segunda-feira, março 28, 2011

CARLOS ALBERTO SARDENBERG

Pouca infraestrutura e muito imposto
CARLOS ALBERTO SARDENBERG
O Estado de S.Paulo - 28/03/11

"A verdade é que investir no Brasil está muito caro. E por causa de infraestrutura e impostos", comentou o presidente do Conselho de Administração da siderúrgica ArcelorMittal Brasil, José Armando de Figueiredo Campos, resumindo um debate promovido pela Rádio CBN Vitória em torno do tema "grandes investimentos".

Em novembro último ouvi coisa parecida de um executivo israelense chamado Dov Moran, simplesmente o cara que inventou o pen drive e que hoje desenvolve uma companhia de celulares, a Modu. Ele resumiu assim seus esforços para fazer negócios por aqui: "O Brasil é caro e difícil".

Nesse "caro" se inclui, certamente, a valorização do real. Preços em dólar ficam altos aqui. Mas não é apenas esse fator nem o mais importante. O pessoal se queixa do ambiente de negócios, ou seja, das dificuldades para montar e operar empresas, registrar marcas, obter licenças e, especialmente, lidar com o sistema tributário. Em cima disso vem o peso dos impostos.

As empresas participantes do debate em Vitória (Petrobrás, Vale, Samarco e Fibria, além da ArcelorMittal) são todas grandes, multinacionais e estão fazendo investimentos importantes no Brasil. E por que fazem isso, se as condições são tão difíceis?

Primeiro, porque são obrigadas. Já desenvolvem grandes empreendimentos, têm compromissos no País, não podem simplesmente fechar as portas e cair fora.

E, depois, porque o Brasil, com todos esses problemas, é uma economia que deve chegar neste ano a um Produto Interno Bruto (PIB) de US$ 2,4 trilhões, colocando-se possivelmente entre as seis maiores do mundo. Há negócios a fazer. O mercado brasileiro de celulares é o quinto do mundo.

O que nos leva a outra pergunta: como foi possível chegar a esse tamanho com essas dificuldades apontadas por executivos locais e estrangeiros?

Resposta: o Brasil cresce apesar desses obstáculos e por causa de virtudes, como a estabilidade macroeconômica, e a sorte de, recentemente, ter sido beneficiado por um forte crescimento global, sobretudo da China.

Mas o custo Brasil fica cada vez mais caro. O cipoal do sistema tributário se complica ainda mais todos os dias, com as novas normas lançadas pelos Fiscos estaduais, municipais e federal.

No final dos anos 90, a carga tributária era normal, cerca de 25% do PIB. Com as obrigações impostas ao governo pela Constituição de 1988, sobretudo nas áreas de Previdência e saúde, e pela tendência, digamos, "natural" de políticos eleitos de aumentarem o gasto público, os impostos também precisaram subir para financiar despesas crescentes.

Mas se isso tivesse ocorrido de uma forma racional - com poucos e simples impostos - o problema seria menor. Ficou mais complicado porque muitas vezes os governantes, políticos, no esforço de arranjar dinheiro sem assumir aumentos de impostos, impopulares ou ilegais, inventaram quebra-galhos e truques que tornaram o nosso sistema tributário o pior do mundo. E o mais custoso. As empresas e as pessoas gastam dinheiro para ficar em dia com o Fisco.

Um dos truques mais escandalosos está no ICMS, imposto estadual cujas alíquotas são fixadas em lei e reguladas pelo Confaz, conselho que reúne os secretários estaduais de Fazenda. Há tetos para as alíquotas.

Foi aí que um talento das contas públicas inventou o "cálculo por dentro". Isso mesmo, uma fórmula matemática que faz o milagre: acrescenta ao preço "líquido" do produto (ou serviço) o valor do imposto e calcula o imposto sobre o preço total.

Não passa no teste da boa lógica ou do simples bom senso. O imposto incide sobre o valor da mercadoria (ou serviço) e ponto final. Está na cara que colocar o imposto no preço e recalcular é um truque para cobrar duas vezes. O resultado é que se cobra imposto sobre imposto, criando-se uma alíquota acima do estipulado na lei.

Eis um exemplo, apanhado numa conta de telefone celular de São Paulo, onde o ICMS é de 25% - e já pedindo desculpas ao leitor pelo excesso de números. Na nota fiscal está escrito que o valor do ICMS é de R$ 98,22 - que são 25% sobre uma base de cálculo, ali referida, de R$ 392,88, total a ser pago pelo usuário.

Ora, retirando desse total o valor do imposto, dá o preço líquido do serviço, certo? Temos, então: preço líquido do serviço, R$ 294,66; e ICMS, R$ 98,22. Portanto, o imposto efetivamente cobrado representa 33,33% - uma alíquota ilegal.

Como é que isso passa nos Parlamentos e nos tribunais? Porque estão todos - deputados, senadores, juízes e mais o Executivo - sempre em busca de dinheiro dos contribuintes para gastar mais.

Ficamos, então, com uma carga tributária que é bem acima da média dos emergentes (24% do PIB) e um sistema complexo e mentiroso, que passa informações erradas ao contribuinte (como a que está nas contas de telefone e de luz).

E para onde vai o dinheiro? Quando a carga era de 25% do PIB, o governo federal chegou a gastar 5% do PIB em obras de infraestrutura. Hoje, com a carga tributária muito maior, o investimento mal chega a 1,5% do PIB. O grosso do dinheiro vai para Previdência, pessoal e custeio, incluindo programas sociais, que, aliás, são até baratos.

Eis o custo Brasil: pouca infraestrutura, muito imposto. Um problema que está passando dos limites e trava o País. Foi crescer 7,5% no ano passado e está tudo entupido.

O governo, o setor público, não cabe no Brasil. É preciso conter e reduzir o gasto e a dívida pública, para poder começar a reduzir impostos e juros. E facilitar a vida de quem quer fazer negócios honestamente.

