sexta-feira, junho 03, 2011

ANCELMO GÓIS - Duo de violoncelo


Duo de violoncelo
ANCELMO GÓIS
O GLOBO - 03/06/11

Dos 44 músicos demitidos da OSB, dois estão de volta aos quadros da orquestra. São os gêmeos do violoncelo Paulo e Ricardo Santoro. 

Função didática...

Aliás, gente importante da nossa música clássica sonha com a criação de uma espécie de sinfonieta do Rio, formada pelos ex-músicos da OSB. Teria função didática, com a formação de plateias, levando a música clássica para a periferia.

Calcinha e sutiã
Cinquenta travestis e transexuais serão contratados para comandar uma cooperativa de roupas íntimas que o governo Cabral vai montar em Nova Friburgo, na Região Serrana do Rio. O anúncio será feito hoje no Fashion Rio por Cláudio Nascimento, do Rio Sem Homofobia. 

Acabou em samba 

A Sebastiana, liga dos principais blocos do Rio, vai promover um grande desfile-manifesto, dia 19 de junho, na orla de Copacabana, do Posto 6 ao Leme, pela revisão do Código Florestal aprovado na Câmara. Dezenas de blocos (Simpatia, Barbas, Suvaco, Imprensa...) sairão juntos com suas baterias. 

Grata, mas não
Maria Fernanda Ramos Coelho, ex- presidente da Caixa Econômica Federal, recusou convite de Dilma para ser representante do Brasil no BID. 

Água no feijão
Hugo Chávez de Cadeia, na visita a Dilma, segunda, vai trazer nove ministros na comitiva.

O próximo
Jim Carrey, o comediante, será o próximo astro de Hollywood a baixar por aqui. Vem ainda em junho divulgar seu novo filme, “Os pinguins do papai”. O ator revelou a viagem no programa “Gente de expressão”, da atriz Bruna Lombardi.

Coração generoso
O setor administrativo do Hospital Israelita Albert Sabin, no Rio, onde a drag queen Isabelita dos Patins se internou depois de um enfarte, recebeu ontem uma ligação da atriz Cláudia Jimenez. Cláudia perguntou quanto era a conta de Isabelita e, em seguida, mandou lá seu motorista com o dinheiro. Pagou R$ 9.394.

É que...
Isabelita está em dificuldade e não tem plano de saúde. 

Gripe Palocci 
Do deputado Chico Alencar, na audiência da Lei dos Direitos Autorais, ontem, na Câmara, abatido por uma forte gripe:
— Peço desculpas. Mas é a “gripe Palocci”, aquela que tira a voz e custa a ir embora. Faz sentido.

Miami é aqui
Veja como o Tio Sam está de olho no dinheiro dos ricos brasileiros. Ontem à noite, num rega-bofe para vips no JW Marriot Hotel, em Copacabana, foram lançados os empreendimentos residenciais Canyon Ranch Living e One Bal Harbours, ambos localizados em... Miami. 

Faz diferença
A secretária Cláudia Costin não para de elogiar as Escolas do Amanhã. São 151 em favelas perigosas do Rio. Um dos problemas, no passado, era a falta de professores. Muitos se recusavam a dar aulas ali. Em 2008, eram 3.365 professores. Hoje, são 5.175. 

Máfia da gasolina 

Uma equipe do delegado carioca Fernando Reis prendeu ontem em flagrante um caminhoneiro que desviava combustível de postos da Barra e levava para um depósito clandestino em Duque de Caxias. 

Quadrigêmeos

Terça, na Perinatal da Barra, no Rio, uma mãe coragem deu à luz quadrigêmeos. Dos quatro, três são meninas. Todos estão na UTI neonatal, mas passam bem. Que sejam felizes. 

Cena carioca
Ontem, por volta das 15h, uma vovó chamava atenção no Hospital São Lucas, no Rio. É que, ao chegar à emergência, as pessoas tinham de enfrentar um atendimento eletrônico. A idosa, que há duas horas aguardava na fila, postou-se ao lado da máquina e ficou orientando os pacientes. Não é fofa?

ANNA RAMALHO - O Rio pelo mundo


O Rio pelo mundo
ANNA RAMALHO

JORNAL DO BRASIL - 03/06/11

Esporte e cultura do Brasil com paisagens deslumbrantes, que só o Rio de Janeiro pode oferecer. É para mostrar este cenário que o canal de TV a cabo norte-americano History Channel está captando imagens e fazendo reportagens para o programa History travel. A edição exclusiva sobre a capital carioca será exibida em diversos países do mundo em setembro. 

Falando em Rio...

O vereador Paulo Messina (PV), membro da comissão de Meio Ambiente, realiza terça-feira, a audiência pública sobre A situação do serde da nossa cidade, para discutir a arborização – corte, poda, plantio – e reflorestamento, incluindo aspectos legais e estruturais dos parques naturais em áreas de proteção ambiental da cidade. 

Queda


A situação das áreas verdes da cidade é preocupante. Para se ter uma ideia, das 17 mil árvores do projeto original do Parque do Aterro do Flamengo, restam cerca de 12 mil. O evento vai contar com representantes da Fundação Parques e Jardins e da Comlurb, atual responsável pelas podas realizadas na cidade.

Alô, ministra Ana!

O advogado carioca Sydney Sanches, participará em Bruxelas, Bélgica, do World Copyright Summit, de 6 a 8 deste mês. Trata-se de um dos mais importantes seminários de direitos autorais, no qual representantes do mundo inteiro discutirão o desafio das novas tecnologias. Este ano o tema central será Creating value in the digital economy.

Segue
Esse seminário sempre ocorre antes da Assembleia Geral anual da Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores – Cisac, entidade presidida pelo Robbin Gibbs (um dos Bee Gees), que congrega a esmagadora maioria das entidades de autores do mundo, na qual Sanches também estará presente, dia 9, como representante da delegação brasileira da União Brasileira de Compositores.

Brasiiiill!!!!

Três brasileiros fazem parte da Lista Internacional dos Mais Bem Vestidos que a revista Vanity Fair promove anualmente: Tatiana Santo Domingo, a namoradinha do príncipe Andréa Casiraghi, seu tio, Alejandro Santo Domingo, e, no quesito Mais Bem Vestidos da Moda, Charlotte Dellal.

Papa fina

O trio disputará o título final com nomes como Leonardo di Caprio, Cate Blanchett, Michelle e Barack Obama, Carla Bruni e Nicolas Sarkozy, Oprah Winfrey, Tom Brady, Lady Gaga, a princesa Letizia de Astúrias, e por aí vai. A eleição já está aberta e é feita online.

Miséria? Que miséria?
A campanha publicitária Brasil sem Miséria, bolada para abafar o affair Palocci, custou aos cofres públicos a bagatela de R$ 31 milhões – quase uma gorda Mega-Sena acumulada.

