sexta-feira, agosto 26, 2011

TUTTY VASQUES - Turismo catástrofe


Turismo catástrofe
TUTTY VASQUES
O ESTADÃO - 26/08/11

Tem turista brasileiro - ô, raça! - desconsolado em Manhattan. Gente que estava em Nova York no dia em que a terra tremeu na costa leste e, todavia, não terá nenhuma história para contar a respeito quando voltar de férias.
O terremoto sem pânico, feridos ou tumultos da última terça-feira na Big Apple foi tão mixuruca que uma boa parte da cidade só se deu conta do que tinha acontecido quando ligou a TV ou, no caso de estrangeiro a passeio, recebeu telefonema de parente preocupado em seu país de origem.
A sensação, como bem definiu alguém que saiu de Belo Horizonte com a família em excursão pelos Estados Unidos, "foi a de acordar em São Joaquim e ficar sabendo que nevou até agorinha mesmo, sô!".
A turma que já comprou quase tudo que tinha de comprar em Nova York torce agora para que o Furacão Irene não vire um ventinho de nada quando, a qualquer momento, chegar à Time Square.
Se der pra tirar uma foto de um guarda-chuva virado com o néon dos letreiros ao fundo já valeu a viagem!
Pode ser arriscado esperar até 11 de setembro pra ver se acontece alguma coisa de grande magnitude por lá. Vai que...

"Eu, hein!"De Paulo Maluf, questionado ontem pela imprensa sobre o tal acordo que teria negociado com a promotoria de Manhattan: "Vocês devem estar me confundindo com o Dominique Strauss-Kahn!" São, convenhamos, lábias diferentes.

Dúvida cruel"NEGROMONTE DE QUÊ?!"Entreouvido em um ponto de ônibus, dito por uma senhora que tentava entender a indignação de outro passageiro com o ministro das Cidades, Mário Negromonte.

Gordura estávelAmanhã faz uma semana que se diz no Corinthians que "Adriano precisa perder três quilos". Isso quer dizer o seguinte: o Imperador não emagrece um grama há seis dias.

UpgradeRubinho Barrichello ganhou uma motivação extra para o GP da Bélgica: com a volta de Bruno Senna à F-1, dificilmente ele será o brasileiro pior colocado na corrida. Ou não!

Bode expiatórioDeu na revista científica Nature: o fenômeno climático El Niño duplica o risco de guerras civis em países tropicais. Era só o que faltava, né não? Qualquer dia vão responsabilizar o aquecimento global pela corrupção nos países emergentes.

Tiro no pé
O que tem de corrupto em Brasília ameaçando assinar o pedido de CPI da Corrupção no Congresso é o que se pode chamar de fogo amigo premeditado. Coisa de louco!

Mal comparandoPrefeito de Campinas é como técnico de futebol: alta rotatividade no cargo!

Paranoia de sempreDepois de confundir tremor com terror, os americanos cismaram agora que a Al-Qaeda está por trás do furação que atingiu a costa leste dos Estados Unidos. 

ANCELMO GÓIS - Meirelles na Copa


Meirelles na Copa
ANCELMO GOIS
O GLOBO - 26/08/11

Ricardo Teixeira convidou Henrique Meirelles para ser o diretor-executivo da Copa de 14.

O ex-presidente do BC, cujo cargo na Autoridade Pública Olímpica é figurativo, deve aceitar.

Aliás...

Desde que o economista Carlos Langoni, também ex-presidente do BC, deixou o Comitê Organizador Local da Copa de 14 , ano passado, gente de dentro e fora do governo sentia falta de um nome de peso no posto.

Nocaute da Justiça

Mike Tyson já estava de malas prontas para vir assistir ao UFC, torneio dessa espécie de novo vale-tudo, amanhã, no Rio.

Mas a Justiça americana, terreno onde o ex-campeão mundial de pesos-pesados coleciona problemas, não autorizou.

Alô, brigões!...

Aliás, o TJ do Rio vai fazer um plantão na Arena Multiuso, na Barra, local do evento.

Os juízes Rafael Estrela, Marcel Laguna e Paulo Roberto Jangutta ficarão num ônibus para qualquer ocorrência.

A propósito...

Como lembrou Zuenir Ventura, qual é a graça de assistir a uma pessoa espancar outra?

Com todo o respeito.

Clube da Luluzinha

Dilma vai aproveitar a ida à Assembleia Geral da ONU, dia 21 de setembro, em Nova York, para participar de um colóquio de mulheres, a convite de Michelle Bachelet, ex-presidente do Chile e atual diretora da ONU-Mulher.

Partido da Bola

Túlio Maravilha, 42 anos, o velho atacante contratado pelo Bonsucesso, foi sondado para mudar o domicílio eleitoral e ser candidato à Câmara do Rio pelo PMDB.

O jogador é vereador licenciado em Goiânia.

Divulgação

ESTE ESTACIONAMENTO, na Rua da Lapa, é tão legítimo como uma nota de três reais. Controlado por um grupo de milicianos que cercou a área e pôs uma guarita sem qualquer autorização, vai deixar de existir hoje, a partir das 9h, quando a Subprefeitura do Centro iniciará seu desmonte para dar lugar a uma das praças do Programa Lapa Legal. E já vai tarde. Para varrer da paisagem mais este ponto de marginais, o subprefeito do Centro, Thiago Barcellos, sofreu até ameaças por telefone, registradas numa queixa à 5ª DP

Jovens fumantes

O Inca divulga segunda agora, Dia Nacional de Combate ao Fumo, o estudo "A situação do tabagismo no Brasil".

Apesar da onda antifumo, os números são alarmantes. Dos fumantes, 70% acendem o primeiro cigarro antes dos 20 anos.

Saiu na "Playboy"

A 3ª Turma do STJ condenou a Editora Abril a indenizar em R$17,5 mil uma advogada de São Paulo.

É que a "Playboy" publicou, em 2002, matéria sobre a noite paulistana, e ela aparecia numa foto, dançado numa boate. Para ela, havia no texto trechos ofensivos às frequentadoras.

Carnaval de Paes

Eduardo Paes passou o dia ontem em reuniões sobre o carnaval. O prefeito diz que as obras da Passarela do Samba estão no prazo:

- São estruturas modulares. Vai dar tempo.

Cidade do Samba

Paes também atuou para que, afinal, sejam feitas as obras dos barracões incendiados na Cidade do Samba, a cargo da Liesa.

A Delta, que fez a obra, receberá pelo serviço R$22 milhões, fixados pela seguradora Mapfre.

"Eu sou bandida"

A impagável Valéria ("Ah, como eu sou bandida!"), do "Zorra Total", da TV Globo, vivida pelo humorista Rodrigo Sant"Anna, estreia na Rádio Globo dia 5.

Terá um quadro no programa "Vale-Tudo", de Tino Júnior.

AeroBellizze

A Amaerj vai fretar um avião para levar 99 magistrados à posse do desembargador Marco Aurélio Bellizze, dia 5, em Brasília, no STJ.

Cena carioca

Dia desses, no Príncipe dos Galetos, no Centro, um cliente reclamou da conta:

- Não vou pagar um galeto inteiro. Eu pedi meio...

O garçom perguntou.

- Quantas coxinhas o senhor comeu?

- Duas - respondeu.

- Meio galeto só tem uma coxa - rebateu o da bandeja.

Para concluir...

O cliente se rendeu à matemática e pagou a conta integral.

Há testemunhas.

ILIMAR FRANCO - José Pimentel


José Pimentel
ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 26/08/11

A presidente Dilma Rousseff tem preferência pelo nome do senador José Pimentel (PT-CE) para substituir o deputado Mendes Ribeiro (PMDB-RS) na liderança do governo no Congresso. Como a presidente não quer problemas com o PMDB, isso ainda precisa ser negociado com o partido, que tem dois nomes para o posto: o deputado Marcelo Castro (PI) e o senador Eduardo Braga (AM).

Governo Dilma quer ganhar tempo

O governo quer vincular a votação da distribuição dos royalties do petróleo com a negociação da regulamentação da emenda 29, que define patamares mínimos de gastos na Saúde; o fim da guerra fiscal; e novos critérios de partilha do Fundo de Participação dos Estados. A presidente Dilma argumenta que os estados que saírem perdendo em cada uma dessas questões vão querer ser compensados pela União, mas que a fonte de recursos é uma só: o Tesouro Nacional. “Os governadores vão querer que eu pague a conta”, tem repetido a
presidente. A emenda 29 e os royalties estão pautados para setembro no Congresso.

"A unidade (do PMDB) não pode beneficiar só alguns, tem que trazer benefícios para todo mundo” — Geddel Vieira Lima, vice-presidente de Pessoa Jurídica da CEF

FLERTE. O ex-presidente Lula conversou ontem, por duas horas, no Instituto Lula, com o pré-candidato do PMDB à prefeitura de São Paulo, deputado Gabriel Chalita. O encontro teve o objetivo de manter os canais abertos. Na conversa, Lula reafirmou que, no PT, o melhor candidato é o ministro Fernando Haddad (Educação). O ex-presidente quer que o PT da capital decida quem será o candidato até o final deste ano.

Mata Atlântica

A presidente Dilma afirmou, em reunião com o PV, que, em um segundo momento, a intenção é expandir o Bolsa Verde para a Mata Atlântica. O benefício é de R$ 300, por trimestre, para as famílias que preservarem a Amazônia.

Ficha suja

Os senadores Pedro Taques (MT), Cristovam Buarque (DF) e o deputado Reguffe (DF) tentam barrar a entrada do prefeito de Manaus, Amazonino Mendes, no PDT. O principal argumento é que ele não seria um político ficha-limpa.

Eduardo Campos arregaça as mangas
Para eleger a mãe, a líder do PSB na Câmara, Ana Arraes, para ministra do TCU, o governador Eduardo Campos (PE) já esteve em quatro estados. Em um deles, Sergipe, o governador petista Marcelo Déda reuniu toda a bancada federal de seu estado. Campos conta com a neutralidade do Planalto. Os adversários de Ana Arraes são: Átila Lins (PMDB-AM), Sérgio Carneiro (PT-BA), Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e Jovair Arantes (PTB-GO).

Inconformado

O presidente dos Correios, Wagner Pinheiro, protesta: “Nossa proposta de reestruturação não tem relação com o projeto do governo FH. Ele previa a quebra do monopólio postal e o fatiamento dos Correios em várias empresas”.

Ele tem a força
Defenestrado do governo Dilma, o ex-secretário-executivo do Ministério da Agricultura Milton Ortolan foi resgatado da faxina pelos militares. Ele foi um dos agraciados, ontem, pelo Comando do Exército, com a Medalha do Pacificador.