RICARDO YOUNG

Homem planetário
RICARDO YOUNG
FOLHA DE SÃO PAULO - 28/03/11
 
Vem da Nigéria e desembarca na sala de conferências do Hotel Tropical em Manaus.
Não é chefe de Estado, mas tem aparato de segurança como se fosse. Salões inteiros são esvaziados à sua chegada, e a ansiedade de centenas de pessoas só é aplacada quando começa a discorrer sobre os problemas do mundo.
Transita por temas que vão das epidemias à biotecnologia; das energias renováveis ao papel da internet nas revoltas pan-arábicas; da crise econômica à obsolescência de políticas públicas anacrônicas.
Fala de chefes de Estado como se amigos fossem e fala de países como se em todos habitasse.O mundo para ele não tem fronteiras, não tem limites. É um lugar instável, desigual e insustentável, mas é o seu lugar: um espaço/tempo de possibilidades infinitas.
Olha o Brasil com um olhar de esperança. Espera que o país assuma o compromisso de ser o primeiro líder planetário em energia renovável, tratamento de lixo urbano, eliminação dos resíduos sólidos, eliminação da pobreza, manutenção das florestas e da biodiversidade.
Vê um país generoso, que olha o mundo com vocação solidária. Um país cujas vantagens comparativas o convocam para agir à altura de suas responsabilidades.
Governador, senadores, empresários, artistas, ambientalistas, lideres de ONGs, cientistas, todos o escutam. No auditório, silêncio devocional.
Suas palavras são sorvidas, uma a uma. Afinal, é observador do mundo, operador de sonhos, livre, sem nenhuma institucionalidade.
O século 20 produziu homens e mulheres notáveis. Gandhi, Churchill, Martin Luther King, Mandela, madre Tereza, o dalai lama....Todos se eternizaram ao abraçar causas universais e por terem lembrado a nossa condição humana naquilo que nos apequena e naquilo que nos engrandece.
Mas todos operaram a partir de um território nacional e daí projetados para o mundo e para a história. Nesse caso, estávamos na presença de alguém cuja nacionalidade tornou-se irrelevante.
Que fala de uma não territorialidade e ao mesmo tempo da territorialidade de todos, o planeta. Talvez seja o primeiro líder planetário forjado na globalização...não sei.
Mas afirmou, ao final, que ninguém deveria criticar o que fosse. A desigualdade, a instabilidade e a insustentabilidade não permitem mais hesitações. Todos deveriam propor e agir para aliviar os males que parecem estar nos colocando no beco escuro da civilização.
Bill Clinton deixou a sala aplaudidíssimo.
Uma saudade imensa daquilo que poderíamos nos tornar inundou aquele recinto no coração da Amazônia.
Sustentabilidade, igualdade, estabilidade. Que sonho é esse que reverbera, habita o mundo e não quer calar?

MELCHIADES FILHO

Obra em progresso 
MELCHIADES FILHO

FOLHA DE SÃO PAULO - 28/03/11

BRASÍLIA - A rebelião de trabalhadores não revelou apenas que empresas, sindicatos e governo estavam despreparados para cuidar de muitas obras de infraestrutura. Expôs também o "lado B" do PAC.
Ficou claro que o programa querido da presidente Dilma, concebido para gerar riqueza e energia, não levou em consideração aspectos trabalhistas nem o impacto social da inauguração de canteiros gigantes em locais remotos do país.
Tome-se o caso da hidrelétrica de Jirau, em construção numa região isolada de Rondônia. Não seria mesmo simples acomodar e administrar os 22 mil contratados da obra. Mas os relatos dão conta de total omissão do poder público.
Episódios recorrentes de castigos físicos, falta de comida, desvio de salários e livre comércio de armas e drogas culminaram em quebra-quebra. Alojamentos e várias instalações acabaram incendiados.
Os esforços para caracterizar o ocorrido como incidente pontual de vandalismo duraram pouco. Dias depois, houve outra depredação bem longe dali, na usina de São Domingos, em Mato Grosso do Sul.
Mais: 80 mil operários do PAC anunciaram greve por salários e condições de trabalho melhores.
Foram afetados justamente os projetos mais vistosos do portfólio dilmista: as usinas do rio Madeira (Rondônia), a refinaria e a petroquímica de Suape (Pernambuco) e a termelétrica de Pecém (Ceará).
Tímida, a reação do Planalto só fez confirmar a falta de "protocolo" para lidar com tantos imprevistos.
O governo pediu a amigos das centrais sindicais que domassem os motins, reforçou o policiamento nas obras (em Jirau, nos escombros) e prometeu que amanhã vai traçar "regras mínimas" de trabalho no PAC -como se já não existisse legislação a respeito no país.
Dilma ganhou elogios por se recolher, em contraste com a hiperexposição de Lula. Mas, ironia, operários mostram à presidente o limite de governar só do gabinete.

JAPA GOSTOSA

MÔNICA BERGAMO

BOLETIM VIRTUAL
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO 28/03/11

O Procon-SP fechou o segundo semestre de 2010 com 13.689 consultas (pessoas que querem checar o histórico das empresas) e reclamações referentes a serviços de comércio eletrônico. O número é o dobro dos 6.833 registrados no mesmo período de 2009. Os problemas com prazos de entrega foram os mais relatados (5.312), seguidos por produtos que chegaram com defeito.

SÓ ELETRÔNICOS

O relatório também aponta quais são os produtos que os paulistas mais compram on-line -ou, pelo menos, os que geram mais dúvidas e reclamações dos consumidores. A maior parte dos contatos (1.583) referiu-se a aparelhos telefônicos (fixos, celulares e interfones). Em segundo lugar (1.462 atendimentos), a computadores e produtos de informática.

REVISÃO COMPLETA

A Controlar pediu uma audiência com o Ministério Público para tratar do inquérito sobre supostas irregularidades na inspeção veicular ambiental. Representantes da empresa devem se reunir com o promotor Silvio Oyama no dia 27 de abril. Até lá, ele quer ouvir os fabricantes dos equipamentos usados na inspeção, para saber que fatores podem influenciar o resultado do teste.

REZA
Zizi Possi fará uma turnê de shows em igrejas históricas do país, no ano que vem. O projeto se chama "Missa Leiga". "As igrejas são monumentos arquitetônicos, lugares de paz. É um show que independe de religião", diz ela.

UM BANQUINHO

E Zizi, que ficou mais de dois meses internada em um hospital por problemas na coluna, volta aos palcos no mês que vem. "Ainda estou recuperando o fôlego." Para ajudar nas performances, ela terá o auxílio de um banquinho "para descansar a lombar" em alguns momentos.

FESTA DO CHAMPANHE

A alameda Gabriel Monteiro da Silva terá uma promenade, assim como acontece na Oscar Freire. Parte da via será fechada em 7 de maio.

Os convidados do Avant Gabriel Chandon poderão tomar champanhe à vontade.

DILMA
NO ESCURINHO DO CINEMA

Aatriz Glória Pires, Dilma Rousseff e a diretora Anna Muylaert no Palácio da Alvorada

Cercada pelas cineastas que queriam entregar a ela DVDs de seus trabalhos, tirar fotos e pedir autógrafos, a presidente Dilma Rousseff tentava escapar do cerco das seis jornalistas que, também convidadas para uma sessão de cinema no Palácio da Alvorada, na noite de sexta, tentavam arrancar dela alguma revelação. "Por que o ex-presidente Lula recusou o convite da senhora para almoçar com o [presidente americano] Barack Obama?", perguntou a Folha.

Dilma segura no ombro da colunista e afirma, com sotaque mineiro: "Ô, gente, não aposta nisso [referindo-se à possibilidade de um desentendimento com Lula]. Cês vão perder... Cê sabe pra onde que eu vou [no dia 30]? Eu vou para Portugal com o Lula, gente". E o voto do Brasil contra o Irã na ONU? "Essa aqui tá querendo discutir o Irã!", dizia Dilma, desviando-se das perguntas.

A cineasta Flávia Moraes diz a Dilma que não votou nela "por causa do Lula. Eu não gosto dele. Mas estou gostando muito da senhora. Parabéns, principalmente pela posição nos direitos humanos". Dilma sorri. Outra diretora, Ana Maria Magalhães, diz que tem um amigo "muito reacionário" que também está adorando o governo de Dilma. "Eu até penso: o que está acontecendo de errado?", brinca Ana. "Sabe que até eu às vezes me pergunto? O que será que eu estou fazendo de errado?", diz a presidente, rindo.

