quarta-feira, novembro 23, 2011

BC guarda munição para crise - CRISTIANO ROMERO


VALOR ECONÔMICO - 23/11/11

O Banco Central (BC) caminha, solenemente, para reduzir a taxa Selic na próxima semana em 0,5 ponto percentual, o que fará com que o governo Dilma Rousseff termine o primeiro ano de mandato com juros de 11% ao ano. Dadas as sinalizações feitas pelo BC até agora, o mercado trabalha com a expectativa de mais dois cortes de 0,5 ponto e 50% de probabilidade de uma terceira redução, também de 0,5 ponto, antes do encerramento do ciclo de alívio monetário. Com isso, a taxa Selic cairia a um dígito (9,5% ao ano) em abril de 2012.

Esse é, digamos, o Plano A, aquele em que o crescimento da economia mundial se reduz de forma acentuada, com provável recessão na Europa e estagnação nos Estados Unidos. Nesse cenário, o Comitê de Política Monetária (Copom) seguirá cortando os juros enquanto a inflação em 12 meses for cadente e o cenário externo apresentar riscos para a atividade econômica doméstica.

Na hipótese de um agravamento da crise financeira internacional a partir de um evento de crédito (a quebra de um banco ou a moratória de um país), a tendência do Copom será acelerar a queda dos juros. Mesmo assistindo a uma desaceleração mais forte da economia brasileira neste momento, o BC optou por estratégia gradualista, guardando munição para enfrentar adiante uma possível piora da situação externa.

Diante de uma ruptura na Europa ou nos EUA, o BC sabe que precisará dar uma resposta mais forte do que a vem dando até o momento. Por enquanto, a expectativa oficial é que a desaceleração mundial tenha impacto negativo equivalente a 1/4 do que teve na crise de 2008, uma perda, portanto, de 1,25 ponto percentual na taxa de crescimento do PIB.

Se acelerasse a queda dos juros agora, como desejam integrantes do governo, do setor empresarial e mesmo do mercado, o BC perderia parte do arsenal necessário ao enfrentamento da crise num momento de maior dificuldade. Além disso, a taxa de juro real já está próxima da mínima histórica - 4,58% ao ano, segundo estimativa do Valor Data.

"O plano de voo do governo é promover uma redução sustentada da taxa de juros, portanto, não pode sair queimando munição. Não pode fazer um negócio agora que depois leve os juros para um nível tão fora de esquadro que rapidamente o obrigue a subi-los novamente", diz um experiente participante do mercado.

Essa é a visão benigna. Muitos analistas acreditam que, se a situação internacional se deteriorar além do esperado e o PIB brasileiro embicar muito, haverá pânico em Brasília e o governo não hesitará em usar todos os instrumentos possíveis (monetário, fiscal, crédito de bancos públicos). Por enquanto, não é o que está colocado. Oficialmente, para reagir a um mundo em crise, o governo anunciou mudança no mix de política econômica, fortalecendo a situação fiscal e afrouxando a política monetária.

Aos trancos e barrancos, o governo ajustou o seu discurso. Depois de um início tumultuado, provocado por uma redução de juros inesperada, o BC aperfeiçoou a comunicação, ganhou credibilidade e voltou a coordenar expectativas. O presidente da instituição, Alexandre Tombini, vive, por isso mesmo, seu melhor momento no cargo.

O BC justificou o movimento inesperado de agosto com base no argumento de que a crise internacional era mais séria do que previa a maioria dos analistas brasileiros e teria um impacto relevante na economia doméstica. Esta, alegou o BC, começou a desacelerar mais fortemente no terceiro trimestre, ao contrário do que também diziam os analistas.

A partir desse cenário, o mercado passou a acreditar que os cortes de juros seriam superiores, em cada reunião do Copom, a 0,5 ponto percentual, acima, portanto, do que previa a estratégia formulada pelo BC. O recado do mercado chegou à diretoria da instituição que, a partir de um dado momento, passou a sinalizar, com clareza, que faria "ajustes moderados" na Selic.

O ajuste moderado está para o momento atual como os termos "tempestivo" e "parcimônia" estiveram para o passado. Na gestão de Henrique Meirelles no BC, "parcimônia" indicava queda de 0,5 ponto na Selic. "Mais parcimônia" significava redução de 0,25. Hoje, "tempestivo" quer dizer agora, enquanto na gestão anterior significava "no tempo adequado ou oportuno".

"Ajuste moderado tornou-se uma expressão-código e é lida como um corte de 50 pontos-base", confirma uma fonte. Se Tombini ou um outro dirigente do BC fala publicamente em piora do cenário internacional e não menciona o "ajuste moderado", o mercado entende que ele está sinalizando um corte maior da Selic na reunião seguinte do Copom.

Nos últimos dois meses, o mercado trabalhou, em mais de uma oportunidade, com a expectativa de um corte mais forte da Selic. Quando isso ocorreu, o BC foi lá e puxou as projeções para uma queda moderada. Os códigos facilitam a comunicação do BC e dão previsibilidade a seus movimentos, o que é positivo para o bom funcionamento do regime de metas para inflação.

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