 CONTRARIADO porque a oposição não queria votar ontem um crédito para as justiças do Trabalho e Eleitoral, o líder da minoria no Congresso, senador Jayme Campos (DEM-MT), explodiu: “Depois a gente sai do DEM, e vocês não sabem o porquê!”.
 O GOVERNADOR Tião Viana (PT-AC) e o senador Jorge Viana (PT-AC) não foram ao lançamento da précandidatura à prefeitura de Rio Branco da aliada Perpétua Almeida (PCdoB).
● NO SAL. O relator do processo do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP) no Conselho de Ética, o tucano Fernando Francischini (PR), é delegado da PF.

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE


Santo remédio
SONIA RACY
O ESTADÃO - 26/08/11

Depois da fusão Droga Raia/Drogasil, há quem jure que vem aí a união da Drogaria São Paulo com a rede carioca Drogaria Pacheco. A negociação estaria sendo tocada pelo Banco Espirito Santo.

Correndo por fora, André Esteves e sua Farmais.

1001 utilidades

Alice, mulher de Ronaldo Ferreira (controlador da Bombril), inaugura terça-feira estúdio que reproduz todas as atividades do lar. Com cursos gratuitos para profissionalização de domésticas. Nome? Casa Bombril.

E abrirá também, em breve, o Espaço Memória, contando a história da marca por meio da evolução das mulheres.

Poder do carisma

As ações da Apple caíam ontem enquanto crescia o número de pessoas que assistiam ao discurso de Steve Jobs na Universidade de Stanford, em 2005. O vídeo tem variações no YouTube e soma 5,5 milhões de acessos. Nele, Jobs fala sobre superação.
Passou?

Alckmistas ventilam a reabilitação de Guilherme Afif perante os tucanos. Além de turbinar as PPPs, o vice-governador tem sido interlocutor de importantes questões entre Alckmin e Kassab.

Teto de vidro

A Câmara dos Vereadores convocou, recentemente, instituições da construção civil para falar na CPI da Acessibilidade. Ironia: no 13º andar do edifício, onde funciona o RH da casa, só se chega pela... escada.

Gilberto Natalini, presidente da CPI, promete aproveitar a reforma prevista para resolver o problema.

Solito

Beto Amaral separou-se do sócio, Pedro Igor. E criou a Cisma Produções, cujo primeiro voo-solo é Hedwig, rock-musical que inicia temporada em Sampa hoje, no Teatro Nair Bello. Com presença do compositor Stephen Trask.

Little Kate

É motivo de comentários, no Lourenço Castanho, a festa de aniversário de uma estudante semana passada. A família reservou a suíte presidencial do Fasano para comemorar os 10 anos da menina.

Com direito a pantufas e travesseiros que traziam, bordados, os nomes das amigas.

Cidade 4?

Cobiçado também pela Prefeitura, o Estado saiu na frente. Desapropriou o prédio do Itaú, no centro de São Paulo. Valor estimado do ato? Algo em torno de R$ 20 milhões.

Vizinho ao Cidade 1, receberá setores do governo que hoje funcionam em prédios alugados.

Amigo é

Desconfia-se que o mercado de trabalho brasileiro esteja passando por uma mudança estrutural. Integrante da equipe econômica garante que índices de desemprego próximos a 10% "são coisa do passado". E pergunta se já não estaria na hora de rever a taxa de equilíbrio, hoje em torno dos 7%.

Afinal, como o IBGE informou ontem, o País vem registrando, há quase um ano, desemprego na casa dos 6%.

Sangue

Da série "isto é incrível". Estão quase esgotados os 1.600 ingressos para a exibição, ao vivo, do UFC Rio nos cinemas UCI pelo Brasil. Repetindo o sucesso do evento, que acontece amanhã no HSBC Arena.

Mutirão

Com a perda de mais um ministro no horizonte, Dilma parece estar correndo contra o relógio. Recebeu Haddad, pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, todos os dias esta semana.

Moda xadrez

A grife Daspre fará desfile em setembro na... Fiesp. Parte do Encontro Nacional do Projeto Começar de Novo. Com roupas confeccionadas por detentas paulistas, as presidiárias também farão as vezes de modelos.

Tem até vestido de noiva.

Mascote

Grupo flamenguista encabeçado por Patricia Amorim pretende adotar um urubu-rei do zoo do Rio. Custo? R$ 500 por mês. A ideia foi muito festejada no clube.

Na frente

Foi visto entrando no Instituto Lula ontem, na hora do almoço, Márcio Thomaz Bastos. Só uma visita?

Sai este mês livro escrito por Cesar Giobbi contando a história dos 20 anos da marca Tania Bulhões.

Mario Testino recebe homenagens por seus 30 anos de trabalho no mês de setembro. A começar pelo prêmio Moët & Chandon Étoile.

Oliver Mangels palestra, hoje na Defensoria Pública, sobre deficiência intelectual.

O Ministério da Cultura enviou e-mail negando que qualquer de seus dirigentes tenha emitido declaração que permitisse deduzir defesa de algo parecido com uma CPI, conforme publicou a coluna.

André Cencin pilota leilão de arte, segunda, nos Jardins.

O que Tiago Leifert e Eriberto Leão têm em comum? Vão palestrar sobre suas profissões para alunos do Dante Alighieri. Hoje e amanhã.

Ao ser escolhido curador da Flip, Miguel Conde assumiu um compromisso: não se engalfinhar com os... Convidados.

GOSTOSA


FERNANDO DE BARROS E SILVA - A faxina do Ferreira

A faxina do Ferreira
FERNANDO DE BARROS E SILVA
FOLHA DE SP - 26/08/11 

SÃO PAULO - O assunto é chato, mas importante. Há dois anos, a Corregedoria da Polícia Civil foi transferida para o âmbito da Secretaria da Segurança Pública. Saiu das mãos do delegado-geral e passou a funcionar subordinada diretamente a Antonio Ferreira Pinto.
Foi uma mudança institucional que contrariou muita gente, exatamente porque deu resultados: cerca de 950 delegados, quase um terço dos 3.200 da Polícia Civil, estão sob investigação da corregedoria. Muito deles respondem por faltas leves, é fato. Mas há também na corporação uma corrupção endêmica que está sendo enfrentada como tal pela primeira vez, sem poupar quadros históricos da cúpula.
O deputado estadual Campos Machado (PTB) tentou aprovar nesta semana um projeto de sua autoria que devolve o comando da corregedoria ao delegado-geral. Não conseguiu por falta de quorum.
Mas o lobby de uma certa banda da polícia que Campos vocaliza contou com o apoio do PMDB e de metade das bancadas do DEM e do PT -uma união esdrúxula a favor do retrocesso. O PSDB e outros aliados do governo obstruíram a sessão, orientados por Alckmin.
A corregedoria da polícia desde sempre foi um órgão de fachada, sem autonomia ou disposição para punir corruptos, suscetível à ação das quadrilhas ou à pressão corporativa. A iniciativa do notório parlamentar para devolvê-la ao regime anterior, submetendo-a ao controle da polícia, representa um passo inequívoco para esvaziar suas atribuições e aplicar, assim, um golpe na faxina do Ferreira.
Este não é, sabemos, o único cancro da polícia paulista. Exemplos de brutalidade e de desrespeito sumário aos direitos humanos ainda são comuns, sobretudo na PM.
A rixa histórica entre as duas polícias voltou a recrudescer. A banda podre da Civil vem explorando casos de truculência da Militar para atingir o secretário. Cabe a ele desarmar essa cilada. E a Alckmin segurar a tropa de Campos Machado.

GUSTAVO PATU - Ortodoxia de ocasião

Ortodoxia de ocasião
GUSTAVO PATU
FOLHA DE SP - 26/08/11 

BRASÍLIA - Nem Dilma Rousseff nem Guido Mantega são conhecidos pela fé nas virtudes redentoras da contenção do gasto público. E se o Planalto e a Fazenda não professam essa crença, não é o resto do governo que vai.
Mas a administração petista, desde Lula, é racional e pragmática. Sempre trata de produzir os resultados necessários -ou, ao menos, as expectativas de resultado- para evitar que a economia desande a ponto de ameaçar seu projeto de poder. Como agora.
Está em curso uma bem-sucedida combinação de aumento da receita e, em menor grau, de controle das despesas, cujo objetivo é combater o excesso de inflação nascido do excesso de gastos do ano eleitoral. Em contrapartida, há uma conspiração de eventos e humores para pôr fim ao purgatório do cumprimento pleno das metas fiscais.
Já está previsto em lei o maior reajuste do salário mínimo desde o pós-mensalão, em 2006; o último pacote de reajustes parcelados para os servidores públicos, de 2008, encerrará seus efeitos, e já há greves entre algumas categorias.
Há centenas de obras prioritárias em atraso, incluindo promessas de campanha, Copa e Olimpíada; há milhares de obras não prioritárias com as quais deputados e senadores pretendem atender suas bases nas eleições municipais.
O sinal mais evidente de que toda Brasília espera por mais gastos é a recente defesa, por Mantega, da preservação da austeridade, mesmo com a piora do cenário global ameaçando o crescimento doméstico. Admitir, agora, um relaxamento precipitaria uma corrida entre generosidades legislativas e executivas, enquanto ainda nem se sabe o efeito da crise na arrecadação.
Nessas horas, o discurso ortodoxo vem a calhar -em particular, a ressurreição da tese de que mais alguns anos de dura disciplina permitirão, finalmente, a derrubada dos juros. Afinal, quem precisa acreditar é quem escuta.

RUY CASTRO - Gaiolas abertas

Gaiolas abertas
RUY CASTRO
FOLHA DE SP - 26/08/11 

RIO DE JANEIRO - Outro dia, flanando pelo centro, atravessei a praça Tiradentes, sem grades, depois de anos cercada. É o primeiro passo da Prefeitura do Rio, apoiada por arquitetos e urbanistas, para libertar as praças cariocas -devolvê-las à cidade, como eram no passado.
Se a ausência de grades atrairá mendigos, drogados e assaltantes, só a prática dirá. Os antídotos contra essas mazelas são urbanismo, iluminação e policiamento -o que, afinal, toda municipalidade deve oferecer a qualquer via pública. Mas, além da ação que vem de cima, a atual reconquista do Rio pelo carioca está contando com a cabeça do cidadão. Ele se deu conta de que a paranoia preventiva, vigente há décadas, contribuiu para a satanização da cidade.
Com o fim das grades nas praças, cabe aos prédios particulares seguir o exemplo. Alguém ainda se lembra de como as grades se instituíram nos prédios do Rio nos anos 80 e 90? Não foi por causa de bandidos ou ladrões -e nem o Rio, mesmo na pior fase, sofreu particularmente com assaltos a residências. Foi por causa da população de rua, que, em certo momento, pareceu se multiplicar.
Para evitar que mendigos dormissem sob as marquises e junto às escadas e portarias, os primeiros edifícios se cercaram. Síndicos e porteiros viram nisso um filão. Alegando a violência, e em conluio com os fabricantes, começaram a impor as grades -contra a vontade de moradores sensatos, vencidos nas reuniões pelos condôminos mais impressionáveis. E assim, rapidinho, fomos nos engaiolando.
Bem, as coisas mudaram. Nos últimos anos, todos os índices de pobreza e insegurança no Rio vêm caindo. Por inércia ou má-fé, a máfia das grades continua -mas, quero crer, apenas por enquanto. Talvez já não seja tão fácil para um síndico, hoje, por mais cínico, cercar um prédio. Resta ao carioca libertar-se das jaulas que já plantou.