A cineasta Bia Lessa, uma das vinte cineastas convidadas para a noite de cinema, se aproxima. Pede um autógrafo "para a minha filha". A atriz Glória Pires, estrela do filme exibido por Dilma naquela noite, "É Proibido Fumar", da diretora Anna Luiza Muylaert, também pede um autógrafo. "É para quem, Glória?" "Para mim!", diz a atriz. "Glória Maravilha, que encanta as nossas vidas!", escreve Dilma numa folha de papel. Lucélia Santos apela à presidente para que a ajude a encontrar nos palácios de Brasília um vaso do Dalai Lama que deu a Lula. "Eu queria saber onde ele está."

O jantar -robalo ao molho de azeitonas, costelinha de cordeiro, filé mignon ao molho de shitake, salada, vinho Valduga e espumante -ainda estava sendo servido mas as cineastas rodeavam a presidente, que saltava de mesa em mesa para conversar.

"E quem vai ser o novo presidente da Vale?", arriscava uma repórter. "Eu não sei", dizia Dilma. A conversa voltava a girar em torno de amenidades. "Eu parei de fumar em setembro de 1989. Depois disso comecei a nadar, nadar, nadar. Até hoje eu sonho que estou fumando", dizia a presidente. Aceita uma cigarrilha "socialmente", mas não chega perto de cigarro. "O pecado, se você chega perto dele, você peca." Acorda cedo, "às 6 horas, não importa a hora em que vou dormir". Parou com a natação e hoje só faz caminhadas. "Mas engordei. Tô comendo mais."

Elas começam a falar de plástica. "Vocês sabem que eu fiz uma plástica, né? Mas tem três lugares que não tem jeito: aqui [aponta o pescoço], nos lábios e nas mãos."

A presidente diz que ganhou a coleção de longas financiados pela Petrobras. "Eu vejo para dormir." Risos. Dilma corrige: "Não, não é que eu durmo no filme. Eu não durmo! Mas, pra tirar as coisas que eu tenho na cabeça o dia inteiro, eu leio ou eu vejo um filme." Cita longas de que gostou: "Vidas Secas", "A Hora e a Vez de Augusto Matraga".

Diz que considera o cinema brasileiro "uma das coisas mais importantes" e que teve a ideia de convidar só diretoras porque março é o mês da mulher. "A eleição de uma mulher não é algo trivial. Eu não vou fazer um governo só para as mulheres. Mas, nesse período, a mulher tem que ser muito afirmada."

Perto da meia-noite, ela serve café e licor às convidadas. Toma um cálice de Frangelico. Diz que vai disponibilizar o Alvorada outras vezes para encontros semelhantes. "Eu vou abrir esse espaço sempre que vocês quiserem, e quando vocês quiserem." Quase todas dizem que desejam voltar.

CURTO-CIRCUITO

A Imprensa Oficial lança hoje, a partir das 19h, 17 títulos da Coleção Aplauso, na Cinemateca Brasileira.

O secretário estadual da Segurança, Antônio Ferreira Pinto, participa na quarta da assembleia da associação AME Jardins, no MuBE.

Fernanda Lima, Tiago Leifert e Zeca Camargo apresentam o evento Globo 2011, apresentação da programação da TV, amanhã, no Teatro Alfa.

O evento Skol Sensation tem "happy hour" de lançamento, hoje, na Villa Daslu.

A Cia. Athletica montou uma academia de ginástica na suíte do ator e ex-governador Arnold Schwarzenegger em Manaus, durante o Fórum Mundial de Sustentabilidade.

Oskar Metsavaht dirigiu editorial de moda da revista "Elle" de abril, com fotos de Gui Paganini, convidado pela editora Susana Barbosa.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

LUIZ FELIPE PONDÉ

"Só os neuróticos verão a Deus"
LUIZ FELIPE PONDÉ
FOLHA DE SÃO PAULO - 28/03/11

"Tenho pensando demais em dinheiro e sucesso. Não porque eu os tenha em excesso (haveria uma "quantidade justa" de dinheiro e sucesso?), mas porque, sem eles, somos afogados no sentimento da inexistência. Talvez por isso tanta conversa fiada sobre sermos honestos e desapegados quando, na realidade, em silêncio, babamos por dinheiro e sucesso.
Haverá amor sem dinheiro e sucesso, ou terá razão o grandioso Nelson Rodrigues quando diz que dinheiro compra até amor verdadeiro? Aqui, ele fala a anos-luz de distância da sensibilidade infantil da classe média e de seu marketing da ética que assola o mundo.
Quando me afundo na agonia, tenho dois profetas: Nelson Rodrigues e Fiodor Dostoiévski. Diante deles, sou um anão de Velásquez.
À noite, ouço a voz do demônio do ceticismo me chamando para o seu país da solidão e sua aridez de três desertos.
Um dos efeitos clínicos do ceticismo é a indiferença para com o que os outros pensam. Num mundo do marketing, que faz da vida um baile da monarquia francesa decadente do final do século 18, a indiferença para com o que os outros pensam é uma forma de ascese. Mas, como toda ascese, é uma danação.
Faz mal pensar em dinheiro e sucesso. Meu Deus, que escravidão! Onde me perdi?
Talvez na infância, quando percebi que o mundo não só é indiferente a nós, mas que nossa mãe é também uma pobre carente de amor e que nosso pai (quando existe pai, porque pai é produto da indústria do luxo) é um coitado esmagado pela carência não só de amor, mas também de dinheiro e de sucesso.
Tornei-me esse ser obscuro e muitas vezes cínico cedo demais. Digo sempre aos meus alunos que tomem cuidado com excessos de ceticismo na juventude, porque ele facilmente deforma a face, e quando se é jovem a face ainda é o espelho da alma.
Hoje estou em companhia de Nelson Rodrigues e sua sublime obsessão pela alma atormentada. Há dias o leio e releio, assim como quem toma um remédio acima da dose, tropeçando na água, por pura pressa de ver o mundo, de novo, por trás de sua membrana opaca. À diferença de Kant, Nelson sim conhecia a "coisa em si".
Sua peça "Bonitinha, Mas Ordinária" é essencialmente dominada pela angústia moral dostoievskiana. Nela, o herói, Edgar, é atormentado pela famosa frase, supostamente de Otto Lara Resende, "mineiro só é solidário no câncer".
Segundo a fortuna crítica, esta sentença niilista seria, por sua vez, semelhante a uma de Ivan Karamazov: "Se Deus não existe, tudo é permitido"; se não há Deus, não há impedimento absoluto contra o que quisermos fazer.
Se o mineiro só é solidário no câncer, é porque sua solidariedade não passa de um gozo secreto pela miséria do "amigo" doente. Se a única solidariedade possível é essa, então não há solidariedade de fato, logo, não há esperança para o mundo.
Ambas as frases decretariam o niilismo como condição amoral do mundo. E o niilismo não é uma brincadeira de adolescente que atropela gatos com sua bicicleta, é um fardo, um fado, um problema filosófico, para alguns, o maior dos séculos 19 e 20, que reuniu ao seu redor gente como Nietzsche, Freud, Schopenhauer, Dostoiévski, Turguêniev, Cioran, Bernanos, Berdiaev e o próprio Nelson.
Não é o drama do "serial killer" de TV. É o drama do policial honesto diante da inexistência do bem como forma de ordenamento do mundo.
Não pressinto o niilismo quando escrevo por aí poemas ruins sobre a agonia dos pobres nas ruas, pressinto o niilismo quando sei que esses poemas são mentiras na forma de marketing da ética, uma especialização do recém-criado "personal marketing". Ambos logo serão um MBA na área de recursos humanos.
Certa feita, falando sobre sua peça "Bonitinha, Mas Ordinária", Nelson disse (respire fundo): "A nossa opção, repito, é entre a angústia e a gangrena. Ou o sujeito se angustia ou apodrece. E, se me perguntarem o que eu quero dizer com minha peça, eu responderia: que só os neuróticos verão a Deus".
Bem-aventurados os de sorriso raro e de beleza tímida. Bem-aventurados os que se desesperam, mas não desistem, porque deles é o reino dos céus".

