segunda-feira, janeiro 16, 2012

O Brasil sofre com problemas de ricos - GUSTAVO CERBASI

REVISTA ÉPOCA

Os brasileiros sempre conviveram com problemas de gente pobre. Pedintes nas ruas, favelas sitiadas, violência urbana, falta de água, filas no transporte público e no SUS e os incontáveis surtos de doenças decorrentes da falta de higiene ou de educação pública sempre foram a realidade aqui.

O Brasil vem se desenvolvendo e, aos poucos, o sofrimento dos mais pobres por falta de assistência básica tem diminuído. As estatísticas mostram que há mais hospitais, mais transporte público e mais educação, além do crescimento da renda, que aumenta o leque de oportunidades de consumo. Seria motivo de comemoração, mas temos agora uma nova categoria de dificuldades. O Brasil está começando a desfrutar os problemas de gente rica.

Apesar de haver maior oferta de serviços públicos de base, falta-lhes qualidade. A população que ganha mais não deseja usar o crescente transporte público, mas sim um automóvel novinho que o crédito permite comprar. Congestionamentos não são mais privilégio da saturada São Paulo. Hoje, centenas de cidades brasileiras apresentam níveis alarmantes de engarrafamentos.

Essa população que ganha mais está deixando o SUS e contratando serviços médicos em caros hospitais particulares. É comum aguardar mais de uma hora para fazer um simples exame de rotina naqueles hospitais que recebem a nata dos políticos, mesmo pagando milhares de reais por mês pelo plano de saúde.

Tenho ouvido relatos de gente que, ao tentar consulta com um médico recomendado, descobre que terá de esperar dois meses pelo atendimento – ao preço de um salário mínimo apenas pela primeira conversa.

Para matricular seu filho em uma boa escola, provavelmente você terá de se antecipar em pelo menos um ano para conseguir uma vaga. Se quiser comer no restaurante mais caro da cidade, terá de reservar com dois dias de antecedência. Se quiser viajar para fora do país, terá de fazer seu passaporte meses antes. Faltam cada vez mais serviços e qualidade para a população consumidora.

Cuidado com estatísticas que medem apenas o avanço sobre a pobreza. Não podemos descansar sobre os louros da vitória contra a miséria, pois os ex-miseráveis ainda sofrem as agruras da escassez. O Brasil carece seriamente de planejamento de longo prazo e de qualidade em seus produtos e serviços. É aqui que precisamos atuar mais.

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