Apoio 
Conforme adiantou aqui a nota Clima quente, no último dia 25, o governador do Amazonas, Omar Aziz, e a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) foram a Brasília pedir apoio ao presidente do Senado, José Sarney, quando da votação da Medida Provisória 534/11.

O que é


A MP concede incentivos fiscais para a produção de tablets. Com a medida, a incidência de dois tributos – PIS e Cofins – sobre os tablets fabricados no país cairá de 9,25% para zero. 

Com isso

Também haverá redução da cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do Imposto sobre Importação. De acordo com Aziz, a medida prejudica a Zona Franca de Manaus e cria um desequilíbrio entre as regiões do Brasil.

Raspadinhas

A artista plástica Vera Roesler participa amanhã da mostra coletiva Sábado com Arte do Atelier 319, no Leblon.

Andrea Tinoco assina o coquetel da Cinex, dia 7, no centro empresarial Le Monde, na Barra.

Marcos Eduardo Neves faz conferência sobre o tema Futebol no Rio: Cem anos de paixão, durante o seminário A cidade do Rio de Janeiro: patrimônio e história cultural, segunda-feira, na Academia Carioca de Letras.

Debora Olivieri estreia hoje, no Teatro do Leblon, a peça Rosa.

GOSTOSA

ILIMAR FRANCO - Jogada de risco


Jogada de risco 
ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 03/06/11

Uma ala do PT, a que elegeu o deputado Marco Maia (RS) presidente da Câmara e fez de Paulo Teixeira (SP) o líder da bancada, está pregando o rompimento do acordo com o PMDB. Este grupo quer eleger outro petista presidente da Câmara. O comportamento dos petistas na votação do Código Florestal na Câmara e o suposto cochilo que resultou na convocação de Palocci, para depor na Comissão de Agricultura, são fruto deste embate.

A luta interna petista 
Esta ala, que não ficou satisfeita com seu quinhão no governo Dilma, também aposta no enfraquecimento do ministro Luiz Sérgio (Relações Institucionais) e do líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP). Este movimento tem a batuta de integrantes das tendências Mensagem (Democracia Socialista), Movimento PT e PT de Luta e de Massas. Por isso, os petistas da maior tendência, a Construindo um Novo Brasil, pretendem retomar a liderança da bancada e reagir aos movimentos para desestabilizar seus quadros no governo. Esta autofagia explica tanto a paralisia na defesa de Palocci quanto seu abandono. 

"Nós não temos o direito de tentar bombardear o ministro Palocci para desestabilizá-lo. É um desserviço ao Brasil. Não é justo com a presidente Dilma” — Delcídio do Amaral, senador (PT-MS)

REDUÇÃO DE DANOS. Em missão de paz, o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa (na foto), foi enviado pelo
chefe (Guido Mantega) do outro lado da Esplanada para aplacar a irritação do colega Garibaldi Alves (Previdência), que ainda não tinha sido chamado a participar da formulação da desoneração da folha. “Essa história de ser atropelado pela Fazenda não é nova, é antiga. Se eu me sentisse atropelado eu já estaria ou num estágio de coma ou na UTI”, comentou Garibaldi.

Por acaso
Foi parar no ministro Antonio Palocci (Casa Civil) o foco da câmera que filmava o discurso da presidente Dilma no lançamento do Brasil Sem Miséria, exatamente no momento em que ela fala “brasileiro brilhante, destemido e corajoso”.

Como de hábito

O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) aproveitou o ato do "Brasil sem miséria" para entregar carta ao ministro Antonio Palocci, cobrando que ele se explique. Suplicy disse que já tinha enviado um e-mail. Palocci teria dito que não recebeu.

Barata-voa na base do governo
O PT e o PMDB, em duas situações distintas, adotaram postura semelhante diante da presidente Dilma Rousseff. Na votação do Código Florestal na Câmara, o PMDB patrocinou a emenda dos ruralistas derrotando a posição da presidente. No caso Palocci, um dia depois de a presidente reunir o Conselho Político, no qual o ministro Antonio Palocci pediu apoio à base governista, recrudesceram no PT as críticas e as cobranças.

Na onda
O DEM decidiu criar ontem o Observatório do Brasil Sem Miséria. O objetivo é acompanhar a execução do programa anunciado pelo governo Dilma e localizar focos de miséria que, eventualmente, não venham a ser contemplados.

Eu fico
O governador Eduardo Campos (PE) e o ex-ministro Ciro Gomes tiveram uma longa conversa ontem, em Brasília. Ciro garantiu que está fechado com o projeto político do PSB e que não tem planos de ingressar em outro partido.
 MARXISTA DE FÉ. A deputada Jô Moraes (PCdoB-MG) diz que vai dar uma medalhinha de “Nossa Senhora Desatadora de Nós” para a presidente Dilma. 
 FARINHA DO MESMO SACO. Ex-tucano, o deputado Gabriel Chalita (PSB-SP) minimiza sua filiação ao PMDB, amanhã: “Todos os partidos são iguais”. 
● A IMPRENSA Oficial de São Paulo lança na terça-feira, no Senado, o livro “Mario Covas, democracia: defender, conquistar, praticar”. Organizado por Osvaldo Martins, ele narra em 352 páginas momentos importantes da trajetória política de Mario Covas.

TUTTY VASQUES - Caiu do céu!


Caiu do céu!
TUTTY VASQUES
O ESTADÃO - 03/06/11

Atingido no rosto por um objeto arremessado em campo pela torcida do Cerro Porteño, Muricy Ramalho ligou para José Serra. Queria o contato do médico que o atendeu quando lhe tacaram um troço na cabeça. O ex-governador bateu o telefone na cara do técnico, certo de que era trote, coisa do pessoal do Aécio!

Faz sentido, mas não importa se o que acertou Muricy foi bolinha de papel, pedra ou pirocóptero, como se discute nas redes sociais. O certo é que, àquela altura do jogo - 38 do segundo tempo -, o incidente teve o efeito de um balde de água fria no ataque adversário. Graças à apresentação do galo na testa ao juiz, a partida foi interrompida quando o Santos mal respirava na defesa.
Muricy não precisava nem ter o mérito indiscutível do bom trabalho, qualquer um ganha razão quando agredido gratuitamente em público. Mal comparando, Joseph Blatter também teria saído melhor de sua última entrevista coletiva na Fifa se algum jornalista lhe atirasse o sapato.
Não sei como a turma que assessora o Palocci ainda não pensou nisso, né não?! Ou, vai ver, já tem gente do ministro comprando pirocópteros no Paraguai.
Já era!
Roland Garros perdeu metade da graça com a eliminação da russa Maria Sharapova. O que ainda poderia restar de interessante no torneio, a sérvia Ana Ivanovic, perdeu logo na estreia. Precisa gostar muito de tênis para admirar a chinesa Na Li e a italiana Francesca Schiavone em quadra.
Gordita
Parte da torcida do Cerro Porteño culpa Larissa Riquelme pela eliminação na Libertadores. 
Visivelmente fora de forma, a musa paraguaia ameaçou tirar a roupa de novo para fotos caso seu time de coração vencesse o Santos. Comenta-se em Assunção que os deuses do futebol que a protegem acharam que não era hora para isso.
Peso pesado
Pesa a favor de Agustín Carstens, candidato mexicano à vaga de Dominique Strauss-Kahn, os quase 140 quilos de massa corpórea do economista. Passa uma certa confiança de que jamais vai pular em cima de uma camareira, sob o risco de cometer, em vez de estupro, assassinato.
Mal comparando
Só no Rio mesmo ainda se prende PM por envolvimento com o jogo do bicho. Em São Paulo, a turma já está assaltando banco.
O cara!
Há muito tempo a televisão brasileira não consagrava um canastrão da grandeza de Eriberto Leão, o Pedro de Insensato Coração. Só se fala disso no meio artístico - ô, raça!
O que é o que é?
Pirocóptero - marca de pirulito anunciada na TV brasileira nos anos 1980 (confira no YouTube). Depois de chupar até o palito, a garotada encaixava uma pequena hélice-brinde na haste, que alçava voo quando friccionada entre as mãos.
É do seu tempo? 