DENIS LERRER ROSENFIELD

Fraternidade e natureza
DENIS LERRER ROSENFIELD
O Estado de S.Paulo - 28/03/11

Com grande alarde, a CNBB lançou um documento intitulado Fraternidade e a Vida no Planeta como orientação da Campanha da Fraternidade de 2011. Tratando-se de um documento teológico-político, sua preocupação central consiste em influir no atual debate sobre as relações entre civilização moderna e meio ambiente. Mais especificamente, seu objetivo reside em participar diretamente da discussão atual sobre a revisão do Código Florestal. Não estamos diante de uma preocupação religiosa politicamente neutra, mas que obedece a diretrizes contempladas nas pastorais da Igreja, nos ditos movimentos sociais e na doutrina da Teologia da Libertação.

Em manifestações, aliás, muito sensatas, de alguns altos dignitários da Igreja, aparece uma preocupação muito genuína com a preservação ambiental, sem ranços ideológicos. Cuidados relativos à coleta seletiva de lixo, contra os desperdícios de água, a poluição de rios e do ar e o uso abusivo de agrotóxicos, por exemplo, entram nessa linha de conduta.

Essa é, no entanto, a apresentação pública, em muito distinta do que consta no documento, eivado de ranços contra o capitalismo, a propriedade privada, o lucro e o agronegócio. Convém, preliminarmente, ressaltar que foi graças ao capitalismo e ao agronegócio que a sociedade atual veio a produzir abundantemente alimentos em escala planetária e a baixo custo. Nunca tantos comeram e jamais foram tão boas as condições de vida.

Os países que aboliram a propriedade privada e "produziram" sem o lucro foram os que sucumbiram à miséria. A URSS abandonou à morte milhões de seus cidadãos por falta de comida e pela desorganização completa da agricultura. A China de Mao seguiu o mesmo caminho, com camponeses morrendo de fome nas estradas. Os admiradores atuais de Cuba, muitos dos quais compartilham os pressupostos da Teologia da Libertação, nada têm a dizer de um partido que nem consegue produzir alimentos para a sua população. Outro representante do "socialismo", Hugo Chávez, está conduzindo seu país à bancarrota, também com a desorganização completa da agricultura e da pecuária.

Se tivéssemos de caracterizar a ideologia do documento o qualificaríamos como uma mistura de ludismo e marxismo. Ludismo porque corresponde a uma corrente política e ideológica inglesa do século 19 que recusava toda e qualquer modernização do processo produtivo, no caso, industrial, pela destruição de máquinas, cuja inovação não era aceita. Marxismo porque adota as categorias dessa corrente ideológica, propugnando uma via anticapitalista, que não estaria mais orientada pelas relações de mercado alicerçadas no lucro e nos contratos. Desta última resgata também a ideia socialista, que ganha uma nova denominação, a de uma sociedade "solidária", não consumista, não capitalista, apoiada na "vida", e não na ganância. Mudou de denominação por conveniências retóricas.

Assim, a CNBB postula que os alimentos produzidos para o mercado, sob a forma de "commodities", sejam caracterizados como produtos de um mercado voltado para o "lucro", que não visa à "disponibilização de alimentos para todas as pessoas". Prossegue em suas diatribes criticando um mercado "dominado por poucas empresas que monopolizam o mercado internacional, impondo preços segundo suas conveniências". Mas é obrigada a reconhecer que esse processo, baseado em "distorções", "se reflete nos preços relativamente baixos dos alimentos". Ou seja, na verdade, é o mercado que produz alimentos abundantes e a baixos preços, o que contradiz sua tese de que a escassez seria a resultante desse processo.

O documento retoma a tese do MST e da Comissão Pastoral da Terra de que o agronegócio termina prejudicando e excluindo a agricultura familiar. Ao contrário, porém, o fato é que o excedente da agricultura familiar é vendido no mercado e em alguns setores, como fumo, aves e suínos, há toda uma rede de relações entre o agronegócio e a agricultura familiar, denominada "sistema integrado de produção". Na verdade, a CNBB adota a postura dos assentamentos da reforma agrária, identificando-os com a agricultura familiar, o que é um equívoco, pois eles não possuem títulos de propriedade, não se voltam para o mercado e estão apoiados na economia de subsistência, a qual, aliás, nem conseguem atingir. Vivem de subsídios governamentais como o Bolsa-Família, o que significa dizer: à custa do contribuinte.

Todo o setor da agropecuária e do agronegócio em geral é tido como praticante de "crimes ambientais", como se esse fosse o seu costume. Evidentemente, a prática agrícola, como ocorre em qualquer lugar do mundo, transforma a natureza, tendo em vista a produção de alimentos. Se assim não fosse, a humanidade morreria de fome. Há uma clara confusão entre desmatar por desmatar, sem nenhuma preocupação agropecuária, e a atividade propriamente agrícola, que também conserva a natureza. Agricultura e natureza marcham de mãos dadas. Se não for assim, ambas acabam perdendo. O agricultor ou a empresa que não conserva a natureza dá um tiro no próprio pé.

A CNBB apoia-se numa concepção religiosa segundo a qual tudo o que existe na natureza é resultado da criação divina, que, enquanto tal, deve ser preservada. Trata-se de "cultivar" a "criação". O ambientalismo estaria, nesse sentido, fundado numa cosmovisão religiosa. Eis por que é defendida a ideia de que os comportamentos que contrariam essa cosmovisão devem ser "corrigidos", por serem "pecaminosos", por atentarem precisamente contra a "criação divina". Ou seja, a Igreja assume a política dos que sabem o que é o "correto" comportamento humano, devendo adotar medidas que o implementem. A correção do comportamento humano seria empreendida pela "tirania dos bons", dos "virtuosos". Isso significa que todo aquele que advoga pela atualização do Código Florestal seria pecador.

