quinta-feira, outubro 20, 2011

ALBERTO TAMER - Brasil depende muito da China


Brasil depende muito da China
ALBERTO TAMER
O Estado de S. Paulo - 20/10/2011

A China vacila, mas não tropeça. Cresceu menos no terceiro trimestre, mas respeitáveis 9,1% sobre 2010. No segundo, cresceu 9,5%. É sinal de que está desacelerando gradualmente, o que afasta, por enquanto, o risco de uma aterrissagem brusca, como aconteceu em 2007, quando o PIB ficou abaixo de 7%. Pode fechar o ano em 9% ou talvez um pouco menos. Não é grave porque o governo manteve a política de estimular a demanda interna, que representa 40% do PIB e conter a inflação por meio de subsídios ao setor que mais pesa nos preços - alimentos. Ela se mantém em 6,2%, com sinais de leve recuo. Pode aumentar, mas a China tem ainda a arma do câmbio. O yuan valorizado pode ser usado para reduzir o custo dos produtos importados e, principalmente, dos alimentos. Com isso, evita tensões sociais mais graves. Ou importá-los absorvendo a diferença. Tem recursos para isso. O cenário atual não tranquiliza, mas alivia o clima de recessão na economia mundial com países importantes crescendo 1,5%.

Importa. Esse resultado da China é vital para a economia mundial, pois ela importa anualmente cerca de US$ 1,5 trilhão. Só se equipara com os Estados Unidos, que representam quase 50% do mercado mundial. Tem superávit comercial de US$ 172 bilhões nos últimos 12 meses, a maior parte com os Estados Unidos. No último trimestre, as exportações aumentaram 17,1% e as importações 20,9%.

Essa tendência deve se acentuar por causa do novo modelo chinês voltado para a expansão do mercado interno no qual há pelo menos 500 milhões de pessoas que consomem pouco. Esse modelo começa a dar resultado. As vendas no varejo em setembro cresceram 17% ante agosto e a produção industrial, que havia recuado, cresceu 13,5%. "Esses resultados são surpreendentes e reforçam a visão de que o crescimento da China é cada vez mais guiado pela demanda domestica", afirma Zhwei Zhang, economista do Nomura.

Bom para eles. E melhor para nós. Mesmo que a economia recue, a demanda interna deverá aumentar.

Os chineses vão continuar comprando e comendo mais. Aqui entra o Brasil. As exportações de soja triturada para a China aumentaram 38,4% até setembro; óleo de soja, 78%; carne de frango, 111%. A China lidera as exportações brasileiras e está no segundo lugar entre os importadores. É hoje o maior parceiro, com um comércio bilateral aumentando quase 40%.

O que não tem sido destacado é a crescente dependência da China. Uma "dependência passiva", de acordo com análise recente do banco Nomura, em Nova York: "Vemos a dependência se aprofundar. Para o melhor ou pior, o futuro econômico do Brasil será mais e mais em função das decisões tomadas em Pequim."

Mais e mais o Brasil está deixando de exportar para outros países para agarrar-se ao barco chinês que continua navegando, mas meio à deriva no que diz respeito ao comércio bilateral, com os produtos básicos dominando as exportações.

Estamos mudando para a China a dependência que antes tínhamos com os Estados Unidos, que chegou a ser de 26%. A nossa com a China se aproxima de 20%. Só que, nesse caso, é mais danosa pela primarização da pauta comercial. Para outros economistas, a dependência é "relativa" e existe só no setor de commodities, diz Welber Barral. Não é tão grave. No mais, estamos bem com eles. Só que quase todas as exportações para a China estão concentradas nesses produtos. Portanto, ela existe, sim. E vai agravar-se nos próximos meses, porque o comércio mundial se retrai.

Tudo bem, por enquanto. E ficamos à mercê do que acontecer na China. Felizmente, por enquanto, o que está acontecendo nos ajuda em parte. O governo chinês reafirmou esta semana que vai manter o crescimento interno, mesmo tendo adotado medidas de restrição de credito. Ele quer que a participação do mercado interno no PIB passe dos atuais 40% para 60%. Isso pode trazer mais inflação - o governo está conseguindo conter com subsídios oferecendo o consumo de alimentos

Esse cenário pode trazer mais tranquilidade ao Brasil, mas não reduz o delicado risco de dependência. Na verdade, não há apenas uma, mas uma dupla dependência: da China e dos preços das matérias-primas que, por sua vez, não devem aumentar - podem até recuar - tendo em vista que a economia mundial não vai crescer nos próximos meses.

E isso mesmo que se resolva a crise europeia no curto prazo. Eles podem até encontrar uma solução na reunião de domingo, mas isso não deverá tirar a União Europeia do caminho da recessão prevista por muitos economistas para este trimestre. Depois de 18 meses de discussão sobre como superar a crise financeira na Eurozona, eles iniciaram outra: o que vamos fazer para voltar a crescer. Mais 18 meses? Política fiscal ou monetária? Incentivar o consumo ou cortar o crédito e conter a demanda por causa da inflação? Mais um ano e meio de discussão?

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