GOSTOSA

IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO - A mancha de zabaione no caxemira




A mancha de zabaione no caxemira
IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO
O Estado de S.Paulo - 03/06/11

Tinha ainda na cabeça as cachoeiras de São Francisco Xavier, o Festival da Mantiqueira cada vez mais consolidado, o murmúrio do riacho por trás da Pousada Muriqui, a embalar nosso sono, enquanto o bolo de fubá do meio da tarde embalava o paladar, o escondidinho de carne-seca ou os peixes do Allegro, sempre lotado, os encontros no café da manhã de figuras como Luiz Felipe Pondé, Lobão, Luis Ruffato, Márcio Souza, Regina Zilberman e Xico Sá. Pensava no dia anterior, achando que o festival é curto e as mesas divertidas, e no supermercado, mergulhado no cotidiano, empurrava o carrinho quando dei de frente com a mulher. Devia ter uns 30 anos e tinha a cara amarrada.

Nos olhamos e ela empurrou o carrinho em minha direção, segura de que eu era um homem cortês. E sou, decidi dar caminho. Na estreiteza dos corredores, a única solução era andar para trás. Ir de fasto, como se diz no interior. Ela nem me olhou, continuou empurrando seu carrinho em minha direção, quase junto da minha barriga. Podia ter andado mais devagar. Continuei de fasto, nem podia olhar para trás.

De repente, tropecei num caixote, perdi o equilíbrio, caí sentado dentro de uma embalagem vazia de frutas. Fiquei de tal modo encaixado que ficou difícil levantar. A mulher passou ao largo e deu um sorriso irônico, me gozando.

Agora, o que faço quando me vir de novo na mesma situação? Empurro meu carro para a frente como se não viesse ninguém na minha direção? Obstruo o caminho? Ou continuo sendo uma pessoa educada, aquela que dá caminho, que cede passagem e que é visto como bobo? Dilemas. E não há mais manuais de etiquetas para nos orientar.

Não era mesmo o meu dia. Saí, caminhei e ao passar por uma doceira, célebre pelas bombas de zabaione, entrei atraído pelo doce cheiro. As bombas, cobertas com glacê rosa, são perfeitas, um creme maravilhoso na textura. Pedi uma, apanhei com cuidado, e dei uma mordida. Ela se rompeu pelo lado de baixo, o creme saiu num jato, caiu sobre a malha de caxemira que me foi dada pela minha mulher naquela manhã. Fiquei na mão com a casca da bomba. Desapontado, comi a casquinha e lambi um restinho do creme que tem uma tênue dose de álcool.

Procurei os guardanapos, estavam na mesinha do centro e havia três mulheres conversando, rodeavam a mesa, bloqueando a passagem.

- Com licença, posso apanhar um guardanapo?

Um delas olhou e me ignorou. Repeti o pedido.

- Por favor, posso apanhar um guardanapo?

Outra das três mulheres me contemplou com cara de desdém (sei lá por que peruas têm esse olhar altivo e desequilibrado), e ao dar com a mancha de zabaione no meu belo caxemira novinho, disse:

- O senhor está todo sujo! Olha a porcaria que fez ao assoar o nariz. Não se envergonha? Este é um lugar fino.

- Não assoei o nariz, este é o creme da bomba de zabaione que explodiu.

- Se comesse direito, não explodia. Coloca-se a bomba inteira na boca. Não se diz bomba, chama-se éclair.

- Ah! Éclair... Como fecho éclair?

Ela me deu as costas. O creme de zabaione estava escorrendo para a minha calça. Olhei em torno, não havia uma pia, não havia uma torneira, minha mão também estava melada. Saí, entraria num bar, me limparia. Voltei correndo, tinha esquecido o livro no balcão. O novo livro da Eliane Brum, o romance Uma/Duas. Corri ao balcão, o livro estava lá, as três mulheres ainda rodeando a mesa onde ficavam os guardanapos inacessíveis, fregueses olhavam com nojo a mancha de zabaione.

Então, passei o dedo no que restava do creme e coloquei na boca, saboreando. Duas mulheres viraram a cara com desprezo. Um mauricinho (ainda existe esse termo, ou essa tribo?) gritou alto e sonoro: PQP. Sorrio, apanhei o livro. Ninguém ligou para um livro no balcão, todos na tarde em que tímidos raios de sol furam nuvens cinzas e geladas tomavam cafés, capuccinos, comiam palmiers, como se estivessem em Paris, os rostos empinados. Como tem gente de rosto empinado na cidade.

Fui atravessar a rua, abriu o sinal para mim, avancei dois passos na faixa de pedestres, um BMW veio para cima, recuei, xinguei, o motorista me fez um gesto, aquele que significa vá tomar. Ainda ouvi: "Pensa que pela idade pode atravessar a faixa quando quiser? Vai morrer rápido, abra o olho!" Tentei uma segunda vez, outro me impediu, recuei. Uma terceira tentativa, e o carro não vacilou, ia me atropelar, brecou em cima, o sujeito colocou a cara para fora, fui xingado. Li no jornal que estão tentando educar os motoristas e os pedestres. Aconselham o pedestre a fazer um sinal na hora de atravessar.

Ergui a mão e fiz o sinal. Um táxi parou, informei que não chamei táxi; ele, áspero, gritou: "Então, por que ergueu a mão para mim?" Não ergui para você, ergui avisando que quero atravessar a faixa, explico. Ele enraiveceu, porque se enraivece facilmente em São Paulo: "Nunca em toda a minha vida, e faz 40 anos que dirijo táxi, vi uma pessoa erguer a mão avisando que quer atravessar a faixa. Isso é para o ônibus, no ponto. De onde o senhor é? Um caipira. Vai morrer logo. Fique esperto. E ainda por cima sujo, melecado, o senhor é um porco!" Foi embora, o sinal fechou para mim.