JESUS TE AMA

ROGÉRIO AMATO


O partido do comércio

ROGÉRIO AMATO

FOLHA DE SÃO PAULO 28/03/11

Os comerciantes, assim como outras categorias, têm todo o direito de criar um partido político que represente e defenda os interesses do setor

Com desagradável surpresa, li o artigo de Fernando de Barros e Silva na Folha de 23/3 ("Partido comercial"). A pretexto de analisar, ou atacar, a criação do Partido Social Democrático (PSD), o articulista se preocupa muito mais com pessoas do que com ideias. Até aí, nada demais. Cada um expõe os seus conceitos como quer, mas o que me revoltou foi o preconceito revelado na forma de se referir aos comerciantes.
Talvez ele não conheça a contribuição da atividade comercial para o desenvolvimento do país, ao ser não apenas o elo entre a produção e o consumo mas também fator fundamental do processo de geração de riquezas, funcionando como elemento regulador da oferta e da demanda e captando os desejos e necessidades dos consumidores, para orientar a indústria sobre o que e quanto produzir.
Com seu pioneirismo, ao explorar novas regiões ou novas formas de comercialização, amplia os mercados e propicia aumento do bem-estar da população.
Revela também que o articulista não conhece as associações comerciais, que, ao contrário do que afirma, não são entidades exclusivas do comércio, pois contam em seus quadros com empresas industriais, comerciais, prestadores de serviços, instituições financeiras e profissionais liberais ligados às atividades econômicas.
Posso dar meu exemplo. Sou industrial e acabo de assumir a presidência da Associação Comercial de São Paulo. Orgulhamo-nos da participação dos comerciantes na entidade ao longo de sua história.
Só para citar um exemplo, o filho de comerciantes Carlos de Souza Nazareth foi preso e exilado no tempo em que presidiu a Associação Comercial de São Paulo, quando foi um dos líderes da Revolução Constitucionalista de 1932, que lutou para o restabelecimento da liberdade, inclusive de opinião, no país.
Os comerciantes, assim como outras categorias econômicas, têm todo o direito de criar um partido político que represente e defenda os interesses do setor.
Se eles decidissem criar um partido, seguramente ele seria liberal, porque a atividade comercial se submete diariamente ao voto do consumidor, que, com sua liberdade de escolha, ao decidir comprar ou não em seu estabelecimento, determina seu sucesso ou fracasso.
Em 1915, as classes produtoras paulistas discutiram a ideia da criação do Partido do Comercio, argumentando que "é conveniente aos interesses do país a colaboração, no estudo dos problemas nacionais, de espíritos práticos, conhecedores das necessidades econômicas da nação e despidos de teorias vistosas mas inconsistentes".
Ainda hoje a necessidade da contribuição dos comerciantes, bem como dos empresários das demais atividades, continua sendo necessária, pois são eles que conhecem as dificuldades para criar uma empresa, gerar riqueza, oferecer empregos, atender às necessidades e desejos dos consumidores.
Talvez o articulista tenha apenas pretendido ser irônico, mas acabou sendo ofensivo a uma classe a quem muito deve o país. A ironia deve ser adequada a todos os aspectos do contexto, sob pena de não fazer sentido ou representar um sentido inverso ao pretendido.
ROGÉRIO AMATO, 62, é presidente da Associação Comercial de São Paulo e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo.

GEORGE VIDOR

Gol contra
GEORGE VIDOR
O GLOBO - 28/03/11
Qualquer que seja o novo comando escolhido pela assembleia de acionistas da Vale, o mercado já avalia como gol contra (o primeiro, aliás da administração Dilma) a interferência do governo na cúpula da companhia. Não chega a ser uma intromissão indevida, pois o governo, direta ou indiretamente, é grande sócio da Vale e tem direito de opinar sobre a formação da diretoria da empresa. Mas dentro de critérios.

Há uma série de empreendimentos importantes no Brasil hoje sob responsabilidade de consórcios entre grupos privados, empresas estatais, BNDES etc. Toda essa história envolvendo a substituição de Roger Agnelli na presidência da Vale abriu um precedente perigoso que sem dúvida vai gerar desconfianças que prejudicarão parcerias futuras.

No início de carreira, como estagiário de engenharia, Roberto Senna penou para comprar seu primeiro apartamento, em Salvador, financiado por 25 anos, e com uma área útil 43 metros quadrados. Passados mais de 30 anos, Senna dirige hoje uma grande empresa de engenharia de capital aberto (Direcional) que lidera o mercado de construções de imóveis residenciais para a faixa de um a três salários mínimos dentro do programa Minha Casa, Minha Vida. Geralmente são casas e apartamentos com área de 42 metros quadrados, a mesma dimensão de um imóvel que adquiriu com dificuldade como jovem profissional oriundo da classe média urbana.

A comparação dos dois exemplos mostra a mudança significativa no mercado imobiliário brasileiro. Na primeira fase do programa do governo federal Minha Casa, Minha Vida, de um milhão de unidades previstas, cerca de 400 mil se destinam à faixa de até três salários mínimos. Na segunda fase, de dois milhões de unidades, 1,2 milhão irá para essa faixa de renda. Alguns construtores perceberam a oportunidade, como a própria Direcional, que já tem um terço dos seus negócios nesse segmento. Roberto Senna explica que para se construir para a baixa renda, com lucro, a chave está na produção em série (a Direcional tem contratos para construir 65 mil unidades, distribuídos em grandes projetos). Sua empresa consegue concluir, em média, dois imóveis por dia, com uma equipe de 22 montadores, no lugar de armadores, pedreiros, carpinteiros etc. Em vez de acompanhar de 120 a 150 diferentes itens e materiais usados em uma obra convencional, nesse tipo de projeto são monitorados somente 19, o que barateia os custos.

A Direcional, empresa de origem familiar, de Belo Horizonte, é no momento líder em mercados como Manaus, mas constrói também no Rio, Brasília e outros cinco estados. Por suprir seu ritmo acelerado de obras, contrata 400 novos empregados por mês, totalizando nove mil. As metas de produção são diárias e uma parte da remuneração de cada empregado fica atrelada a esses objetivos. Os imóveis são montados usando-se uma sequência de cores nas peças, o que agiliza a tarefa, pois são identificadas até por operários sem instrução. Até agora o processo tem dado certo, possibilitando à construtora dobrar seu lucro a cada exercício, com uma margem de ganho entre 20% e 25% sobre as vendas.

Depois da entrega dos imóveis, o desafio é que os condomínios de habitação popular se espelhem na experiência já bem conhecida pela classe média. A solução da Direcional foi assumir a administração do condomínio por um tempo, até que uma diretoria da associação de moradores seja gradativamente composta por representantes dos proprietários e assuma a tarefa.

A venda de imóveis para famílias de baixa renda muitas vezes esbarra na falta de comprovação de capacidade financeira dos potenciais compradores. Em capitais do Norte do país, onde a informalidade ainda é grande, essa comprovação, para efeito de financiamento da Caixa Econômica Federal, é feita na prática. Se, durante a obra, quem se candidatar ao financiamento bancário conseguir pagar em dia doze prestações consecutivas terá provado que poderá receber o empréstimo de longo prazo na entrega das chaves.

