segunda-feira, junho 13, 2011

MARIA INÊS DOLCI - Teleproblemas


Teleproblemas
MARIA INÊS DOLCI
Folha de S. Paulo - 13/06/2011

Os consumidores querem apenas que as teles prestem bons serviços, a preços justos; não é pedir demais

POR QUE AS operadoras de telefonia estão boicotando o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL)?
Pelo mesmo motivo que as leva a prestar um serviço ruim e caro -dos mais caros do mundo, aliás. Porque "há algo de muito errado no reino das telecomunicações".
O PNBL nem é um plano tão ousado assim, uma vez que pretende levar internet a 68% dos domicílios, com velocidade de até 1 Mbps, por até R$ 35. Convenhamos que o "até 1 Mbps" ainda nos deixará longe da banda larga de outros países.
Mas, pelo menos, o PNBL fixa um teto de preço e tem abrangência boa, uma vez que o acesso à internet é fundamental para que os cidadãos não fiquem fora do mundo digital, inclusive em termos de informação e de conhecimento.
A exclusão digital, hoje, tende a se transformar em perda de qualidade de vida e em limitação no mercado de trabalho. Consequentemente, com queda de rendimento e de ascensão social.
É preciso que o governo federal aproveite esse episódio -a resistência das teles- para mudar o tratamento que recebem quando não retornam aos consumidores o que cobram por seus serviços, principalmente em telefonia móvel.
Uma das saídas para o impasse -a ameaça de convidar empresas estrangeiras para o PNBL- deveria valer também para os demais serviços de má qualidade.
Há certa reserva de mercado que não se justifica, pois as companhias são privadas.
Nunca é demais lembrar que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) trata as teles a pão de ló, como se dizia antigamente.
Por exemplo, a agência se nega a tornar pública a lista dos bens, como imóveis e softwares -que devem retornar à União em 2025. São os chamados "bens reversíveis". Muitos desses bens já foram vendidos, embora a Lei Geral de Telecomunicações proíba que isso ocorra sem a autorização da Anatel.
Então, há por aqui um estranho panorama: tarifas caríssimas, serviço ruim, tratamento meia-boca e total e absoluta complacência da agência reguladora e do Ministério das Comunicações com as companhias responsáveis por essas infrações ao Código de Defesa do Consumidor (CDC). Somente isso já valeria uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso, para que os brasileiros saibam o que há por trás das telecomunicações no país.
A impressão que fica é a de que as operadoras de telefonia fazem o que fazem porque são grandes e fortes. Que não há ninguém, entre as autoridades dos três Poderes, com coragem para enfrentá-las.
Até agora, a presidente Dilma Rousseff sinalizou mudanças no relacionamento com as operadoras.
Primeiramente, ao exigir mais velocidade no PNBL. E, como a Folha noticiou, teria autorizado o convite a empresas estrangeiras para participar do PNBL, se a resistência das operadoras continuar.
São reações adequadas, mas há que mudar o principal, no dia a dia de atuação dessas empresas. Não por acaso, são elas que lideram os rankings de reclamações dos órgãos de defesa do consumidor.
As operadoras móveis querem participar da popularização da banda larga. Aqui, caberia uma avaliação criteriosa, porque também não se destacam pela qualidade dos serviços prestados.
Uma das áreas vitais para o desenvolvimento de uma nação moderna está, então, nas mãos de empresas que deixam muito a desejar em todos os sentidos, inclusive bens públicos, que retornarão à União em pouco mais de dez anos, se não forem dilapidados até lá.
Ninguém está satisfeito, mas as providências para mudar esse quadro não parecem suficientes.
Não há nada que justifique a tranquilidade com que as companhias dessa área passam por cima dos interesses dos consumidores.
Queremos somente bons serviços, a preços justos. Não é pedir demais, exceto se as teles, como os bancos, tiverem licença e proteção para fazer as coisas como acharem certo, mesmo quando estiverem erradas.
É uma resposta que os cidadãos esperam para ontem.

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