BARBARA GANCIA - Vidão de cachorro

Vidão de cachorro
BARBARA GANCIA 
FOLHA DE SP - 26/08/11

Nos últimos 15 anos, o leitor conviveu com meu cão e personal trainer, Pacheco Pafúncio (1996 - 2011)


ESCREVO COM o estrupício aninhado sob os meus pés. Também não estou lá grande coisa. Desde a noite de quarta, quando voltamos do hospital veterinário, venho tentando me conformar com mantras repetidos em sequência: "Ele levou uma vida gloriosa; viveu mais de cem anos caninos; tomou água de coco no dia em que se foi".
Nos últimos 15 anos, o leitor desta coluna se acostumou a conviver com meu cão e personal trainer, Pacheco Pafúncio. Nesse período, tornou-se rotina sermos parados na rua por gente interessada: "Este que é o famoso Pacheco Pafúncio?". E o Pachecão lá parado com ar de sonso, esperando a conversa terminar para dar prosseguimento à caminhada. Sem a menor ideia de que eu o havia transformado numa espécie de Lassie do jornalismo tapuia.
Para seu núcleo íntimo, composto pelo estrupício, ou seja, por meu outro cão, o também salsicha Ziggy Stardust (ou Ziggy Zagallo, aquele que, a partir de hoje, vocês vão ter de engolir), é evidente que ele era bem mais do que uma celebridade das colunas e revistas de amenidades. Para nós, ele era o SuperPacheco, o melhor cão do mundo.
Nos últimos tempos, porque um era idoso e o outro não, e cada um tinha seu ritmo, eles saíam para passear separados. Quem ficava o fazia de focinho grudado na porta até que ela se abrisse novamente. O reencontro sempre era o de velhos amigos que não se viam há décadas. "Pacheco, você por aqui?", "Ziggy, querido, há quanto tempo!" Eu ficava comovida com a camaradagem. Nunca o ancião usou do seu privilégio de chefe de matilha para submeter o caçula.
Pacheco era o nosso "metrônomo", foi o impressionante caso do cão que abanou o rabo desde o primeiro ao último dia de vida, que morreu de velhice sem nunca ter importunado ninguém e sem jamais ter cometido um malfeito.
Podemos descontar como fraqueza momentânea -ou quem sabe computar como uma forcinha a mais na dieta da moça- o dia em que ele deu uma lambida no sorvete de cone da gorda sentada ao nosso lado no banco da Brunella.
Meu personal trainer em forma de quadrúpede era tão especial que arrancou a ponta do dedo da minha cunhada em uma única e asséptica dentada. Outro teria causado uma infecção generalizada ou passado alguns momentos mastigando a carne sadicamente feito chiclete Nicorette -castigo inclusive merecido se levarmos em conta o grau de debilidade mental da brincadeira que desencadeou a mordida.
Fato está que, para o Ziggy e para mim, Pacheco possuía o dom da infalibilidade, nós o víamos como um Dalai Lama de bigodes e rabo.
Na última quarta-feira, cheguei em casa para encontrar meu velhinho cardíaco ofegante e quase sem movimento. Peguei-o com o máximo cuidado e procurei uma posição que facilitasse sua respiração. Percebi alguma intenção e coloquei meu rosto perto do seu focinho. Com muita dificuldade, apenas com a pontinha da língua ele conseguiu lambiscar a minha bochecha.
Em qualquer outra circunstância, eu teria limpado o rosto na hora. Desta vez não. Consegui colocá-lo no carro e ele chegou ao hospital quase desfalecido.
Levaram-no para a emergência e não o vimos mais até que vieram me chamar. "Ele está tendo uma parada cardíaca, a senhora quer tentar reanimá-lo?" Pedi para ser levada até ele e, com o Ziggy e comigo ao seu lado, Pacheco Pafúncio foi sedado. Sobramos o estrupício e eu.

ROBERTO FREIRE - O Brasil tocado em tom menor


O Brasil tocado em tom menor
ROBERTO FREIRE
Brasil Econômico - 26/08/2011

Enquanto a propaganda oficial trombeteia os benefícios do Programa Brasil Maior, a realidade é a silenciosa dependência da China

Lançado como importante instrumento de competitividade de nossa indústria, o programa “Brasil Maior”, urdido pelo Ministério da Fazenda, sob a regência de Guido Mantega e apresentado como a política industrial do governo Dilma — mas buscando, basicamente, produzir uma agenda positiva em um governo subordinado, cotidianamente, à agenda da corrupção — começa a fazer água e a despertar a desconfiança de setores que seriam beneficiados com o plano.

Descobriram os empresários dos setores calçadista, moveleiro e têxtil que poderiam arcar com uma carga tributária maior pelo fato de a proclamada desoneração da folha ser acompanhada da elevação do imposto sobre o faturamento bruto dessas empresas. Simplesmente porque a fórmula mágica que foi apresentada, segundo estudos das assessorias econômicas de tais setores, não representa desoneração real, como alardeado pela própria presidente Dilma Rousseff. Ao contrário, em alguns casos, haverá até mesmo o pagamento de mais impostos.

Este é o resultado de uma política industrial feita no afogadilho, que não tem por finalidade resolver os reais problemas da indústria: falta de infraestrutura física e humana, alta carga tributária, juros escorchantes, taxa de câmbio que ajuda os importadores, etc. São causas profundas de nossa perda de competitividade internacional. Em vez de se preocupar com isso, o governo quer é produzir boas notícias, buscando reproduzir a estratégia midiática de seu antecessor. Fiel a seu mestre, a presidente Dilma prefere o faz-de-conta da publicidade ao enfrentamento das verdadeiras causas dessa situação.

Um dos motivos apontados pelos representantes desses setores que tornam inócuas as medidas do governo é que as indústrias escolhidas para fazer parte do projeto-piloto de desoneração da folha de pagamento são as que mais enfrentam concorrência de importados, barateados pelo generoso câmbio que tem apreciado nossa moeda, esse sim um problema real.

Além isso, dois preocupantes fenômenos ocorrem sem chamar a devida atenção do governo: nossa crescente dependência do mercado chinês, tornando-nos meros exportadores de matérias primas e de commodities, e os sinais vindos da indústria nacional, que deverá puxar para baixo o crescimento da economia nacional neste ano, por conta da política cambial do governo e da retração do consumo, fruto do cenário de incertezas que ronda a economia mundial nesse recrudescimento da crise de 2008.

Isso sem falar dos investimentos, que não estão se expandindo na velocidade e taxas projetadas, ao ponto de empresas de consultoria, como a Tendências, por exemplo, trabalhar com uma retração de 0,9% no segundo trimestre em relação ao primeiro. Assim, já foi revisto o crescimento do PIB do segundo trimestre de 1,1% para 0,7%, o que impactará negativamente o crescimento anual da nossa economia.

Enquanto a propaganda oficial trombeteia, em todos os tipos de mídia, os benefícios do Programa Brasil Maior, carro-chefe de uma pretendida política industrial do governo, a realidade é a crescente e silenciosa dependência da China e o contínuo processo de estagnação e declínio de nossa indústria.

Ao contrário do ufanismo do governo, o que vemos é um país sendo tocado em tom menor, com a incompetência gerencial tão marcante no lulodilmismo.

Roberto Freire é Presidente do Partido Popular Socialista (PPS).

JOSÉ SIMÃO - Ueba! Eu vi um Sarneycóptero!

Ueba! Eu vi um Sarneycóptero!
JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 26/08/11 

E diz que o Itaquerão vai ficar pronto até 2012. Pra poder sediar o fim do mundo! Rarará!


Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Piada pronta direto da Líbia: "Jornalistas são transferidos para o Hotel CORINTHIA". Continuam presos. Rarará! Foram transferidos pro Itaquerão! Colchonete cinco estrelas! Aliás, diz que o Itaquerão vai ficar pronto até 2012. Pra poder sediar o fim do mundo.
E adorei a lista das mulheres mais poderosas da "Forbes": 1) Angela Merkel; 2) Hillary Clinton; 3) Dilma Rousseff; 60) Gisele Bündchen. Agora bota todas peladas e refaz a lista. Classifiquem de novo! Rarará!
E o chargista Dalcio diz que o Sarney lançou uma nova obra-prima: "Helicópteros de Fogo". E a capa é a foto de um Sarneycóptero! E o Gaddafi? O Kagadafi! Continua o leilão de caftans exóticos. Eu quero todos!
Aliás, eu quero aquele banco dourado em forma de sereia com a cara da filha do ditador. Coleção kitsch! E eu tenho uma foto do Gaddafi com aqueles caftans exóticos que tá parecendo uma drag. KADRAG. Muammar Kadrag! E o chanceler da Líbia disse que a guerra acabou. Mas os combates continuam. Adorei esta: a guerra acabou, mas os combates continuam. Rarará!
E Palestina e Israel? Esta é a realidade do Oriente Médio: toda vez que tem ameaça de paz, eles saem brigando. É muita guerra mesmo, viu! Como já dizia o filósofo Bronco Ronald Golias: a civilização não se comportou!
E o filho do Neymar devia se chamar Gansinho! Rarará! Mamãe, eu pari um ganso! Rarará! E esta do Sensacionalista: "Filho do Neymar faz dez embaixadinhas no teste do pezinho". E já foi contratado pelo Real Madrid? Agora já tão contratando brasileiro na barriga da mãe!
E sabe como se chama o matemático que analisa a queda do Grêmio para a segundona? TRISTÃO Garcia! Rarará! É mole? É mole, mas sobe! Ou como disse aquele outro: é mole, mas trisca pra ver o que acontece! Rarará!
O Brasileiro é Cordial! Mais uma placa do Gervasio na empresa dele lá em São Bernardo: "Se eu descobrir quem foi o morto de fome que comeu a minha coxa de frango e jogou o ossinho na pia, vou pegar esse ladrão de galinha e fazer ele engolir uma bola de basquete até obrar um ovo de avestruz. Conto com todos. Assinado: Gervasio". Ueba! Nóis sofre, mas nóis goza!

