segunda-feira, agosto 22, 2011

DENISE ROTHENBURG - A fonte secou


A fonte secou
DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 22/08/11

Para quem acha que o cenário político está ruim, é melhor ir se preparando para um pior. O Orçamento de 2012 mostrará que não há recursos para incrementar o ano eleitoral.

Há poucos dias, a presidente Dilma Rousseff deixou escapar a um interlocutor: "Lula deixou obras demais. Não temos como tocar tudo ao mesmo tempo e liberar tudo o que pedem". Tentava assim justificar a impossibilidade de atender os R$ 7,5 bilhões em emendas ao Orçamento de 2011 pedidas por deputados e senadores. A frase circulou entre os petistas como se Dilma tivesse feito uma reclamação e não uma constatação de que o antecessor gastou por conta do futuro. E isso serviu de base para que, ao longo dos últimos dias, alguns saíssem levantando o "volta Lula".

Muito se escreveu e se comentou sobre esse possível retorno do ex-presidente à ribalta como candidato em 2014. Foram consumidas horas de debate para se tentar entender como essa faxina anticorrupção pode terminar respingando na imagem de Lula. Afinal, muitos dos ministros com validade de um iogurte saíram de seu governo, assim como as liberações de recursos agora investigadas. No meio político, entretanto, pouco se disse sobre as contas públicas e o rico dinheirinho do contribuinte que, não raras vezes, vai parar em obras turísticas onde não há turismo, como mostraram reportagens do fim de semana.

Dilma é técnica. Acompanha diariamente as receitas e despesas do governo. Leu cada linha da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2012 que sancionou na semana passada. Sabe que não tem margem para gastar a rodo como desejam os políticos. Está ciente ainda que, diante da balbúrdia no cenário internacional, terá que manter o superavit primário — ou seja, aquilo que o governo economiza — na faixa dos R$ 139,8 bilhões previstos, 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2010, esse superavit ficou abaixo da meta. Foi de R$ 101,7 bilhões (2,77% do PIB).

Daí, conclui-se que Lula gastou mais do devia. Os lulistas dirão que os gastos e lançamentos de obras por parte do ex-presidente foram feitos porque eram necessários, senão ao povo, para alavancar a eleição de Dilma — naquela época uma desconhecida que precisava mostrar serviço para cair no gosto do eleitor. A turma de Dilma, entretanto, diz que a candidatura dela foi escolha de Lula e, se a conta de elegê-la ficou cara, não resta à atual presidente outra saída, senão varrer o descontrole — e os descontrolados — para que os recursos sejam bem aplicados. E aí, deu-se o choque com a base aliada.

Noves fora...

Para quem acha que o cenário político está ruim, é melhor ir se preparando para um estica e puxa maior ainda. Quem estudou a LDO de 2012, como fez Dilma, sabe que não há recursos para aumentos salariais no que vem. Da margem de R$ 17,6 bilhões que o governo teria para ampliar as chamadas despesas obrigatórias, R$ 15,6 bilhões já saíram dessa conta com os incentivos setoriais previstos no programa Brasil Maior e no Supersimples. Sobraram R$ 2 bilhões. Tampouco haverá recursos em caixa para fazer todas as obras em andamento, muito menos para começar novas que ainda não estejam projetadas. O Orçamento de 2012, que sairá do forno da ministra Miriam Belchior em 10 dias, indica que não há margens para inventar mais despesas.

Você aí deve estar pensando: como não terá dinheiro se a arrecadação só aumenta? É sempre bom lembrar que há juros da dívida, pagamento de pessoal, ativo e inativo, e ainda toda a legião de obras dos PACs 1 e 2, da Copa do Mundo, do Minha Casa,Minha Vida, e o Bolsa Família. Só os gastos sociais vão crescer R$ 10,5 bilhões em 2012. Em suma, o mesmo governo que arrecada, já tem claro onde será aplicado esse dinheiro extra.

...ou entende ou dança

Foi ciente de tudo isso que a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, pediu aos líderes que cada parlamentar listasse suas prioridades entre as emendas apresentadas ao Orçamento deste ano. E faltando quatro meses para acabar o ano, muitos acreditam que o dinheiro dessas emendas só chegará às bases no ano que vem, e se chegar. Ou seja, o mau humor no plenário vai continuar e as votações vão prosseguir a conta-gotas. Os aliados do governo, acostumados à gastança do passado e aos convites para jantares no Palácio da Alvorada, se sentirão "desprestigiados" em pleno ano eleitoral. E Dilma que durma comum barulho desses!

A presidente não parece tão preocupada assim. Afinal, ela se dedica mais a fazer o que pode com os recursos disponíveis do que ficar atendendo os choramingos dos políticos. Mas não pode viver sem eles. O difícil daqui para frente será fazer com que eles entendam que a fonte secou. Os tucanos, que vinham alertando há tempos sobre esse cenário, já entenderam Dilma e lhe estenderam a mão em suaves gestos de carinho. Querem assistir de dentro do campo, a briga entre ela e os aliados do governo. E, assim, lá na frente, se der para pegar essa bola, dar um chega para lá no PT e conquistar o Planalto, eles não vão titubear em fazê-lo.

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