Decidi ir a pé até minha casa, são 16 quadras, um vento gelado corta a Rebouças. Não era meu dia. Talvez amanhã seja. Ou depois, ou domingo. Quem sabe um dia eu possa sair de casa, atravessar a rua, comer uma bomba, conseguir um guardanapo. Talvez um dia as pessoas sejam gentis, mas não sei se estarei vivo.

NELSON MOTTA - A grandeza dos baixinhos


A grandeza dos baixinhos
NELSON MOTTA
O GLOBO - 03/06/11

Eles são chamados de tampinha, pintor de rodapé, segurança de baile infantil, piloto de autorama e chaveirinhos, mas, desde a invenção da pólvora, os baixinhos se valorizaram muito — principalmente os que atiravam bem. Mas os melhores perfumes — e os piores venenos — continuam nos menores frascos. 

Napoleão Bonaparte é o grande patrono dos baixinhos, e dominou o mundo do alto dos seus 1,62m. Em compensação, o maior pacifista da História, alem de baixinho, era magrinho e fraquinho, mas Gandhi ganhou as suas guerras sem dar um tiro. Com 1,62m o pintor de rodapé Pablo Picasso fundou a arte moderna e mudou a nossa maneira de ver o mundo. 

A fábrica de ilusões do cinema, com seus truques e efeitos, é um ambiente muito favorável a tampinhas como Charles Chaplin, o primeiro a se tornar um gigante das telas com o humor e o romantismo do seu Carlitos. Grandes astros do cinema, criadores de personagens colossais — como Al Pacino e Dustin Hoffman —, não chegam a 1,67m. Nesse time sub 1,70m também entra o segurança de baile infantil Joe Pesci — principalmente com um taco de beisebol na mão. E não vá bulir com aquele tiozinho de 1,62m porque Jean Claude Van Damme é um chaveirinho enfezado que não leva desaforo pra casa. Mas não é só em frente às câmeras que eles crescem. Diretores gigantescos como Woody Allen, Martin Scorsese, Steven Spielberg e Spike Lee, que dirigem as maiores estrelas, também não passam de 1,67m, mas sua imaginação e poder não têm limites. 

Ao contrário da NBA, a música favorece os baixinhos. Compositores geniais como Cole Porter e o poetinha Vinicius de Morais, e grandes vozes como Paul Simon, Freddie Mercury, Prince, Bono e Djavan, atingiram as alturas da glória. 

Na bola, reinam "O" baixinho Romário, com seu talento, sua marra e seus 1,67m, o genial tampinha Maradona, que é ainda menor, e o maior craque da atualidade, Lionel Messi, 1,65m. Eles são o terror dos zagueirões do mundo inteiro. 

Assim como os feiosos tentam equilibrar o jogo com simpatia e inteligência, os baixinhos têm que se esforçar mais para provar que não é o tamanho que conta — mas o que se faz com ele.

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO - Situação-limite


Situação-limite
EDITORIAL
O Estado de S.Paulo - 03/06/11

As virtudes da contenção verbal no comportamento humano são louvadas nas mais diferentes culturas. Exemplo disso é o ditado "o silêncio é de ouro", que os brasileiros compartilham com muitos outros povos. Mas, em relação ao silêncio de que se fala sem parar no País de duas semanas para cá, a evocação do nobre metal é despropositada. Se é para associar ao reino mineral a mudez do ministro Antonio Palocci sobre o seu estupendo enriquecimento entre a sua saída do Ministério da Fazenda, no governo Lula, em 2006, e até pouco antes de assumir a chefia da Casa Civil da sucessora, Dilma Rousseff, em janeiro último, a comparação certa é com a pirita, o ouro dos tolos, por sua enganadora cintilação.

De tolo, o ministro não tem nada. Por isso mesmo, a sua recusa a explicar ao País, convincentemente, como fez fortuna de forma limpa e ética levou a uma situação-limite as suas condições de continuar no Planalto. Tanto por desfigurar a positiva imagem pública que a sua chefe vinha construindo nos meses que antecederam a crise quanto por expô-la ao desmedido apetite da alcateia com que tem de se haver no Congresso. Além disso, cada vez mais inquieto com a perspectiva de novos danos ao governo, o partido já não se limita a manter profilática distância do escândalo - como, aliás, fez a presidente Dilma logo na sua irrupção.

Nos bastidores, parcela talvez substancial dos companheiros tampouco fica apenas no chamamento do ministro às falas. A demanda tem sido a sua substituição - e nomes já correm para o seu cargo. A manifestação mais comentada foi a da senadora Gleisi Hoffmann. No almoço da bancada com o ex-presidente Lula, semana passada, quando ele se abalou a Brasília para aplacar os atritos entre Dilma e a caciquia do PMDB, ela teria pedido a cabeça do ministro. Esposa do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, que está na lista dos eventuais sucessores de Palocci, teria argumentado que uma coisa era amparar os petistas envolvidos com o mensalão - que, afinal, operavam em benefício do partido -, outra é defender quem se dedicou a engordar o próprio patrimônio. Gleisi desmente.

Quando também se reuniu com os companheiros senadores, Palocci disse que os seus serviços de consultoria consistiam em palestras, análises de alternativas de investimentos financeiros e assessoria para empresas interessadas em fusões. Decerto não esperava que um de seus ouvintes, Eduardo Suplicy, viesse a revelar candidamente que o ministro contara ter recebido R$ 1 milhão por seus conselhos a uma empresa em processo de fusão. O ministro, de todo modo, insistiu em que não praticou nenhuma ilegalidade - e acusou a oposição de fabricar pretextos para desestabilizar o governo Dilma. Para não se prestar a esse jogo, a base aliada faz bem em impedir as tentativas de convocá-lo a depor no Congresso.

Mas, anteontem, prova da desarticulação política da coalizão dilmista, a base "engoliu vergonhoso frango" - para usar a retórica de Lula - ao deixar passar uma daquelas iniciativas na Comissão de Agricultura da Câmara. Alheio à agenda de sessões na Casa e esquecido de que a oposição não desistira de aproveitar todas as brechas disponíveis para requerer a oitiva de Palocci, o Planalto marcou um encontro do Conselho Político com a presidente na mesma quarta-feira em que as comissões dos deputados se reúnem rotineiramente. Na de Agricultura, a convocação de Palocci foi aprovada a toque de caixa, em circunstâncias controversas. O presidente da Câmara, o petista Marco Maia, sustou a decisão. Não o terá feito por Palocci, mas por dever de ofício - a oposição não pode prevalecer sobre o governo, ponto.

O ministro já tinha feito saber que se pronunciaria assim que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, desse o seu parecer, previsto para ontem, sobre as representações oposicionistas contra ele e as suas réplicas por escrito. A situação se complicou quando o procurador não se contentou com as explicações dadas até agora e pediu ao acusado esclarecimentos adicionais. Mas não é por aí que se decidirá a atual crise. Em todos os lados, as reservas de boa vontade com Palocci parecem esgotadas. Cabe à presidente Dilma lavrar a sentença final.