EDITORIAL - O GLOBO - Barreiras para isolar o STF da vida política


Barreiras para isolar o STF da vida política 
EDITORIAL 
O GLOBO - 26/08/11

O pedido de aposentadoria antecipada da ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal, alimenta a longa discussão sobre a regulação da mais alta Corte do país. Não só acerca da forma como ela é constituída, como sobre o regimento da sua própria magistratura.
A saída precoce da ministra, assim como ocorrera há não muito tempo com Nelson Jobim, coincide com o fato de que oito anos de governo Lula e, no mínimo, quatro de Dilma Rousseff garantem a um mesmo grupo político o invejável poder de nomear a grande maioria dos 11 ministros do STF. E, a depender das circunstâncias, todos. Não que haja uma relação direta entre a corrente político-ideológica do presidente e o voto na Corte do ministro indicado por ele, mas, em nome da necessária diversidade e independência da mais alta instância da Justiça, conviria criarem-se mecanismos que protegessem o Supremo na eventualidade de um longo ciclo de governo de uma mesma aliança partidária. A não linearidade entre posição política do presidente e ministro indicado é comprovada por Carlos Alberto Direito, já falecido, um jurista a léguas de distância da ideologia petista, mas indicado pelo presidente Lula. Porém, quanto mais barreiras para impedir infiltrações na Justiça vindas de outros poderes, melhor para a democracia. Não é o caso, óbvio, de se acabar com o mandato de quatro anos no Executivo, com uma reeleição consecutiva - modelo ainda em teste, mas já com bons resultados. O melhor caminho é estudarem-se maneiras, por exemplo, para desestimular aposentadorias precoces de ministros. A alternativa da vitaliciedade, como nos Estados Unidos, não é a melhor, por dar margem a constrangimentos desnecessários. Vale debater um sistema de mandato fixo - 12 anos, por exemplo -, em que a aposentadoria antes da idade máxima - hoje, 70 anos - seria punida por um redutor de proventos. A importância do desestímulo à retirada do Supremo antes do tempo está em que, se houver muitas aposentadorias em pouco tempo, um mesmo presidente poderá nomear todo o Pleno da Corte.
A questão é mais grave no Brasil porque, ao contrário dos Estados Unidos, o nome enviado pelo chefe do Executivo ao Senado é sempre aprovado, sem o escrutínio rígido que acontece naquele país. Na gestão de George W. Bush, diante da reação negativa ao ser anunciado seu escolhido, uma advogada, consultora jurídica da Casa Branca, ele sequer formalizou o encaminhamento dela ao Senado. Espera-se que o amadurecimento da democracia brasileira leve a se dar às indicações ao STF o peso que têm na realidade.
Caberia, ainda, ao Congresso apressar a tramitação de um projeto de emenda constitucional, de autoria do senador Pedro Simon (PMDB-RS), destinado a aumentar o limite de idade para a aposentadoria do servidor público de 70 para 75 anos. A apelidada "Emenda da Bengala" atualiza uma regra superada pelo aumento da expectativa de vida da população e, em particular, pela longevidade crescente das pessoas envolvidas em atividades intelectuais. O trabalho do Supremo ganharia com juízes mais experientes e maduros, e haveria uma estabilidade maior no Pleno, que se descolaria ainda mais das flutuações da vida político-partidária.

ALON FEUERWERKE - Dança com dois pares


Dança com dois pares
ALON FEUERWERKE
Correio Braziliense - 26/08/2011

Dilma substituirá quando for para substituir, segurará a onda quando as águas no Congresso parecerem agitadas demais, deixará ao relento os personagens de que não gosta ou que pretende enfraquecer

A presidente da República usa retórica para dar o ritmo da reconcentração de poder. Num momento, flerta com a ideia de estar em curso a tal faxina. Noutro, cita Roma, Joana D"Arc e o que mais for para acalmar os preocupados e sugerir que não haverá caça às bruxas.

Na resultante, apenas a constatação de a suposta faxina continuar o que sempre foi. Um mecanismo legitimador da retomada do controle sobre a máquina, pulverizada por razões defensivas ao longo dos anos de Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio do Planalto.

Esta é uma operação na qual vale a regra orwelliana da Revolução dos bichos. Todos são iguais, mas uns são mais iguais do que os outros. E o que torna uns mais iguais? A densidade do candidato a faxinável e a conveniência da dona da caneta. Variáveis interdependentes.

No episódio do Ministério dos Transportes, o ministro do PR recebeu sinal claríssimo de que deveria pedir o boné. O sub foi chamado ao palácio para reunião de rotina, contornando a autoridade do chefe, que nem sequer tinha conhecimento da atividade.

O episódio dos Transportes fundou a ilusão sobre a faxina ampla, geral, irrestrita e sem freios.

Nos movimentos a partir dali a coisa não segue sempre o mesmo script. Mas o resultado final é um só. Sai o alvejado e entra alguém mais próximo da presidente. Aconteceu na Agricultura, onde o ministro do PMDB já havia se transformado num ônus político para o padrinho, o número 2 da República.

Como também na única troca até agora que nada teve a ver com acusações de malfeitos, no Ministério da Defesa.

No PP, o verbalmente ousado ministro das Cidades sentiu o bafo quente do tigre e resolveu mostrar os dentes. Encomendou para si uma passagem de volta à Câmara dos Deputados.

Aos alvos da vez, resta torcer para estar do lado certo, conforme a conveniência momentânea da presidente. Que pode dançar com a opinião pública ou com a base parlamentar.

Mas ela está é bailando com os dois dançarinos, cada um a segurar uma mão presidencial. Certa hora Dilma olha para um, depois para outro. Conforme a necessidade.

E cada um deles se acha, no seu momento, o tal.

Não há maior risco à estabilidade do governo, pois nem a opinião pública, nem a oposição somariam fileiras com vítimas da faxina para colocar em questão a liderança presidencial.

Pode haver uma turbulência aqui, uma rebeliãozinha ali. Ocuparão algum espaço no noticiário, mas Dilma prosseguirá fazendo só o que bem entende.

Substituirá quando for para substituir, segurará a onda quando as águas no Congresso parecerem agitadas demais, deixará ao relento os personagens de que não gosta ou que pretende enfraquecer. Especialmente se o alvo veio como herança.

Fingirá não ser com ela quando o vespeiro parecer arriscado demais. Mas quem se interpuser no caminho estará marcado.

O pós
A revolução líbia segue o rumo, com a dúvida razoável sobre o pós-Kadafi. Instituições não se criam de uma hora para outra, e a ansiedade é saber que novo líder substituirá o deposto. Para ver como a banda vai tocar.

É razoável supor um cenário de conflito, com grupos apeados do poder recorrendo inclusive ao terror para tentar inviabilizar a estabilização da nova ordem.

Assim vai o Iraque, onde com Saddam Hussein mandava a minoria sunita, removida do mando pela invasão americana e substituída por uma aliança majoritária curdo-xiita.

Com o tempo, a insurgência terrorista deixou de ser principalmente antiamericana, tornou-se antixiita. E lateralmente anticurda.

Sistemas políticos autocráticos suficientemente longevos produzem redes abrangentes e cristalizadas, de dependência e lealdade, na estrutura estatal e nas redondezas. Com a repentina mudança política, a turma fica sem o chão. Ou sem o sustento.

Nas forças vitoriosas, a expectativa é ocupar precisamente esse espaço.

Nas derrotadas, resistir. Até faltar completamente o oxigênio.

DORA KRAMER - Era vidro e se quebrou


Era vidro e se quebrou
DORA KRAMER
O Estado de S.Paulo - 26/08/11

Qual a razão de a presidente Dilma Rousseff resolver pagar o preço junto à opinião pública de um recuo naquilo que seus próprios assessores até outro dia denominavam com orgulho de "faxina" ética, anunciando aos partidos aliados que não fará novas demissões?

Pode ser apenas um recuo tático. Pode ser que a presidente tenha decidido dar uma meia trava na ofensiva contra a corrupção em seu ministério e contra comportamentos inadequados de seus ministros, em observância ao princípio segundo o qual para avançar é preciso retroceder.

Pode ser também que a presidente esteja querendo demonstrar que não será pautada pela imprensa nem pelas brigas internas das bancadas governistas no Congresso.

Podem ser essas e outras razões não detectáveis a olho nu que levaram a presidente a, neste momento, dar o dito pelo não dito dizendo que nunca disse o que foi perfeitamente ouvido.

Mas pode ser também que a presidente esteja simplesmente exercitando o estilo de hesitações, de decisões em ritmo de vaivém, bastante marcantes nos primeiros dois meses de governo.

O mais provável mesmo é que a presidente Dilma Rousseff esteja diante das consequências da falta de um planejamento específico para levar em frente uma sistemática de ação com começo, meio e fim.

Dilma atuou nessa questão da dita faxina sempre a reboque dos acontecimentos. Quando eles se acumularam e se atropelaram é possível que ela tenha se dado conta de que não controla todas as variáveis em jogo. Não controlando, corre o risco do descontrole e, portanto, melhor parar antes que seja tarde.

Mas, com isso, se de um lado em tese acalma a "base" - que não se acalmará por tão pouco, diga-se -, de outro deixa órfã aquela parcela da sociedade que gostou do que estava vendo e embarcou no apoio à presidente, em alguns casos deflagrando movimentos de engajamento na empreitada em prol da recuperação da ética como valor social e, sobretudo, institucional.

Alguma resposta o governo terá de dar ao entusiasmo dessa gente. Alguma explicação precisará ser oferecida para a manutenção de Pedro Novais e Mário Negromonte nos Ministérios do Turismo e das Cidades.

Um aceitou trabalhar com uma estrutura "estourada" pela Polícia Federal e outro disse impropriedades muito mais impróprias que aquelas que custaram o cargo a Nelson Jobim. E a denúncia, feita ao Planalto, de que Negromonte comprava apoios à razão de R$ 30 mil cada?

A presidente sempre poderá dizer que não fez o que pretendia fazer porque foi impedida por uma conjuração de malfeitores acantonados no Congresso Nacional.

O problema dessa versão é que tem pernas curtas. No presidencialismo quase imperial do Brasil o governo quando quer e se empenha de verdade ganha todas. Desde que saiba o que está fazendo, que tenha claro aonde, como e por que quer chegar.

Um exemplo: quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso quis privatizar o sistema de telecomunicações, enfrentou resistências enormes da "base", pois as "teles" eram poderosos feudos de empreguismo e um instrumento de manejo da maioria congressual que parecia impossível de ser quebrado. No entanto, se fez. Com método, tempo, poder de comando, capacidade de convencimento e foco na meta.

Não parece ser o caso do combate à corrupção iniciado pela reação rigorosa de Dilma diante de denúncias e que por enquanto se pode afirmar que durou o exato tempo da reação dos atingidos.

Presentes e futuros, pois o PT teme que venha a ser a próxima vítima do fogo amigo (?) e a presidente seja obrigada a agir com igual rigor.

Haverá uma segunda fase, um recomeço da ofensiva? É a questão se que põe para uma resposta que no momento só pode ser depende.

E depende primordialmente de Dilma Rousseff se dispor a tomar para si o controle das nomeações nos ministérios, no lugar de transferir essa prerrogativa aos partidos.

Agindo como agiu na composição primeira da equipe, a presidente torna-se refém dos humores das bancadas, das artimanhas, do jogo de pressões, dos dossiês e permite que seus ministros defendam os interesses dos respectivos partidos em detrimento dos interesses do governo.