Para agilizar o treinamento de oficiais destinados a embarcações de apoio às atividades da indústria do petróleo na costa brasileira, a Rolls-Royce está estudando trazer para o Brasil um simulador que reproduza o funcionamento desses navios. A Rolls-Royce é uma das principais fornecedoras de motores para tais embarcações, compressões e turbinas usados em plataformas de petróleo e está expandindo suas atividades no Brasil, de olho nas emendas que virão com o pré-sal. O treinamento convencional pode durar muitos meses. O simulador abrevia o tempo necessário para a capacitação desses oficiais.

A primeira fase da ampliação do Porto de Pecém (com a construção de um novo píer) ficará pronta no início do segundo semestre. Com essa expansão, estava previsto que o porto teria condições de atender à demanda prevista até 2015, mas os cálculos foram refeitos e a segunda fase da ampliação terá de ser antecipada para este ano. A obra é conduzida pela construtura do grupo Marquise, uma das maiores empreiteiras do Ceará, que teve como desafio fazer a ampliação sem interferir na atividade cotidiana do porto. Para isso, precisou usar balsas e uma draga. Na construção do novo píer tem sido usado material de aterro que havia sido retirado na obra original do porto, reduzindo-se agora o passivo ambiental.

O Porto de Pecém tem uma localização excepcional. Está a quatro dias de navegação da Costa Leste americana e a cinco dias dos principais portos europeus. E tem um calado de 18 metros.

Quando o novo traçado da ferrovia Transnordestina estiver concluído, Pecém poderá ser um dos principais portos de escoamento da produção das regiões Centro-Oeste e do próprio Nordeste.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Fiesp busca apoio para ICMS de 4% no destino
MARIA CRISTINA FRIAS
FOLHA DE SÃO PAULO - 28/03/11

O presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Paulo Skaf, afirma já ter recebido sinais positivos de representantes dos governos que poderiam perder com a cobrança do ICMS no destino.
Para combater a guerra fiscal, Skaf defende a Resolução Federal nº 72, do senador Romero Jucá (PMDB-RR), mas com mudanças.
Na disputa por investimentos produtivos, Estados brasileiros reduzem o ICMS, assim como oferecem benefícios quando da importação de produtos por seus portos.
A proposta zera a alíquota interestadual de ICMS, mas só para os importados que não recebem benefícios.
Para Skaf, a medida deve valer não só para o que vem de fora, e deve ter alíquota de 4%, em vez de zero.
"No Brasil, 60% da reforma tributária é acabar com a guerra fiscal e passar o ICMS da origem para o destino. Na hora em que você tem [a cobrança do imposto] no destino, não há como dar incentivo", afirma.
Para o presidente da Fiesp, o importado não pode ser transferido com zero e o nacional, com 12%.
"Se não vai sair mais barato do que o produzido no Brasil e o Estado não terá interesse em fiscalizar. Tem de ter a alíquota de 4%", acrescenta.
"A compensação que São Paulo teria é o fim da guerra fiscal. Acaba com essa doença, que prejudica o Estado."

NO VERMELHO
Para o presidente da CNI, Robson de Andrade, o deficit comercial do Brasil com os EUA, que foi de US$ 7,7 bilhões em 2010, vai se aprofundar, e bem, neste ano.
A expectativa de Andrade é que chegue a US$ 15 bilhões. "Mas fiquei otimista com a visita do presidente Obama e dos CEOs americanos. Eles também se interessaram por negócios no Norte e no Nordeste", disse.

SEM ABALOS NO FRANGO
As exportações de frango do Brasil para o Japão não serão muito afetadas devido ao terremoto que atingiu o país asiático no dia 11 de março, segundo a Ubabef (União Brasileira de Avicultura).
"Os japoneses só irão exigir uma ligeira aceleração para a chegada do nosso produto, já que os estoques deles estão muito baixos", diz o presidente-executivo da entidade, Francisco Turra.
A crise fará o Japão economizar em outras áreas e não com alimentos, diz Turra.
Em 2010, o Brasil exportou 380,6 mil quilos de frango congelado para o país, o que representa 31,7 mil quilos por mês. A média foi mantida neste ano até o momento.
O total arrecadado pelo Brasil com a venda do produto ao Japão no ano passado foi de US$ 898,6 milhões.
O valor foi o segundo maior obtido pelo Brasil no comércio bilateral, atrás apenas de minérios de ferro, que renderam US$ 2,5 bilhões.

Decolagem 1 

O primeiro voo de São Paulo para Cingapura feito pela Singapore Airlines decola, amanhã, com 90% dos 276 assentos ocupados. A companhia oferecerá três voos semanais para o país.

Decolagem 2 
A GOL realiza entre hoje e quarta-feira uma promoção em sete países da América Latina. A ação faz parte de uma tentativa da companhia de internacionalizar suas marcas.

Luz 

A Ecom Energia fechou contrato de dois anos e meio com a Braskem para fornecer energia elétrica. A companhia já comercializou energia equivalente a uma cidade de 2,9 milhões de habitantes.

Açúcar... 

A Sermatec, que fornece equipamentos para o mercado de açúcar e etanol, pretende fechar negócios de US$ 12 milhões a US$ 20 milhões com empresas da República Dominicana.

...no Caribe 

A empresa participa hoje e amanhã de uma rodada de negócios no país promovida pela Apex-Brasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos).

Visita 
O desenvolvimento de combustíveis alternativos será discutido hoje pelo ministro dos Transportes da Alemanha, Peter Ramsauer, e pelo presidente da Mercedes-Benz no Brasil, Jürgen Ziegler. A reunião será na fábrica em São Bernardo do Campo.

Embalagem 
Um ano após lançar o projeto para eliminar o uso de sacolas plásticas em sua unidade de Piracicaba (SP), a rede Carrefour deixou de distribuir 7,7 milhões de sacolinhas aos clientes no município.

Global 
A International Association of University Presidents indicou a brasileira Cauduro Associados, que criou as marcas da Vale e do Banco do Brasil, para elaborar estratégia que leve a entidade a ser conhecida mundialmente.

