quarta-feira, setembro 14, 2011

VINICIUS TORRES FREIRE - Ignorâncias sobre a inflação

Ignorâncias sobre a inflação
VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 14/09/11

Afora catástrofes mundiais, vamos saber muito pouco sobre o destino do PIB e da inflação antes de dezembro


OS NÚMEROS ainda fortes das vendas no varejo provocaram ontem entre alguns povos do mercado um pouco de "Schadenfreude", de alegria com a desgraça alheia.

No caso, com a possibilidade de desmoralização da hipótese governista de que a economia desacelera rápido, o que puxará os preços para baixo e assim justificará a redução rápida da taxa de juros.

Mas não parece recomendável tirar conclusões a respeito dos indicadores econômicos dos próximos meses, talvez até dezembro.

Antes mesmo de o Banco Central dar o talho polêmico nos juros, o rumo de preços e PIB já era bem incerto. Ainda estava para chegar à economia o efeito da alta de juros do início do ano, o que seria mais visível lá por outubro, se tanto.

Também era difícil de antever qual seria o impacto das decisões de gasto do governo -de quanto seria o crescimento da despesa e qual seu efeito na atividade econômica.

Por último, até junho quase ninguém atinava com o tamanho da turumbamba político-econômica nos EUA e na Europa. Até agora, quando o desastre é iminente, está difícil de "colocar nos preços" daqui o impacto da crise de lá.

"Até o momento (e vale frisar "até o momento", porque a deterioração do cenário externo ainda está indefinida) não se observa deterioração relevante nos três canais de transmissão [da crise] para o Brasil. Isto é, o canal de demanda externa, preços de exportações e crédito externo", como dizia ontem relatório dos economistas do Bradesco.

Quanto a dados pontuais, como os do varejo, note-se que, apesar de ainda forte, o consumo desacelera.

Também nas contas do Bradesco, o crescimento semestral das vendas corria a 12,1% em março, caindo aos poucos para os 8,1% de julho (em agosto, deve baixar mais).

Mas, com a decisão de BC e mercado (ressalte-se, mercado) de baixar juros, a desaceleração, lenta e incerta até agosto, ficou sub judice de vez após o corte polêmico.

Mais importante, talvez, nem seja o fato de a inflação ficar meio ponto acima ou abaixo do que BC ou mercado preveem para 2012.

Há problemas novos e mal pensados no que diz respeito à inflação brasileira. O mercado de trabalho ficou apertado devido à falta de trabalhador qualificado. Se foi o caso, isso não se resolve tão cedo. Vamos viver com inflação mais alta, então?

Há novidades nos vários mercados de serviços, ainda mal conhecidas, derivadas do aumento do consumo dos mais pobres. Quanta retração é necessária para abater o surto de preços nos serviços? Ou esse surto altista especial é temporário, devido à mudança da estrutura de distribuição de renda recente?

Enfim, é claro que a pressão inflacionária derivada do mercado de trabalho apertado e das mudanças no setor de serviços ganha impulso adicional com a alta indexação do salário mínimo e dos benefícios sociais. Esse impulso extra está nas contas do governo que quer ver juros mais baixos daqui em diante?

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