Morte e vida Severina - Letícia Lins



Morte e vida Severina

Violentada pelo pai, agricultora é absolvida de mandar matá-lo para evitar que filha sofresse o mesmo destino

Letícia Lins



RECIFE. Acusada de ter mandado matar o próprio pai — que começou a violentá-la ainda menina — a trabalhadora rural Severina Maria da Silva, de 44 anos, foi julgada ontem por júri popular e absolvida por unanimidade, mesmo sendo ré confessa. Ela viveu uma relação incestuosa com o seu agressor, com o qual chegou a ter 12 filhos, dos quais cinco estão vivos. Mas decidiu se vingar quando Severino Pedro de Andrade deu sinais que ia fazer com a filha-neta, então com oito anos, a mesma coisa que fizera com ela. A lavradora não conseguiu conter a emoção ao recordar os momentos mais dramáticos de sua história.

—- Fui obrigada a fazer isso, porque ele quis abusar de minha filha e isso eu jamais aceitei. Eu não ia aguentar ver a menina passar pelo mesmo sofrimento que passei, quando tinha nove anos. Eu não aceitei, e a solução foi fazer isso com ele. Espero vencer e que a Justiça entenda o meu desespero — afirmou ela ontem, ao chegar à 4a- Vara do Tribunal do Júri, no centro da capital. O trauma da acusada, no entanto, era muito maior, como revelou durante a audiência.

Pouco depois de ter sido estuprada pela primeira vez pelo pai, a sua própria mãe ajudou o maníaco a abusar mais uma vez da menina, depois que soube da relação sexual entre o marido e a filha. Ela confessou que desesperou-se ao lembrar da falta de apoio da mãe durante sua dor:

— No dia que ele abusou de mim, no caminho do roçado, a minha mãe foi me buscar na minha cama, onde eu e minhas irmãs, nós estava (sic) dormindo. Ela me levou para a cama dela, fez com que eu ficasse de bruços, ela segurou nas minhas pernas e mandou ele fazer o que queria. Uma irmã do agricultor, Otília Maria da Conceição, de 86 anos, funcionou como testemunha de defesa. Ela relatou que a família sabia da relação incestuosa, mas ninguém o denunciava por causa do seu temperamento violento. Os familiares temiam morrer.

— A gente sabia da tristeza de ela ser uma filha-esposa — disse. Violentada aos nove anos, Severina viveu por duas décadas com o seu algoz. Dos cinco filhos vivos, dois têm distúrbios neurológicos, devido à consanguinidade. Por conta do homicídio, ela passou um ano e seis meses presa, aguardando a sentença na colônia penal feminina de Buíque, na região agreste de Pernambuco. Saiu por bom comportamento e voltou para o sítio onde passou a criar os filhos. O crime foi no sítio Rafael, município de Caruaru, a 130 quilômetros de Recife. Ela pagou R$ 800 para que dois homens matassem o pai com uma faca, a mesma com a qual ele a ameaçava de morte, todas as vezes que Severina dizia que ia denunciá-lo à polícia:

— Quando vi ele olhando a menina, me desesperei. Já tinha apanhando por três dias, levado muito cacete. Os dois homens contratados —- Edilson Francisco de Amorim (Galego) e Denisar dos Santos (Denis) — foram condenados em Caruaru a 17 e 18 anos de reclusão. O julgamento de Severina foi transferido para Recife a pedido do Ministério Público de Pernambuco. O promotor José Edvaldo da Silva não chegou a pedir a condenação da ré, mas a criticou:

— Não pode existir segurança na vingança privada. O Ministério Público não faz apologia ao crime e não encampa a tese de que todo mundo pode mandar matar a mãe, matar o pai. — Com todo o sofrimento que ela passou, podemos dizer que foi a vítima quem coagiu a filha a agir daquela maneira. Severina passou duas décadas sendo violentada e, diante da ameaça da filha passar pelo mesmo sofrimento, não teve outra saída. Ela não contou, sequer, com o apoio da mãe, quando tinha nove anos — disse Poliana Queiroz, advogada de defesa.

— Ela não teve apoio do Estado. Quando procurou a delegacia, mandaram retornar ao sítio e ficar com ele. Não tinha apoio de ninguém. Negra e pobre, nunca frequentou a escola. A ré não é uma criminosa. Ontem, quatro dos cinco filhos de Severina estavam no fórum. A sentença foi comemorada com lágrimas. — Vou voltar para o sítio. É do roçado que retiro o sustento dos meninos. Todos são direitos e estão estudando — disse Severina.

LUIZ GARCIA - Farra no Senado


Farra no Senado 
LUIZ GARCIA
O GLOBO - 26/08/11

Dizia-se antigamente que há limite para tudo nessa vida. Pode parecer generalização ingênua, mas tinha sua serventia; por exemplo, como advertência de que apetite demais boa coisa não é. Hoje em dia, de vez em quando aparece uma discussão sobre voracidade e limites.
Por exemplo, uma decisão da Justiça Federal - coisa recente, de dois meses atrás - determinou que o teto dos salários dos funcionários públicos federais deveria valer para quem mais fosse servidor do Estado. Não era teto baixo: equivalia ao que ganham os ministros do Supremo Tribunal Federal. E fazia sentido, já que o STF é o órgão máximo da Justiça. Se acima dele não há qualquer órgão ou corporação, nada mais lógico do que considerar que o telhado era ali mesmo.
E não era teto baixinho: R$26.723,13. Pode ser respeito excessivo aos critérios proporcionais, mas alguém está nos devendo uma explicação para esses 13 centavos. Não que a gente, aqui embaixo, esteja cobrando. Podemos ser um povo generoso. Pelo menos, no caso de centavos.
Seja como for, o limite tinha sua lógica: se os 26 mil e trocados remuneravam os ministros do STF, só poderiam ter maior salário os servidores que prestassem ao país serviços mais relevantes do que aqueles da mais alta instância do Judiciário - o que, pelo menos em tese, não acontece. Por isso mesmo, o Tribunal Federal Regional de Brasília, em primeira instância, transformou em sentença o que era óbvio, e reafirmou: ninguém no serviço público pode ganhar mais que o pessoal do STF.
Como logo se viu, esse critério - por mais natural que fosse - não era obstáculo para o apetite dos funcionários do Senado. Com o apoio (alguns irritadiços leitores falariam em conivência ou cumplicidade, mas sejamos serenos) do presidente da casa, José Sarney, eles conseguiram obter, em segunda instância, que a torneira dos salários voltasse a ser aberta.
Foi decisão do presidente do TRF da 1ª Região (Brasília), desembargador Olindo Menezes. Debite-se a ele o fato de que, por exemplo, um jornalista assessor de um senador continua a ganhar R$35 mil por mês. E não é caso isolado.
É uma farra do boi patrocinada, não podemos dizer por todos, mas pela maioria dos senadores. Não seria má ideia se, nas próximas eleições, os eleitores cobrassem dos candidatos ao Senado uma tomada de posição - formal e assinada embaixo - sobre a farra.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS - Churchill e os governos do PT


Churchill e os governos do PT
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
FOLHA DE SP - 26/08/11

O Brasil, como os Estados Unidos, também trilha, felizmente, o caminho certo após os erros cometidos


INICIO A coluna de hoje lembrando uma imagem que Winston Churchill usava para caracterizar os americanos na primeira metade do século passado: "A sociedade americana sempre acaba fazendo as coisas certas, mas antes disso experimenta todos os caminhos errados que existem".
Lembrei-me dessa imagem ao ler na imprensa duas notícias relativas à privatização de empresas de serviços públicos no governo Dilma: a primeira descreve o bem-sucedido leilão de privatização de um aeroporto na cidade de Natal, no Rio Grande do Norte; a segunda especula sobre a possível venda, ao setor privado, das distribuidoras de energia elétrica em seis Estados do Norte e do Nordeste e que são controladas hoje pela Eletrobras.
Na solenidade de encerramento do leilão de privatização do aeroporto de São Gonçalo do Amarante, tivemos até a cena tradicional de "bater o martelo" na Bolsa de Valores de São Paulo. A foto desse ato simbólico nos jornais levava, há alguns anos, os membros do PT à revolta pública nas ruas.
Agora, passou despercebida mesmo entre seus mais radicais militantes. Mas o tempo passa e o Brasil, felizmente -como os Estados Unidos na imagem de Churchill-, também acaba trilhando o caminho correto depois dos erros cometidos.
Agora a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) promete levar adiante a concessão dos aeroportos de Cumbica e de Viracopos, ambos em São Paulo, e de Brasília. Espero sinceramente que prevaleça, daqui para a frente, a máxima caipira que diz que "em porteira que passa um boi passa também uma boiada" e que a privatização dos aeroportos permita que o cidadão tenha mais respeito quando for utilizar os serviços de um aeroporto no Brasil.
No caso das empresas estaduais de distribuição de energia elétrica, várias reportagens no jornal "Valor" trazem um resumo transparente do caos que domina a gestão dessas empresas, depois de dez anos sob o controle da Eletrobras.
Desde 2008, só em conversão de dívidas para com a estatal federal em capital social já foram gastos mais de R$ 5 bilhões. Mesmo com todo esse esforço de redução de dívidas para manter as empresas funcionando, elas já acumulam prejuízo consolidado de mais de R$ 750 milhões.
Esse estado caótico, aliás, levou os auditores dessas empresas a colocar em seus balanços uma nota em que chamam a atenção para um possível colapso operacional em futuro próximo.
Conheço bem esse quadro -principalmente as razões que levaram a essa situação caótica. Durante os anos em que fui presidente do BNDES, coordenei a privatização de várias empresas estaduais de distribuição de energia elétrica e, nesse processo, pude observar que nem sempre a boa gestão era praticada para o bem do povo e do Estado. Por isso, não me emocionam os números revelados finalmente pela Eletrobras.
Uma das empresas em pior situação quando o BNDES implantava esse processo de privatização nos Estados era a Cemar, a distribuidora de energia elétrica no Maranhão.
Nesse feudo da família Sarney, essa empresa estava sob o comando de um filho do ex-presidente da República. Por motivos políticos, a empresa continuou nas mãos do governo estadual e somente em 2004 foi vendida a um grupo privado.
Nesses últimos sete anos, tudo mudou e transcrevo, a seguir, parte do que foi publicado no jornal "Valor": "Dona de um terço do capital da Companhia Energética do Maranhão (Cemar), a Eletrobras pouco dá palpite em sua administração, pois está feliz com o que acontece por lá. Em sete anos, viu a distribuidora sair de um estado falimentar, com serviço que deixava o cidadão maranhense, na média, 60 horas por ano sem luz, para uma situação em que os dividendos pagos já se aproximam de R$ 1 bilhão e a média de horas sem luz caiu para menos de 20".
Espero sinceramente que a presidente Dilma vença a oposição que sindicatos e políticos ainda fazem às privatizações e siga os conselhos de técnicos da Eletrobras e do próprio Ministério de Minas e Energia e leve adiante a venda dessas empresas.