O SORRISO DO MISERÁVEL!


FOTO NO LANÇAMENTO DO BOLSA MISÉRIA
ONTEM 02/06/11

MONICA B. DE BOLLE - Pigmaleão


Pigmaleão
MONICA B. DE BOLLE

O Estado de S.Paulo - 03/06/11

A demonização dos fluxos de capital integrou-se, definitivamente, ao discurso do governo. Não bastassem os alarmes constantes do Ministério da Fazenda sobre as implicações adversas das entradas de recursos externos para o câmbio, para as exportações e para a indústria brasileira, agora o Banco Central se junta ao coro, insistindo em que o apetite dos investidores estrangeiros por ativos brasileiros atiça a inflação. O remédio, recém-endossado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), é claro: fluxos exacerbados devem ser contidos por meio da adoção de controles de capitais, "bem estruturados e preventivos", como enfatizou o economista-chefe do Fundo, Olivier Blanchard, em suas declarações durante uma conferência sobre o tema na semana passada. É uma recomendação adequada para o Brasil? Eis a dúvida.

Não foi por acaso que a conferência sobre os controles de capitais se realizou no Rio de Janeiro. Afinal, o Brasil tem sido um dos principais proponentes do uso dessas medidas como parte do arsenal "macroprudencial", sobretudo com a fartura de liquidez global provocada pela frouxidão monetária das economias maduras. Além do mais, o País está no topo da lista quando se trata dos principais receptores de recursos externos, tendo captado, só no primeiro trimestre de 2011, cerca de US$ 40 bilhões - ou 40% de todo o fluxo do ano passado. Desde a elevação do IOF para conter a entrada de recursos de curto prazo - os investimentos em carteira -, a maior parte dos fluxos destinados ao País tem vindo como investimento direto estrangeiro, aumentando as suspeitas de que os indesejados fluxos especulativos estejam burlando os controles estabelecidos. Provavelmente estão. E esse é apenas um motivo para duvidar da sua eficácia e da sua utilidade para ajudar a resolver os desequilíbrios brasileiros.

Se ao menos a causa para os fluxos exacerbados fosse unicamente o excesso de liquidez global, combinado com o bom desempenho relativo da economia brasileira e a falta de opção dos investidores diante das agruras do mundo avançado, haveria alguma justificativa para instituir medidas de controle. De fato, a entrada maciça de recursos dificulta o manejo das condições de liquidez domésticas. No entanto, mesmo nesse caso, em que os controles seriam mais "justificáveis", os recursos externos só "atiçam a inflação" se o governo tentar gerenciar a taxa de câmbio, operando um regime que, na prática, se assemelha ao câmbio fixo, ainda que seja denominado de flutuante.

Mas qual a alternativa, se a valorização do câmbio prejudica a indústria e as exportações, de um lado, e não se pode elevar muito a taxa de juros para conter a inflação, de outro, sob o risco de estimular ainda mais a ganância dos especuladores? Bem, como disse certa vez o dramaturgo George Bernard Shaw, autor da peça que intitula este artigo e que inspirou o famoso musical My Fair Lady, para todo problema complexo existe uma solução clara, simples e errada. A panaceia dos controles de capitais encaixa-se precisamente nessa afirmação. Não é a valorização do câmbio que prejudica a indústria - o câmbio é apenas o preço relativo entre duas moedas, nada mais. A real causa da falta de competitividade relativa da indústria brasileira são os onerosos encargos tributários que pesam sobre ela e a ausência de uma infraestrutura adequada para escoar a produção, pressionando os custos. Também não é a taxa de juros elevada que atiça os fluxos, mas, sim, os desequilíbrios fiscais e as reformas parciais, que impedem uma redução de juros isenta de uma desorganização macroeconômica no País. Mas mudar esse quadro é muito difícil - exige, sobretudo, planejamento e vontade política.

Mais fácil é fechar os olhos e imaginar que somos a Eliza Doolittle de George Bernard Shaw, como fazem os investidores internacionais com a sua pragmática visão sobre as boas perspectivas relativas do Brasil. Uma humilde vendedora de flores, de vocabulário pobre e cultura limitada, repentinamente transformada em dama da sociedade. Vivam os controles de capitais!

JOÃO MELLÃO NETO - Senhora presidente


Senhora presidente
JOÃO MELLÃO NETO
O Estado de S.Paulo - 03/06/11

Não votei na senhora. Aliás, em São Paulo, o lulismo nunca deu muito certo. Vocês já disputaram várias eleições por aqui. Para governador não levaram nenhuma. E isso desde a fundação do PT. Já em 1982, quando foi realizada a primeira eleição direta para o cargo - eu bem me recordo -, o próprio Lula se apresentou como candidato e levou uma bela surra: acabou em quarto lugar. Eleições para presidente, de seis vocês só levaram uma, a de 2002. E já no pleito seguinte foram sovados novamente.

O povo daqui é ordeiro e trabalhador. Vai ver que é por isso que não gosta de vocês. Pelo menos a maior parte dele. A gente torce o nariz à forma como os petistas fazem política.

Vocês se deram bem no começo por se dizerem diferentes de tudo o que existia. Agora, quatro décadas passadas, continuam a se achar assim. São ripongas, ou seja, hippies fora de época: gente que não soube envelhecer com dignidade.

O fato é que a hora da revolução já passou. E, quando passou, vocês estavam dormindo. Paciência. Como leão desdentado também ruge, vocês, petistas, acreditam poder continuar na estrada.

Naquelas "pré-históricas" eleições de 1982, o slogan do partido era: "Vote em Lula, um brasileiro igualzinho a você". Para reforçar o apelo, o candidato deixou a gravata e o paletó de lado e comparecia aos debates televisivos apenas com uma camiseta. Não funcionou. Pesquisas posteriores demonstraram que as pessoas, em geral, pensavam: "Se ele é igual à gente, por que não vem aqui pegar no pesado? Nós queremos votar em alguém que seja melhor".

Bem, senhora presidente, como Vossa Excelência não é daqui e naquela época nem sequer era petista, esses assuntos devem parecer-lhe tediosos. Vamos, então, direto ao que realmente interessa.

Acontece que nós, paulistas, mesmo não tendo contribuído para a sua vitória eleitoral, por alguns momentos acreditamos que o seu governo, em relação ao anterior, representaria um avanço. Ainda antes de ser empossada, a senhora cuidou de descartar Celso Amorim, encerrando, assim, a política externa de "pragmatismo irresponsável" que ele representava. A gente passava vergonha lá fora com as diabruras do ex-chanceler. Ele que vá procurar emprego no Irã ou na Venezuela.

Essa sua atitude, presidente Dilma, contribuiu muito para incrementar o seu prestígio por aqui. Aumentou a nossa esperança no futuro. Também quando a senhora confrontou as centrais sindicais, no início do ano, a imagem que nos passou foi a de uma nova "dama de ferro". E isso alimentou ainda mais os nossos bons augúrios.