PEQUENO NEGÓCIO
Em tramitação na Câmara, o projeto de lei 591 de 2010 -que eleva o teto da receita bruta para ingresso no Simples Nacional para micro e pequenas empresas- começa a tomar forma definitiva, segundo Luiz Barretto, presidente do Sebrae.
"Fixado o teto, haverá um novo mecanismo de auxílio ao exportador. O governo deve dobrar esse valor, o que amplia a base de exportadores." Outro ponto que parece já estar decidido diz respeito à equiparação do produtor rural de pequena propriedade aos pequenos negócios urbanos.
"Não há consenso sobre isso. Está no projeto, mas acho que deve cair", afirma Barretto.
A entidade também estuda as oportunidades ao pequeno negócio que podem ser geradas no entorno de grandes obras de infraestrutura em curso no país.
com JOANA CUNHA, ALESSANDRA KIANEK e VITOR SION

GOSTOSA

CELSO MING

Alargamento do horizonte
CELSO MING

O ESTADO DE SÃO PAULO - 28/03/11

O Banco Central já avisou que não contará com a inflação na meta até final de setembro. A partir daí, a inflação começará a convergir para lá - avisa a última ata do Copom.
Essa ideia poderá vir a ser mais bem explicada no Relatório de Inflação, a ser editado nesta quinta-feira. Em todo o caso, fica claro que o horizonte com que o Banco Central trabalhará não será, ao menos desta vez, o ano calendário, mas um ponto qualquer lá no meio de 2012. É o que o Banco Central chama, algo empoladamente, de "alongamento do horizonte relevante da meta de inflação".
Primeiramente, é preciso entender o que está por trás dessa decisão. E, em segundo lugar, avaliar algumas de suas consequências.
No seu depoimento à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, na última terça-feira, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, citou as novas incertezas geradas por acontecimentos que ninguém previra. Entre eles, a esticada dos preços das commodities agrícolas, especialmente dos alimentos, que no período de 12 meses terminado em fevereiro subiram nada menos que 55%. Mas apontou também o avanço, este previsível, do crédito, de 20,3%, no período de 12 meses terminado em janeiro. Não falou que a virulência da inflação foi provocada mais pela escalada das despesas públicas do que por esses dois fatores juntos. Mas isso agora é leite derramado.
Tombini provavelmente dirá que, se fosse para enfiar a inflação para dentro da meta ainda em 2011, seria necessário aplicar uma quimioterapia de juros. E que, apesar de toda a sua autonomia à frente do Banco Central e tal, um novo choque de juros agora seria inadmissível. Daí porque a saída foi estender, ao menos provisoriamente, o prazo de convergência.
Convém perguntar se esse aumento do prazo será suficiente para controlar o atual empuxo da inflação. E há um punhado de dúvidas sobre isso. A primeira delas está no próprio efeito desse alongamento. Será mais inércia inflacionária produzindo efeitos sobre a inflação futura. Não está claro se os modelos do Banco Central estão devidamente carregados com essa pressão e o que virá com ela.
A segunda dúvida é uma enorme omissão. Em nenhum dos seus documentos, o Banco Central avalia o impacto inflacionário que será produzido pelo reajuste do salário mínimo em 2012, que será ao menos de 13,9%, um preço já contratado pela Lei 12.382, de 25 de fevereiro de 2011.
O Banco Central fala do câmbio estimado para 2011, do que espera de resultado das contas públicas e do comportamento futuro dos preços da energia elétrica, dos combustíveis e do gás de cozinha. Mas, misteriosamente, ignora a paulada do mínimo e o efeito que exerce antecipadamente sobre os preços da economia.
O terceiro fator de inflação é o crédito. O Banco Central tomou as tais medidas macroprudenciais destinadas a desacelerar o crédito. E lá mesmo no Senado mostrou gráficos indicando o seu encarecimento e a redução do número de prestações nas operações de financiamento. O problema é que o comércio segue vendendo como antes e, o crédito, crescendo, até porque o BNDES, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal (bancos oficiais) ignoram a determinação de limitar o crescimento do crédito em apenas 15%.
As enormes dificuldades que o Banco Central vem encontrando para afinar as expectativas do mercado têm tudo a ver com as dúvidas aqui apontadas.

CONFIRA
Rotulagem de transgênico

Em longa carta a esta coluna, o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) discordou do questionamento feito à exigência de rotulagem dos produtos transgênicos no Brasil.

Resíduos tóxicos 
Ao contrário do que afirmam dirigentes da CTNBio (organismo que regula o setor), o Idec adverte que já foi verificada a existência de mais resíduos de agrotóxicos nas plantações transgênicas do que nas de cultura convencional.

Riscos à saúde 

O Idec também não aceita o que dizem autoridades brasileiras da área: há, afirma, risco à saúde. O transgênico pode causar resistência a antibióticos e aumento de alergias.

Ignorância sobre o assunto 
Também discorda das conclusões de pesquisa do Instituto Ipos, que aponta que 74% dos brasileiros não sabem o que é transgenia e não poderiam rejeitar o produto a partir de aviso em rótulo. Pesquisa do Ibope, diz o Idec, mostrou que mais de 90% das pessoas querem saber se o alimento é transgênico ou não. 

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE

"Não sobrou nenhuma mágoa"
SONIA RACY

O ESTADO DE SÃO PAULO - 28/03/11

Herchcovitch fala de Dilma, negócios e casamento gay


Alexandre Herchcovitch foi, antes de Dilma assumir a Presidência da República, o escolhido para ser o estilista da presidente. Não deu. Chegou a fazer 30 peças, em quatro dias, baseadas no armário de roupas dela, segundo contou à coluna. Dilma preferiu manter a gaúcha Luisa Stadtlander, sua costureira há 20 anos.

Tímido, assume que sempre carrega uma bolsa, uma pasta, uma assessora ou uma modelo quando simplesmente precisa ir daqui para ali. Diferentemente de outros que surgem na passarela diante dos fotógrafos para aplausos finais, assim que as modelos somem, ele usa truque de invisibilidade. Desfila no epílogo misturando-se a seu elenco e, principalmente, segurando a mão da musa, modelo e cantora Geanine Marques.

À beira de completar 40 anos em julho, perdeu a retenção e expôs intimidades preciosas: o dia em que se casou com o empresário Fábio Souza, a parceria ainda em desalinho com o grupo empresarial InBrands, o desacerto com a presidente e segredos de família. E, apesar de ter lojas fora do País, garante que o sucesso da moda brasileira no exterior é tão espalhafatoso quanto os balagandãs de Carmen Miranda. Aqui, trechos da conversa.

O que de fato aconteceu entre você e Dilma? Por que a parceira foi curta?

A Dilma foi muito exigente e eu tive poucos recursos para exercer meu trabalho. Para o que me foi pedido, teria de passar mais tempo com ela que os três encontros permitidos: um de oito minutos, outro de 12 minutos e o terceiro com cinco minutos. Foi impossível. Um grande desafio que aceitei e não consegui cumprir por falta de estrutura e de tempo entre nós. Gostaria de ter acertado de primeira, mas não deu. Foi feito um guarda-roupa completo, de 30 peças, em quatro dias. Um mês de tentativas até que se decidiu, poucos dias antes da eleição, que o trabalho teria de ser descontinuado. Posso falar? A minha primeira pesquisa foi com o que ela já tinha no guarda-roupa. Além disso, também teria de produzir coisas novas. Mas não sobrou nenhuma mágoa.

Qual dessas mulheres públicas é elegante?

Elegância não tem nada a ver com roupa. Não se pode dizer que uma pessoa mal vestida é deselegante. A Carla Bruni e a Michelle Obama nunca vi errarem. Olha-se para as duas e elas não erram a ponto de ficar chato. De quem mais vou falar? Só tem elas, né?

Seu nome está ligado a muitos produtos, de jeans à papelaria. Você, de fato, cria tudo?