GOSTOSA, PARA COMER


EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO - Derivativo da China?


Derivativo da China?
EDITORIAL
O Estado de S.Paulo - 26/08/11

A economia brasileira depende cada vez mais da parceria comercial com a China e das políticas formuladas em Pequim. Mais que isso: o comércio bilateral segue o velho padrão Norte-Sul, com o lado mais fraco fornecendo matérias-primas em troca de produtos manufaturados. Essa descrição, familiar aos brasileiros atentos à evolução da economia global, já é assunto de comentários e de análises no mercado financeiro. A relação entre os dois países - com referência ao padrão do comércio - foi tema de um relatório do Banco Nomura, de Nova York, ligado a um dos maiores conglomerados financeiros do mundo, com sede no Japão. Também nesta semana, um artigo apresentado no site da Forbes foi aberto com a sugestiva pergunta: é o Brasil um derivativo da China? Preços de derivativos, lembrou o autor, dependem do valor de outro ativo - neste caso, a economia chinesa. Se essa economia fraquejar e seu apetite por matérias-primas diminuir, quais serão as consequências para os brasileiros?

A China é hoje a principal fonte de receita comercial para o Brasil. No ano passado, o País ganhou US$ 30,8 bilhões com as vendas ao mercado chinês, 15,2% do valor total das exportações. O comércio com os Estados Unidos, em outros tempos o comprador mais importante, proporcionou US$ 19,5 bilhões, 9,6% do total faturado. A China ficou em segundo lugar como fornecedor do mercado brasileiro, com 14,1% do valor vendido ao País. Os Estados Unidos mantiveram o primeiro lugar, com participação de 15%.

Mas a diferença entre o comércio com os Estados Unidos e o intercâmbio com a China vai muito além dos valores totais. A relação com os chineses de fato reproduz o padrão Norte-Sul, embora os dois países sejam classificados como emergentes.

A China vende ao Brasil quase exclusivamente produtos manufaturados. Parte das vendas é de peças e componentes para a indústria brasileira. Isso resulta em deslocamento de empresas nacionais, incapazes de competir com produtores chineses favorecidos pelo câmbio desvalorizado e por mecanismos obscuros de formação de preços.

Em contrapartida, as vendas brasileiras à China são, predominantemente, de produtos básicos. Em 2010, apenas 4,5% das exportações brasileiras para o mercado chinês corresponderam a bens manufaturados. Somados os bens intermediários, o total chegou a 16,3%.

O comércio com os Estados Unidos é muito mais diversificado. No ano passado, 51,6% das exportações brasileiras para o mercado americano foram de produtos manufaturados. Com os bens intermediários, o total dos industrializados alcançou 68,1%. O intercâmbio do Brasil com a maior e mais desenvolvida economia do mundo há muito tempo deixou de ser regido pelo tradicional padrão de bens primários em troca de bens manufaturados. A relação Norte-Sul, de estilo quase colonial, ocorre no comércio com a China, país emergente escolhido como "parceiro estratégico".

Também o comércio com a União Europeia é mais equilibrado quanto à composição. Em 2010, as vendas de manufaturados ao mercado europeu equivaleram a 35,7% das exportações brasileiras para o bloco. A parcela de industrializados (com inclusão dos semielaborados) chegou a 40,6%. A União Europeia absorveu 21,4% das vendas brasileiras. A participação da América Latina e do Caribe foi maior - 23,8%, também com alta proporção de manufaturados (78,4%) e industrializados (82,1%).

A diversificação de mercados, uma tendência tradicional do comércio brasileiro, é uma boa política. A ampliação do comércio com a China e com outros parceiros do Oriente foi um desdobramento dessa política. Mas esse acerto foi acompanhado de um erro grave: a partir de 2003, o governo desperdiçou as possibilidades de acordos com os Estados Unidos e com a Europa - no primeiro caso, por miopia ideológica. Isso deixou espaço à China e a outras economias empenhadas em conquistar mercados por todos os meios. Com isso, o Brasil se tornou mais dependente - e de forma perigosa - da política de Pequim, da prosperidade chinesa e dos preços das commodities. Todos esses fatores estão fora do controle dos brasileiros.

ROBERTO ROMANO - Nêumanne e os termidorianos


Nêumanne e os termidorianos
ROBERTO ROMANO
O Estado de S.Paulo - 26/08/11

O livro de José Nêumanne Pinto O que Sei de Lula ajuda a reflexão ética e política. As suas páginas ultrapassam a figura do suposto pai da Pátria. Elas narram, em surdina, o golpe político encenado pelos que se abrigam no Partido dos Trabalhadores e em agremiações similares. Nêumanne traça um retrato fiel do proprietário no condomínio petista. Os fatos brotam diante de nossos olhos e têm como base a experiência pessoal do autor e documentos ou testemunhos de pessoas que seguiram a carreira do líder. O seu relato segue o preceito de Tucídides e Tácito: nada adiantar sem provas e, sempre, manter a isenção de ânimo.

O livro narra as agruras, as idiossincrasias, as matreirices do personagem que, ainda hoje, governa o Brasil. A cada instante fica bem claro que a cadeira da Presidência da República é ocupada por certa personalidade vicária, à espera de um retorno triunfal, em 2014, do verdadeiro dono. Tudo indica a prática de um império de tipo cesarista: populismo, propaganda, cargos e recursos públicos em favor de um homem. Temos aí a face visível da tragédia. A escondida indica o oportunismo das esquerdas, que, para chegarem ao poder, jogaram às urtigas ideologias, programas, posturas éticas.

Na história política moderna, este não é o primeiro golpe da esquerda para garantir aos seus líderes as benesses palacianas. Um intelectual insuspeito, porque fiel à ideologia, Alain Badiou prova que o Termidor, quando acabou a Revolução Francesa, se deveu aos jacobinos. "Os termidorianos históricos não são aristocratas, restauradores, ou mesmo girondinos. São as pessoas da maioria robespierrista na Convenção" (1). Os partidários do Incorruptível - apelido de Robespierre - aboliram as teses revolucionárias. "Meditar sobre a corrupção", adianta Badiou, "com certeza não é inútil hoje. (...) Sylvain Lazarus mostrou que "corrupção" designa inicialmente a precariedade política, ligada ao seu princípio real subjetivo (a virtude, os princípios). E depois, como resultado, vemos a corrupção material. Um termidoriano, em sua essência política, é um corrompido. O que significa: um aproveitador da precariedade das convicções (e das vontades). Aliás, os termidorianos históricos são, o dossiê é claro, corrompidos no sentido usual". Primeiro os valores éticos são alardeados, depois eles se transformam, na metamorfose ambulante, em "bravatas".

Após anos proclamando a virtude, a facção jacobina decidiu melhorar sua vida rifando os antigos ideais? Negativo. A corrupção não caiu nas hostes da esquerda de repente. A historiografia da Revolução Francesa evidencia, com documentos e relatos de vida, a maneira como líderes "puros" e "inflexíveis", que usavam a guilhotina contra adversários, se foram apropriando desde cedo da riqueza pública em proveito pessoal. Quem deseja se informar leia o dossiê, publicado por Michel Benoit, 1793, a República da Tentação, um Caso de Corrupção na Primeira República (2). O autor narra a odisseia de Claude Bazire e seus pares, todos da ala radical esquerdista. Um caso basta: em 1792 foi roubado o armário com joias da antiga Coroa francesa. "O ministro Roland, ao informar a Assembleia sobre o roubo, tinha apontado com o dedo os verdadeiros responsáveis: a Comuna Insurrecional e o Comitê de Vigilância, do qual Bazire e Chabot eram integrantes, mas ele não denunciou os verdadeiros culpados, por insuficiência de provas..." (3). As estripulias dos "puros" aumentaram com a impunidade, até que eles foram condenados por corrupção.

O exemplo francês teve antecedentes de corrupção e voracidade de poder na Revolução Puritana da Inglaterra, no século 17. Os radicais exigiam que os governantes e juízes prestassem contas à cidadania dos recursos humanos e materiais sob sua responsabilidade. Falamos da famosa accountability. No entanto, com o avanço do movimento, a morte do rei, os cargos de mando serviram como aperitivo saboroso para os que se designavam santos incorruptíveis. John Milton, o poeta revolucionário, bem antes que morresse a República ditatorial inaugurada por Cromwell, desencantou-se com os líderes corrompidos. E veio a trama do monumental poema O Paraíso Perdido. Os comandantes revolucionários são retratados como anjos caídos. Em vez de libertar os ingleses, eles, radicais, fizeram o contrário de Moisés, pois instalaram um pandemônio de servidão como se levassem o povo eleito de volta ao Egito... Maiores informações podem ser lidas no insuspeito historiador, porque marxista, Christopher Hill (4).

Quem se corrompe e renega ideais costuma apelar para o realismo político. Mas o cacoete maquiavélico é confissão de algo sinistro: a hipocrisia disfarçava, sob os rostos imaculados e as falas virtuosas dos supostos jacobinos, o vulgar oportunismo. A traição dos militantes e líderes da esquerda ao seu discurso anterior não muda o fato brutal, a ganância pelo poder a qualquer custo. Sem a corrupção ética da esquerda, o sr. da Silva não teria a força que lhe garantiu o Planalto duas vezes e, mesmo, o conduzirá à Presidência em 2014. Lúcido Elias Canetti: "Nunca vi um homem vituperando contra o poder sem o secreto desejo de possuí-lo". Os hipócritas jamais perdoarão a José Nêumanne Pinto o seu ato, corajoso ao extremo, de rasgar a máscara da virtude ostentada no passado por quem, hoje, elogia a desfaçatez como artifício político. Ler as páginas desse livro é um exercício de lucidez histórica.

(1) O que é um termidoriano?, no livro editado por C. Kintzler A República e o Terror (Paris, Kimé, 1995).

(2) Paris, L"Armançon Ed., 2008.

(3) Benoit, página 61.

(4) Milton e a Revolução Inglesa (Penguin, 1979).


FILÓSOFO, PROFESSOR DE ÉTICA E FILOSOFIA NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS (UNICAMP), É AUTOR, ENTRE OUTROS LIVROS, DE ''O CALDEIRÃO DE MEDEIA'' (PERSPECTIVA)

MÔNICA BERGAMO - MEMÓRIA MILITAR


MEMÓRIA MILITAR
MÔNICA BERGAMO 
FOLHA DE SP - 26/08/11

A Marinha terá que responder na Justiça à acusação de levar um cadete à morte em 2010, por exaustão. Adonais Santos da Costa Junior, 19, participava de treinamento no Centro de Instrução Almirante Milcíades Portela Alves (Ciampa), no Rio, quando sofreu parada cardiorrespiratória. É o mesmo em que quase 60 militares passaram mal recentemente. Internados, foram diagnosticados com gripe.

