domingo, setembro 18, 2011

CLÓVIS ROSSI - Dois Estados, nenhuma paz?


Dois Estados, nenhuma paz?
CLÓVIS ROSSI
FOLHA DE SP - 18/09/11

Ação palestina na ONU muda o jogo numa região hipersensível, mas EUA já anunciaram veto ao pedido


A AUTORIDADE PALESTINA tem uma boa coleção de motivos para reivindicar, na semana que vem, a concessão pelas Nações Unidas do status de membro pleno (hoje é apenas uma "entidade observadora não-membro").

Lista não exaustiva de motivos:

1 - Em 1948, resolução da própria ONU determinava a criação de dois Estados, um para os judeus, outro para os árabes. O Estado de Israel foi de fato criado. O palestino não saiu do papel nesses 63 anos.

2 - Israel foi comendo fatias do território destinado aos palestinos, a ponto de hoje, segundo cálculos de uma ONG (israelense) de direitos humanos, a B'Tselem, cerca de 500 mil israelenses viverem em áreas que deveriam ser dos palestinos.

"A cada dia que os palestinos esperam um Estado por meio de negociações [com Israel], outra lasca desse Estado é absorvida por Israel. Em poucos anos mais, praticamente nada restará", escreve Reza Aslan, ativista iraniano-americano considerado um dos principais especialistas na região.

3 - As negociações com Israel -o outro meio de obter o Estado palestino- estão estancadas há 18 anos.
O presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, vê a obtenção do status de Estado como um meio de forçar a retomada de negociações em termos menos desfavoráveis aos palestinos.

Escreveu Abbas em maio: "A Palestina estaria negociando na posição de membro das Nações Unidas cujo território está militarmente ocupado por outro, e não como um povo derrotado".

Motivos à parte, a questão seguinte é saber se os palestinos obterão o Estado desejado. A resposta é não. Para ser membro-pleno da ONU, é preciso uma recomendação do Conselho de Segurança à Assembleia Geral. Os EUA já anunciaram o veto à proposição palestina.

A alternativa seria pedir à Assembleia Geral que conceda aos palestinos o caráter de "Estado observador não-membro", o que já é mais que "entidade", o rótulo atual.

Se o objetivo, de qualquer forma, é retomar a negociação, o estado de ânimo das duas partes não parece nada favorável. Michael Cohen, pesquisador do Projeto de Segurança Americano, que acaba de regressar de viagem a Israel, resume os sentimentos de cada lado, no site da revista "Foreign Policy": "Os israelenses estão completamente cegos ou desinteressados da humilhação [aos palestinos] que é a característica da ocupação israelense. Horas gastas em check-points, revistas pelos soldados israelenses e bloqueios nas estradas que restringem os movimentos e transformam o que seria uma curta viagem em uma excursão de dia inteiro são apenas uns poucos exemplos das pequenas degradações que fazem parte da vida diária dos palestinos".

Já os palestinos "têm limitada simpatia ou avaliação do trauma causado em Israel pelo fato de viver em estado de sítio constante e com medo de ataques terroristas". É sobre esse ambiente envenenado que incide a ação palestina na ONU.

Qualquer que seja o desenlace, muda o jogo e acrescenta mais tensão e dramaticidade ao que tem sido um dos pontos mais quentes do mundo nos últimos 60 anos.

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