Mas, vou ser sincero, é muito frustrante perceber que todas essas nossas expectativas estão se demonstrando vãs, em razão dos fatos ocorridos nos últimos tempos. O que parece é que os governantes da era lulista têm sido muito infelizes com as suas escolhas para a Casa Civil. Os que ousam sentar-se naquela cadeira quase sempre dela são ejetados. E ficam, para sempre, sob suspeita.

Todos nós sabemos, senhora presidente, que Antônio Palocci tem sido o seu principal auxiliar no governo. Como o foi também Erenice Guerra, na gestão anterior. E antes disso havia, ainda, José Dirceu. Pelo visto, somente a senhora, no posto, teve um comportamento irreprovável.

De duas, uma. Se a senhora realmente acredita que os dois primeiros sejam inocentes, saia imediatamente em defesa deles. Não se conhece nenhuma palavra sua nesse sentido. E ambos foram escolhidos pessoalmente pela senhora. Omitir-se, simplesmente, não lhe fica bem. Ou, então, se não pretende arder no inferno com eles, a senhora deve assumir que selecionar recursos humanos não é mesmo o seu forte. Cuide de bem administrar e delegue essa tarefa à alta burocracia do Estado, aos partidos que a apoiam ou - quem sabe - até mesmo a uma empresa de headhunting.

Mas, até agora, não se verificou nem uma coisa nem outra. Essa omissão acabou contribuindo para que a sua estrela esmaecesse e a de seu antecessor voltasse a brilhar.

Creio que é esse o ponto, senhora presidente. Todos nós, brasileiros - tendo ou não sufragado seu nome -, esperamos que a senhora se revele uma pessoa superior ao cidadão comum. Eu, pelo menos, tinha essa expectativa. Não a apoiei, mas entendia que, uma vez eleita, a senhora se imbuiria de sua missão. E com isso encorpasse, crescesse e ganhasse grandeza.

De um estadista, dona Dilma, não se requer, tão somente, que seja eficiente. É preciso, também, que seja eficaz. E que se mostre efetivo.

Superar-se, senhora presidente, não significa apenas pretender impor a sua vontade aos outros, mas também compreender que, na política - como na vida -, a gente não faz apenas o que quer, mas também aquilo que pode. Os parlamentares que estão no Congresso Nacional foram igualmente eleitos pelo voto popular. E, portanto, eles se sabem tão legítimos quanto a senhora. Não vale a pena confrontá-los.

É preciso ousadia, é certo. Como dizia Tancredo Neves, "ninguém chega ao Rubicão para pescar". Nem para apenas molhar os pés.

Mas é preciso, também, saber conversar. E a senhora, pelo visto, não sabe e não quer dialogar com ninguém.

A História esta aí para mostrar: os governantes que fizeram a diferença foram todos excelentes negociadores. Criavam os seus consensos, compunham as suas maiorias e sabiam, enfim, como empolgar com os seus próprios enredos.

Por outro lado, na vigência da democracia, no último meio século, apenas três presidentes acreditaram ser possível governar sem o Parlamento: um renunciou, outro foi deposto e o terceiro acabou impedido.

GOSTOSA

DORA KRAMER - Origens da crise


Origens da crise
DORA KRAMER 
 O Estado de S.Paulo - 03/06/2011

Avaliação de dois aliados de peso, sem nenhum interesse no desgaste político do governo: se a presidente Dilma Rousseff não revisar seus métodos e se o PT não resolver suas disputas internas por hegemonia, o projeto de poder idealizado por Luiz Inácio da Silva pode não ter a vida longa pretendida.

Nessa crise aos cinco meses de governo ficou claro que o modelo petista de governança política não dá muito certo sem a presença de um maestro como Lula para, ao mesmo tempo, atrair e desviar todas as atenções, a depender do interesse.

Portanto, o distanciamento do ex-presidente do cotidiano da política nacional é algo impensável. Mas, se Lula é o remédio, sua eficácia depende da dose em que for aplicado.

O desembarque em Brasília na semana passada como se viu só serviu para desorganizar a confusão e subtrair da presidente uma credibilidade que vinha sendo construída nos primeiros meses em que marcou diferenças do antecessor e deu margem à interpretação de que a complementação de estilos poderia resultar em um projeto eleitoralmente imbatível.

Lula sustentando o patrimônio de popularidade já assegurado entre a imensa maioria dos mais pobres e dos emergentes recentes; Dilma trabalhando na manutenção da confiabilidade entre os mais ricos enquanto conquistava espaços na chamada classe média tradicional e nos setores refratários ao populismo do ex-presidente.

Só que, ao intervir com estardalhaço, o antecessor expôs toda a fragilidade da antecessora, cuidadosamente protegida por anteparos durante a campanha eleitoral. A principal "blindagem" de Dilma, então, era o próprio Lula.

Uma vez estando ela na Presidência, a repetição do método produziu a cena de ilegitimidade captada por todos nos dois dias em que Lula esteve na capital fazendo e acontecendo como se presidente ainda fosse.

Poderia e até deveria intervir, na visão de dois espectadores privilegiados da crise, mas com discrição. A atuação de Lula nos bastidores é considerada imprescindível para orientar na articulação da ampla base partidária, mas, sobretudo, para segurar os apetites por vezes suicidas do PT.

Ninguém duvida de que o infortúnio de Palocci é visto por setores do partido como uma janela de oportunidade para deslocar o eixo de poder.

Mas quem observa o panorama sob a perspectiva dos outros partidos integrantes do governo, principalmente PMDB e PSB, preocupa-se mais com o restante do mandato de Dilma que propriamente com o desfecho do caso em curso.

Este provavelmente se resolve com a saída de Palocci. Mas como se resolvem as questões que levaram o episódio a assumir proporções de crise ampla e quase irrestrita?

A solução, na opinião dos parceiros, cabe a Lula saber apresentar. Afinal, é o avalista de um projeto com o qual todos se comprometeram e do qual todos se pretendem participantes sem reconhecer no PT o papel de protagonista absoluto com o direito de pôr tudo a perder.

Em pessoa. O notório telefonema de Palocci para o vice-presidente Michel Temer ameaçando com a demissão de todos os ministros do PMDB, caso o partido não se alinhasse ao governo na votação do Código Florestal, foi feito do gabinete de Dilma Rousseff.

E com o viva-voz acionado para que ela pudesse acompanhar a conversa pari passu, conforme indicava o eco perceptível do outro lado da linha.

O ministro, que normalmente se refere a ela como "Dilma", naquela noite, ao telefone, durante todo o tempo aludiu às ordens da "senhora presidente".

Isso explica o fato de o sempre habilidoso Palocci ter-se dado ao deslize de tão inábil abordagem.

Ciente. Um dos fatores que teriam contribuído para a ausência de uma decisão mais firme e rápida em relação a Palocci seria a informação passada por ele mesmo à presidente, antes de assumir a Casa Civil, sobre a amplitude de seus êxitos financeiros no período em que esteve fora do governo.