MEMÓRIA 2
A família do cadete ingressou ontem com processo, assinado pelo advogado João Tancredo. Pede indenização por dano moral e pensão para a mãe do jovem. A assessoria do Ciampa não foi encontrada para comentar.

ESTRELA
Fernando Henrique Cardoso deve ser homenageado no programa do PSDB de SP que irá ao ar em setembro. O presidente do partido, Pedro Tobias, considera que foi "um erro" esconder o ex-presidente nas últimas campanhas eleitorais. "Ele é de longe a pessoa mais lúcida do partido."

GELADEIRAS
A Samsung comunicou ao governo de SP que investirá US$ 400 milhões na construção de sua fábrica de linha branca, em Limeira.

LAUDO 1
A defesa da nutricionista Gabriella Guerrero, 28, que dirigia uma Land Rover e atropelou Vitor Gurman, 24, na Vila Madalena, contratou um laboratório de perícias para fazer um laudo particular sobre o acidente.

LAUDO 2
Já o Instituto de Criminalística (IC) faz outro laudo, para a polícia. O documento ficará pronto em setembro. E deve mostrar a velocidade em que o carro trafegava. Para a polícia, Gabriella estava acima da velocidade (30 km/h) da rua Natingui e assumiu o risco de matar.

PAPO MUSICAL
Fotos Mastrangelo Reino/Folhapress

Gilberto Gil participou do debate "Música: A Fronteira do Futuro - Criatividade, Tecnologia e Políticas Públicas" junto com o americano Lawrence Lessig, criador do selo Creative Commons, anteontem, no Auditório Ibirapuera.

NAMORO
Em debate sobre direitos autorais anteontem no Auditório Ibirapuera, o mediador Claudio Prado apresentava Manuela D'Ávila (PC do B-RS) como "a deputada do futuro, a nossa Arnold Schwarzenegger", quando corrigiu: "Não, ela é mais bonitinha...". Gilberto Gil, que também participava, sorriu: "Muito mais".

NAMORO 2
Manuela D'Ávila falava que é uma "bobagem absoluta" achar que os jovens são mais aptos a discutir novidades tecnológicas: "Olha que já vou fazer 70 anos...", disse Gil. Ela rebateu: "E tá tão bem. Fiz declarações apaixonadas por você no Twitter". Durante o debate, ela postava mensagens no microblog.

ARMAS
No evento, os participantes diziam que a única coisa boa de Ana de Hollanda ter tirado o selo do Creative Commons do site do Ministério da Cultura era que os obrigava a discutir o tema. Gil emendou: "Se os adversários não apresentam suas armas, não sabemos como lutar".

AUTOAVALIAÇÃO
Questionado sobre a gestão de Ana na Cultura, Gil se esquivou. "Estou torcendo como todo mundo. Sempre precisa melhorar. Eu preciso melhorar lá em casa, todo mundo precisa melhorar."

DANCING QUEEN
Mais um musical a caminho: "Para Sempre, Abba", que conta a história do grupo americano, que tem hits como "Mamma Mia" e "Dancing Queen", está em fase de produção.

ROUPA NOVA
A estilista Cris Barros apresentou sua coleção de verão com um desfile no hotel Unique, na terça, que contou com a modelo Alicia Kuczman na passarela. As empresárias Kika Rivetti e Camila Espinosa assistiram.

CURTO-CIRCUITO

A Trupe Chá de Boldo se apresenta hoje à noite no Bleecker St., com participações de Pélico e Tatá Aeroplano. 18 anos.

A estilista Gloria Coelho lança hoje sua coleção primavera-verão nas três lojas da grife em SP.

O espetáculo "A Ilusão Cômica" terá pré-estreia hoje, às 19h30, no Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo. 18 anos.

O ex-ministro Adib Jatene fará a abertura da Cúpula Justina 2011, em 26 de setembro, em SP.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

WASHINGTON NOVAES - Rumo às energias que nos convêm


Rumo às energias que nos convêm
WASHINGTON NOVAES
O Estado de S.Paulo - 26/08/11

O governo federal deve à sociedade brasileira uma satisfação, que não pode mais ser postergada, sobre a matriz energética nacional. Não se pode continuar avançando em meio a informações contraditórias, que levantam dúvidas quanto à estratégia no setor, conveniência dos rumos tomados, adequação dos investimentos, custos a serem pagos pela sociedade, etc.

O primeiro ponto a esclarecer é sobre a real necessidade de expansão da matriz. O governo e seus órgãos vão continuar fazendo de conta que nunca ouviram falar do estudo da Unicamp (2006), várias vezes citado neste espaço, segundo o qual o País pode viver com 50% da energia que consome (poupando 30% com conservação e eficiência, 10% com redução de perdas em linhas de transmissão - que estão em 17% - e 10% com repotenciação de geradores antigos)? Mesmo que continuem, vão seguir com as informações contraditórias e insuficientes, que inclusive permitem onerar a sociedade com custos discutíveis, para beneficiar alguns setores? Como disse recentemente (Ambiente Energia, 21/8) o diretor do Instituto Nacional de Eficiência Energética, Pietro Erber, uma boa política energética não pode estar voltada apenas para questões do desenvolvimento econômico e obreirismo, precisa estar atenta aos chamados fatores ambientais e sociais, dar preferência a fontes renováveis de energia e de origem local (mais próximas dos usuários, menos caras), computar e cobrar dos geradores os impactos que produzam.

Mas não é o que ocorre. Várias consultorias estão reduzindo suas previsões sobre crescimento econômico no País nos próximos tempos - e isso terá influência no consumo de energia. Estão sendo consideradas? O próprio Operador Nacional do Sistema Elétrico e a Empresa de Pesquisa Energética já preveem, segundo os jornais, que o aumento de consumo de energia este ano não será de 5%, e sim de 3,9% (ONS), ou baixará de 5,4% para 3,8% (EPE). "Estamos nadando em sobras", diz o diretor-geral do ONS, Hermes Chipp. Então, por que insistir em tantas hidrelétricas na Amazônia, com altos custos sociais e ambientais (incluindo a redução de parques nacionais, decretada por medida provisória)? Por que insistir na usina de Angra-3 e mais quatro no Nordeste? "O planejamento energético no País continua autista", diz o professor Carlos Vainer, da UFRJ. Mas no mesmo debate o secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia (MME), Altino Ventura Filho, previu "forte tendência de crescimento no Brasil nos próximos anos", que justificaria as hidrelétricas na Amazônia. "Se adotarmos a energia solar", disse ele, "o pobre não vai ter energia". Não é só. O próprio MME teve de intervir para mudar as metas projetadas pela Aneel para as renováveis (eólica, biomassa, pequenas centrais), que haviam sido fixadas (favorecendo fontes não renováveis) em 2.700 MW de potência e tiveram de ser elevadas para 4.300 MW.

Quando se põem todas as cartas na mesa, os números assustam. No ano passado, por exemplo, a conta paga às geradoras de energia a gás (era indispensável?) foi de R$ 670 milhões (Estado, 2/8). Pelo ângulo do cidadão, mais grave ainda, diz a Fiesp que a economia para o consumidor nas contas de luz em 20 anos poderá ser de quase R$ 1 trilhão se não forem renovadas as atuais concessões para fornecimento de energia. Mas um lobby poderoso trabalha pela renovação.

Está ficando difícil, porém, a posição dos adversários das energias renováveis e "limpas". No último leilão de energia, as fontes eólicas ficaram com 48% do total leiloado (Estado, 19/8), quase 2 mil MW, com preço inferior a R$ 100 por MWh, menor que o das hidrelétricas, a R$ 104,75 (de novo: por que insistir na Amazônia?). Não por acaso, a previsão da Associação Brasileira de Energia Eólica é de que os investimentos nesse setor até 2013 serão de R$ 25 bilhões, em 141 projetos (4.343 MW, tanto quanto Belo Monte). Na verdade, hoje a EPE afirma que potencial eólico já mapeado está em 143 mil MW. Há quem pense que pode chegar a 300 mil.

Não é só por aqui. Na Espanha a eólica já é a maior fonte de energia, com 21% do total. A Noruega começa a instalar usinas flutuantes no mar. A energia solar também avança, até mesmo no Brasil, onde o megaempresário Eike Batista inaugura sua primeira usina em Tauá (CE), com 4.680 painéis. E a Abrava calcula que, se todos os 11,2 milhões de habitantes de São Paulo se banhassem em água aquecida por painéis solares, economizariam R$ 7,3 bilhões anuais e evitariam a emissão de 450 mil toneladas de dióxido de carbono. A projeção que se faz (Ambiente Energia, 14/8) é de que este ano se acrescentarão mais 200 mil metros quadrados de painéis ao quase 1 milhão implantado em 2010.

A tendência parece irreversível. Diz o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), da Convenção do Clima, que fontes renováveis suprirão 80% da demanda de energia em 2080, principalmente eólica, solar e das biomassas. Hoje, juntamente com as energias geotérmica e de ondas oceânicas, respondem por 13%. A América Latina já é a segunda região no volume de investimentos em energias renováveis, nas quais o mundo investiu US$ 211 bilhões em 2009. A China é que mais investe (US$ 48,9 bilhões/ano); o Brasil, US$ 7 bilhões. Mas os subsídios às energias fósseis continuam a vencer: US$ 312 bilhões em 2009, ante US$ 57 bilhões para as renováveis. E o carvão segue como principal fonte, 47% do total.

Só que a corrida pelas tecnologias de energias renováveis continua fortíssima: no ano passado, o Escritório Americano de Patentes reconheceu 1.811 patentes de tecnologias energéticas relacionadas com veículos elétricos, células de combustível e aplicações energéticas em biomassas, eólicas, geotérmicas, solares e hídricas (hidrelétricas, ondas e marés).

Precisamos sair com urgência da nossa confusão e jogar pesado nas direções corretas.

GOSTOSA


NELSON MOTTA - O reino do faz de conta


O reino do faz de conta
NELSON MOTTA
O ESTADÃO - 26/08/11

Não chamar as coisas pelos seus nomes - principalmente quando são desagradáveis, ilegais ou imorais -, mas por doces eufemismos, é uma das características mais marcantes do estilo brasileiro. Já começa no nosso célebre jeitinho - o nome que damos a transgressões da lei e das normas para levar vantagem em tudo.

De gratuito, o horário eleitoral não tem nada: as emissoras recebem créditos fiscais por suas perdas de receita comercial e são os contribuintes que pagam pela boca livre dos partidos, num milionário financiamento público das campanhas. Contribuinte já é um eufemismo que sugere ser facultativo e voluntário o pagamento obrigatório de impostos. Em inglês, os que pagam a conta são chamados literalmente de "pagadores de impostos".

