenda, mas que é preciso estudar o assunto. Sarkozy está impaciente. Dentro de quatro meses ele concorrerá a um segundo mandato presidencial. Ele quer que a taxa Tobin seja criada à toda velocidade, antes das eleições.

Merkel fez careta. O que mais o "pequeno francês" vai tirar da cartola, esse tipo parecido com o ator Louis de Funès (É um dos grandes números de Merkel, quando está entre seus íntimos, ela imita Sarkozy emprestando-lhe os tiques e gestos de Louis de Funès.)? A Itália diz que é interessante, mas que essa Tobin deve ser criada no mesmo momento em toda a Europa. Os gregos não dizem nada: estão muito ocupados se afogando. Esse afogamento é em tempo integral. Em breve, por toda parte, a "magia" de Sarkozy será saudada como mirabolante e rejeitada por todos mais adiante.

Sarkozy, porém, não se acalma. Ele, que cobria essa taxa de opróbrio há dez anos, e que nunca fez nada para impô-la durante cinco anos de governo, eis que, à véspera de encerrar seu mandato, é tomado por uma necessidade premente: criar a taxa Tobin. E tanto pior se a França ficar de cavaleira solitária. Os outros países serão obrigados a seguir.

Na França, Sarkozy pegou todo mundo de surpresa. Os socialistas se mostraram prudentes. Somente a ultraesquerda achou a iniciativa sábia. Mas os empresários e o pessoal da bolsa e dos bancos, que sempre foram os queridinhos de Sarkozy, não sabem o que fazer. A muito liberal "patroa dos patrões", Laurence Parisot, disse secamente: "Seríamos todos perdedores". Os financistas são contra. Eles dizem que, se Paris se lançar sozinha nessa aventura, haverá o risco de "deslocalizações".

Como as operações são feitas eletronicamente, eles dizem que será muito fácil não fazer nada com base em Paris. As transações financeiras podem ser facilmente expatriadas para lugares onde os encargos serão mais leves, por exemplo, a City (distrito financeiro) de Londres.

Como explicar a estratégia de Sarkozy? Ele terá sido convertido subitamente às teses altermundialistas e decidido atacar o setor financeiro? Estará apenas fazendo fanfarronada? Ou será uma operação para se livrar de sua imagem de direita dura e de amigos ricos? "Estão vendo", ele dirá quando sua taxa Tobin capotar, "eu luto para moralizar o mercado, para fazer os especuladores devolverem o que ganharam indevidamente, e ninguém, nem mesmo os socialistas, quis me seguir".

Um blefe para seduzir uma parte da esquerda? Difícil ver claro nessa fumaceira generalizada. Com um outro, se poderia adivinhar, sob essa iniciativa astuta, uma tática, um artifício, uma tramoia. Mas com Sarkozy é difícil decifrar os meandros de sua ação. Hiperativo, meio sábio e meio louco, a um só tempo exasperante e comovente, Sarkozy é um espírito por demais barroco para se poder decidir se a sua taxa Tobin é uma manobra ou o efeito de uma convicção sincera.

Merkel nos esclarecerá, quem sabe. / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK

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