MERVAL PEREIRA - Saco de gatos


Saco de gatos
 MERVAL PEREIRA
O Globo - 03/06/2011

No Brasil atual, de amplo espectro partidário que abriga nada menos que 27 legendas com registro nacional, sendo que 22 delas com atuação no Congresso, não há partidos “de direita”, muito menos de “extrema- direita”, e nem partidos de “extrema-esquerda”. Todo mundo quer ser “de esquerda” e, quando não dá, no máximo, “de centro”.

Sem falar no 28opartido em gestação, o PSD, que não é “de centro, nem de direita, nem de esquerda”, segundo a indefinição de seu criador, o prefeito paulistano, Gilberto Kassab.

Essa geleia geral de siglas — a maioria delas abrigada sob uma aliança governista, a mais ampla e diversificada já vista no país — esterilizou a prática política, retirando conteúdos programáticos ou ideológicos dos partidos, transformandoos em meros instrumentos a serviço do governo e de interesses pessoais.

É dentro desse quadro que a aliança entre o deputado Aldo Rebelo, do PCdoB, e a bancada ruralista na defesa do novo Código Florestal traz novamente à discussão a ideologia dos partidos políticos brasileiros.

O PCdoB já foi, em outras épocas, considerado de “extrema- esquerda”, e garante que não mudou de posição: a defesa do novo Código seria a dos pequenos agricultores, ao contrário do que dizem os que acusam o partido de ter se vendido ao agronegócio.

O DEM, saído da tentativa de modernização da antiga Frente Liberal, chegou perto de assumir uma identidade “de direita”, aliando-se à Internacional Democrática de Centro (IDC) em 2005. A IDC contrapõe-se à Internacional Socialista, que reúne os partidos de esquerda e social-democratas no mundo, e agrupa legendas representadas também por políticos como Jacques Chirac, na França; Durão Barroso, do PSD, em Portugal, hoje presidente da Comissão Europeia; e o Partido Republicano nos EUA.

Mas houve uma reação a essa decisão e o partido, hoje desidratado, segue sem definição oficial, embora seja visto como “de direita”.

O movimento Tea Party (Partido do Chá, em português), uma referência ao movimento de 1773 em Boston, nos Estados Unidos, contra o governo britânico — que, por meio da Companhia das Índias, tinha o monopólio do chá nas colônias e cobrava impostos considerados abusivos —, representa na política americana o conservadorismo mais radical, com políticos ligados à ultradireita, geralmente do Partido Republicano, e se identifica com uma parte do eleitorado.

Temos aqui no Brasil vários deputados atuando individualmente dentro de parâmetros que são definidores da “extrema- direita” e poderiam fazer parte do Tea Party, como os deputados Jair Bolsonaro (PP) e Garotinho (PR) ou a bancada suprapartidária das igrejas. Mas seus partidos não são tachados de “extrema-direita”, e nem mesmo se assumem como “de direita”.

Esses grupos tiveram ação mais forte na recente campanha presidencial, quando questões como o aborto surgiram, e continuam em ação hoje, sobretudo na discussão da política sobre as minorias. PP e PR, além do mais, estão na base de um governo que se diz “de esquerda”, o que aumenta a confusão ideológica.

Ao contrário da regra de que nenhum político brasileiro se declara “de direita”, a direita está sempre presente nos governos formados a partir de 1985, quando Tancredo Neves se elegeu presidente da República, numa aliança antes impensável com os dissidentes do PDS, partido que dava sustentação à ditadura militar. O PFL provocou outro choque quando chegou ao poder nas eleições diretas ao lado de Fernando Henrique, do PSDB.

Assim como ninguém é de “extrema-direita”, também não existe mais um partido de “extrema- esquerda”, pelo menos em atuação no Congresso. Mas, no mundo político real de outros países democráticos, há distinção clara entre “direita” e “extrema-direita”, e entre “esquerda” e “extrema-esquerda”.

Esquerda seriam Michelle Bachelet, do Chile; o governo espanhol de Zapatero; Lionel Jospin, o premier que antecedeu Sarkozy na França. Já Hugo Chávez, a ditadura cubana que Lula está visitando pela enésima vez, ou mesmo as Farc da Colômbia, deveriam ser classificados como de “extrema- esquerda”, mas são jogados todos no mesmo balaio da “esquerda” mundial, no máximo tratados como “vegetarianos” e “carnívoros”, uma maneira sutil de tocar em suas tendências sem ser politicamente incorreto.

Essas reflexões sobre a indefinição ideológica me foram propostas pelo experiente jornalista José Gorayeb, que ressalta que, dos anos 1960 aos 1980, e até recentemente, nos anos 1990, a imprensa brasileira fazia essa distinção muito claramente: referia-se a regimes, partidos ou correntes “de extrema-esquerda”.

Assim eram referidos o MR- 8, o PCdoB, a Libelu e o MEP, entre outros. Talvez porque, no Brasil sob o regime militar, a luta armada era claramente mencionada como ação e ideologia de extrema-esquerda, em contraposição à “esquerda” ideológica, ou seja, o MDB e o PCB, que defendiam a luta contra a ditadura “pelo voto” e pela ação parlamentar. De “esquerda” eram também designados o PDT brizolista e o PT, apesar de este ter agasalhado facções de extrema-esquerda que, com outras denominações, até hoje estão lá.

Ao falar, por exemplo, numa eleição europeia, a imprensa distinguia os partidos de “esquerda”, como os socialistas, dos de “extrema-esquerda”, a exemplo dos mais radicais, como, na Alemanha, os egressos do terrorismo à la Baader-Meinhof. Como “de extrema-esquerda” eram também mencionados os movimentos insurgentes/ terroristas latino-americanos como os Montoneros e os Tupamaros. Hoje, as Farc são referidas como “organização de esquerda”.

Essa banalização das ideologias partidárias, e a esterilização da política por meio da cooptação por vantagens fisiológicas, fazem com que todos os gatos se pareçam pardos e caibam no mesmo saco.

ORGULHO DE SER BRASILEIRO!

JOSÉ SIMÃO - Ueba! O Neymar é aerodinâmico!