"Prestar contas do mandato" significa que o parlamentar gastou verba oficial para se promover com seu eleitorado. As chantagens, achaques e acertos dos políticos com o governo são sempre em nome da "governabilidade". É claro que ninguém fala de suborno ou propina, ou mesmo da antiga comissão, nossa inventividade criou a "taxa de sucesso".

O companheiro Delúbio Soares deu inestimável contribuição ao nosso acervo eufemístico criando o imortal "recursos não contabilizados" em substituição ao antigo, mas sempre atual, "caixa 2", eufemismo histórico para sonegação de impostos e dinheiro sujo.

No Brasil, quase todas as organizações não governamentais só vivem com o dinheiro governamental: o meu, o seu, o nosso. Assim como "notória capacidade técnica" é o álibi linguístico para ganhar licitações sem disputá-las, "mudança de escopo" é o superfaturamento legalizado.

O clássico "o técnico continua prestigiado" significando iminente demissão migrou do futebol para a política com sucesso. Diante de acusações da imprensa, o ministro jura que não fez nada de errado e o governo diz que ele está prestigiado. A novidade é que agora, justamente porque é inocente e está prestigiado, ele pede para sair antes de ser demitido.

No país do faz de conta, quando se ouve falar em "rigorosa investigação, doa a quem doer", todos entendem que não vai dar em nada.

ANTERO GRECO - Coisas da vida


Coisas da vida
ANTERO GRECO
O Estado de S.Paulo - 26/08/11

A gente vive a fazer associação de ideias, sem percebermos. Vou contar uma. Estava a caminhar ontem, antes do almoço, e ouvia música num desses aparelhinhos modernos com nome inglês que não passam de radinhos de pilha metidos a besta. Na Eldorado tocava antiga canção de Vinicius e Toquinho: "Tem dias que fico pensando na vida e sinceramente não vejo saída"... e por aí vai. Aquilo esteve a batucar na minha cabeça, sob um solzinho bacana. Chego em casa, ligo a tevê e vejo duas cenas curiosas: primeiro a cara de alegria do Dorival Júnior com o título do Inter na Recopa Sul-Americana. Depois, o jeito sem graça do Cristiano Ronaldo ao olhar o Messi receber de Michel Platini o prêmio de melhor jogador da Europa de 2010-11.

Pimba! A aproximação veio na hora: música, futebol e vida se juntaram e desembocaram na constatação óbvia de que tem gente que está no lugar certo na hora certa, ou no lugar errado na hora errada. Dorival e Cristiano personificaram as duas situações que ocorrem a todo momento. Pode verificar que você conhece muitas histórias idênticas.

Dorival dançou miudinho no Atlético-MG até ser defenestrado, um tempo atrás, porque o time emperrou e não saía da parte de baixo do Brasileiro. Ou seja: saiu de BH com a equipe quase na mesma situação em que a encontrou no ano passado. Lembra? Em 2010, foi chamado para apagar incêndio, pois havia risco de rebaixamento. Deu uma revigorada no elenco, evitou o mal maior e se animou com projetos ambiciosos para a atual temporada. Nada deu certo.

Ficou alguns dias de molho e, como a toda hora cai técnico, logo apareceu convite para ajustar o Internacional. Não disputou nem meia dúzia de partidas e se deparou com o desafio de anular vantagem do Independiente na Recopa. Vitória por 3 a 1, com Leandro Damião inspiradíssimo, festa no Beira-Rio e caminho mais sereno para Dorival colocar a turma colorada no prumo no restante da Série A. Quer dizer: calhou de aceitar proposta na hora certa e assim ostenta seu primeiro troféu internacional.

E nem se pode dizer que o time mudou de maneira expressiva de quando estava sob o comando de Paulo Roberto Falcão. Talvez se mostre menos ansioso - ou há mais boa vontade da diretoria. A propósito: Falcão pegou o bonde andando na hora errada e ficou a pé. É o caso do sujeito na hora e no lugar errados. Assim como, me parece, sucede com o Cuca. A não ser que consiga reviravolta daquelas, tem tudo para quebrar a cara no Atlético-MG. Desde que chegou, foram cinco derrotas em cinco jogos. E domingo tem clássico com o Cruzeiro...

O Cristiano Ronaldo, então? Esse deve lamentar diversas vezes por dia a época em que nasceu. O português joga demais, não é fenômeno de marketing nem conversa fiada. É estiloso no visual e nas atitudes dentro de campo. Arrasou no Manchester United, é ponto de referência no Real Madrid. Merece prêmios, medalhas, distinções - o mais importante o de melhor do mundo em 2008.

De lá pra cá, o futebol dele só evoluiu, ficou vistoso e eficiente, para torná-lo sempre protagonista, como nenhum patrício seu jamais foi. Mas Cristiano não consegue emplacar prêmios, se tiver como concorrente Lionel Messi. O argentino leva todas e está com pinta de que não vai parar tão logo de colecionar comendas. Complicado, mesmo para quem é craque, dividir atenção com estrela de altíssima grandeza. Por mais que brilhe, será ofuscado pelo astro maior. Como acontecia na época de Pelé. Era um desperdício de gente boa a desfilar pelos gramados, virtuoses de primeira linha, que no entanto ficavam à sombra do solista, do Rei.

A vida tem dessas ironias. Fazer o quê? Como diz a música: "Sei lá, a vida é uma grande ilusão. Sei lá, sei lá, vida tem sempre razão".

Na trave! O Palmeiras correu, sufocou, venceu, mas... não levou. Os 3 a 1 sobre o Vasco foram insuficientes para garantir o time de Felipão na fase seguinte da Sul-Americana. O Palestra foi atrevido, prensou o rival com quatro jogadores mais adiantados - Valdivia, Luan, Maikon Leite, Kleber -, fez 2 a 0, sonhou pelo menos com a definição nos pênaltis, porém o golaço de Jumar derrubou as esperanças. Valeu só como consolo o gol de Marcos Assunção. O clube completa hoje 97 anos com mais uma frustração e só lhe resta o Brasileiro como alternativa para salvar 2011. Vai, Toquinho: "De nada adianta ficar-se de fora..."

MÍRIAM LEITÃO - Sentido dos tempos


Sentido dos tempos
MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 26/08/11

Não procurem sentido na economia dos tempos atuais. O Japão teve sua dívida rebaixada esta semana pela Moody's e, em seguida, a agência japonesa ameaçou rebaixar também. E o que houve? O Banco Central teve que intervir para deter a valorização do iene. A moeda do país atingido por terremoto, tsunami, desastre nuclear, recessão e crises políticas não para de subir.

O iene subiu 8,4% em relação ao dólar desde abril. Isso fez com que o Banco Central japonês tivesse que inventar políticas para evitar a supervalorização da moeda do seu enfraquecido país. Esta semana, anunciou que usará US$ 100 bilhões de suas reservas para ajudar os exportadores japoneses, que estão tendo dificuldades de competição em outros mercados porque a moeda forte está tirando competitividade dos seus produtos.

O Japão terá agora o sexto governo em cinco anos. O país é a terceira maior economia do mundo e tem este grau de instabilidade política. Claro que a democracia está forte, mas o país não consegue formar governos estáveis, o que se soma à enorme incapacidade de crescer. Ele passou longo tempo em vida vegetativa e quando parecia que voltaria a crescer foi atingido pelo triplo choque deste ano. Resultado: voltou a cair em recessão.

Para recuperar as áreas atingidas pelo terremoto-tsunami-desastre nuclear, o Japão teve que aumentar o gasto público, aprofundando o déficit. O que complica mais o quadro é que a dívida japonesa é de 200% do PIB. A vantagem é que é uma dívida detida principalmente pelos próprios japoneses. Seja a quem for, o fato é que o Japão deve dois japões e está com déficit. Logo, faz sentido que as agências de risco considerem que o país precisa ser rebaixado. A Moody's estabeleceu que ela é AA3 em vez de AA2.

Mas não é que no mesmíssimo dia do rebaixamento o BC japonês teve que intervir para segurar o iene, que não parava de subir, dada à procura pela moeda por investidores interessados em se proteger da turbulência global? O governo japonês resolveu proteger sua indústria gastando esses US$ 100 bi de reservas, mas a valorização do câmbio está fazendo com que as empresas japonesas saiam pelo mundo comprando outras que, para elas, ficaram baratas. A Kirin, de capital japonês, por exemplo, está tentando comprar a brasileira Schincariol.

Em março, o iene bateu pela primeira vez, desde 1995, o 80 por dólar. Este ano, já subiu 5,1%, mas como se pode ver no gráfico abaixo a onda vem de longe e é enorme. Desde 2007, o iene se valorizou 53% sobre a moeda americana. O governo anunciou um plano para tentar enfraquecer a moeda sem intervir de forma mais explícita no mercado de câmbio.

Não é a única esquisitice do momento. Outra aconteceu nos Estados Unidos, logo após o anúncio da Standard & Poor's de que a dívida americana, pela primeira vez na história daquele Tesouro, tinha perdido a nota máxima. Perdeu um A e ganhou mais interessados em títulos do seu Tesouro, o mesmo que uma semana antes quase dera um calote na dívida. A procura foi tanta pelos Treasury Bills que os juros caíram ao nível mais baixo da história recente. Enquanto os Estados Unidos atraíam todos esses investidores, eles fugiam de todos os outros ativos, derrubando, na correria, as bolsas do mundo inteiro, entre elas, a nossa, que nada tem a ver com a história.

Ontem, outra coisa estranha foi o rumor de que as agências poderiam derrubar a nota da dívida alemã. Ora, a Alemanha é que segura a Europa, tem um déficit de 2,5% do PIB previsto para este ano, foi de 3% no ano passado e acaba de anunciar um pacote de ajuste fiscal de C 80 bilhões. Os alemães são conhecidos por terem mais rigor fiscal, resultado de um passado hiperinflacionário que entrou na genética do povo. Já a França tem uma dívida de 87% do PIB e um déficit de 7% que só voltará a ficar abaixo de 3% em 2014. Fez um pacotinho fiscal de C11 bilhões, que tem mais charme - cobra mais impostos dos ricos - do que músculos, mas mesmo assim as agências confirmaram a nota máxima da França. Nada disso faz sentido.

Menos sentido ainda faz a debandada dos investidores de todas as moedas em direção ao franco suíço. A Suíça é, como se sabe, um pequeno país de PIB de US$ 590 bilhões, que é 15% do PIB Alemão. Não tem dimensão para ser porto seguro de investidor nenhum. O governo suíço, coitado, tenta conter a avalanche com todo o tipo de medida e mesmo assim a moeda sobe 29% em 1 ano sobre o dólar. Outro dia, para espantar esses investidores intrometidos o governo suíço ameaçou vincular sua moeda ao euro. As duas oscilariam juntas, para cima ou para baixo. Isso equivale a abraçar o afogado, porque o euro é aquela moeda sobre a qual se fala que pode entrar em colapso. É de dar nó na cabeça a conjuntura econômica atual e suas conexões sem sentido.