Impossível fazer sozinho. Dou total crédito à minha equipe. São 500 produtos por semestre. Até por isso senti necessidade dessa loja, bem maior, de 400m2, onde podemos expor todos os produtos. 

Como se sente sabendo que seu nome foi vendido para a InBrands?

Normal. Por muitos anos fui administrador e criador. Entretanto, incompetente na administração. Hoje estou mais livre, com tempo para criar, e confio a parte da administração aos meus sócios. O artista tem de entender do business, e o executivo da arte. 

Você é um dos poucos casos de aquisição de marca que deu certo. Por quê?

Na verdade ainda não acho que deu certo. Somos sócios há três anos, fizemos várias tentativas de se acertar e o que percebo é que eles têm uma visão, e eu outra. Agora estamos tentando unificar as visões.

A moda brasileira faz sucesso no exterior ou se resume às Havaianas e Gisele? 

A moda brasileira não aconteceu lá fora, mas ainda não desisti. Há marcas que tentam, como eu, desde 1996. Mas lá fora a relação comercial vem antes e não há marcas brasileiras com campanhas maciças. Não adianta querer ser estilista internacional e viver no Brasil. Tem de morar em Paris, Nova York ou Milão. Se eu for num evento aqui, todo mundo vem falar comigo. Lá fora, sou reapresentado dez vezes às mesmas pessoas. E não relacionam minha cara à roupa que, aliás, chega muito cara no exterior.

É o contrário do que dizem alguns estrangeiros. Eles afirmam que comprar roupa no Brasil é que é um absurdo. Por quê?

Roupa no Brasil é um item caro. Temos muitos impostos e sobretaxas. Quem paga por isso muitas vezes é o cliente. 

Você vende para a classe C?

Temos isqueiros e band-aids. Chegamos em todas as camadas. A linha de roupa mais popular é o jeanswear, mas é fato que a marca tem público limitado. Não adianta ter plano de expansão para 50 lojas no Brasil. 

O que falta você criar? Um carro, um avião, um navio?

Carro até fiz. Um protótipo para a Fiat. Adoraria entrar no ramo imobiliário, sugerir formas de moradia que não são comuns no Brasil. Também queria fazer marcenaria e trabalhar na TV. 

Gosta tanto de TV assim?

É uma cultura que vem da casa de minha mãe. Assisto novela, quando interessante, e na TV paga os programas Intervention e Hoarders. E algo da Fashion TV. 

O que faz quando não trabalha ou vê TV? Qual é sua vida social?

Não tenho, por opção. Tenho poucos amigos e a minha família. 

Para ir a um evento, vou quase arrastado. Gosto de comer e cozinhar. Faço de tudo um pouco. Eu adorava fazer carne ensopada, mas virei vegetariano há um ano e parei.

Como um estilista judeu como você encarou o episódio John Galliano?

Detesto julgar. Será que ele não falou da boca para fora? Será que não queria dar um basta numa conversa? Não sei. Hoje uma pessoa pública não pode falar o que quiser. Eu mesmo levo bronca da minha assessora porque falo o que quero no Twitter. Não dá para separar a vida pessoal da profissional.

Você casou com outro homem. Como foi a reação em casa? 

As pessoas não abordam muito esse tema comigo. Ninguém da minha família, fora meu pai, minha mãe, meu irmão. Eu falhei na comunicação com meus pais. Por receio da reação, casei sem avisar. Depois levei bronca da minha mãe judia, que chegou num backstage e disse: "A única coisa que eu queria é que você tivesse me avisado". 

Como foi esse casamento?

Fui no cartório da Sé, com testemunha, e acabou. Não teve festa. É um procedimento super simples. O cartório realiza união civil de pessoas do mesmo sexo. Pouco tempo antes até pensei em reunir todo mundo, dizer que iria casar com Fábio (Souza, empresário, dono de brechó em São Paulo, com quem está há quatro anos), mas eu simplesmente não consegui. É uma falha minha. Eu tô melhorando, mas como eu não sabia qual seria a reação... (os olhos enchem-se de lágrimas, mas ele as contém). Pensei que depois daria um jeito de falar. Essa conversa com ela foi três dias depois de eu ter casado. Fiquei super triste.

Por que casou? Muda alguma coisa depois?

Eu falei para o Fábio que, por mim, não casaria. Já me sentia casado, mas ele é super ativista. Achei válido mostrar que não deve haver nenhuma diferença de tratamento da sociedade, da família ou do Estado.

Pensa em adotar filhos?

Essa questão vem e volta. Sabe qual é o meu sonho? Que alguém largue uma criança na minha porta. 

Fazer 40 anos muda alguma coisa para você?

Não. Mas número redondo me faz refletir. Tinha 16 anos, comecei a fazer roupas na casa da minha mãe. Tudo sozinho. Hoje felicidade para mim é ter tempo para modelar, sentar na máquina e costurar. Tenho em casa quarto com mesa de corte, tábua de passar, ferro profissional e máquina de costura. Mas raramente o frequento.

FERNANDO DE BARROS E SILVA

Aborto e tabu
 FERNANDO DE BARROS E SILVA

FOLHA DE SÃO PAULO - 28/03/11

SÃO PAULO - Dilma Rousseff tem se empenhado para fazer do início de seu mandato uma vitrine de valorização da mulher. A despeito do cálculo de marketing implicado no esforço, o resultado é positivo e joga a favor de uma sociedade mais emancipada. Ainda na sexta, a presidente recebeu no Alvorada mais de 30 cineastas e artistas, além de jornalistas, todas mulheres.
Nesse mesmo espírito, a edição de 20 anos da revista "Marie Claire" reuniu as nove ministras mulheres do governo. Fez com cada uma delas pequenas entrevistas, entre as quais há apenas uma pergunta comum: "A senhora é a favor da legalização do aborto?".
É surpreendente que apenas duas delas -Miriam Belchior (Planejamento) e Ana de Hollanda (Cultura)- tenham respondido, sem eufemismos: "Sou". Há matizes nas demais respostas. Mas mesmo aquelas que se inclinam pela legalização tergiversam, procuram meios de atenuar sua posição, como se pisassem em ovos.
Há também respostas francamente escapistas, como a de Ideli Salvatti (Pesca): "Sou a favor da vida. Não só dos fetos, mas também das mulheres que correm risco ao fazer abortos em clínicas clandestinas". Esqueceu de dizer que também é a favor das ovas de peixes...
Luiza Bairros (Igualdade Racial) vai mais longe ao explicitar seu constrangimento: "Essa coisa de opinião pessoal de ministro causa problema. A forma como isso foi tratado nas eleições é um problema!". De fato. É um problema que respostas como essa não enfrentam, ajudando a reforçar o tabu.
José Serra explorou o tema na campanha da forma mais obscurantista. Apelou à convicção religiosa do eleitorado, apesar de saber que se trata de um grave problema de saúde pública. Dilma, que já havia defendido a legalização, recuou e aceitou o debate nesses termos. Essa é uma discussão que regrediu no país. Basta ver o comportamento das ministras do governo da primeira presidente mulher do Brasil.

FAZENDO MERDA