Ueba! O Neymar é aerodinâmico! 
JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SÃO PAULO - 03/06/11

E adoro a ficha técnica dos Meninos da Vila. Se juntar todos, não dá a idade do Rogério Ceni

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta: "TRE-Minas fará recontagem de eleitores". Em que cidade? MARMELÓPOLIS! E esta: "Transexual Lea T. desfila de engana-mamãe no Fashion Rio". Engana mamãe, papai e um monte de marmanjo. Rarará!
E mais um pra minha série Os Predestinados. É que em Candeias, na Bahia, tem um ginecologista chamado Ary Toledo das Dores! Rarará! Esse deve ficar contando piada até passar as dores!
E o Santos? E o Neymar? O Neymar é aerodinâmico. Aquele cabelo dele parece flap de avião! Seu Galeão Cumbica! Impressionante! O Neymar não tem osso! E o técnico Muricy Ramalho que levou uma pedrada paraguaia na cabeça. Intifada paraguaia. Mas aquilo não era pedra, não! O povo do Twitter diz que era um pirocóptero!
Quem lembra do pirocóptero? Um pirulito que vinha com uma hélice! Pirulito voador. O Muricy foi atingido por um pirulito voador. A Globo disse que era pedra. Bem, pra Globo tudo que voa é pedra. Lembra do caso Serra que bolinha de papel virou pedra na Globo?
E o coitado ficou bem xoxo! Mudou de nome pra Esmoreci. Esmoreci Ramalho. Rarará! E quebrar cabeça de técnico é dificil. Porque todo técnico é cabeça-dura! Rarará!
E adoro a ficha técnica do Santos. Dos Meninos da Vila! Faixa etária: bezerro desmamado. Escolaridade: maternal incompleto. Se juntar todos, não dá a idade do Rogério Ceni! Rarará!
E a torcida santista é acusada de roubar a lanchonete dum argentino. Como é o nome do argentino? Mario Grana! Raparam a grana do Grana. Rarará! Depois falam dos corinthianos! E essa: "Vídeo de sexo do goleiro do Sport vaza na internet". Onde ele nasceu? Piranhas, Alagoas! Rarará!
E o Brasileiro é Cordial. Olha a placa do Gervásio na empresa em São Bernardo: "Se eu souber que alguém daqui fica simulando doença ou dorzinha pra ficar em casa vagabundeando, vou fazer esse bipolar insano ficar uma semana algemado no pé da cama junto com a minha sogra. Conto com todos. Assinado: Gervásio".
E aí um cara escreveu com bic: "Se você já é assim, imagine a sua sogra". Rarará! Nóis sofre mas nóis goza

MÍRIAM LEITÃO - Sim, é possível


Sim, é possível 
MIRIAM LEITÃO
 O Globo - 03/06/2011

O Brasil pode eliminar a extrema miséria, está dentro do horizonte das nossas possibilidades. Depois dos avanços que começaram na estabilização da moeda nos governos Itamar Franco e Fernando Henrique, continuaram com os programas sociais e crescimento no governo Lula, é desejável e possível dar o passo seguinte. O governo Dilma está no começo e deve mesmo ter essa meta.

O programa lançado ontem é menos ambicioso do que o nome diz. As estatísticas são conhecidas, há 16 milhões de brasileiros extremamente pobres. Há um número de corte, tão arbitrário quanto qualquer outro: R$ 70 de renda familiar per capita. Qualquer pessoa sabe que isso não é suficiente para garantir o mínimo. De início, parece mais uma ampliação do Bolsa Família do que um novo programa com um nome tão amplo como “Brasil sem miséria”. Como o objetivo inicial é incluir mais 800 mil famílias no Bolsa Família, a rede de proteção social atingirá entre três milhões a quatro milhões dos 16 milhões. Não é, portanto, a erradicação da miséria.

Para quem teme que a ampliação do número de filhos que podem ser incluídos no programa produza o risco de uma explosão demográfica, aqui vai um dado do último Censo. Entre 2000 e 2010 o número de brasileiros com menos de 14 anos caiu em cinco milhões. Em todas as classes sociais as brasileiras estão tendo menos filhos. Dos brasileiros na pobreza, como a ministra Teresa Campelo mostrou ontem, 40% têm menos de 14 anos. As crianças é que estão mais expostas à pobreza. O melhor que a sociedade tem a fazer com elas é alimentá-las e, sobretudo, educá-las.

Mas atenção: nenhuma rede de proteção social será boa o suficiente se o Brasil não fizer mais esforços na educação. Só na escola é possível quebrar-se definitivamente a cadeia de reprodução da pobreza. É a única chance, não há outra. A rede de proteção faz o primeiro socorro; a educação resgata e promove. O investimento em melhoria da educação pública é absolutamente fundamental para que esse não seja mais um programa assistencialista.

Está certa a presidente Dilma em dizer que é o Estado que tem que ir atrás dos pobres; e não os pobres atrás do Estado. É função de quem recolhe os impostos — e como são altos! — dos cidadãos e os distribui encontrar os despossuídos. Mas quanto mais pobre mais difícil de ser encontrado, porque eles sequer sabem dos seus direitos e muitas vezes não têm documentos ou não foram registrados. Não é uma tarefa fácil e os riscos de exploração política são imensos. O benefício terá mais qualidade se for apresentado e entendido com direito dos cidadãos e não benemerência da mãe ou do pai da pátria. O benefício terá mais qualidade se for entregue com plataforma de ascensão social dos atendidos.

O programa foi apresentado na data de ontem por uma estratégia de marketing. O que querem os comunicadores do governo é atender à ordem do ex-presidente Lula de iniciar a divulgação de uma agenda positiva. Esperase no entanto que tenha sido já bem formatado. Será um desperdício de uma excelente ideia se o programa tiver sido apressado por exigências criadas pela crise política que se abateu sobre o governo, enfraqueceu o ministro mais forte, rachou a base e expôs a ascendência que Lula ainda tem sobre todos e todas. A proposta de aumentar o esforço para enfrentar a miséria é tão sedutora, que o melhor é apostar que nada tenha sido feito apenas para que o governo tenha espaço nas boas notícias.

Tudo vai depender evidentemente da execução, gerenciamento, capacidade de tornar programas pensados em gabinetes em fatos reais na vida dos brasileiros. O país já desenvolveu tecnologia de distribuição de bolsas aos mais pobres e já sabe até o que não fazer. É preciso ter cadastro, ter sistema de avaliação, ter estratégia de saída, ter programas complementares e ter contrapartidas do beneficiado em manter as crianças na escola. Só assim a bolsa não será apenas e meramente uma distribuição de dinheiro. Tomara que o governo tenha aprendido com os erros recentes de programas sociais semelhantes.

Há outros programas com finalidades diferentes incluídos no mesmo lançamento de ontem, como o Bolsa Verde. Também só será bem sucedido se não for mais uma distribuição de dinheiro e sim incentivo à produção. Nada é fácil nesse campo. A maior parte dos sete milhões de miseráveis brasileiros da área rural está no Nordeste. Lá é o núcleo duro da extrema pobreza brasileira. Eles estão em áreas muitas vezes impróprias para a agricultura. É o semiárido nordestino que enfrenta inclusive sérios riscos de desertificação com a mudança climática. Se estiverem em área que possa ser transformada em produtiva, eles precisarão mais do que a Bolsa Verde: precisam de sementes, técnicas, água, implementos e inclusão na rede de comercialização.

O Brasil está num nível de desenvolvimento que permite que ele alimente a ambição de erradicar a extrema pobreza. Será melhor para a economia e para a democracia brasileira se perseguirmos essa meta. Portanto, longa vida ao Plano Brasil sem Miséria; e que ele consiga fugir da tentação da demagogia e ser de fato o que merecemos que ele seja.